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Media & Jornalismo

versão impressa ISSN 1645-5681versão On-line ISSN 2183-5462

Media & Jornalismo vol.16 no.28 Lisboa jun. 2016

https://doi.org/10.14195/2183-5462_28_3 

ARTIGO

 

Jornalismo Radiofónico Luso-Brasileiro: as tipificações da convergência nos modelos de ensino da FCSH/UNL e da ECA/USP

 

Luso-Brazilian Radio Journalism: the typifications of convergence in teaching models of FCSH/UNL and ECA/USP

 

 

L.C. Galvão Jr.I

I Unitau. E-mail: galvaojr@uol.com.br

 

 


RESUMO

O contexto digital leva o Jornalismo a reconfigurações não apenas no âmbito dos media, mas também nas salas de aula, onde docentes promovem ações dedicadas a promover a aderência do ensino à realidade. A existência dessas iniciativas motivou este estudo que observa a inserção do fenômeno da convergência no ensino do Jornalismo Radiofónico em Portugal e no Brasil. O modelo metodológico parte de estudos de caso envolvendo as disciplinas Atelier de Jornalismo Radiofónico, do percurso Jornalismo da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH/UNL); e Radiojornalismo e Projetos em Rádio, do curso de Jornalismo do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (CJE-ECA/USP). Notou-se no estudo a adoção de atividades que ressaltam a convergência tecnológica, no caso português, e de conteúdos, no recorte brasileiro, evidenciando aproximação das ações pedagógicas à prática do jornalismo radiofónico..

Palavras-chave: Comunicação; Educação; Jornalismo Radiofónico; Convergência


ABSTRACT

The digital context leads Journalism to reconfigurations not only in media context, but also in classrooms, where teachers develop actions dedicated to promoting the adherence of teaching to reality. The existence of these initiatives motivated this study that analyses the inclusion of the convergence phenomenon in Radio Journalism education in Portugal and Brazil. The methodological model of case studies is used involving the disciplines “Atelier de Jornalismo Radiofónico”, from Journalism branch of the Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH/UNL), and “Radiojornalismo e Projetos em Rádio”, from Journalism course of the Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (CJE-ECA / USP). It was noted in the study the adoption of activities that highlight the technological convergence, in the Portuguese case, and the content convergence, in the Brazilian case, showing approximation of pedagogical actions to the practice of Radio Journalism.

Keywords: Communication; Education; Radio Journalism; Convergence


 

 

Introdução

Os media estão à mercê de um processo de reconfiguração desencadeado com maior ênfase, na última década, pela disseminação social da internet e das tecnologias digitais. Rádio, televisão e periódicos impressos perdem gradativamente a hegemonia consolidada no século passado e migram conteúdos analógicos para um ambiente virtual que abriga infinitas mensagens, em distintas configurações e linguagens. Os novos suportes digitais deslocam sons, imagens e textos para o mesmo entorno virtual, onde ocorre o fenômeno da Convergência dos Media. Conforme Henry Jenkins (2006: 27), as transformações vigentes afetam a tecnologia, os mercados, as culturas e a sociedade a partir da convergência, que atinge principalmente as mentes de indivíduos que manejam não apenas aquilo que querem ouvir ou ver, mas tudo que desejam ampliar, repercutir, produzir e interagir. Esse fenômeno da era digital submete o Jornalismo a remodelações nos media e, consequentemente, nas instituições de Ensino Superior, que têm a missão de capacitar indivíduos críticos e socialmente comprometidos.

No tocante ao ensino do Jornalismo Radiofónico, o cenário descrito exige dos docentes portugueses e brasileiros a readequação das ações teóricas e práticas, sem que ocorra com isso prejuízo aos conceitos e fundamentos desse campo comunicacional e aos princípios elementares da Educação, como os relativos à qualificação ética para o trabalho e à promoção da cidadania. Portugal e Brasil, que partilham do mesmo idioma e que têm laços históricos e culturais indissolúveis, possuem nessa seara semelhanças e diferenças que carecem de maior compreensão, principalmente devido à limitada troca de experiências e por conta da escassez de investigações conjuntas. Isto posto entende-se como adequada à análise das estratégias do ensino de Jornalismo Radiofónico nessas nações no atual e desafiador contexto da convergência.

Assim motivada, esta investigação adota como modelo metodológico estudos de caso que possuem como recorte as disciplinas Atelier de Jornalismo Radiofónico, do percurso de Jornalismo do curso de Ciências da Comunicação da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa – Portugal (FCSH/ UNL); e Radiojornalismo e Projetos em Rádio, do curso de Jornalismo do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – Brasil (CJE – ECA/USP). O critério de validação das amostras, obtidas na FCSH/UNL no período letivo de 2013/2014 e na ECA/USP no período letivo de 2014, observa o fato de que ambos os cursos, bem como as instituições que os oferecem, têm posições internacionais de destaque, ocupando as primeiras colocações em seus países1 .

 

Tipificações da convergência

A Convergência dos Media é uma das tipificações atribuídas ao fenômeno relacionado ao ato ou efeito de convergir, verbo que tem na essência etimológica o conceito de tender algo ou alguma coisa a um ponto comum. Na era digital, a expressão adquiriu nova vestimenta que faz referência a um segmento autônomo de características particulares que sofre transformações contínuas. Nos anos 1970, o termo Convergência das Media referia-se à aproximação entre setores de computação e de telecomunicações. A partir de 1990, a intensificação da transposição do analógico para o digital, seguida da digitalização das formas de produção, de distribuição e de consumo dos serviços de comunicações fez com que a Convergência dos Media indicasse a aproximação e a integração entre setores de comunicação de massa, telecomunicações e informática.

