Introdução
Com o desenvolvimento tecnológico e o surgimento de novos canais e suportes de informação, também os gostos, as necessidades e os hábitos das audiências se alteram. As audiências são entendidas, nos estudos de mass media, como uma entidade abstrata que é exposta às mensagens, sendo contabilizadas em termos estatísticos. A informação sobre as audiências é usada na definição dos alinhamentos da programação (McQuail, 1983/2000). Quando a exposição às mensagens se torna mais regular e se começa a identificar o envolvimento, a participação regular e níveis de fidelização a determinados projetos mediáticos, os membros das audiências podem também designar-se como públicos (Livingstone, 2005 e 2013). Os públicos não devem ser confundidos com “o público” ou “o público em geral” (outra categoria abstrata). Os públicos são definidos como um grupo de indivíduos com um interesse específico em relação a um assunto (e.g. Babo, 2013; Blumer, 1946). Para Babo (2013) “público”, enquanto substantivo, é um ator coletivo; enquanto categoria, é um grupo de indivíduos ligados por um desejo, interesse, convicção, experiência ou ação pública comum, caracterizando-se por uma dimensão de compromisso. A designação destes públicos pode ser refinada atendendo ao tipo de ação comunicativa face ao medium em estudo (por exemplo: leitor, utilizador, participante, seguidor e até cidadãos) (Hermida, 2020; Livingstone, 2013).
A procura de informação é uma tarefa cada vez mais exigente e, perante a diversidade de oferta, os cidadãos precisam de melhorar as suas capacidades de seleção e opção por fontes credíveis, acessíveis e apelativas. A mudança do ecossistema informativo evidencia novos comportamentos e experiências por parte dos públicos, decorrentes da inovação da oferta mediática existente, mas também de um novo paradigma participativo que evidencia uma mudança de comportamento nas audiências (Livingstone, 2013). Aos mass media ou media tradicionais, juntam-se projetos editoriais multiplataforma que contribuem para uma maior produção, difusão e consumo de conteúdos (Hermida, 2020). Por sua vez, os indivíduos tornam-se o que Singer (2014) apelida de gatekeepers secundários que escolhem as mensagens que querem consumir, entre a muita oferta informativa, promocional e de entretenimento. Adicionalmente, são também impulsionadores de projetos editoriais alternativos e diferenciados com foco em interesses não mainstream, de cariz cívico, cultural e artístico (e.g. Mihailidis, 2014). Considerando a sociedade civil como “um processo comunicativo alicerçado na informação, na comunicação e nas relações” (Taylor, 2010, p. 7), os seus elementos desempenham um papel ativo na partilha de informação e na criação de mensagens. As suas escolhas, investimentos, agendas e ações determinam o que tem valor e é relevante (Jenkins, Ford, & Green, 2013, p. 21).
A Comunidade Cultura e Arte (CCA) assume a missão de “popularizar e homenagear a Cultura e a Arte em todas as suas vertentes e incentivar, em comunidade, o debate social e cultural” e apresenta-se como uma plataforma de distribuição e/ou de acesso de conteúdos de cariz informativo, privilegiando o seu caráter nacional e regional; está disponível em: https://www.comunidadeculturaearte.com/. Esta plataforma, criada a 31 de janeiro de 2014, possui atualmente um website próprio onde são publicados os conteúdos produzidos e perfis nas redes sociais digitais Facebook, Instagram e Twitter. Estes perfis permitem a disseminação dos conteúdos publicados no website, apresentados nos formatos permitidos pelas redes sociais, respetivas com hiperligação para o website. As redes sociais digitais apresentam raros conteúdos específicos (exemplo: publicação sobre o número de patreons ou screenshot com um diálogo cinematográfico). O financiamento do projeto assenta principalmente em donativos, feitos pelos públicos através da plataforma do Patreon (https://www.patreon.com/comunidadeculturaearte). A 22 de junho, foi publicado um agradecimento nas redes sociais digitais da CCA aos seus 110 patronos.
Para assinalar seis anos de existência, a 1 de fevereiro de 2020, a equipa editorial da CCA partilhou uma publicação de reflexão, no seu perfil de Instagram, sobre o seu percurso, revelando possuir cerca de “500 000 leitores mensais” no website. No seu estatuto editorial, afirma ser “rigorosa, isenta, independente de poderes políticos ou particulares, e com orientação criativa para os leitores”, procurando fomentar “a divulgação de opinião informada e pertinente, permitindo a publicação de artigos produzidos por não-jornalistas” numa aproximação à sociedade civil. Constata-se, portanto, o distanciamento da conceção de maior credibilidade da informação produzida por “especialistas”, neste caso jornalistas.
Perante a apresentação inovadora deste projeto editorial, questiona-se: quais as motivações do(s) público(s) da CCA ao utilizarem-na enquanto fonte de informação? As questões de pesquisa decorrentes são: quem lê, o que lê e porque lê a CCA?
Esta investigação é motivada por questões sociais e académicas. Socialmente verifica-se um crescimento cada vez maior de plataformas digitais e a consequente redução da utilização dos media tradicionais enquanto fontes de informação. Este fator leva ao questionamento das preferências e motivações dos indivíduos no momento da escolha das suas fontes de informação. Em termos académicos, procura-se aferir se, no momento das escolhas, os indivíduos ainda valorizam as características associadas à credibilidade das fontes tais como a veracidade percebida e a confiança na informação (Berlo, Lemert, & Mertz, 1969; Self & Roberts, 2019), ou se é necessário propor a atualização teórica face à inovação na produção e disseminação de conteúdos informativos e à mudança dos comportamentos de consumo de informação.
Autores como Gillespie (2010), van Dijck (2013) ou Jin (2015) concordam que os media tendem a tornar-se cada vez mais indissociáveis da sociedade contemporânea. Castells (1999), verificando as mudanças sociais provocadas pelo desenvolvimento das tecnologias da informação e da comunicação (TIC), apelidou a sociedade de “sociedade em rede” marcada pelo capitalismo informacional, cuja principal matéria-prima é a informação. Manovich (2001) explicou que o surgimento da Internet conduziu à implementação de ferramentas tecnológicas de produção, manipulação e distribuição de conteúdos. Esta temática é indissociável da teoria dos usos e gratificações, que serve de auxílio para aferir as motivações do público da plataforma CCA.
Em termos estruturais, este artigo apresenta um enquadramento teórico com revisão de literatura em torno dos conceitos de comunicação digital, plataformas digitais e fontes de informação; e das teorias base do modelo teórico: a source credibility theory e a teoria dos usos e gratificações. De seguida é apresentado e desenvolvido o estudo empírico e são apresentadas as conclusões.
