Serviços Personalizados
Journal
Artigo
Indicadores
Links relacionados
Compartilhar
Acta Portuguesa de Nutrição
versão On-line ISSN 2183-5985
Acta Port Nutr no.9 Porto jun. 2017
https://doi.org/10.21011/apn.2017.0902
ARTIGO DE REVISÃO
Práticas parentais de controlo alimentar: relação com o peso da criança
Parental-Child Feeding Practices: Relation With Children’s Weight
Carolina Coelho1; Lisa Afonso2; Andreia Oliveira1-3*
1Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Fernando Pessoa, Rua Carlos da Maia, n.º 296, 4200–150 Porto, Portugal
2EPIUnit – Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, Rua das Taipas, n.º 135, 4050-600 Porto, Portugal
3Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, Alameda Prof. Hernâni Monteiro, 4200-319 Porto, Portugal
Endereço para correspondência
RESUMO
É na infância que se formam os comportamentos alimentares, sendo os pais agentes cruciais neste processo. Os pais adotam práticas de controlo alimentar que influenciam a alimentação das crianças, no sentido de aumentar ou diminuir a sua ingestão, podendo desta forma comprometer o seu normal desenvolvimento ponderal.
Com esta revisão pretende-se abordar as diferentes práticas parentais de controlo alimentar, centradas nos seus efeitos ao nível individual, identificando os instrumentos disponíveis para a sua avaliação e os vários estudos conduzidos para estabelecer uma associação entre estas práticas e o peso da criança.
Para a condução desta revisão foi realizada uma pesquisa na base de dados PubMed®, complementada por uma pesquisa em snowball. Incluíram-se estudos longitudinais (observacionais ou experimentais) que abordassem a relação das práticas parentais de controlo alimentar com a ingestão ou peso/índice de massa corporal da criança em idade pré-escolar.
As práticas parentais de controlo alimentar de crianças em idades precoces são frequentemente avaliadas através do Child Feeding Questionnaire, que inclui três domínios que incidem sobre a pressão para comer, a restrição e a monitorização. A associação entre as práticas parentais e o peso da criança tem sido inconsistente na literatura, dada a natureza transversal de muitos estudos, o que limita a avaliação da direção das associações, já que este efeito pode ser bidirecional, ou seja as práticas podem condicionar longitudinalmente o peso da criança, mas também podem ser exercidas em reação ao peso da criança. De um modo geral, a pressão para comer parece diminuir o peso da criança, enquanto a restrição alimentar parece aumentar o peso infantil. Ambas as práticas de controlo alimentar apresentam efeitos bidirecionais. Para a prática da monitorização, os resultados são ainda inconclusivos. O controlo encoberto parece associar-se positivamente com o peso da criança e o controlo explícito mostra uma associação negativa.
O conhecimento acerca das práticas parentais de controlo alimentar e a sua complexa associação com o peso da criança pode servir de suporte para a implementação com êxito de programas de intervenção para prevenir e tratar a obesidade infantil, pelo que deve ser futuramente valorizado.
Palavras-chave
Alimentação, Estudos longitudinais, Índice de massa corporal, Infância, Obesidade infantil, Peso, Práticas parentais
ABSTRACT
Eating behaviours are shaped during childhood, and parents are crucial agents in this process. Parents adopt control feeding practices which influence children’s diet, in a way to increase or decrease their consumption, and thus could compromise their normal weight development.
This review aims to study different parental-child feeding practices, focused in their individual effects, identifying the available instruments to evaluate them and the research studies conducted to establish an association between those practices and child’s weight.
To conduct this review, a theoretical review in the PubMed® database was performed, supplemented by a snowball search. Only longitudinal studies (observational or experimental) which focus on the relation between parental-child feeding practices and dietary consumption or weight/body mass index of preschool-aged children were included.
