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Acta Portuguesa de Nutrição
versão On-line ISSN 2183-5985
Acta Port Nutr no.20 Porto jan. 2020
https://doi.org/10.21011/apn.2020.2002
ARTIGO ORIGINAL
Hábitos alimentares, de saúde e adesão à dieta mediterrânica dos jovens da região do algarve
Eating habits, health and adherence to mediterranean diet among young people in algarve
Joana Margarida Bôto1; Ezequiel Pinto1,2; Maria Palma Mateus1*
1Escola Superior de Saúde da Universidade do Algarve, Campus de Gambelas, Edifício 1, 8005-139 Faro, Portugal
2Centro de Estudos e Desenvolvimento em Saúde da Universidade do Algarve, Campus de Gambelas, Edifício 1, 8005-139 Faro, Portugal
Endereço para correspondência
RESUMO
Introdução: Estudo desenvolvido pela Universidade do Algarve, inserido no âmbito do Projeto 0290_MEDITA_5_P - "Dieta Mediterrânica Promove Saúde", financiado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) através do Programa Operacional (POCTEP).
Objetivos: Caracterizar os hábitos alimentares, de saúde e a adesão ao padrão alimentar mediterrânico dos jovens do ensino secundário da região do Algarve.
Metodologia: Estudo descritivo transversal onde se inquiriu, em ambiente escolar, uma amostra de jovens, do 10.º ano de escolaridade, dos cursos científico-humanísticos e cursos profissionais de oito escolas secundárias da região do Algarve. Recolheu-se informação através de um questionário de autopreenchimento com cinco secções: 1) hábitos alimentares; 2) adesão ao padrão alimentar mediterrânico (Índice KIDMED); 3) prática de atividade física; 4) higiene do sono e oral; 5) características sociodemográficas. Registou-se o peso, altura, perímetro da cintura e da anca, e a pressão arterial, obtidos através de metodologias de referência.
Resultados: A amostra final incluiu 325 participantes, 47% (n=153) do sexo masculino e 53% (n=172) do sexo feminino, com idades entre 15 e 19 anos (M=16,4 anos; DP=0,89 anos). Analisou-se o percentil Índice de Massa Corporal/Idade de acordo com as recomendações da Organização Mundial da Saúde e registou-se uma prevalência de sobrecarga ponderal de 19,7%. Os resultados do Índice KIDMED (M= 6,9 pontos; DP=2,46) indicam uma baixa adesão ao padrão alimentar mediterrânico em 9,0% dos participantes, adesão intermédia em 45,5% e adesão alta em 45,5%.
Conclusões: Os resultados indicam que devem ser delineadas estratégias de educação alimentar e de promoção da saúde dirigidas à população juvenil, tendo por base a Dieta Mediterrânica.
Palavras-chave
Adolescentes, Dieta Mediterrânica, Excesso de peso, Hábitos alimentares, Obesidade, Saúde
ABSTRACT
Introduction: Study developed by the University of Algarve, under the Project 0290_MEDITA_5_P-"Mediterranean Diet Promotes Health", financed by the European Regional Development Fund (FEDER) through the operational programme (POCTEP).
Objectives: Characterize the eating habits of health and adherence to the Mediterranean Dietary Pattern of young people of secondary school of the Algarve region.
Methodology: In a cross-sectional descriptive study, a sample of students, from the 10th grade, of the scientific-humanistic and professional courses from eight secondary schools in the Algarve region were surveyed. Information was collected through a self-filling questionnaire with five sections: 1) eating habits; 2) adherence to the Mediterranean Dietary Pattern (KIDMED Index); 3) practice of physical activity; 4) sleep and oral hygiene; 5) sociodemographic characteristics. Weight, height, waist and hip circumference, and blood pressure were recorded using reference methodologies.
Results: The final sample included 325 participants, 47% (n = 153) male and 53% (n = 172) female, aged between 15 and 19 years (M = 16.4 years; DP = 0.89 years). The Body Mass Index/Age percentile was measured according to World Health Organization recommendations and the prevalence of overweight was 19.7%. The results of the KIDMED Index (M = 6.9 points, SD = 2.46) indicated a low adherence to the Mediterranean Dietary Pattern in 9,0% of the participants, intermediate adherence in 45.5% and high adherence in 45.5%.