1. Comunicação digital, plataformas digitais e fontes de informação
Neste ponto são apresentados os conceitos fundamentais para a compreensão deste estudo. Abordam-se as mudanças ocorridas fruto da evolução tecnológica (Castells, 1999) e apresenta-se o conceito de comunicação digital, expondo a sua importância e complexidade em captar a atenção dos públicos, num contexto de overload informativo. Associadas à comunicação digital caracterizam-se as plataformas digitais e fontes de informação para os utilizadores. Ao operacionalizar o conceito de fontes de informação é abordada a teoria da credibilidade das fontes (source credibility theory), numa tentativa de identificar quais as fontes consideradas credíveis e quais as suas características (Self, 2009). Por fim, é abordada a teoria dos usos e gratificações, associada à suposição de que os indivíduos selecionam as suas fontes de informação, atendendo às suas necessidades, desejos e perceções (Papacharissi, 2009).
1.1. Comunicação digital
É num contexto de mudanças políticas, económicas e sociais que Castells (1999) fundamenta o aparecimento da “sociedade de informação”: “uma nova economia surgiu em escala global (…). Chamo-a de informacional, global e em rede (…). Essa nova economia surgiu no último quartel do século XX porque a revolução da tecnologia da informação forneceu a base material indispensável para sua criação” (Castells, 1999, p. 119). Castells (2003) considera a utilização da expressão “sociedade da informação” redutora, face à relevância da informação em todas as sociedades. Prefere a expressão “capitalismo informacional” para definir a sociedade contemporânea, uma vez que é a ação do conhecimento sobre o conhecimento a principal força produtiva, originando uma nova economia e uma nova sociedade. Na opinião do autor, atualmente, as estruturas capitalistas de produção (lucro, propriedade privada, dinâmica de mercado) combinam-se com a flexibilidade e globalidade das redes informativas. Fuchs (2008), por sua vez, evidencia a distinção entre as dimensões antagónicas que enquadram o capitalismo informacional e que se relacionam com as duas lógicas dominantes na relação entre a Internet e a sociedade: a lógica da “co-operação” e a lógica da competição. Ao evidenciar as duas lógicas introduzidas e acentuadas pela sociedade em rede, Fuchs (2008, p. 341) faz a apologia da lógica de “co-operação” caracterizada por uma maior igualdade de oportunidades, por tecnologias de cooperação, pela e-participação, pela sustentabilidade, pela socialização virtual e pela dádiva.
Referindo-se a um paradigma tecnológico, Castells (2003) aponta a informação como principal matéria-prima de uma sociedade que estava perante a ascensão de novos espaços de procura e partilha de informações, onde não havia barreiras de acesso a bens de consumo, produtos e comunicação. É neste contexto de evolução tecnológica que novas formas de comunicar se desenvolvem, surgindo o conceito de comunicação digital.
Este conceito é indissociável do crescimento da world wide web (mais conhecida como web) definida como um “sistema tecno-social de interação de indivíduos baseado em redes tecnológicas” (Aghaei, Nematbakhsh, & Farsani, 2012, p. 1). Aghaei e outros (2012) esboçam uma resenha da evolução dos conceitos associados à web. Esta é inicialmente caracterizada como web 1.0 servindo para ler (a read-only web), uma web estática, pouco interativa e em parte unidirecional. O principal objetivo dos websites era publicar informações, de modo a estabelecer uma presença online. Em 2004, terá sido cunhado o termo web 2.0 para nomear a web da sabedoria, a web da participação, permitindo ler e escrever (a read-write web), abandonando o caráter unidirecional. A web passa a ser considerada uma plataforma, começam a surgir as web applications, com maior dinamismo e interatividade entre utilizadores. Em 2006, foi sugerido o termo web 3.0. A ideia base desta terceira web assenta em estruturas de dados, ligadas e integradas, disponibilizando ferramentas que permitam ao utilizador usufruir de uma experiência mais atrativa. A web 3.0 melhorou a gestão de dados, começou a evoluir na ligação de Internet no telefone, foi capaz de simular criatividade e inovação e melhorou a satisfação dos utilizadores. É vista como a web da semântica, uma web de dados que consegue não ser apenas compreendida por indivíduos, mas também por computadores - os autores chegam a referir que neste modelo as máquinas estão primeiro que os humanos (Aghaei, et al., 2012, p. 5).
Almeida (2017) esclarece que, ao contrário do que sucede com a web 1.0, 2.0 e 3.0, a definição de web 4.0 não é consensual. A dificuldade em defini-la surge em consequência das múltiplas dimensões que possui, cada uma diferente da outra. Almeida (2017, p. 7044) conclui que aplicativos - como as redes sociais digitais - e tecnologias - como a Internet das coisas, o big data e a inteligência artificial - foram preponderantes na adoção e implementação da web 4.0.
Lembramos que Tim Berners-Lee (2002 e 2006), o criador da world wide web, discordava desta divisão da web. Na sua opinião, a principal função da web mantém-se desde que foi criada - ser um espaço colaborativo, onde as pessoas podem interagir, ler e escrever - e não houve quaisquer desenvolvimentos técnicos na web, houve sim avanços tecnológicos em web browsers que permitiram, por exemplo, a criação de vídeos e de conteúdos auditivos em websites, tornando-os mais dinâmicos.
Não obstante, estas caracterizações associadas à web confirmam a importância dada por Castells (1999, p. 82) aos progressos tecnológicos que permitem o empacotamento de todos os tipos de mensagens, inclusive de som, imagens e dados, criando-se, assim, uma rede capaz de comunicar sem fronteiras. Para o autor, a universalidade da linguagem digital e a lógica das redes do sistema de comunicação geraram as condições tecnológicas para a comunicação global horizontal. Manovich (2001) defende que o surgimento da Internet, que passou a ser a maior distribuidora de conteúdos, permitiu a utilização de ferramentas tecnológicas de produção, manipulação e distribuição de conteúdos, o que, por conseguinte, contribuiu para um overload informativo. O autor explica que os conteúdos passaram a incluir texto, imagens (estáticas e dinâmicas), som e construções espaciais, conduzindo ao aparecimento dos “novos media”. Manovich (2001) indica cinco aspetos que caracterizam os “novos media”: representação numérica, modularidade, automatização, variabilidade e transcodificação cultural. O primeiro remete para os códigos digitais e para a manipulação algorítmica presente nestes novos formatos; o segundo associa-se à estrutura dos “novos media”, que são compostos por vários módulos, que podem apresentar diferentes formatos; o terceiro relaciona-se com a capacidade da tecnologia em criar, manipular e assegurar o acesso aos conteúdos de forma autónoma e automática; o quarto remete para o dinamismo dos conteúdos, que neste contexto podem sofrer inúmeras modificações; o último relaciona-se com os efeitos da computação na nova forma de tratar e organizar os dados.