Parental-child feeding practices at early ages are frequently assessed by the Child Feeding Questionnaire, which includes three domains on pressure to eat, restriction and monitoring. The association between parental-child feeding practices and child’s weight has been inconsistent in the literature, due to the cross-sectional nature of several studies, which hampers the evaluation of the direction of these associations. This is particularly important because this effect could be bidirectional, which means the feeding practices could have a longitudinal influence child’s weight, but they also could be a reaction to the child’s weight. In general, pressure to eat seems to decrease child’s weight, while restriction appears to increase it. Both feeding practices have bidirectional effects. For monitoring, inconclusive results were found. The covert control appears to be positively associated with child’s weight while overt control shows a negative association.
The knowledge on parental-child feeding practices and their complex association with child’s weight could serve as support to develop successful intervention programs to prevent and treat childhood obesity, and thus should be given value in the future.
Keywords
Diet, Longitudinal studies, Body mass index, Childhood, Childhood obesity, Weight, Feeding behaviours
INTRODUÇÃO
A obesidade infantil deriva da associação de diversos fatores tanto do foro genético como ambiental (1). São exemplos de fatores ambientais, a atividade física e o acesso aos alimentos (1-3). Como referem Leann Birch e Jennifer Fisher: “O que é familiar é o que está presente no ambiente”, já que este ambiente familiar, sobretudo no momento das refeições, vai estruturar as preferências da criança, constituindo um modelo de observação para a mesma (2). O controlo sobre a alimentação das crianças, ou a falta dele, pode condicionar a alimentação destas, e aliado ao ambiente obesogénico que hoje predomina, contribuir para o excesso de peso ou obesidade (3-5). De uma forma geral, são os pais os grandes responsáveis pela estruturação dos padrões alimentares, pela manutenção do estado ponderal e ainda pela sua autorregulação (6-8). Os pais influenciam a decisão sobre os alimentos que a criança consome, a sua quantidade, a frequência do consumo e ainda modelam as emoções e a socialização durante as refeições, podendo as suas atitudes comprometer o normal desenvolvimento ponderal da criança, bem como os respetivos hábitos alimentares (1, 7, 9, 10). Desta forma, as práticas parentais podem afetar indiretamente o peso da criança através do seu efeito no consumo e comportamento alimentares (3).
A associação entre as práticas parentais e o peso da criança tem sido inconsistente na literatura. Grande parte dos estudos assume uma natureza transversal o que limita a avaliação da direção das associações, já que este efeito pode ser bidirecional (11, 12). Os pais são propensos a modificar as suas atitudes por influência das características que a criança possa apresentar, como, por exemplo, o peso, face ao qual utilizam as diferentes práticas para controlar a alimentação da criança (13-16). Por um lado, os estudos são influenciados por diversas variáveis que podem confundir os resultados obtidos (17). Por outro lado, o questionário é o método mais frequentemente utilizado para avaliar as práticas parentais de controlo alimentar e pode conduzir a vieses (13).
O conhecimento acerca das práticas parentais de controlo alimentar e a sua complexa associação com o peso da criança é crucial, dado que estas podem servir de suporte para a implementação de programas de intervenção eficazes para prevenir e tratar a obesidade infantil (14, 18).
Com esta revisão pretende-se abordar as diferentes práticas parentais de controlo alimentar, centradas nos seus efeitos ao nível individual, identificando os instrumentos disponíveis para a sua avaliação e os vários estudos conduzidos para estabelecer uma associação entre estas práticas e o peso da criança.
Foi realizada uma revisão da literatura recorrendo à base de dados PubMed®, usando como expressões de pesquisa “Parenting practices AND child BMI”, “Parenting child-feeding practices” e “Parental feeding practices AND child weight”, complementadas por uma pesquisa em snowball, sempre que apropriada. Foram incluídos apenas os estudos observacionais longitudinais e experimentais que relacionassem as práticas com o peso/índice de massa corporal e com a ingestão alimentar de crianças em idade pré-escolar, resultando em 50 artigos utilizados nesta revisão. Não foram estabelecidas quaisquer restrições relativas ao ano ou idioma de publicação.