Na última década, o fenômeno adquiriu tipificações peculiares, conforme indica Salaverría (2010). Uma dessas distinções é a Convergência Tecnológica, que trata do estabelecimento de novas relações entre aparatos que antes operavam separadamente, como o telefone, a rádio e a televisão. Essa tipificação é deflagrada por empresas de telecomunicações, produtores de dispositivos de informática e desenvolvedores de aplicativos digitais (Salaverría, 2010: 33). Possibilidades tecnológicas se converteram em demandas de serviços que os media são levados a satisfazer devido a crescente demanda de usuários. No Jornalismo, esse modelo reconfigurou as rotinas internas das redações a partir do final dos anos 1980, estimulando a inclusão de novas ferramentas de produção e de digitalização.

A Convergência Empresarial relaciona-se às empresas de comunicação que mudaram estruturas e processos de produção para responder às imposições do mercado que, devido à internet, segue regras administrativas e comerciais distintas das anteriores. “Não é raro encontrar hoje em dia empresas de mídia que, além da edição jornalística comum, têm participações em agências de notícias, empresas de produção e distribuição audiovisual e prestadores de serviços digitais” (Idem, Ibidem – tradução nossa).

A questão econômica está relacionada ainda a Convergência Profissional, que modifica gradativamente o perfil dos especialistas que ingressam no Jornalismo. Novas tecnologias que permitem o manejo de várias ferramentas e o acesso a multiplataformas demandam novas aptidões profissionais adequadas a uma forma de organização laboral diferenciada. Exige-se polivalência – palavra que representa uma significativa parcela do motivo da degradação da profissão. “Muitos jornalistas se veem hoje impelidos a produzir cada vez mais informação, mais rápido e em jornadas de trabalho mais extensas, considerando que, em troca, recebem salários ou outras recompensas menores” (Salaverría, 2010: 36 – tradução nossa).

Outra tipificação refere-se à Convergência dos Conteúdos ou Comunicacional, gerada pelo aperfeiçoamento dos aparatos tecnológicos, dos processos logísticos e do perfil dos profissionais. Salaverría (2010: 38) chama tal cenário de “Multimidialidade”, fenômeno que não é exclusivo dos media no ciberespaço, mas que afeta os media tradicionais, uma vez que condiciona linguagens distintas e específicas a um processo de fusão de conteúdos textuais e/ou audiovisuais.

As tipificações de Salaverría são corroboradas por Scolari (2011), que menciona o trabalho do colega espanhol ao ser questionado sobre quais transformações culturais podem ser observadas no quadro de convergência conceituado por Henry Jenkins. Ao salientar que cada tipificação “inclui uma série de tendências e processos, como a fusão de empresas, a união de redações digitais e analógicas ou a aparição de perfis profissionais híbridos como o jornalista multimídia ou multiplataforma”, Scolari relata que é preciso considerar outras convergências, como a Semiótica, pela qual “as diferentes linguagens e sistemas de significação se cruzam e se contaminam entre si – e de uma convergência narrativa na qual os relatos saltam de um meio a outro”; e a Narrativa Transmediática (transmedia storytelling), “na qual os relatos saltam de um meio a outro” no ambiente digital (2011: 133).

No que concerne à rádio, é evidente a adesão às tipifi convergentes. Exemplo disso é a opção pelo viés tecnológico continuamente renovado em telemóveis que, na maioria dos modelos, oferecem dispositivos que dão acesso ao áudio emitido por ondas hertzianas, ou nos sites das rádios via streaming. Nesses sítios, há ainda uma gama de informações sonoras, visuais e textuais, entre outros atrativos, que cativam as audiências. A Convergência, independentemente da tipificação, insere a rádio numa polifonia2 comunicacional desencadeada no ciberespaço, onde o mundo real migra para uma esfera de interações virtuais imediatas que estabelecem a combinação de formatos, conteúdos e linguagens diferenciados. Há uma ambiência de dimensões imensuráveis na qual tempo e espaço estabelecem uma realidade social de caráter virtual remodelada a cada novo momento – não se opondo àquilo que é real, mas oferecendo novos contornos ao que é atual. “O virtual é como o complexo problemático, o nó de tendências ou de forças que acompanha uma situação, um acontecimento, um objeto ou uma entidade qualquer, e que se chama um processo de resolução: a atualização” (Lévy, 1996: 16). Há no ciberespaço uma efetiva soma de outras vozes que não são apenas reverberadas pelas ondas hertzianas, mas também nos cabos de fibra ótica e em condutores Wi-Fi que permitem a interconexão online à internet.

Para a rádio, a década de 1990 foi crucial por causa da popularização e posterior massificação da internet que, gradativamente, atinge segmentos sociais diversos (Prata, 2009). Porém, na última década, tal fenômeno definiu a opção dos media analógicos pelo ambiente digital. De acordo com o resumo executivo Medicíon de La Sociedad de La Informacíon (UIT, 2013), estimava-se que 40% da população mundial teria acesso online à internet, sendo que a banda larga móvel seria mais acessível do que a banda larga fixa. As assinaturas de banda larga móvel alcançariam 2,3 bilhões, com 55% delas registradas em países em desenvolvimento, como o Brasil. As estimativas eram de que, globalmente, a penetração da banda larga móvel chegasse a 32% até o fim de 2014, representando quase o dobro da taxa de penetração registrada três anos antes.

A telefonia móvel tem sido a responsável por promover o acesso planetário à Web. Conforme o relatório da UIT, o planeta registrou até o final de 2013 a marca de 6,8 bilhões de assinaturas de telefonia móvel, sendo que 2,7 bilhões teriam possibilidade de acessar à internet. O número de telemóveis no mundo ultrapassará a população do planeta e, dentre esses usuários, 30% são jovens considerados “nativos digitais”. Em 2012, havia cerca de 363 milhões de indivíduos com esse perfil, o que representava 5,2% de uma população mundial de sete bilhões de habitantes. O relatório da UIT informou que os jovens com idades entre 15 a 24 anos têm cinco ou mais anos de experiência online. Eles fazem parte de uma geração que nasceu em meio à vasta disponibilidade de informações rápidas e acessíveis obtidas na Web a partir das novas tecnologias digitais.