Conclusions: The results indicate that strategies for food education and health promotion aimed at the youth population should be drawn upon the basis of the Mediterranean Diet.
Keywords
Adolescents, Mediterranean Diet, Overweight, Food habits, Obesity, Health
INTRODUÇÃO
Os hábitos alimentares praticados durante a infância e a adolescência, nomeadamente o consumo de alimentos nutricionalmente pobres e de elevada densidade energética, podem tornar estas fases particularmente vulneráveis a situações de obesidade e carências nutricionais específicas (1, 2). Maus hábitos alimentares e estilos de vida sedentários, quando desenvolvidos na primeira infância e especialmente na adolescência, tendem a ser reforçados e mantidos na vida adulta (3).
Uma dieta saudável sustentável e um estilo de vida ativo podem limitar os comportamentos prejudiciais que contribuem para a epidemia de doenças crónicas não transmissíveis, como a diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares, apneia do sono e certos tipos de cancro (4).
Conhecer os hábitos de vida dos adolescentes é condição determinante para poder intervir adequadamente em estratégias preventivas, focadas na promoção da saúde, através da ação articulada de fatores relacionados com estilos de vida, ao nível dos hábitos alimentares e prática de atividade física (5).
A Dieta Mediterrânica (DM) é considerada, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), como um importante modelo salutogénico, com efeito no controlo do peso, prevenção de doenças crónicas e aumento da longevidade, pelo que a sua promoção torna-se fundamental junto dos adolescentes (6, 7). Investir na sua saúde traz vantagens na saúde imediata e futura e na saúde da sua descendência (4).
O Algarve, pelas suas características geográficas e socioculturais, é uma região onde se espera que as tradições alimentares mediterrânicas estejam presentes. Contudo, não existem publicações na literatura científica que permitam identificar o padrão alimentar e a adesão à DM em adolescentes algarvios. De maneira a caracterizar os hábitos alimentares de adolescentes da região e obter informação que possa servir de base para intervenção alimentar, submeteu-se uma candidatura ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) através do Programa Operacional (POCTEP) para desenvolver o Projeto 0290_MEDITA_5_P - "Dieta Mediterrânica Promove Saúde". Esta candidatura foi aceite e este artigo apresenta os resultados da primeira fase do projeto.
OBJETIVOS
Caracterizar os hábitos alimentares, de saúde e a adesão ao padrão alimentar mediterrânico de jovens da região do Algarve.
METODOLOGIA
Estudo descritivo transversal, aprovado pela Comissão Nacional de Proteção de Dados (Autorização n.º 234/2018) e Direção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular (Registro n.º 0625700001).
População-alvo e amostra
De acordo com os recursos alocados ao projeto, tempo de execução e natureza deste estudo, direcionou-se as atividades da primeira fase apenas a estudantes do 10.º ano de escolaridade. Foi selecionada uma amostra aleatória estratificada, multietapas, representativa dos alunos do 10.º ano dos cursos científico-humanísticos e cursos profissionais do Ensino Secundário, na região do Algarve. De acordo com o método proposto por Fleiss e colaboradores (8), estimou-se que devia inquirir-se oito das dezasseis escolas secundárias da região, perfazendo uma amostra final de 545 jovens. A estratificação foi levada a cabo tendo em conta a densidade estudantil. De maneira a aumentar a validade e fiabilidade da inquirição, definiram-se como fatores de exclusão: 1) gravidez; 2) incapacidade física e/ou doença mental. As participantes grávidas poderiam enviesar os resultados das avaliações antropométricas e poderiam ter um padrão alimentar específico, diferente dos restantes elementos da população-alvo. Participantes que apresentassem incapacidade física e/ou doença mental poderiam inviabilizar as avaliações antropométricas ou terem a capacidade de compreensão do questionário comprometida.
Participaram neste estudo apenas os jovens autorizados pelos encarregados de educação, mediante consentimento informado, livre e esclarecido, e que, simultaneamente, manifestaram vontade em participar.
Foi desenvolvido o questionário “Alimentação, estilo de vida e saúde”, de autopreenchimento, com cinco secções: 1) hábitos alimentares; 2) adesão ao Padrão Alimentar Mediterrânico (Índice KIDMED); 3) prática de atividade física; 4) hábitos de saúde (higiene do sono e oral); e 5) características sociodemográficas.