Tanto Castells (1999) como Manovich (2001) ajudam a compreender mudanças na natureza e na forma dos conteúdos. A ubiquidade e o uso crescente de tecnologias de comunicação cria uma necessidade premente de repensar as forças complexas e multifacetadas que remodelam os ambientes de comunicação das democracias ocidentais. Num contexto de fragmentação, media tradicionais e “novos media” coexistem, podendo-se identificar aquilo que Chadwick (2013) caracteriza como sistema mediático híbrido, que oferece mais escolhas aos públicos e lhes permite redefinir a sua “dieta mediática” (Hermida, 2020).
Assim, numa sociedade de informação em que se verifica um overload informativo (que tende a não abrandar), os criadores de conteúdos digitais veem-se perante o desafio de captar e conquistar a atenção dos públicos. Para tal, não basta ter conhecimento acerca da parte técnica da criação desses conteúdos. Há que saber escolher a melhor maneira de os criar e partilhar. Saucken e outros (2013) abordam o processo user experience design, explicando que consiste em alcançar uma reação emocionalmente positiva do utilizador, com o intuito de o conduzir a usufruir/comprar determinado bem/serviço. Os autores alertam para a complexidade deste processo, dependente de fatores psicológicos e sociais, onde estão incluídas perceções, necessidades, emoções, desejos e crenças. Por conseguinte, dividem o processo em quatro partes: (1) a interação entre o utilizador e o produto - que considera fatores emocionais e racionais; (2) a perspetiva temporal - as expetativas antes e depois da utilização; (3) o ambiente - inclui influências sociais; (4) o mental mode - a perceção que o utilizador já tinha do serviço vai influenciar a sua experiência (Saucken et al., 2013, p. 4). Morville (2004, p. 2) constata que, na perspetiva do utilizador, a experiência deve ser “útil, utilizável, desejável, valiosa, encontrável, acessível e credível”. Os dois estudos evidenciam a complexidade do desafio de captar e conquistar a atenção do público através da comunicação digital.
1.2. Plataformas digitais
Eijk e outros (2015, p. 2) e van Gorp e Batura (2015, pp. 7-8) definem plataforma digital como sendo uma base tecnológica de entrega e/ou agregação de serviços/conteúdos, que tem origem nos provedores destes serviços/conteúdos, dirigida a utilizadores. Contudo, não existe consenso na definição de “plataforma digital”. Gawer (2014), por exemplo, prefere o termo “plataforma tecnológica”, dividindo-o em duas dimensões: a económica e a técnica. Utilizando elementos das duas dimensões, o autor define o conceito de “plataforma tecnológica” como organizações ou meta-organizações cujos agentes são legalmente autónomos, não estão sob uma relação laboral e que: 1) coordenam agentes que podem inovar e competir; 2) criam valor aproveitando as economias de gama na oferta e/ou na procura; e 3) implicam uma arquitetura tecnológica modular composta por um núcleo e uma periferia (Gawer, 2014).
A Comissão Europeia (2016) utiliza o termo “plataforma online” e, fruto da falta de consenso na sua definição, prefere apontar características comuns a diversas plataformas: capacidade de facilitar e extrair valor de interações diretas ou transações entre utilizadores; capacidade de armazenar, usar e processar uma grande quantidade de dados, a fim de melhorar o serviço e a experiência de cada utilizador. A capacidade de agregação de dados concede às plataformas: 1) uma vantagem informacional sobre cada utilizador da plataforma; 2) capacidade de criar ligações onde qualquer novo utilizador poderá melhorar a experiência de todos os utilizadores já existentes - os chamados network effects; 3) capacidade de criar e moldar novos mercados em modelos mais eficientes que trazem benefícios para os utilizadores, mas que podem perturbar os mais tradicionais; 4) capacidade de organizar novas formas de participação civil com base no armazenamento, processamento, alteração e edição de informações; e 5) dependência da tecnologia de informação como meio de alcançar todos os itens acima (European Commission, 2016, p. 2).
Allen e Flores (2013) utilizam o termo “plataformas abertas”. Os autores consideram que a natureza destas plataformas está no seu caráter aberto, permitindo a vários agentes comunicarem e interagirem entre si. Os autores dividem o termo em dois tipos: plataformas de agregação - serviços que têm como principal objetivo permitir que os utilizadores acedam a outros provedores de conteúdo (como, por exemplo, navegadores de Internet que permitem aos utilizadores aceder a websites) - e “plataformas de intercomunicações” - agentes que permitem aos utilizadores interagir entre si (as plataformas Whatsapp, Skype ou Facebook servem de exemplo) (Allen & Flores, 2013).
Deste modo, consultadas várias obras de referência, e apesar da falta de consenso na designação a atribuir, e sendo a CCA uma plataforma que se relaciona com o seu público em contexto digital, optou-se por considerá-la uma plataforma digital.
Os contributos de Eijk e outros (2015) e da Comissão Europeia (European Commission, 2016) apresentam diversas semelhanças no que diz respeito à tipologia das plataformas digitais. Assim, com base nos autores mencionados e fazendo alguns ajustes, opta-se por dividi-las em cinco tipos: 1) plataformas de marketplaces e de comércio eletrónico (e-commerce): aquelas que têm como principal objetivo permitir que os utilizadores realizem transações entre si (e.g. OLX, Ebay, Amazon Marketplace); 2) plataformas de distribuição de plataformas: têm como principal finalidade permitir o acesso a outras plataformas digitais (e.g. Google Play, App Store, Windows); 3) plataformas de partilha de bens e serviços: pretendem, sobretudo, colocar à disposição do utilizador bens e/ou serviços (e.g. Uber, AirBnB); 4) plataformas de redes sociais digitais: a principal funcionalidade destas plataformas é permitir que os utilizadores interajam entre si, permitindo, em alguns casos, que criem perfis e que partilhem e criem conteúdo (e.g. Facebook, Instagram); e 5) plataformas de distribuição ou de acesso a conteúdos: têm como principal atividade a circulação de conteúdos. Aqui também se incluem as plataformas que permitem o acesso a conteúdos (e.g. Wikipedia, Researchgate, Google).