Ao convergir com outras expressividades comunicacionais na internet, a rádio é desafiada a rever rotinas e se reconfigurar – fato quer ocorre de maneira gradativa, uma vez que é possível dispor no ambiente virtual de acesso, em tempo real, a um número incalculável de fontes, agências de notícias, portais e outros meios online (Del Bianco, 2004: 2). Na atualidade, as transformações tornam-se mais significativas, revelando um Jornalismo Radiofónico que procura firmar-se na internet. Fazem parte das mudanças em pleno curso na maioria das rádios portuguesas e brasileiras a ampliação do processo de interação com os ouvintes pelas redes sociais e o oferecimento de conteúdos sonoros exclusivos que convergem com outras expressividades na Web. No âmbito académico, iniciativas buscam promover a aderência do ensino à realidade, como revelam, a seguir, ações deflagradas na FCSH/UNL e na ECA/USP.

 

O ensino do Jornalismo Radiofónico na FCSH/UNL

Além de ser a primeira dentre as instituições de ensino superior a lançar uma licenciatura específica em Comunicação em Portugal, fato ocorrido em 1979, a FSCH/ UNL foi pioneira na criação de mestrados na área ao lançar os cursos Ciências da Comunicação em 1984 e Jornalismo em 1991 (Mendes, 2012). Os doutoramentos na área surgiram no fim dos anos 1980 e contribuíram “para relançar a oferta na área específica dos estudos da comunicação” (Coelho, 2013: 355). No período letivo de 2011/2012, a instituição criou a Pós-graduação em Reportagem Multiplataforma, com a duração de dois semestres em regime intensivo. No período letivo de 2014/2015, a FCSH/UNL ofereceu 14 licenciaturas, incluindo Ciências da Comunicação. O Mestrado ofereceu 14 cursos, entre eles Ciências da Comunicação3 , Comunicação da Ciência, Comunicação, Média e Justiça e Jornalismo. O Doutorado teve 26 opções de cursos, dentre os quais há o de Ciências da Comunicação4 .

A estrutura curricular obrigatória da licenciatura em Ciências da Comunicação tem como áreas Jornalismo, Comunicação, Cultura e Artes, Comunicação Estratégica e Cinema e Televisão5 . Nesses cursos, com a duração de seis semestres, o aluno deve cumprir 180 créditos, sendo 120 realizados no programa de disciplinas obrigatórias, 30 no quadro de opções condicionadas e 30 créditos realizados em opções livres ou em um grupo menor de outra área científica. A licenciatura em Ciências da Comunicação permite acesso aos percursos Comunicação, Cultura e Artes, Comunicação Estratégica, Jornalismo e Cinema e Televisão. Em 2013 foram oferecidas 87 vagas ao percurso Jornalismo, que teve uma grelha formada por 29 disciplinas, sendo de 20 obrigatórias6 . O currículo ofereceu nove disciplinas optativas, chamadas condicionadas. Dentre elas estão os ateliers de Ciberjornalismo, de Jornalismo, de Jornalismo Televisivo e de Jornalismo Radiofónico7 , cada uma com direito a seis créditos que são somados ao total de 30 créditos obrigatórios a serem cumpridos em disciplinas expostas no quadro de opções condicionadas.

O plano de estudos para o período letivo 2013/2014 do Atelier de Jornalismo Radiofónico observou a apresentação das especificidades das ações jornalísticas a partir da análise comparativa das características entre o Jornalismo realizado na rádio e nos outros media com o objetivo de explorar os conceitos relacionados com a linguagem, a redação e a edição de conteúdos sonoros. A análise e as discussões teóricas dividiram espaço com a produção e a apresentação de pequenas reportagens a partir de softwares usados por rádios portuguesas. A transmissão da mensagem e as técnicas de locução, bem como os elementos sonoros associados à notícia na rádio foram outros conteúdos propostos pelo plano de estudos, que previu ainda a produção e a apresentação de uma reportagem de 5 a 7 minutos de duração. No período letivo de 2013/2014, o Atelier de Jornalismo Radiofónico destacou as especificidades da ação jornalística na rádio visando oferecer aos alunos condições para elaborar textos de caráter sonoro e produzir reportagens a partir de softwares de edição de áudio como o Audacity, com download gratuito na internet. Um treinamento sobre o manejo do programa, acompanhado pelo docente responsável pela disciplina, prof. Dr. Pedro Coelho8 , foi oferecido aos alunos pela coordenadora técnica da FSCH/UNL, Mariana Escudeiro.

O conteúdo programático do Atelier tratou do som enquanto elemento essencial à reportagem radiofônica, das pequenas reportagens e das notícias elaboradas durante o semestre, do papel social do jornalista e dos conteúdos informativos veiculados pelas rádios portuguesas. Comparou também o Jornalismo praticado na rádio e nos outros media e acompanhou trabalhos teóricos e práticos, envolvendo produção, apresentação e discussão de reportagens feitas pelos alunos. Em 2013, as aulas do Atelier aconteceram no primeiro período letivo (ocorrido no segundo semestre), às terças-feiras, das 8 às 11h45 horas da manhã, com intervalo de 15 minutos iniciado às 9h45. A divisão horária foi usada como estratégia para, no primeiro segmento, apresentar os conceitos teóricos sobre o Jornalismo na rádio, enquanto o segundo horário destinou-se às ações práticas baseadas na produção de textos e de reportagens relacionadas com o conteúdo teórico. As aulas ocorreram em sala com computadores conectados à internet e equipamentos multimedia que permitiram a projeção de vídeos e áudios. Essa estrutura compensou, em parte, a falta de um laboratório de rádio destinado à locução e produção de conteúdos sonoros, que foram elaborados pelos alunos em seus equipamentos particulares ou nos computadores disponibilizados pela FCSH, sob a orientação de um profissional da instituição.