A adesão ao Padrão Alimentar Mediterrânico (PAM) foi estudada a partir da versão portuguesa do índice KIDMED utilizada no estudo de Mateus MP (9). Na tradução portuguesa, a autora optou por redigir a questão relativa ao pequeno-almoço como “Costumas tomar o pequeno-almoço?”, na forma positiva, e com isso ajustou a pontuação, em que a resposta “sim” passa a corresponder a “0” e o “não” corresponde a “-1”.
Criou-se um protocolo para a avaliação física, com registo do peso, altura, perímetro da cintura, perímetro da anca e da pressão arterial, recolhidos através de metodologias de referência e cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC) (10, 11). Utilizou-se equipamento validado e certificado para o efeito: balança digital Seca 877®; estadiómetro portátil Seca 217®; fita métrica de teflon flexível e indeformável; e esfigmomanómetro Medel Elite®. A classificação do estado nutricional teve por base o percentil IMC/Idade, segundo os critérios da OMS que utiliza as curvas de crescimento para crianças dos 5 aos 19 anos (12). A classificação da hipertensão foi feita com recurso às guidelines da Sociedade Europeia de Hipertensão para crianças e adolescentes (13).
Análise estatística
Utilizou-se o software IBM-SPSS® versão 25.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, USA) para a análise estatística.
Para comparações entre dois grupos utilizou-se o teste t-de-Student ou o teste de Mann-Whitney, para comparações de múltiplos grupos utilizou-se o teste de Kruskal-Wallis ou a análise de variância (ANOVA), juntamente com a correção de Bonferroni sempre que necessário.
Utilizou-se o coeficiente de correlação de Pearson para analisar a associação entre variáveis com distribuição Normal. Em todas as outras situações onde se levou a cabo um teste de correlação foi interpretado o coeficiente de correlação de Spearman.
Utilizaram-se os testes de independência e de homogeneidade do qui-quadrado para estudar variáveis categóricas. Em situações onde a aplicação do teste era limitada pelo número de respostas, optou-se por acompanhar o teste por um procedimento de bootstrap, bias-corrected (BCa) com 1000 amostras aleatórias.
Analisou-se o IMC de acordo com os critérios da OMS (12) e calcularam-se os respetivos z-scores através do software WHO Anthro (versão 3.2.2, January 2011).
Considerou-se, em todos os testes, um intervalo de significância inferior a 0,05 como indicação de significado estatístico.
RESULTADOS
Caracterização sociodemográfica
Registou-se uma taxa de resposta de 59,6%, correspondendo a uma amostra final composta por 325 participantes, 47% (n=153) do sexo masculino e 53% (n=172) do sexo feminino, com idades entre os quinze e os dezanove anos (M=16,4 anos; DP=0,89 anos).
No geral, os participantes vivem num meio não rural (78,5%, n=255), são de nacionalidade portuguesa (88,6%; n=287) e naturais do Algarve (76,3%; n=244). Relativamente à composição dos agregados familiares, a maior parte (67,0%; n=217) vivem com a mãe e com o pai, com maior prevalência da nacionalidade portuguesa em ambos os progenitores (MÃE: 80,4%; n=230; PAI: 78,9%; n=183).
Hábitos alimentares
Mais de um terço dos participantes (41%; n=134) referiram ter modificado os seus hábitos alimentares nos últimos 12 meses, e os três principais motivos foram: “Preocupações do próprio com a imagem ou com o peso” (22,4%; n=30), “Preocupação do próprio com a qualidade da alimentação” (23,1%; n=31), e “Motivos de saúde” (26,1%; n=35). Cerca de 7% (n=24) refere seguir um padrão alimentar especial, do qual a exclusão da lactose (66,7%; n=16), da carne (29,2%; n=7) e do glúten (20,8%; n=5) são as alterações predominantes. A maior parte dos jovens inquiridos faz entre quatro e seis refeições diárias, com uma média de cinco refeições (DP=±0,95). A merenda da manhã (28,6%; n=93) e a ceia (59,7% (n=194) são as refeições menos realizadas. Verificou-se também que 13,2% (n=43) não toma regularmente o pequeno-almoço, por “falta de tempo” (32,6%; n=14) ou “falta de apetite” (39,5%; n=17) como os motivos mais referidos.