A maior diferença da tipologia adotada anteriormente para a da Comissão Europeia (European Commission, 2016) está na separação dos pontos 4) e 5). Esta separação interessa ao estudo de caso desta investigação sobre a plataforma digital CCA que, em termos de tipologia, se insere no ponto 5) plataforma de distribuição ou de acesso a conteúdos. Estes conteúdos não são produzidos por jornalistas (e por isso não os designamos como notícias), sendo a CCA considerado como um projeto editorial alternativo, onde membros da sociedade civil interessados e conhecedores de assuntos culturais, artísticos e cívicos desempenham um papel ativo na partilha de informação e na criação de mensagens. As suas escolhas, investimentos, agendas e ações determinam o que tem valor e é relevante para públicos com interesses partilhados, que por sua vez contribuem para a amplificação e maior partilha destes conteúdos (Jenkins, Ford, & Green, 2013).
1.3 Fonte de informação e usos e gratificações
Atendendo à caracterização de sociedade informacional e ao overload informativo é fundamental que o indivíduo faça escolhas relativamente ao consumo de conteúdos. À luz da abordagem construtivista, o homem dá sentido à vida quotidiana pelo conhecimento que procura e adquire recorrendo a vários recursos, entre eles os media (Berger & Luckmann, 1966/2010). Considerando que os indivíduos procuram informação para reduzir a incerteza no momento de produzirem julgamentos em relação aos outros (Westerman, Spence, & van der Heide, 2012), é importante explanar o conceito de “fonte de informação”.
Neste artigo, existe um distanciamento em relação à conceção de fonte de informação apenas num contexto jornalístico e entendida como “todos os agentes sociais dispostos a colaborarem com os jornalistas no fornecimento de material informativo considerado de interesse pelos jornalistas” (Correia, 2011, p. 93). Entende-se a fonte de informação como um repositório de informação que pode ser acedido por qualquer indivíduo para satisfazer a sua necessidade de informação em relação a determinado assunto, ou seja, uma fonte de informação é qualquer obra que se usa para responder a uma pergunta (Katz, 2001).
Carrizo (2000) explica que a informação escrita evoluiu fruto do avanço das TIC, que exerceram influência na elaboração, publicação, distribuição e consulta das fontes de informação, através de suportes óticos, sistemas automatizados e redes de comunicação que produziram uma grande transformação na produção escrita e no acesso ao conhecimento. Rodrigues e Blattmann (2011) complementam esta ideia, referindo que, até ao fim de 1990, o termo fontes de informação remetia para um formato impresso e que, com a evolução das TIC e da Internet, passou a ser sinónimo de recursos de informação, disponíveis em formato digital. Vega (2007) também afirma que o crescimento da web e a sua evolução a transformaram numa das fontes informativas mais importantes. O autor exemplifica, referindo que os profissionais da informação passaram a manifestar capacidade para localizar e produzir diretórios, índices e resumos, repositórios de documentos, bibliotecas eletrónicas, revistas eletrónicas, bancos de dados, catálogos e outros sistemas de transferência de mensagens. Percebe-se, portanto, que o termo engloba todos os tipos de meios capazes de conter informações.
Vásquez (2009, pp. 87-98) procura indicar vantagens e desvantagens relativas ao acesso a fontes de informações em formato digital. Como vantagens, a autora refere o seu dinamismo, a gratuidade, o caráter informal, os conteúdos antes ocultos, os conteúdos inéditos, a facilidade de produção, a acessibilidade, o aumento de informação e o valor acrescentado; como desvantagens indica a dependência da participação dos internautas, a parcialidade, a fiabilidade dos conteúdos, a dispersão e fragmentação da informação, o maior grau de obsolescência e a duplicidade dos conteúdos.
Pinto (2000) também aborda as consequências proporcionadas pelas TIC nas fontes de informação, afirmando haver novas modalidades de produção, processamento e circulação de conteúdos informativos. O autor aponta como consequência das transformações ocorridas a quantidade de informação disponível que tem vindo a crescer exponencialmente. Aborda, ainda, o facto de o papel do jornalista, enquanto intermediário de informação, se ter diluído, uma vez que, atualmente, todos os indivíduos que disponham de Internet conseguem aceder a material informativo ao mesmo tempo que os jornalistas. Concluindo, Pinto (2000) considera que a multiplicação e diversificação das fontes de informação representam um sinal da complexificação da vida social; “fazem crescer o volume de dados e informações, expressam, finalmente, a intervenção de novos atores na cena social” (2000, p. 292).
Sendo a CCA uma plataforma digital de cariz informativo, não registada na ERC (e, portanto, não pode ser considerada um órgão de comunicação social) torna-se relevante compreender o porquê de ser usada como fonte de informação face à proliferação de espaços de partilha de informação e à sua “não qualificação” à luz da source credibility theory. Self (2009) explica que os estudos sobre esta teoria, com origens no pós-II Guerra Mundial em Yale (Hovland & Weiss, 1951), visam identificar fontes de informação percebidas como credíveis e caracterizá-las. O autor enumera três ideias centrais nesta teoria. Assim, as fontes são credíveis porque: 1) as audiências percebem que a mensagem transmitida é verdadeira; 2) sabem como se revelar a determinadas audiências; e 3) é o caráter do seu público que as torna credíveis (Self, 2009, p. 437).
Berlo, Lemert e Mertz (1969) aplicaram análise fatorial e identificaram três dimensões dominantes na credibilidade das fontes: segurança, qualificação e dinamismo. Para percecionar a credibilidade de cada meio de comunicação, Roper (1985) procurou a resposta à questão: “se tivesses ouvido/visto o mesmo assunto na rádio, televisão, revistas e jornais, mas contado de maneira diferente, em qual deles estarias mais inclinado a acreditar?” (p. 3). Já em contexto online,Haas e Wearden (2003) e Westerman e outros (2012) identificam como fundamentais as qualidades percebidas da informação, autenticidade, perspicácia, consistência, precisão, popularidade, foco e oportunidade. Assim, à luz desta teoria tenta-se compreender se a CCA é percecionada como uma fonte de informação credível para os públicos e quais as características que contribuem para essa perceção.