Esta revisão encontra-se estruturada nas seguintes secções: nota introdutória às práticas parentais de controlo alimentar; identificação dos métodos de avaliação das referidas práticas mais frequentemente utilizados a nível populacional; efeito das práticas parentais de controlo alimentar, nomeadamente da pressão para comer, da restrição, da monitorização, dos controlos explícito e encoberto, na regulação do peso da criança; evidência sobre a bilateralidade da relação entre as práticas e o peso da criança. No final, é feita uma análise crítica aos conteúdos abordados e identificam-se perspetivas futuras de investigação.
Práticas parentais de controlo alimentar
As práticas parentais de controlo alimentar são estratégias comportamentais concretas, usadas pelos pais, que influenciam diretamente a alimentação das crianças, no sentido de aumentar ou diminuir a sua ingestão alimentar. Como exemplos destas apresentam--se a modelação de comportamentos alimentares, a restrição de alguns alimentos, a pressão para comer, a recompensa com alimentos após ações positivas e ainda a disponibilidade de alimentos em casa (13).
As práticas de controlo alimentar podem afetar a preferência, a seletividade e a autorregulação da criança (2, 17, 19), ou seja, afetam a capacidade de perceção dos sinais internos de fome e saciedade (2, 20). Podem igualmente estimular sinais externos (3, 10), como, por exemplo, comer alimentos por recompensa ou mesmo condicionar o tamanho da porção ingerida (15, 21, 22).
As práticas parentais de controlo alimentar mais frequentemente estudadas têm sido a pressão para comer, a restrição e a monitorização (23). A pressão para comer é uma prática usada no sentido de aumentar a ingestão alimentar das crianças. Contrariamente, a restrição é dirigida às crianças de forma a limitar a ingestão de alguns alimentos ou grupo de alimentos. A monitorização é a observação exercida sobre os alimentos que a criança ingere (4, 11).
A utilização destas práticas de forma excessiva pode afetar negativamente ou positivamente a ingestão e o peso das crianças (24, 25). No entanto, algumas práticas parentais parecem influenciar a criança para uma alimentação mais saudável (3).
São diversos os instrumentos que têm vindo a ser desenvolvidos para avaliar as práticas parentais de controlo alimentar (4, 23). Nesta revisão será abordado especificamente o Child Feeding Questionnaire (CFQ), por ser o mais frequentemente utilizado no desenvolvimento de estudos desta temática e o que mais se adequa à idade pré-escolar.
1.1. Child Feeding Questionnaire (CFQ) como método de avaliação
Descrito originalmente por Birch e colaboradores, o CFQ1 é um método desenvolvido no sentido de avaliar as práticas e preocupações parentais associadas à alimentação e peso infantis, mostrando as estratégias usadas para o controlo das atitudes alimentares da criança (26). É constituído por sete domínios que englobam trinta e um itens. Quatro domínios permitem medir as perceções parentais relativas ao próprio peso, ao peso da criança e preocupações acerca dos mesmos: “Perceção do peso parental”, “Perceção do peso da criança”, “Preocupação acerca do peso da criança” e “Perceção de responsabilidade”. Os restantes três domínios incidem sobre as práticas parentais de controlo alimentar: “Pressão para comer”, “Restrição” e “Monitorização” (26).
No sentido de dar um maior esclarecimento acerca da restrição e dos seus efeitos, Odgen e colaboradores questionaram o conceito desta prática e resolveram expandi-lo para duas dimensões de controlo explícito e encoberto. O controlo explícito é uma dimensão que limita a ingestão de alimentos menos saudáveis com a perceção da criança (por exemplo, proibindo-a de comer determinados alimentos). O controlo encoberto diz respeito à mesma restrição, mas sem que a criança a percecione (por exemplo, não a levando a restaurantes fast food) (27).