Os participantes fazem, em média, 1,62 refeições intermédias (DP=±0,57). Verificou-se que 4,6% (n=15) referem não fazer nenhuma, 28,3% (n=92) fazem apenas uma e 67,1% (n=218) fazem duas refeições intermédias ao longo do dia. A Tabela 1 mostra a informação relativa ao pequeno-almoço e merendas dos participantes, no que respeita ao local, companhia e alimentos mais consumidos. De referir que se encontrou um consumo de alimentos de elevada densidade energética nestas refeições (Tabela 2). Obtiveram-se diferenças estatisticamente significativas entre sexos para o pequeno-almoço (X2=4,193; p=0,041) e para a merenda da manhã (X2=7,609; p=0,006), verificando-se que os rapazes referem uma maior frequência de consumo destas refeições comparativamente às raparigas. Também foi possível identificar diferenças estatisticamente significativas entre sexos no consumo de alguns alimentos. Os rapazes referem mais o consumo de leite (p=0,003), mas as raparigas referem mais o consumo de fruta (p=0,024), frutos secos e oleaginosos (p=0,028), sumos de fruta 100% (p=0,007) e chá ou infusões (p<0,001).
Encontrou-se uma associação positiva estatisticamente significativa entre a toma do pequeno-almoço e o número de refeições em família (MW=4519,500; p=0,004).
Todos os participantes referem almoçar (n=325), contudo 1,2% (n=4) destes não jantam (Tabela 3). Foi possível observar que cerca de 31% (n=100) dos participantes comem sandes em substituição do prato ao almoço e 9,3% (n=30) ao jantar, e que mais de metade refere fazer um consumo habitual de leguminosas ao almoço (58,2%; n=173) e ao jantar (55,6%; n=163).
O café é consumido por 23,3% (n=67) dos participantes ao almoço e por 12,9% (n=36) ao jantar. Obtiveram-se diferenças estatisticamente significativas entre sexos para o consumo de café ao jantar (X2=9,269; p=0,002), verificando-se que os rapazes referem um maior consumo do que as raparigas. Relativamente à ingestão de água ao longo do dia, 37,5% (n=122) dos participantes refere consumir entre 0,5L e 1L.
No que diz respeito ao consumo de bebidas alcoólicas, a maior parte dos participantes raramente ou nunca consomem bebidas alcoólicas (80,6%, n=262). Contudo, 23,7% (n=78) dos jovens inquiridos consome bebidas destiladas (puras, com sumo ou refrigerantes e em shots), 23,1% (n=75) consome cidra ou cerveja com sabores ou com refrigerantes, 16,6% (n=54) consome cerveja e 5,8% (n=19) reporta o consumo de vinho. Encontraram-se diferenças estatisticamente significativas entre sexos para o consumo de cerveja (X2=19,5; p<0,001), com os participantes do sexo masculino a reportarem um consumo mais frequente desta bebida alcoólica.
Adesão ao padrão alimentar mediterrânico
Os resultados do Índice KIDMED apresentam uma pontuação média de 6,9 pontos (DP=2,46) e mostram uma baixa adesão ao PAM em 9,0% dos jovens, uma adesão intermédia em 45,5% e uma alta adesão em 45,5%. Os dados relativos às respostas “sim” de cada pergunta do Índice KIDMED encontram-se na Tabela 4. Foi possível identificar diferenças estatisticamente significativas entre sexos para algumas perguntas. Assim, os rapazes referem mais vezes “frequentar, mais de uma vez por semana, restaurantes de fast-food” (p=0,006), “consumir massa ou arroz, quase todos os dias (5 ou mais vezes por semana)” (p<0,001).
Um maior número de refeições diárias associou-se significativamente a uma maior adesão ao PAM (rspearman=0,195; p<0,001), bem como a toma do pequeno-almoço (MW=2408,500; p<0,001). Também o número de refeições em família se associou significativamente a uma maior adesão ao PAM (rspearman=0,161; p=0,004). Os alunos que consomem habitualmente sopa ao almoço apresentaram uma maior adesão ao PAM (MW=8843,500; p<0,001) e ao jantar também (MW=7190,000; p<0,001).