Sendo um dos objetivos deste trabalho aferir as vantagens, enquanto fonte de informação, da plataforma CCA, assume-se como base teórica a abordagem dos usos e gratificações. Katz, Blumler e Gurevitch (1974) explicam que ao utilizar determinado medium os indivíduos procuram informação, identificação com as personagens relacionadas, entretenimento, interação social e/ou fuga ao stress da vida diária. Ruggiero (2000) aborda esta teoria em contexto digital e refere que, apesar da questão central ser a mesma - “por que motivo as pessoas escolhem um tipo específico de medium e que gratificações recebem?” (p. 29) -, é preciso incluir conceitos como interatividade, desmassificação, hipertextualidade e assincronicidade para entendê-la melhor. O primeiro remete para a capacidade de interação em contexto digital que os indivíduos passaram a ter; o segundo traduz a ideia de que o indivíduo passou a ter um amplo leque de opções no momento de escolher o seu medium; o terceiro refere-se à sequência de texto que permite o acesso a outra localização em ambiente digital; o último associa-se à capacidade de os conteúdos poderem ser vistos múltiplas vezes e em qualquer altura. Papacharissi (2009, p. 137) explica que os indivíduos selecionam os seus media, e conteúdos, consoante as suas necessidades, desejos e perceções. Essas necessidades expressam-se nas motivações que levam os indivíduos a utilizar determinado medium, relacionando-se com fatores sociais e psicológicos individuais.
2. Opções metodológicas
Este artigo tem como principal objetivo compreender as motivações dos públicos ao recorrerem à plataforma CCA enquanto fonte de informação. Nesta perspetiva, definiu-se como pergunta de partida: quais as motivações do(s) público(s) da CCA ao utilizarem-na enquanto fonte de informação? Elaborou-se esta pergunta de partida com o intuito de se compreender como os “novos media” (Manovich, 2001) vieram alterar o acesso à informação e a perceção da sua credibilidade. Por conseguinte, e assumindo a CCA como estudo de caso (Bryman, 2015; Stake, 1995), estabeleceram-se as seguintes questões de pesquisa:
QP1- Quem lê a CCA? (visando identificar e caracterizar o seu público);
QP2 - O que pode ser lido na CCA? (visando descrever a linha editorial e o tipo de conteúdos que são disponibilizados na plataforma);
QP3 - Porque são lidos os conteúdos da CCA? (procurando aferir as vantagens da CCA, enquanto fonte de informação, na opinião do seu público).
Recorrendo a uma abordagem metodológica mista, tendencialmente dedutiva e quantitativa, utilizou-se a observação direta, a análise de conteúdo e o inquérito por questionário.
A observação direta, durante o mês de janeiro de 2020, à plataforma e aos seus canais online - perfis de Facebook e Instagram - permitiu a recolha de informação sobre a CCA e a análise de conteúdo às suas publicações permitiu identificar a linha editorial. A escolha deste período de análise é motivada pela necessidade de analisar um mês de publicações recentes, não atípicas (sem acontecimentos ou celebrações excepcionais) e não dominadas pela pandemia da Covid-19.
Com o inquérito por questionário pretendeu-se caracterizar o público e aferir as vantagens da CCA, enquanto fonte de informação, na opinião do seu público. O questionário foi dividido em duas partes. A primeira parte incluía oito questões fechadas - cinco de caracterização sociodemográfica dos inquiridos, uma sobre a frequência de acesso à CCA, outra sobre o tema mais procurado e a plataforma preferida de acesso à CCA. A segunda parte incluía cinco questões associadas à motivação e ao uso da plataforma como fonte de informação em comparação com outros meios de informação. Esta parte incluía uma pergunta fechada de resposta múltipla sobre os motivos para a leitura da CCA discriminados seguindo Papacharissi (2009); uma pergunta com resposta de ordenação de meios por preferência, duas questões de resposta por escala de Likert, relacionadas com a comparação entre meios informativos elaborada de acordo com Morville (2004) e de concordância com afirmações pré-definidas, e uma pergunta de resposta aberta, posteriormente sujeita a análise interpretativa.
Após contactar o fundador e diretor editorial da CCA, optou-se pela aplicação online do questionário, sendo disponibilizado no website da plataforma, para abranger o maior número de membros do seu público possível.
Tendo em conta a publicação comemorativa da existência da CCA, publicada a 1 de fevereiro de 2020 no perfil de Instagram, que informava existirem cerca de 500.000 seguidores da CCA, e utilizando uma fórmula de cálculo de amostra probabilística aleatória de populações finitas heterogéneas, seriam necessárias cerca de 386 para um erro amostral de 5% e nível de confiança de 95%. Procurando o maior número de respostas e a maior precisão dos resultados, optou-se por disponibilizar o questionário online durante uma semana no website da plataforma (28/05 a 04/06 de 2020).
3. Apresentação de resultados
De seguida, apresentam-se os resultados do trabalho empírico desenvolvido atendendo a que foram validadas 1525 respostas completas ao questionário, o que permite caracterizar o público-alvo da CCA e aferir as suas vantagens, na opinião do seu público inquirido, enquanto fonte de informação.
3.1. Quem lê e o que lê: caracterização do público-alvo
Através do inquérito por questionário disponibilizado na plataforma em análise, podemos constatar que a maior parte dos respondentes (69,8%) são do sexo feminino, com idades predominantemente compreendidas entre os 17 e os 24 anos (64,9%), seguindo-se a faixa dos 25 aos 34 (26,7%). Residem um pouco por todos os distritos do país, com ligeiro destaque para os distritos de Lisboa e Porto (33% e 16,5%, respetivamente). Por fim, podemos referir que a maior parte dos inquiridos são estudantes (56,2%); encontram-se a frequentar ou possuem o ensino superior (66,2%). Os inquiridos são assíduos, acedendo à plataforma todos os dias (49,51%) ou, pelo menos, uma vez por semana (28,13%), conforme observado no gráfico 1.
Ao acederem aos conteúdos da plataforma CCA no website, os temas que os inquiridos mais procuram são cinema (78,9%), música (70%) e sociedade (67,7%). Sublinha-se que esta era uma questão de resposta múltipla permitindo aos inquiridos assinalar, sem limite, os temas de maior interesse. Para aceder a estes conteúdos, a plataforma mais utilizada é o Instagram, destacando-se com 78,6% das respostas; o website da plataforma é a via menos utilizada (3,5%), pelo menos de forma direta, para aceder aos conteúdos. Clarifica-se, que são raras as publicações exclusivas no Instagram, pois é no website que surgem originalmente os conteúdos, sendo depois disseminados pelas diferentes redes sociais digitais.
O gráfico 2 apresenta os resultados obtidos através da análise de conteúdo aos temas das publicações do mês de janeiro de 2020 da CCA no website. Nesse período foram registadas 281 publicações. As publicações analisadas foram agrupadas em seis temas: cinema, televisão, música, literatura, outras artes e sociedade (Quadro 1).
Regista-se uma maior frequência de publicações sobre música (28,47%), cinema (25,27%) e televisão (20,28%); por outro lado, verifica-se uma menor frequência de publicação dos temas sociedade (12,46%), outras artes (11,03%) e literatura (2,49%).