No Atelier, a avaliação baseou-se na produção e na apresentação de trabalhos, sendo que pelo menos duas atividades práticas elaboradas individualmente valeram 30% da nota final. Outros 30% foram atribuídos aos trabalhos teóricos feitos em sala e os 40% restantes vieram de uma reportagem radiofônica com duração de 5 a 7 minutos, elaborada no fim do semestre. Não ocorreram provas dissertativas escritas ou outra forma de avaliação documental de fundo exclusivamente teórico. Mas, como parte da avaliação, os alunos participaram numa prova oral de 15 minutos sobre o quadro conceitual que foi associado às ações jornalísticas em rádio.

Na primeira aula de 2013, o prof. Dr. Pedro Coelho apresentou as estratégias relacionadas à metodologia de ensino que recebeu, posteriormente, o acréscimo da produção e veiculação em sala do material radiofónico jornalístico a partir de entrevistas e de reportagens. A ação evidenciou que não há preocupação em atender de maneira exclusiva às demandas do mercado local e, sim, estimular uma reflexão teórica aplicada à ação jornalística na rádio. As atividades práticas priorizaram uma produção empírica desvinculada à aplicação de técnicas específicas para a rádio com o propósito de levar os alunos à percepção das noções da narrativa radiofónica pela elaboração de textos vindos de outras plataformas. A primeira atividade prática usou, para esse fim, uma matéria extraída de um site português. Na segunda aula, exibiu-se um vídeo Youtube referente a uma notícia de cunho esportivo. A atividade inicial foi feita individualmente, sendo que a segunda foi executada em grupo. Cada trabalho foi finalizado com a apresentação oral dos textos refeitos a partir da linguagem jornalística da rádio. Nessas ocasiões, o docente tratou com os alunos da relação entre o conteúdo teórico e os trabalhos práticos, aproveitando ainda para falar da locução radiofónica com ênfase à configuração do texto à pronúncia portuguesa. Notou-se, nesse quesito, preocupação com a padronização da narrativa oral, a começar pela supressão de termos ou expressões regionais distintas.

As aulas seguintes intercalaram abordagens teóricas e práticas que focalizaram a especificidade do Jornalismo na rádio, com a elaboração de exercícios práticos para a aplicação dos conceitos teóricos. Um trabalho em grupo propôs a seleção de reportagens emitidas nas rádios Antena 1 e TSF, com a apresentação e discussão, em aula, dos conteúdos transmitidos pelas emissoras citadas. Houve ainda a introdução ao conceito de reportagem radiofónica, bem como os elementos relativos à narrativa na rádio. Os aspectos sensoriais presentes nesse media foram destacados nessa discussão, assim como nos trabalhos práticos voltados, inicialmente, à captação de áudios, que trataram da transcrição de conteúdos sonoros e da definição dos ambientes onde eles ocorreram. O conteúdo teórico discutiu a especificidade daquilo que foi chamado de Jornalismo de Proximidade e da missão social do Jornalismo. Em outras aulas essas ações foram complementadas pela apresentação e discussão dos planos de reportagem desenvolvidos pelos alunos e a discussão das primeiras pequenas reportagens individuais, feitas a partir da aplicação dos conceitos mostrados em sala.

Outra atividade prática promoveu a audição crítica e debate sobre reportagens radiofônicas selecionadas pelos alunos. No campo teórico trataram-se dos gêneros radiofónicos, da reportagem e da construção de uma notícia com base nas reportagens analisadas nos trabalhos de grupo. Ainda sobre a entrevista na rádio, destacaram-se os diferentes gêneros e a análise crítica conforme exemplos de reportagens e entrevistas obtidas em emissoras portuguesas. Seguiram-se, às últimas aulas, a apresentação, a discussão e a avaliação dos trabalhos teóricos dos grupos, culminando assim na avaliação das reportagens radiofônicas de porte médio.

Nos trabalhos práticos, notou-se a intenção de evidenciar o aspecto sensorial do conteúdo radiofónico. Sons captados nos ambientes onde os fatos foram prospectados, foram editados pelos alunos no Audacity, atuando de forma convergente ao texto previamente elaborado pelos estudantes e criando um conteúdo jornalístico, para a rádio, rico em detalhes. O objetivo do áudio foi deflagrar na mente dos ouvintes “visões” contextualizadas dos episódios narrados. Exemplos dessas ações notaram-se nas apresentações dos trabalhos práticos elaborados exclusivamente pelos alunos que tiveram apoio, na área técnica, de Mariana Escudeiro e, na área teórica, do prof. Dr. Pedro Coelho. Numa das reportagens produzidas, os alunos trataram da greve dos metroviários de Lisboa, inserindo na reportagem radiofónica sonoridades comuns ao ambiente do Metro, como o barulho dos trens, a abertura e fechamento das portas e a locução que informava aos passageiros a chegada numa determinada estação. Em outro trabalho, os estudantes abordaram a reabertura para visitação pública do mirante do arco da Rua Augusta, um dos principais monumentos da capital lusitana. Sons de passos inseridos na reportagem reforçaram as informações que salientavam sobre o acesso ao local que é feito por escadas. O som do sino existente no mirante, emanado diariamente ao meio-dia, também ecoou na reportagem jornalística, frisando uma característica peculiar daquele monumento. As sonoridades intercaladas aos textos e aos depoimentos gravados das fontes ressaltaram o conteúdo jornalístico, ampliando o aspecto sensorial.