Este instrumento foi aplicado em Portugal numa amostra de crianças com 4 anos de idade da coorte Geração XXI (Porto, 2009-2010) e combinou o CFQ com os conceitos de controlo explícito e encoberto (Tabela 1). O instrumento mostrou boas propriedades psicométricas, no entanto, realçou a necessidade de reformular a dimensão da restrição e manter separadas as dimensões do controlo explícito e encoberto (28).
1.2. Efeito das práticas parentais de controlo alimentar na regulação do peso da criança
A pressão para comer, a restrição e a monitorização (23) serão abordadas detalhadamente de seguida, juntamente com os novos conceitos de controlo explícito e encoberto, dada a sua maior relevância na literatura científica. Irão ser descritos estudos observacionais longitudinais e experimentais que avaliam o efeito das práticas parentais no peso da criança e adicionalmente estudos que avaliam o efeito das práticas parentais na ingestão alimentar, visto este ser um possível mediador para o estado ponderal.
1.2.1. Pressão para comer
Na generalidade, os pais utilizam a pressão para comer no sentido de incrementar a ingestão alimentar da criança (17, 29), estabelecendo normas relativas ao tipo, qualidade e quantidade de alimentos a ingerir, para, desta forma, obter um maior ganho de peso (11).
O recurso a esta prática de forma excessiva pode incutir efeitos adversos na criança, de tal forma que possa comprometer a sua própria autorregulação, ou seja, condicionando a sua resposta à fome ou à saciedade (2, 11, 30). Estas estratégias que pretendem motivar a criança para aumentar a ingestão de um alimento em particular podem também ter consequências na visão que a criança tem desse alimento, nomeadamente condicionar uma aversão a esse alimento (3, 11, 22, 29) ou o hábito de comer desse alimento (29).
São vários os estudos que mostram uma associação significativa negativa (inversa) entre a pressão para comer e o índice de massa corporal (IMC) da criança (3, 6, 11, 15, 17, 20, 26, 28, 29, 31-38), a ingestão alimentar (3, 13, 29) e em particular o consumo de fruta e produtos hortícolas (11, 39, 40). Contudo, segundo alguns autores pode haver tanto uma associação positiva como negativa entre estas duas variáveis, sugerindo que as crianças mais pequenas e magras são pressionadas de forma a incrementar a sua ingestão alimentar, resultando num aumento da ingestão energética pelo aporte de alimentos mais densamente energéticos, enquanto crianças com maior IMC são pressionadas a aumentar o aporte de alimentos menos energéticos, como produtos hortofrutícolas (4). É curioso, ainda nesta temática, realçar um estudo que encontra uma associação entre o aumento da pressão para comer e o aumento do consumo de laticínios (39).
A pressão para o consumo de laticínios, fruta e produtos hortícolas pode ser explicada pelo entendimento que os cuidadores têm sobre o que é uma alimentação saudável.
A relação entre a pressão para comer e a diminuição do IMC pode entender-se como um efeito obtido devido à resposta que a criança dá ao seu sinal interno de saciedade, ou seja, quando pressionada a ingerir mais alimentos a criança sente-se rapidamente saciada (33), o que leva a uma menor ingestão (41) e a um menor prazer pela alimentação, conduzindo a uma consequente perda ponderal (33).
1.2.2. Restrição
A restrição é descrita como uma prática que os pais recorrem para tornar menos acessível um alimento ou grupo de alimentos, controlando o tipo ou quantidade de alimentos que a criança vai ingerir (4, 11). Geralmente esta prática é reportada menos frequentemente pelos pais, o que pode indicar que limitar o consumo de alimentos menos saudáveis não seja percecionado pelos pais como restrição (32).
A literatura sugere existir uma associação positiva entre a restrição e o IMC da criança (3, 4, 6, 12-15, 20, 26, 27, 29, 31-33, 38, 42-44) e a ingestão alimentar (3), particularmente de fruta e produtos hortícolas (39). Por outro lado, é descrita uma associação negativa com o consumo de snacks e refrigerantes (4).