Avaliação física
Relativamente ao estado nutricional analisado a partir do Percentil IMC/Idade, verifica-se que 19,7% dos participantes encontram-se com sobrecarga ponderal, dos quais, 17,2% (n=56) com excesso de peso e 2,5% (n=8) com obesidade (Tabela 5). Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre sexos nesta variável (X2=1,35, p=0,718). Observou-se que 2,2% (n=7) dos alunos apresentaram hipertensão e que 10,2% (n=33) apresentaram valores de pressão arterial normal-alta (Tabela 5). A Tabela 6 resume as características antropométricas e o valor da pressão arterial dos participantes. Verificaram-se diferenças estatisticamente significativas entre sexos (p<0,05) no peso, altura, perímetro da cintura, perímetro da anca e na pressão arterial sistólica. Não se encontraram diferenças estatisticamente significativas na associação das categorias de hipertensão com o nível de adesão ao PAM.
O número de refeições associou-se de forma negativa e estatisticamente significativa ao percentil IMC/Idade (rspearman=-0,152; p=0,006), ou seja, quanto maior o número de refeições diárias, menor o percentil IMC/Idade. Não se encontrou associação estatisticamente significativa entre a toma do pequeno-almoço e o percentil IMC/Idade (MW=5113,500; p=0,098), contudo encontrou-se com o perímetro da cintura (MW=4898,500; p=0,046), sendo que quem não toma o pequeno-almoço apresenta um perímetro da cintura mais elevado.
Ao relacionar a adesão ao PAM com elementos da avaliação física não se encontraram diferenças estatisticamente significativas para o percentil IMC/Idade (rspearman=0,061; p=0,275), nem para o perímetro da cintura (rspearman=0,030; p=0,591), nem para os níveis de pressão arterial (rspearman=-0,018; p=0,749).
O perímetro da cintura associou-se positivamente e de forma significativa ao percentil IMC/Idade (rspearman=0,739; p<0,001), bem como a pressão arterial (rspearman=0,225; p<0,001).
Atividade física e hábitos de saúde
No que diz respeito à atividade física, 90,2% (n=293) dos participantes referem não praticar desporto escolar. Dos que o fazem, a média de horas semanal mais referida, foi de 2 horas (31,3%, n=10). Verificaram-se diferenças estatisticamente significativas no total de tempo dedicado ao desporto escolar durante a semana (X2=10,400; p=0,034), verificando-se que os rapazes dedicam mais tempo que as raparigas.
Mais de metade dos jovens inquiridos (55,4%, n=180) pratica desporto fora da escola, e destes 42,5% (n=76) dedicam, uma média, de mais de 5 horas semanais, a essa prática. Encontraram-se diferenças estatisticamente significativas entre sexos, com os rapazes a praticar mais desporto fora da escola do que as raparigas (x2=20,518; p<0,001) e a dedicar mais tempo semanal a esses desportos (x2=12,960; p=0,011). Não se encontraram diferenças estatisticamente significativas no percentil IMC/Idade (KW=4899,500; p=0,042), na pressão arterial (KW=9,683; p=0,021) nem no perímetro da cintura (KW=12547,000; p=0,608) entre os praticantes e não praticantes de desporto fora da escola.
Relativamente às horas durante a semana que os participantes passam a ver televisão ou a jogar videojogos, verificou-se que 27,8% (n=90), dedica uma média, de 2 horas por dia, e que durante o fim de semana essa média sobe para mais de 5 horas em 27,9% (n=90) dos participantes.
Registou-se uma média de 8 horas de sono durante a semana e uma média de 9,2 horas de sono durante o fim-de-semana. Verificaram-se diferenças na duração média do sono entre os dias da semana e os dias de fim-de-semana (teste de Wilcoxon; p<0,001). De destacar que durante a semana, 37,8% dos alunos refere dormir menos de 8 horas.
Encontrou-se uma associação negativa estatisticamente significativa entre o número de horas sedentárias semanais e o nível de adesão ao PAM (rspearman=-0,175; p=0,002). A prática de desporto fora da escola (MW=9548,000; p<0,001) e de atividades desportivas de lazer (MW=8560,000; p<0,001) associaram-se de forma significativa com uma maior adesão ao PAM, assim como os participantes que bebem uma maior quantidade de água por dia (KW=28,572; p<0,001).
Um maior número de horas de sono semanais associou-se positiva e significativamente com uma maior adesão ao PAM (rspearman=0,142; p=0,010).