As estratégias do Atelier de Jornalismo Radiofónico não se desvincularam do conteúdo teórico, que se tornou mais valorizado. Não houve, na prática educacional, limitação às abordagens comuns ao processo de produção jornalístico vigente nas rádios portuguesas, que tendem a priorizar em suas reportagens o relato informativo dos fatos e a inclusão de depoimentos sonoros gravados. A condição decorre, em parte, do processo próximo ao industrial adotado pelas emissoras.

A rádio, porque tem tempos de difusão da informação muito apertados, está obrigada a renovar continuamente as suas mensagens ao longo do dia. A atualidade na rádio é diferente da atualidade da imprensa e isso determina a organização do trabalho e condiciona a forma e o conteúdo das mensagens que cada órgão de comunicação social difunde (BONIXE, 2012: 157).

A aplicação teórico/prática do plano de estudos superou obstáculos estruturais como a inexistência, na FCSH/UNL, de um laboratório para produção radiofónica. As ações efetivadas ainda relacionaram a formação à Convergência Tecnológica, conforme tipificou Salaverría (2010) e como comprovaram as atividades que capacitaram os estudantes a realizar a captação e a edição das sonoridades em suportes digitais e em softwares disponíveis na Web. Ao enfatizar o uso das tecnologias digitais em condições semelhantes às disponíveis para produção jornalística nas rádios portuguesas, o ensino propiciado na FCSH/UNL mostrou-se próximo da realidade e coerente com os preceitos relativos à profissão. Segundo o prof. Dr. Pedro Coelho9 , responsável pelo Atelier de Jornalismo Radiofónico, os jovens chegam às Universidades dominando dispositivos digitais que favorecem as ações práticas. “Os alunos são muito tecnológicos”, ressaltou o docente, que buscou aliar esses conhecimentos prévios a uma formação que privilegiou as características da rádio como meio informativo e sensorial. “A rádio não vive sem o som. É preciso transportar o ouvinte para o local onde isso ocorre”, completou o professor.

Ao ser questionado sobre as ações que relacionaram a convergência à rádio, Pedro Coelho avalia que acontece, na atualidade, uma junção entre a convergência tecnológica e a convergência de conteúdos que ocorre não apenas por causa das facilidades propiciadas pelas tecnologias digitais, mas por situações relacionadas às novas rotinas de trabalho enfrentadas pelos jornalistas, como a integração das redações. Apesar disso, o docente destaca que, no ensino, é preciso “fazer coisas diferentes do mercado” e privilegiar o Jornalismo. No Atelier, essa premissa torna-se real, como indicou a busca pela aplicação de elementos sensoriais que emolduram, nas sonoridades radiofônicas, os conteúdos jornalísticos. “Os alunos não devem ficar reféns da técnica, mas sim [precisam] criar uma identidade pessoal a começar pela criação de um estilo próprio. Eles não devem ficar reféns da rotina da redação”, completou Pedro Coelho.

 

O ensino do Jornalismo Radiofónico na ECA/USP

A Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP) foi criada como Escola de Comunicações Culturais por decreto assinado pelo Governo do Estado de São Paulo em 15 de junho de 1966. O nome atual foi atribuído em 1970 na reforma do ensino na USP, quando foram acrescentados os cursos de Editoração, Música e Artes Plásticas. A ECA/USP foi pioneira no Brasil no ensino de Pós-Graduação, iniciando em 1972 um curso de mestrado em Ciências da Comunicação (Marques de Melo, 1974: 60-61). Na mesma área, a Instituição criou em 1980 um doutoramento. Em 2014, a ECA/USP ofereceu 24 cursos de graduação10. Jornalismo ofertou 87 disciplinas, nomeadas como obrigatórias e optativas livres11. O curso intercala conteúdos teóricos e práticos nesses dois segmentos, que são ministrados em, no mínimo, oito semestres e, no máximo, 12 semestres, com carga horária de 4.590 horas. O Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE) cedeu 60 vagas para Jornalismo, sendo 30 no período matutino e 30 para o período noturno.

As disciplinas destinadas à rádio são obrigatórias, semestrais e totalizam 420 horas na grade curricular do CJE. Apesar de distintas, elas têm destinações comuns e indicam um desenvolvimento gradativo dos conteúdos. A primeira delas, Jornalismo no Rádio e na TV (CJE 0600) é oferecida aos alunos do 1.º período pelo Prof. Dr. Luiz Fernando Santoro12, caracterizando-se como introdutória a esses medias. Foco deste texto, as disciplinas Radiojornalismo (CJE 0603) e Projetos em Rádio (CJE 0532) são específicas ao ensino da rádio, ministradas sequencialmente a partir do 5.º semestre pelo Prof. Dr. Luciano Victor Barros Maluly13. As atividades teórico/ práticas ocorrem em salas de aula com estrutura multimedia e nos laboratórios de informática e de rádio, sendo que este último dispõe de infraestrutura técnica para a elaboração e apresentação de programas e outras atividades jornalísticas, como entrevistas e debates.

O plano de estudos em Radiojornalismo14 propôs estudar e avaliar manifestações jornalísticas na rádio no sentido de permitir o conhecimento e o emprego das técnicas de produção essenciais à área. A intenção era gerar conhecimentos sobre as potencialidades da rádio com base no estudo crítico do jornalismo atual. O plano abordou questões sobre o conteúdo programático, a linguagem oral e radiofónica e as conformações noticiosas da rádio. Versou-se ainda sobre a relação com as fontes, as regras redacionais e a emissão sonora e a expressão de opiniões a partir de entrevistas e debates. Os conteúdos teóricos, somados à produção e à apresentação dos programas, foram complementados com a elaboração final de uma monografia relacionada à pesquisa em rádios brasileiras. A disciplina Projetos em Rádio, aplicada concomitantemente a Radiojornalismo, tem em seu plano de estudos uma proposta prioritariamente prática que enfatiza a produção de programas com diferentes formatos na rádio, com o intuito de viabilizar um maior conhecimento e domínio das especificidades desse media como difusor de notícias.