A restrição não parece produzir rejeição por parte da criança a determinado alimento, mas sim uma maior atração por este (2, 3, 15, 20, 21, 25, 39, 41, 42), podendo mesmo promover uma maior desinibição (25, 29, 41, 45) e excessivo consumo quando o alimento se torna acessível (2, 3, 25, 29, 33, 41, 46, 47), com consequente aumento de peso (25, 33, 35, 44). Alguns autores explicam que esta prática pode causar pensamentos contraditórios na criança, já que os alimentos “menos saudáveis” são geralmente os mais restringidos, mas são habitualmente os mais oferecidos em momentos agradáveis de socialização e celebração, nomeadamente festas e jantares fora de casa (2).
1.2.3. Monitorização
A monitorização é caracterizada pelo nível de observação mantido sobre os alimentos que a criança vai ingerir (4, 11).
A associação entre esta prática e o IMC da criança não é consistente na literatura (4, 12, 33, 35). Uma justificação para tal incoerência é que provavelmente o ato de vigiar o consumo de snacks, doces, alimentos com elevado teor de gordura ou qualquer outro que seja considerado como menos saudável, entende-se como um comportamento comum aos pais, não estando objetivamente relacionado com o peso da criança (33). Por outro lado, existe a probabilidade dos pais apenas exercerem esta prática quando a criança demonstra já ter excesso de peso/obesidade e não pela respetiva prevenção (4, 48).
O aumento da utilização desta prática apresenta uma associação negativa significativa com o consumo de fruta e produtos hortícolas abaixo das recomendações (39), cujo ponto de corte foi definido de acordo com um consenso de recomendações alimentares para crianças em idade pré-escolar, que para o consumo de fruta e produtos hortícolas foi 4 porções/dia.
1.2.4. Controlo explícito e controlo encoberto
Odgen descreve que o controlo explícito e encoberto podem refletir-se nas subescalas do CFQ, sendo que o controlo explícito está relacionado positivamente com a monitorização (27) e a pressão para comer (27, 39) e o controlo encoberto associado à restrição (27) e a IMC mais elevados (12, 39).
A literatura sugere que elevados níveis de controlo explícito podem aumentar a ingestão de snacks mais saudáveis (28, 40, 46). O controlo encoberto leva a uma diminuição da ingestão de snacks menos saudáveis (27, 39). Ambos parecem associar-se a um aumento do consumo de frutas e produtos hortícolas (39, 40).
Relativamente ao IMC da criança, o controlo encoberto mostra uma associação significativamente positiva, enquanto o controlo explícito parece influenciar negativamente o IMC nos anos seguintes (12). No entanto, são poucos os resultados longitudinais desenvolvidos para avaliar a relação do controlo encoberto e explícito com o IMC da criança.
1.3. Relação bilateral entre as práticas e o peso da criança
Por um lado, as práticas parentais de controlo alimentar podem influenciar a alimentação e o estado ponderal da criança; por outro lado, as práticas podem ser exercidas em resposta à alimentação e ao peso da criança (11, 12).
Pais com filhos com mais peso para a faixa etária tendem a responder com restrição (3, 12, 13, 15, 29, 33, 44), com controlo encoberto (12), a monitorizar mais (39, 49) e a exercer menos pressão para comer (12, 15, 29, 49, 50). Em contrapartida, se a criança apresentar peso mais baixo para a faixa etária, a resposta dos pais é exercer mais pressão para comer (3, 12, 15, 23, 24, 29, 33, 36, 44, 49) ou recorrer a alimentos de maior palatabilidade como recompensa pelo consumo de alimentos menos palatáveis (23). Esta reação pode surgir como resposta a um comportamento alimentar mais seletivo, percecionado como problemático pelos pais, e caracterizado pela recusa da criança perante determinados alimentos (13, 42), pela ingestão lenta dos mesmos (1, 6, 13) ou pela preferência de alimentos menos saudáveis (6).