Verificaram-se diferenças estatisticamente significativas na quantidade de água ingerida ao longo do dia, de acordo com número de horas de atividade física semanal (rspearman=0,298; p<0,001), ou seja, quem pratica mais horas de atividade física semanal consome uma quantidade de água superior. Também se encontraram diferenças estatisticamente significativas no número de refeições feitas pelos alunos que praticam desporto fora da escola (MW=11057,500; p=0,012), apresentando estes, uma média de refeições maior.
Assim como, entre a toma do pequeno-almoço e o número de horas de sono duranta a semana (MW=4899,500; p=0,042), em que os participantes que tomam o pequeno-almoço dormem mais horas comparativamente aos que não o tomam.
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Os resultados obtidos indicam que, no geral, os adolescentes da região possuem hábitos alimentares que se distanciam de algumas das principais recomendações. A literatura descreve a importância do pequeno-almoço para o rendimento intelectual (14), mas cerca de 13% dos participantes deste trabalho não tomam habitualmente o pequeno-almoço, uma prevalência mais elevada do que a registada em adolescentes a nível nacional (15). Apesar de nesta refeição o leite ser um dos cinco alimentos mais consumidos (74,8% dos participantes referem o seu consumo habitual), este assume uma importância menor em refeições subsequentes, não havendo menção a este alimento ou a qualquer um dos seus derivados nos cinco alimentos mais consumidos, por exemplo, na refeição a meio da manhã ou no lanche. A literatura sugere que existe uma associação negativa entre a ingestão de leite, iogurte e bebidas à base de leite e iogurte, e o excesso de gordura total e abdominal (16), pelo que estes resultados indicam que a promoção dos produtos lácteos nas refeições intermédias pode constituir um campo de atuação para a melhoria dos hábitos alimentares.
Ainda que os participantes identifiquem a fruta como um dos alimentos mais consumidos, as suas respostas no índice KIDMED contradizem o que declararam anteriormente, pois verificou-se que 31,4% (n=102) dos jovens não consome fruta diariamente. Contudo, este resultado é superior ao encontrado no estudo HBSC 2018 (15), que apresenta uma prevalência de 11,5% dos jovens a consumir raramente ou nunca fruta. Resultado semelhante foi obtido no que respeita aos produtos hortícolas, onde a questão relativa ao consumo de produtos hortícolas pelo menos uma vez por dia, apresentou 31,1% (n=101) de respostas negativas, superior aos 17,8% encontrados no HBSC 2018 (15). Ainda que se tenha encontrado uma prevalência de consumo de hortofrutícolas mais elevado do que em estudos anteriores, o consumo pode ser descrito como abaixo do proposto pelas recomendações alimentares para este público-alvo (17).
No que diz respeito ao consumo de bebidas alcoólicas, o presente trabalho apresentou uma prevalência inferior para o consumo raro ou inexistente de bebidas destiladas (76,3%, n=248) do que no HBSC 2018 (89,4%) (15), mas superior para o consumo raro ou inexistente de cerveja (83,4%, n=271). A ingestão de água entre 0,5L e 1L foi verificada em 37,5% (n=122) dos participantes, valor semelhante aos 35% encontrados no HBSC 2018 (15).
As principais bebidas ingeridas ao almoço e ao jantar foram a água (Almoço: 96,9%, n=279; Jantar: 95%, n=264), os refrigerantes (Almoço: 45,5%, n=131; Jantar: 41,7%, n=116) e os néctares de fruta (Almoço: 43,4%, n=125; Jantar: 38,1%, n=106). Nos dados do Inquérito Alimentar Nacional e de Atividade Física, IAN-AF 2015-2016 (18), os refrigerantes apresentam o consumo médio mais elevado a seguir à água (88 g/dia) e os adolescentes são o grupo etário com prevalência de consumo diário de um ou mais refrigerantes ou néctares (≥220 g/dia) mais elevada (42%, 34% nas raparigas e 51% nos rapazes).
Também se encontrou neste estudo uma correlação negativa entre o número de refeições diárias e o percentil IMC/Idade, o que indica que estudantes num percentil IMC/idade mais elevado declaram fazer um menor número de refeições. Esta associação também foi descrita, em outros trabalhos com adolescentes, onde um menor número de refeições diárias associou-se com uma maior prevalência de excesso de peso (19-21).