O prof. Luciano Maluly15 relata que a descoberta da rádio no campo teórico e prático ocorre nas experimentações envolvendo a produção sonora, com embasamento no referencial teórico. Radiojornalismo expõe-se como disciplina conceitual e de base, voltada à análise e aplicação prática de questões que tratam de aspectos como estrutura, funcionamento e estilos relativos à rádio e ao Jornalismo. De acordo com o professor, nessa disciplina “os alunos já produzem programas, mas básicos, como o radiojornal [principal noticiário da rádio], que tem uma estrutura baseada naquilo que já existe [no mercado]”. De forma sincrônica, a disciplina Projetos em Rádio gera a produção de programas alternativos que oferecem descobertas e experimentações reais que podem ser compartilhadas, de fato, com as audiências. O professor explica que a complexidade é ampliada porque, nessa fase, os alunos tiveram a oportunidade, nas outras matérias que compõem o curso, de se familiarizar com as bases, os conceitos e os fundamentos do Jornalismo.

Para efetivação dos trabalhos de maior densidade técnica e operacional, formam-se grupos com quatro pessoas. A intenção é que cada equipe faça quatro programas por semestre, sendo que esse número pode aumentar conforme ocorram desdobramentos dos trabalhos. Após serem finalizadas e avaliadas, as produções não são condicionadas à audiência dos alunos, técnicos e professores, uma vez que encontram reverberação entre públicos diversos ao serem exibidas pela Rádio USP FM. Criada em 11 de outubro de 1977, a emissora tem estúdios na Cidade Universitária, em São Paulo, transmitindo de forma convencional e disponibilizando as sonoridades em directo no site da emissora via streaming. Esses trabalhos decorrentes das disciplinas Radiojornalismo e Projetos em Rádio têm 30 minutos de duração e são emitidos aos domingos, às 11h30, no programa Universidade 93,7. A iniciativa, criada pelo CJE em 2008, obedece a três formatos: entrevistas, temas especializados e audiobiografias. Os programas tratam de assuntos de interesse público, como saúde, educação, segurança, habitação e esportes, entre outros. O programa tem ainda uma homepage16 com acesso aos trabalhos e demais informações sobre o projeto. O sítio ressalta a transversalidade do curso de Jornalismo da ECA/USP, que alega permitir, do primeiro ao último semestre, a elaboração e divulgação de conteúdos jornalísticos para rádio. O espaço virtual apresenta links com a bibliografia usada pelos alunos nas duas disciplinas e um expediente que identifica os responsáveis pela orientação acadêmica, pela produção radiofónica e Web Design. A iniciativa conta com supervisão da coordenação de programação da Rádio USP.

A veiculação pela Rádio USP e a disponibilização das produções acadêmicas no suporte virtual caracterizam-se como estratégias que inserem os futuros jornalistas numa condição próxima ao contexto das rádios brasileiras. A variedade de assuntos e de fontes consultadas nos programas, bem como o número de produções elaboradas são detalhes que sobressaem nessas ações. Somente entre 20 de março a 11 de dezembro de 2014, o site do Universidade 93,7 recebeu 24 novos trabalhos17 feitos pelos alunos que se somaram aos 260 programas elaborados desde a criação do projeto. Cada edição foi disponibilizada online para audiência ou download dos áudios. De acordo com o prof. Luciano Maluly, trabalha-se nessas produções de forma prioritária a questão da responsabilidade profissional, não apenas quanto à qualidade dos conteúdos e formas radiofônicas emitidas, mas também o cumprimento de metas comuns à rotina de trabalho das redações. “Ele [o aluno] tem responsabilidade sobre aquilo. É o nome dele que está ali, claro que com a supervisão do professor”, enfatizou o docente. É também evidente na iniciativa pedagógica o estímulo à divulgação das produções acadêmicas por intermédio do uso das potencialidades do ambiente digital.

Os alunos dão visibilidade aos trabalhos que realizam nos canais informativos institucionais da Universidade, como a Agência, a Rádio e o Jornal da USP, ou então elaborando cartazes fixados nas dependências da escola. Em alguns trabalhos os estudantes criam conteúdos complementares que convergem com os programas de rádio disponíveis na Internet. Expressividades como Making of, vídeos, fotos e ilustrações complementam os conteúdos em áudio no site do projeto, sendo que o mesmo ocorre com os conteúdos excedentes em áudio dos programas que não são transmitidos, mas introduzidos no site que ainda dá a ficha técnica completa do grupo, indicando quem fez a locução, a reportagem, a produção, a edição e a coordenação do trabalho. No âmbito virtual, os trabalhos também são divulgados nas redes sociais, com destaque para as postagens na página do programa Universidade 93,7 no Facebook18 , onde é possível ter acesso aos links dos programas, além de imagens, vídeos e textos relacionados aos trabalhos jornalísticos para rádio feitos por estudantes, que replicam tais produções numa ambiência diferenciada, atendendo assim a públicos que podem não ser atingidos pelas emissões sonoras da Rádio USP.