É possível responder às QP2 e QP1 referindo que quem lê a CCA o faz de forma assídua, para ler publicações sobre cultura e artes, mas também, de forma geral, com interesse pelo que se passa na sociedade. Acede aos conteúdos sobretudo através das plataformas das redes sociais digitais, com especial destaque para o Instagram (QP2). O público da CCA é composto, na sua maioria, por jovens estudantes que têm, ou frequentam, o ensino superior; são sobretudo indivíduos do sexo feminino e encontram-se espalhados um pouco por todo o país, com especial foco nos distritos de maior concentração populacional, Lisboa e Porto (QP1). Tendo como referências os resultados obtidos com as respostas ao inquérito por questionário, definiu-se uma Buyer Persona. Pretende-se com este exercício, apresentar uma caracterização em termos de estilo de vida complementar à caracterização sociodemográfica do público (Figura 1).
3.2. Porque lê: vantagens da CCA enquanto fonte de informação
Para compreender as vantagens da plataforma, enquanto fonte de informação (QP3), destaca-se o valor da informação em si, que permite ao público da CCA estar informado (75,2%) e entretido (15,6%).
Não sendo a CCA um órgão de comunicação social (OCS), é relevante comparar as opiniões dos inquiridos em relação a esses órgãos, atendendo a que a CCA se apresenta como uma plataforma de informação e essa é a natureza dos OCS. Comparou-se a utilização da plataforma com o Jornal Público, Jornal de Notícias, Observador, NiT e Portal Sapo - alguns OCS que dedicam seções próprias a temas artísticos e culturais. Foi pedido aos inquiridos que colocassem estes meios por ordem decrescente de utilização quando procuram informação sobre cultura e arte, e quase metade dos inquiridos (43,28%) colocou a CCA como primeira opção - gráfico 3. Relativamente aos restantes OCS, verificou-se um equilíbrio entre as respostas intermédias (2.ª a 5.ª opção de meio mais usado), com exceção do Portal Sapo, que registou uma predominância das respostas “menos usado” e “mais usado”.
Posteriormente, foi pedido aos inquiridos que comparassem, numa escala de 1 (bastante inferior) a 5 (bastante superior), a CCA com outros meios informativos (jornais, rádio, televisão, outras plataformas digitais) em relação a nove aspetos: organização do website, facilidade de navegação no website, títulos apelativos, leads claros, linguagem acessível (ou seja, simples e clara evitando erudição), presença em redes sociais digitais, ilustrações utilizadas, rigor e isenção. Apesar de resultados anteriores demonstrarem que o website da plataforma é a via menos utilizada para aceder diretamente às publicações (3,5%), os utilizadores acabam por ser direcionados por hiperligação para o website, onde os conteúdos são publicados de forma completa.
De forma geral, houve um equilíbrio nas respostas 3 (semelhante), 4 (superior) e 5 (bastante superior), não havendo, em nenhum parâmetro, destaque para as respostas 1 (bastante inferior) ou 2 (inferior). Nos aspetos “organização do website”, “facilidade de navegação” e “isenção” predominaram as respostas semelhante e superior; em “títulos apelativos”, “leads claros”, “ilustrações utilizadas” e “rigor” predominaram as respostas superior e bastante superior. O destaque vai para os parâmetros “linguagem acessível” e, sobretudo, “redes sociais digitais”, onde se verificou uma discrepância das respostas (bastante) superior em relação às restantes. Com um desvio padrão inferior a 1 (exceto no parâmetro isenção), a análise de variância das médias (ANOVA) permite rejeitar a hipótese nula.
Adicionalmente, procurou-se compreender a relação dos media e dos públicos com a área cultural e artística em Portugal. Neste sentido, foi pedido aos inquiridos que classificassem cinco afirmações, numa escala de 1 (discordo totalmente) a 4 (concordo totalmente).
À afirmação “a temática cultural e artística é suficientemente divulgada em Portugal” (gráfico 4), a maior parte dos inquiridos respondeu que discorda totalmente (53,18%) ou que discorda parcialmente (26,23%).
À afirmação “os meios de comunicação tradicionais (jornais, rádio, televisão) investem pouco nestas temáticas” (gráfico 5), predominaram as respostas concordo totalmente (46,43%) e concordo parcialmente (40,20%).
A maior parte dos inquiridos (66,95%) consideram ainda, de forma parcial ou total, que o público português demonstra pouco interesse nestes temas; tal como consideram que a indústria cultural e artística é pouco desenvolvida em Portugal (68,98%). Em relação à última afirmação - “acredito que após a pandemia que se atravessa estes temas sejam mais valorizados”, as respostas dividiram-se sobretudo entre discordo parcialmente (37,25%) e concordo parcialmente (33,97%), havendo uma repartição de 50% se reduzirmos as respostas a “concordo” e “discordo”.
A última questão era aberta, permitindo o comentário dos inquiridos sobre a utilização da plataforma CCA. A análise às 239 respostas recolhidas permite destacar os seguintes aspetos: 1) foi enaltecida a variedade de informação cultural, bem como o papel da plataforma na difusão e valorização destas temáticas, consideradas insuficientemente divulgadas; 2) foi sublinhada a clareza na forma de expor os conteúdos, aliada a um estilo apelativo, o que acaba por transmitir confiança e crença na credibilidade aos utilizadores; e 3) foi valorizada a presença em plataformas de redes sociais digitais, ao facilitarem o acesso aos conteúdos, através de hiperligações, e estimularem a interação entre membros do seu público.
De forma geral, foi transmitido um sentimento de gratidão e reconhecimento pelo trabalho desenvolvido pela CCA - “é absolutamente enriquecedor e digo até incrível ter uma plataforma em Portugal como esta, que aborda finalmente a cultura e a valoriza de uma maneira tão única, quando ela é tão esquecida. O meu obrigada!”.