O consumo de alimentos de elevada densidade energética faz parte do consumo diário habitual dos participantes, ao pequeno-almoço, merendas e ceia. E, 16,3% refere consumir doces ou guloseimas todos os dias, indo de encontro aos 15,7% observados no HBSC 2018 (15). Este consumo poderá ser explicado pelo aumento exponencial da disponibilidade destes alimentos nas últimas décadas, e contribui para diversos prejuízos para a saúde, relacionados com a obesidade e respetivas complicações (22).
Neste trabalho encontrou-se um baixo nível de adesão em 9,0% (n=29) dos participantes, valor mais elevado que o encontrado por Adelantado-Renau et al. (23) em adolescentes espanhóis (5,2%, n=14). Num estudo em adolescentes catalães, foi verificada uma associação positiva entre a adesão ao PAM e a prática de atividade física e o menor tempo em atividades sedentárias (tempo de ecrã) (24). No presente estudo, um maior nível de adesão ao PAM associou-se a um estilo de vida mais saudável, onde os jovens inquiridos tomam o pequeno-almoço, fazem um maior número de refeições diárias, consomem sopa ao almoço e jantar, bebem uma maior quantidade de água por dia, passam menos tempo em atividades sedentárias e são fisicamente mais ativos.
Relativamente ao estado nutricional, encontraram-se 19,7% dos participantes com sobrecarga ponderal, dos quais 17,2% apresentavam excesso de peso e 2,5% obesidade. Estes dados estão de acordo com os obtidos no HBSC 2018 (15) que encontraram 15,8% dos jovens com excesso de peso e 3,1% com obesidade.
Os rapazes e raparigas apresentaram diferenças estatisticamente significativas para a prática de atividade física. São os rapazes os que mais praticam desporto fora da escola (X2=20,518; p<0,001) e que dedicam mais tempo semanal a esses desportos (X2=12,960; p=0,011). Estas diferenças entre sexos para a atividade física parece consistente com diversos estudos, em que as raparigas são menos ativas fisicamente (25). A análise da prática de atividade física e a sua relação com o percentil IMC/Idade não mostrou diferenças significativas. Um aspeto que poderá contribuir para a interpretação destes resultados é a energia utilizada na prática de atividade física ser excessivamente compensada com a ingestão alimentar (5).
Os resultados obtidos relativos à higiene do sono vão ao encontro dos obtidos no estudo do HBSC de 2018 (15), em que a percentagem de participantes que referem dormir “mais de 8 horas” durante o fim-de-semana é superior comparativamente com dias de semana. Segundo a Sleep Foundation (24) muitos dos adolescentes têm um ritmo irregular de sono durante a semana, havendo uma diferença marcante entre os dias úteis e os fins de semana.
As limitações deste estudo estão relacionadas com a dimensão da amostra, dado que se registou uma taxa de adesão de 52,4%, tendo em conta o número total de potenciais participantes fornecido pelos agrupamentos escolares. Apesar de se terem assegurado todos os procedimentos possíveis, verificou-se alguma dificuldade no recrutamento dos participantes, dadas as tarefas habituais que desenvolvem na escola e o número de autorizações por parte dos encarregados de educação para participação no estudo. Apesar de se ter alcançado um número de participantes que permita indicar significado estatístico na análise realizada, a taxa de adesão poderá ter comprometido a caracterização e identificação de subgrupos específicos de participantes, com padrões alimentares que careceriam de estudo e/ou intervenção.
CONCLUSÕES
Este estudo permitiu concluir que os jovens inquiridos apresentam hábitos alimentares e estilo de vida passíveis de melhoria, nomeadamente o consumo do pequeno-almoço, a composição da refeição do almoço, a quantidade de água ingerida ao longo do dia, o consumo de bebidas alcoólicas, o nível de adesão ao PAM, bem como a prática de atividade física. Desta forma, evidencia-se a importância da implementação de estratégias de educação alimentar, que envolvam toda a comunidade educativa, nomeadamente os encarregados de educação e os professores, bem como as entidades de saúde da região, tendo por base o estilo de vida mediterrânico.
AGRADECIMENTOS
Ao Programa de Cooperação INTERREG V - A Espanha-Portugal 2014 – 2020.
À Direção, diretores de turma e jovens participantes das Escolas Secundárias que colaboraram neste estudo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Maria Palma Mateus
Escola Superior de Saúde da Universidade do Algarve,
Campus de Gambelas, Edifício 1, 8005-139 Faro, Portugal
Recebido a 5 de julho de 2019
Aceite a 27 de março de 2020