Para o docente de Radiojornalismo e Projetos em Rádio, a prioridade do ensino é o conteúdo em áudio, sendo que a convergência desejada acontece no processo de adaptação das sonoridades à emissão na rádio. “Radio é radio em qualquer lugar. A nossa convergência se dá em termos de estilo. Temos que produzir um conteúdo mais marcado pela sensorialidade. [A convergência] é uma questão sensorial”, enfatizou o prof. Luciano Maluly. Tal preocupação denota que, além de priorizar uma das principais essências da rádio, o ensino deve priorizar a qualificação plena dos profissionais que atuarão em emissoras que não aparentam, no Brasil, dedicação aos aspectos sensoriais. Segundo o docente, os programas necessitam se adequar às novas formas de captação sonora que se consolidam perante as audiências, como o uso do fone de ouvido ligado ao smartphone, computadores e notebooks. A orientação é para a composição de sons que não sejam agressivos ao ouvido e que ofereçam uma linguagem acessível, condição preconizada nos referenciais teóricos relativos à produção radiofónica, mas que no cotidiano das rádios, principalmente nas de apelo popular, é quase que inexistente.

Ao verificar os planos de estudo e as atividades educacionais das disciplinas Radiojornalismo e Projetos em Rádio ficou evidente a ocorrência da Convergência de Conteúdos, como tipificou Salaverría (2010). Compreende-se que tal constatação, evidente no uso intensivo do ambiente digital com vistas à proliferação dos trabalhos radiofónicos académicos, permitiu a aproximação dos alunos à realidade na qual está inserido o Jornalismo Radiofónico no Brasil.

 

Considerações finais

O ensino de Jornalismo é impactado por transmutações que se intensificam por conta da disseminação dos novos aparatos tecnológicos e da Convergência dos Media no ambiente digital. O manuseio de softwares e de artefatos de última geração é uma condição salutar ao novo contexto, mas estar conectado à Internet e dominar as tecnologias digitais não são as únicas aptidões necessárias ao futuro profissional. O cuidado com a formação proporcionada nas salas de aula e laboratórios vai além das tecnologias, assim como o Jornalismo vai além da Rádio. Tal desígnio, observado nos estudos de caso realizados em Portugal e no Brasil, desvela uma intenção comum às disciplinas Atelier de Jornalismo Radiofónico, Radiojornalismo e Projetos em Rádio: o não provimento de meras habilidades instrumentais, mas a capacitação de profissionais aptos a compreender de forma reflexiva tudo aquilo que envolve o exercício pleno do Jornalismo. Em ambos os casos pesquisados, observou-se precaução no tratamento dos conteúdos ministrados, obviamente, em condições distintas e adversas. Tal zelo prezou pela inserção do ensino à realidade, conectada a Convergência Tecnológica e de Conteúdos.

As ações empreendidas na FCSH/UNL, apesar de terem um menor tempo para efetivação, cumpriram os propósitos básicos descritos no plano de estudos. O conteúdo teórico foi integrado às atividades práticas, que excederam a simples realização de exercícios para tornarem-se oportunidades concretas de reflexão sobre o porquê do uso das técnicas jornalísticas na rádio e das tecnologias digitais disponíveis para esse media. As disciplinas ministradas no CJE da ECA/USP, que tiveram um tempo de aplicação mais estendido para realização das ações teóricas e práticas propostas pelo plano de estudos, apresentaram um volume de produção maior de trabalhos, além da interface com a rádio pertencente à Universidade e do emprego da internet como ferramenta de potencialização e disseminação dos conteúdos académicos.

As estruturas disponíveis para a aplicação dos conteúdos, diferenciadas em ambos os países, não se expressaram como empecilho às atividades realizadas mediante orientação docente constante. Em Portugal, a falta de laboratórios para produção de programas foi superada por trabalhos que possibilitaram aos alunos não somente uma vivência prática, mas um aprendizado reflexivo real. Eles ainda tiveram a chance de aprender a lidar com aparatos não com o propósito operacional, mas como instrumentos que viabilizaram ações práticas alicerçadas pelas teorias expostas em sala. Surgiram, assim, produções jornalísticas de nível técnico e de conteúdos que surpreenderam pela qualidade e evolução, adequadas à emissão nas mais renomadas rádios lusitanas. O caso brasileiro revelou maior conforto quanto à estrutura, mas não demonstrou acomodação por conta disso. A convergência das sonoridades elaboradas pelos alunos, que também tiveram contato com softwares e equipamentos digitais similares aos vigentes no campo profissional, ocorreu de maneira efetiva no ambiente virtual. As ações nascidas em sala de aula e nos laboratórios foram projetadas para o patamar da virtualidade, onde outros públicos conferiram as produções baseadas na discussão e na prática profissional. As ações não foram relegadas ao esquecimento e ganharam projeção planetária.

As tipificações convergentes mostraram-se evidentes, não somente nos planos de estudos analisados, mas nas iniciativas teóricas e práticas empreendidas nos casos pesquisados. Os trabalhados indicaram, em Portugal, maior inserção da convergência tecnológica ao ensino, enquanto no Brasil a convergência de conteúdos destacou-se no processo educacional. As atividades promovidas no Atelier de Jornalismo Radiofónico, em Portugal, ou nas disciplinas Radiojornalismo e Projetos em Rádio, no Brasil, permitiram compreender que a adequação do processo de formação caracteriza-se como um desafio contínuo para os educadores, que em seus esforços manifestaram a busca pela aderência do ensino à realidade. Prova disso foi a presença das tipificações convergentes nas atividades que possibilitaram uma aproximação ao atual contexto do Jornalismo. Observou-se, assim, um ensino voltado ao preparo de jornalistas para o ingresso em rádios, em Portugal e no Brasil, que estão às voltas com uma Convergência dos Media pujante no ambiente virtual.

Nos casos pesquisados constatou-se a luta pela superação de um dos maiores problemas do ensino contemporâneo: o esquema da classe frontal, na qual o aluno é configurado como um ser passivo, reduzido a um receptáculo de conhecimento, conforme alusão metafórica ao modelo bancário de Paulo Freire construído por Kaplún (2002). Em Portugal e no Brasil, a força da construção coletiva dos saberes no ensino do Jornalismo radiofônico consolidou-se como condição fundamental que merece servir de exemplo a outras ações educacionais.