4. Discussão de resultados
Os resultados evidenciam a importância para o público de uma forte presença em plataformas de redes sociais digitais para o processo de produção e difusão de conteúdos, sendo um fator chave para o sucesso da CCA. Relembram-se os contributos de Eijk e outros (2015) e da Comissão Europeia (European Commission, 2016) e as suas tipologias de plataforma digital. Nestas constavam as plataformas de distribuição ou de acesso a conteúdos - como é o caso da CCA - e as plataformas de redes sociais digitais - por exemplo, o Instagram, Facebook e Twitter -, cuja principal funcionalidade é permitir que os utilizadores interajam entre si. Através das plataformas de redes sociais digitais referidas, estes dois veículos interligam-se, uma vez que, as redes sociais digitais impulsionam a visita ao website. Os resultados obtidos da comparação entre a plataforma digital em estudo e outros meios informativos (jornais, rádio, televisão, outras plataformas digitais) acerca das suas formas de produção de conteúdos permitiram aferir algumas vantagens da CCA enquanto fonte de informação. Os inquiridos consideram a CCA, relativamente à presença em plataformas de redes sociais digitais, (bastante) superior (89,64%) aos restantes meios informativos. Este resultado reflete a forma de acesso aos conteúdos por parte dos públicos, feita sobretudo através das redes sociais digitais, com o Instagram a ser a plataforma de acesso mais utilizada (78,6%). Este resultado evidencia a importância, para os projetos editoriais online, de estar presente nas plataformas mais usadas pelos públicos, atendendo a que poderão expô-los a conteúdos ou a hiperligações para esses conteúdos com maior facilidade e visibilidade. A importância destas formas de acesso e das valências de partilha de conteúdo, aumenta as possibilidades de escolhas em relação ao que se lê e ao “como se lê”, algo destacado por Jenkins et al. (2013) no contexto do desenvolvimento dos spreadable media.
Se atendermos a que o público-alvo predominante da CCA tem entre 17 e 24 anos e que estes indivíduos estão entre os principais utilizadores do Instagram em Portugal (Johnson, May 4, 2020), é possível entender a necessidade de o projeto investir na sua presença nesta rede. É através do Instagram que a maior parte dos inquiridos acede aos conteúdos e também é nesta plataforma que se regista um maior nível de interação. Considerando as métricas registadas nos perfis da CCA em várias redes sociais digitais, constata-se a importância de estar presente nessas plataformas e o seu papel na difusão dos conteúdos produzidos, que acaba por se traduzir no número de seguidores/gostos na página e, consequentemente, de reações, comentários, partilhas.
Castells (1999 e 2003) e Manovich (2001) abordam o desenvolvimento tecnológico e a informação em ambiente digital, alertando para um overload informativo. Neste contexto, torna-se difícil captar a atenção dos públicos. Os resultados apresentados demonstram que a linha editorial da CCA se divide essencialmente em seis temas, sendo cinco de cariz artístico/cultural e um tema ligado à “sociedade”. Desta forma, este projeto destaca-se pela sua linha editorial, que aborda temas pouco divulgados - diferenciando-se de outras publicações, podendo desta forma “chamar a atenção” dos públicos num contexto de overload informativo -, sendo um exemplo único em Portugal.
Realça-se que o tema “sociedade” é o terceiro mais procurado (67,7%), apesar de ser dos menos abordados nas publicações. Atendendo que é um tema presente em outras fontes de informação, nomeadamente OCS generalistas, esperava-se que os temas mais procurados na CCA incidissem em temáticas culturais e artísticas - temas, na ótica dos inquiridos, que não são tão divulgados. Não obstante, os resultados parecem indicar que os interesses dos públicos são difusos (Plowman, et al., 2015) combinando o interesse em temas culturais e artísticos, com assuntos da atualidade de pendor social (tema: sociedade).
Em comparação com os restantes meios informativos, em termos de formato dos conteúdos e sua disponibilização, destaca-se que os inquiridos consideram que a CCA tem uma linguagem acessível (bastante) superior (82,75%). O tipo de linguagem aliado a ilustrações utilizadas nos conteúdos consideradas “bastante superiores” e uma superioridade nos parâmetros de organização e facilidade de navegação no website, títulos apelativos, leads claros, rigor e isenção, ajudam a compreender o porquê do tema “sociedade” ser o terceiro mais procurado num projeto editorial predominantemente cultural e artístico. Desta forma, a CCA acaba por cumprir a função de OCS generalista, diluindo-se a sua relevância (Pinto, 2000), podendo, eventualmente, retirar-lhe alguns leitores. Outra explicação possível é a da conveniência. Estando o utilizador presente na plataforma Instagram, a consumir conteúdos culturais e artísticos na CCA, por uma economia de esforços e de recursos de navegação, opta por se informar sobre assuntos sociais da atualidade.
À luz destes resultados, compreende-se que estes aspetos tornam a experiência do utilizador “útil, utilizável, desejável, valiosa, encontrável, acessível e credível” como referia Morville (2004, p. 2). Todos estes fatores acabam por estar interligados, mas destacam-se algumas relações: a unicidade do projeto editorial torna a plataforma útil e valiosa para os públicos que acedem aos conteúdos diariamente (62,82%); a presença em plataformas de redes sociais digitais, a organização do website e a sua facilidade de navegação ajudam a tornar a experiência utilizável, encontrável e acessível; a linguagem acessível (simples e clara), as ilustrações utilizadas, os títulos apelativos e os leads claros permitem tornar a experiência desejável; o rigor e a isenção atribuem credibilidade à experiência. Estes resultados confirmam igualmente a relevância da apresentação dos conteúdos online na perceção de credibilidade e na preferência dos públicos, indo ao encontro das conclusões de Lowry, Wilson e Haig (2014).
À luz da source credibility theory e face aos resultados apresentados sobre questões do rigor e isenção e com base nos contributos de Self (2009), pode-se afirmar que a CCA é tida como uma fonte credível porque os públicos percebem que a mensagem transmitida é verdadeira. Sublinha-se, ainda, a responsabilidade assumida pelos públicos na determinação da credibilidade da informação disponibilizada online, atendendo a que a sua seleção não é feita por profissionais (os gatekeepers); os públicos são os gatewatchers, na aceção de Bruns (2008) ou secondary gatekeepers, como lhe chama Singer (2014), e cabe-lhes atribuir relevância e utilidade à informação que selecionam e consomem (Jenkins et al., 2013; Westerman, et al., 2014).
De reforçar que uma observação direta dos perfis de Facebook e Instagram, realizada no dia 23 de junho de 2020 evidencia que o perfil de Facebook tem cerca de 247.894 seguidores e as publicações são atualizadas diariamente, com conteúdos de cariz cultural e artístico; o perfil de Instagram tem cerca de 202.000 e as publicações são atualizadas diariamente quer no feed principal quer nas instastories, com hiperligação para o website. A 30 de janeiro de 2021, o perfil de Instagram atingiu os 250 000 seguidores e o perfil de Facebook os 263 322 seguidores.
No perfil de Facebook, as publicações atingem, em média por semana, cerca de 235 mil utilizadores, 467 gostos e 14 comentários. As publicações do Instagram têm um alcance semanal de cerca de 200 mil utilizadores, atingem em média 3982 gostos e 18 comentários.