A associação entre a prática de pressão para comer e o IMC da criança parece ser inversa, em ambas as direções, no entanto, verifica-se ser mais forte no sentido do peso da criança influenciar a prática parental (12).
As práticas de restrição e de pressão para comer associam-se positivamente entre si, e de forma independente com o IMC, ou seja, em crianças com IMC mais elevado o uso da pressão para comer visa incrementar o consumo de alimentos saudáveis e a restrição de limitar o consumo de alimentos não saudáveis. Desta forma, ambas visam uma alimentação saudável (13).
Para poder considerar a bilateralidade desta associação são necessários estudos observacionais longitudinais e experimentais para providenciar evidência acerca da direção destes efeitos.
ANÁLISE CRÍTICA
A associação entre as práticas parentais de controlo alimentar e o peso das crianças em idade pré-escolar é complexa e para a qual é necessária mais investigação de natureza longitudinal, no sentido de clarificar tanto a direção das associações como o papel do ambiente como fator influenciador. Há ainda a realçar a elevada inter-correlação entre algumas destas práticas, sendo que na relação quotidiana possam ser difíceis de destrinçar, nomeadamente as práticas de controlo explícito e encoberto.
Claramente, a maioria dos estudos aborda as práticas tendo como resultado o excesso de peso ou a obesidade infantil, no entanto, o subpeso infantil também é um fator de risco para comorbilidades futuras, e algumas práticas podem contribuir para este efeito adverso.
Apesar de designadas de práticas parentais de controlo alimentar, estas mostram, maioritariamente, o efeito que as mães exercem na alimentação das crianças. No entanto, é de notar que o pai está progressivamente mais envolvido na educação alimentar e comportamental das crianças, pelo que estudos futuros deveriam analisar o papel destes de forma a clarificar os seus efeitos e poder compará-los com o das mães. É ainda importante realçar a situação familiar da criança, analisando a estrutura (que pode seguir um modelo monoparental, de guarda partilhada, etc.) e a composição familiar, dado que os modelos parentais podem diferir e, dessa forma, influenciar a alimentação da criança. Nesta perspetiva, o recurso a métodos qualitativos poderá ajudar a compreender melhor as práticas parentais de controlo alimentar adotadas, em função destas características familiares.
CONCLUSÕES
As práticas parentais de controlo alimentar podem influenciar a alimentação e o estado ponderal da criança, podendo futuros programas de intervenção na obesidade infantil beneficiar do conhecimento acerca do efeito de cada uma destas práticas. No entanto, pais e crianças influenciam-se mutuamente tornando complexo perceber o sentido destas associações.
A pressão para comer é usada para incrementar a ingestão alimentar das crianças, mas pode ter como resultado uma diminuição ponderal desta. A restrição, apesar de limitar um alimento ou grupo alimentar, está associada a um aumento do peso da criança. Ambas as práticas de controlo alimentar apresentam efeitos bidirecionais. Para a monitorização não parece existir um consenso literário acerca da sua influência no IMC da criança. O controlo encoberto mostra uma associação significativamente positiva com o peso da criança, enquanto o controlo explícito parece potenciar o efeito contrário.
De futuro, serão necessários mais estudos longitudinais de forma a clarificar o papel das práticas de controlo alimentar sobre o peso da criança, bem como o respetivo sentido destas, dado que as práticas podem ser reativas ao estado ponderal da criança ou podem, quando exercidas frequentemente, influenciar de forma longitudinal o seu estado ponderal.
AGRADECIMENTOS
Andreia Oliveira é financiada pelo Contrato-Programa Investigador FCT IF/01350/2015, com Fundos FEDER através do Programa Operacional Competitividade e Internacionalização e Fundos Nacionais através da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia, cofinanciado pelo Programa Operacional Potencial Humano (POPH/FSE).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Andreia Oliveira
Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Fernando Pessoa,
Rua Carlos da Maia, n.º 296,
4200–150 Porto, Portugal
Recebido a 19 de junho de 2016
Aceite a 15 de março de 2017