 

 

Referências

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Del Bianco, Nélia R. (2004). Radiojornalismo em Mutação na Era Digital. In: (http://reposcom.portcom.intercom.org.br/bitstream/1904/17663/1/R0278-1.pdf). (acedido 10/08/2014).

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Salaverría, Ramón (2010). Estructura de la convergencia. In: Lopez, Xosé e Pereira, Xosé (Orgs.) Convergencia digital: reconfiguración de los medios de comunicación en España. Santiago de Compostela: Servicio Ed. de la Universidad de Santiago de Compostela: 27-40.         [ Links ]

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Notas

1 O curso de Ciências da Comunicação da FCSH/UNL, no qual há o percurso Jornalismo, foi o único oferecido por instituição portuguesa a figurar na relação da QS World University Rankings. A classificação de 2014 baseia-se em indicadores que avaliam a qualidade do ensino, a internacionalização, a inovação, a investigação e o número de citações em revistas científicas. Segundo ranking das entidades educacionais com até 50 anos de existência, a UNL figura na 36a colocação. In: (http://www.topuniversities.com/universities/universidade-nova-de-lisboa/undergrad). (acedido 07/07/2014). Ainda segundo dados de 2014 da QS, o curso de Jornalismo do CJE da ECA/USP é oferecido pela instituição de Ensino Superior que ocupa o 1.o lugar no Brasil e a 2.a colocação na América Latina. In: (http://www.topuniversities.com/latin-american-rankings). (acedido 07/07/2014).
2 Conceito formulado pelo pensador russo Mikhail Bakhtin que, ao criticar o objetivismo abstrato que via a língua como um sistema monológico, salientou que a palavra é polivalente e o dialogismo configura-se como uma condição constitutiva do sujeito, que não pode ser concebido fora das relações que o ligam aos outros indivíduos (Bakhtin, 1988).
3 O Mestrado atende as áreas de Cinema e Televisão, Cultura Contemporânea e Novas Tecnologias, Comunicação e Artes, Comunicação Estratégica e Estudos dos Media e Jornalismo.
4 O doutorado atende as áreas de Cinema e Televisão, Comunicação e Artes, Comunicação Estratégica, Comunicação e Ciências Sociais, Comunicação e Linguagem, Cultura Contemporânea e Novas Tecnologias, Estudos de Argumentação, Estudos dos Media e do Jornalismo e Teoria da Comunicação.
5 Das áreas disponíveis no ano letivo 2010/2011 para 92 estudantes matriculados, Jornalismo foi a opção escolhida por 33 alunos (Coelho, 2013: 357).
6 Além do Jornalismo, as disciplinas obrigatórias citadas são comuns às demais vertentes do curso de Ciências da Comunicação: Comunicação, Cultura e Artes, Comunicação Estratégica, Cinema e Televisão. In: (http://www.unl.pt/guia/2014/fcsh/UNLGI_getCurso?curso=4004). (acedido 15/09/2013).
7 In: (http://www.unl.pt/guia/2012/fcsh/UNLGI_getUC?uc=711011066). (acedido 10/06/2014).
8 Pedro Coelho é Doutor em Ciências da Comunicação pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH-UNL), onde concluiu mestrado e licenciatura em Comunicação Social. Jornalista desde 1988 atua como repórter especial de televisão da SIC do programa “Grande Reportagem”. Na UNL é Professor Auxiliar Convidado.
9 Depoimento obtido durante entrevista com o docente em novembro de 2013.
10 Números relativos às licenciaturas, bacharelados e habilitações. Os cursos são nas áreas de Artes Cênicas (4 bacharelados, 2 habilitações 1 ciclo básico e 1 licenciatura), Biblioteconomia, Comunicação Social (4 habilitações: Editoração, Jornalismo, Publicidade e Propaganda e relações Públicas), Áudio Visual, Educação Artística (2 licenciaturas), Educomunicação, Música (4 bacharelados) e Turismo. In: (http://www3.eca.usp.br/graduacao/cursos). (acedido 03/11/2014).
11 As informações apresentadas estão disponíveis para consulta pública no site ECA/USP. Os dados sobre o número de disciplinas foram atualizados em 2011, enquanto o número de professores e de servidores foi atualizado em 2010. In: (http://www3.eca.usp.br/). (acedido 04/12/2014).
12 Graduado em Comunicação (Rádio e TV) pela Escola de Comunicação e Artes da USP (1977), Mestrado em Artes Contemporâneas pela Université de Provence, França (1979), e Doutorado em Ciência da Comunicação pela Universidade de São Paulo (1988). In: (http://www.lattes.cnpq.br/5338933760422537). (acedido 05/03/2014).
13 Graduado em Comunicação Social, Habilitação em Jornalismo, pela Universidade Estadual de Londrina (1995), Mestrado em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (1998), Doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (2002) e Pós-doutorado na Universidade do Minho/Portugal (2011). In: (http://www.lattes.cnpq.br/8327819994771588). (acedido 05/03/2014).
14 In: (http://uspdigital.usp.br/jupiterweb/obterDisciplina?sgldis=CJE0603&codcur=27011&codhab=404).(acedido 20/06/2014).
15 Depoimento obtido durante entrevista com o docente em junho de 2014.
16 In: (http://www.radiojornalismo.jornall.com.br/).(acedido 05/03/2014).
17 Em 2014, a produção foi afetada por conta do movimento grevista ocorrido na USP que perdurou entre os meses de maio a outubro.
18 Essa interface pode ser acessada pelo endereço (https://www.facebook.com/pages/Programa-Universidade-937/286428344773141)

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