Quando a CCA atinge novos marcos em relação ao número de patreons é divulgada uma publicação de agradecimento nas redes sociais digitais. A 30 de janeiro, a CCA agradeceu aos seus 210 patronos (o que representa um acréscimo de 100 patronos desde junho de 2020). Esta é a forma de agradecer de um projeto cujo modelo de negócio assenta em donativos, sendo dependente da captação de atenção e interesse do público, cuja participação é imprescindível, quer no financiamento quer na disseminação dos conteúdos (Jenkins, et al., 2013).
Como a maior parte dos inquiridos são jovens estudantes, com um grau de escolaridade ao nível do ensino superior, nota-se um interesse por temas culturais e artísticos que, na sua opinião, são desprezados e não têm o devido reconhecimento nos media tradicionais. Atualmente, e em consequência do desenvolvimento tecnológico, há mais produções culturais e artísticas, difundidas de variadas formas. Os jovens cresceram neste ambiente de massificação e difusão da cultura, justificando-se a sua maior procura, interesse e preocupação por estas questões. Assim, não surpreende que, com base na teoria dos usos e gratificações (Papacharissi, 2009), a motivação dos públicos para a utilização da CCA seja estar informado (75,2%), a uma longa distância de motivações de lazer (15,6%). Este resultado confirma a pertinência do posicionamento da CCA como uma plataforma de conteúdos informativos.
Quando comparada com outros cinco meios informativos acerca da frequência de utilização, quase metade dos inquiridos (43,28%) afirmaram que a CCA é a sua fonte de informação mais consultada, aquando da procura de informação acerca de cultura e arte. No entanto, 25,25% dos inquiridos responderam que é a menos usada. No Portal Sapo, aconteceu o inverso: registou-se uma predominância das respostas “menos usado” (38,30%), em primeiro lugar, e “mais usado” (25,05%), em segundo lugar. Este resultado contraditório pode dever-se ao facto de, como explicam Plowman et al. (2015) através do termo “latent diffuse publics”, os públicos online não terem comportamentos padronizados, podendo haver uma disparidade de comportamentos. Importa referir que o Portal Sapo também é um mailbox provider - um servidor que permite criar endereços eletrónicos e armazenar, enviar e receber emails -, o que aumenta o seu tráfego, a sua configuração como homepage e pode levar os utilizadores a consultarem os seus conteúdos informativos; adicionalmente, este Portal tem um papel ativo no desenvolvimento de conteúdos para outras marcas, apostando assim no marketing content, aliando a sua capacidade de inovação tecnológica à divulgação de conteúdos (Oficina Sol, 1 de junho de 2020).
A CCA é um projeto editorial único que preenche uma lacuna no panorama informativo - o insuficiente investimento e divulgação de temas culturais e artísticos -, tornando a plataforma valiosa para o seu público. No entanto, os inquiridos também consideram que os portugueses demonstram pouco interesse nestes temas, o que ajuda a compreender o processo de gatekeeping jornalístico (Shoemaker & Vos, 2009) nestas áreas: se não são rentáveis, não se discute.
Em suma, os inquiridos revelam grande motivação na utilização da CCA e um espírito de identificação com o projeto. Pelas palavras dos inquiridos foi enaltecida a diversidade de conteúdos culturais e artísticos, bem como o papel da plataforma na difusão e valorização destas temáticas; destacou-se a presença em redes sociais digitais, que facilita o acesso aos conteúdos e estimula a interação entre o público, melhorando a experiência; elogiou-se a linguagem utilizada, sendo esta percebida como clara, objetiva e apelativa, transmitindo confiança, rigor e veracidade os públicos. Foi transmitido um sentimento de valorização e gratidão para com a CCA, também notório no número de respostas ao inquérito realizado neste estudo (n=1525).
Conclusão
Esta investigação foi desenvolvida para responder à pergunta de partida: “quais as motivações do(s) público(s) da CCA ao utilizarem-na enquanto fonte de informação?”. Neste sentido, procurou-se compreender que fatores e características motivam o uso de plataformas digitais e o seu papel enquanto fontes de informação, tomando-se como estudo de caso a plataforma CCA.
Aferiu-se que a linha editorial da plataforma inclui temáticas ligadas à área cultural e artística (cinco temas), com espaço para publicações sobre a sociedade. O inquérito por questionário permitiu caracterizar os públicos da CCA e aferir as suas vantagens, enquanto fonte de informação. O público da CCA caracteriza-se por incluir, na sua maioria, jovens estudantes, instruídos e assíduos. Como vantagens, destaca a unicidade do projeto editorial e a sua diversidade de conteúdos culturais e artísticos - valorizando estes temas e ajudando a colmatar o fraco investimento por parte dos OCS portugueses -; a presença em redes sociais digitais, que facilitam o acesso aos conteúdos produzidos e ainda a linguagem utilizada, que foi considerada clara, objetiva e apelativa, transmitindo confiança e levando à perceção de credibilidade da fonte de informação.
Evidenciou-se também a importância das redes sociais digitais no acesso aos conteúdos produzidos e à sua difusão: os seguidores dos perfis da plataforma vêm as publicações no feed principal e podem ativar a hiperligação que conduz ao conteúdo no website. Adicionalmente, facilitam a interação entre utilizadores, que se podem manifestar através de reações (gosto, adoro, surpresa, entre outras), comentários e partilhas.
Concluindo, neste estudo de caso a uma plataforma digital de cariz informativo, cujos conteúdos não são produzidos por especialistas em informar (jornalistas), verifica-se uma maior valorização por parte do(s) público(s) ao formato da informação, à sua apresentação e à oportunidade de contacto (via redes sociais digitais) - ou seja, a forma como a informação é revelada à audiência (Self, 2009) mais do que os atributos de segurança e qualificação.
As limitações deste estudo estão essencialmente associadas à falta de aprofundamento da visão jornalística e um maior detalhe na análise das métricas de interações. Sugere-se que em trabalhos futuros seja feita uma comparação: 1) sobre a produção e difusão de diversos meios informativos, para obter uma visão mais abrangente dos eventuais fatores de sucesso e insucesso; 2) entre uma plataforma digital de sucesso e um órgão de comunicação social, com projetos editoriais semelhantes. Adicionalmente, recomenda-se aferir se as circunstâncias sociais provocadas pela pandemia tiveram influência nos resultados obtidos e quais os efeitos do confinamento na leitura de conteúdos online.
Este estudo evidencia o contributo dos avanços tecnológicos para o modo de acesso a conteúdos informativos e para a perceção de credibilidade desses conteúdos. Adicionalmente, e tendo em conta as preferências dos públicos, fornece uma visão sobre como os conteúdos devem ser produzidos e difundidos, podendo servir de auxílio a projetos editoriais informativos.