Introdução
A doença oncológica, incluída na categoria das doenças crónicas (WHO, 2002), continua a representar a segunda causa de morte em Portugal. Pelo seu surgimento inesperado e pela imprevisibilidade associada ao seu prognóstico, facilmente se depreende que a doença oncológica terá um impacto significativo no projeto de vida e de saúde da pessoa. A este impacto soma-se a necessidade de realização de tratamentos antineoplásicos, como é o caso da quimioterapia (QT), tratamentos que não são inócuos, pelo contrário, têm o potencial de provocar um conjunto de sintomas adversos, com repercussões significativas no bem-estar e qualidade de vida da pessoa.
Por outro lado, cada vez mais os tratamentos de QT são realizados em contexto de ambulatório, transferindo para a pessoa e/ou familiares/pessoas significativas a responsabilidade pela monitorização e gestão dos sintomas adversos e complicações associadas a este tipo de tratamento. Perante esta complexidade, estas pessoas apresentam necessidades específicas em cuidados de enfermagem, que promovam a aquisição e/ou desenvolvimento de conhecimentos e habilidades que lhes permitam assegurar uma autogestão eficaz dos sintomas associados ao tratamento de QT.
Neste contexto, e tendo em conta que em pleno século XXI a sociedade orienta-se para o desenvolvimento e adesão a novas tecnologias, nomeadamente smartphones e os seus diversos aplicativos informáticos, considera-se que estas abordagens poderão ser uma mais-valia no processo de empoderamento e capacitação destas pessoas. A literatura destaca a utilização de aplicativos informáticos em smartphones sugerindo, não só, o seu potencial na promoção da autogestão dos sintomas, associados ao tratamento da doença oncológica e na prevenção de eventuais complicações, como também efeitos positivos nos resultados centrados na pessoa (Warrington et al., 2018; Magalhães, Fernandes, Santos & Martínez-Galiano, 2020).
Alicerçado nesta problemática, surgiu o projeto iGestSaúde que tem como finalidade desenvolver um aplicativo informático para smartphone de suporte à autogestão da doença crónica, com vista à implementação de boas práticas nos cuidados a estas pessoas. Pretende-se com este projeto, e especificamente com o desenvolvimento deste aplicativo informático, estabelecer uma relação de proximidade com a pessoa, que contribua para monitorizar e apoiar, à distância, o processo de doença e regime terapêutico, incluindo o fornecimento de um conjunto de orientações terapêuticas de suporte à autogestão da doença crónica. O projeto iGestSaúde encontra-se nesta fase direcionado para o desenvolvimento do módulo “Quimioterapia”, focando-se nos sintomas adversos associados a este tipo de tratamento mais evidenciados na literatura: anorexia, dor, diarreia, obstipação, fadiga/inatividade, dispneia, insónia, ansiedade, náuseas/vómitos, mucosite, alopecia, alterações da pele, alterações da sexualidade e distúrbios urinários. O aplicativo a desenvolver terá como objetivo promover a automonitorização e a autogestão do regime terapêutico, em pessoas submetidas a tratamento de QT no domicílio. Deste modo, pretende-se responder atempadamente e de forma individualizada aos sintomas adversos experienciados pela pessoa, identificando a sua gravidade e fornecendo orientações terapêuticas de enfermagem em conformidade.
Incluída na primeira fase do desenvolvimento do aplicativo iGestSaúde: Quimioterapia delineou-se a realização de uma revisão integrativa da literatura (RIL), com o objetivo de identificar as orientações terapêuticas de suporte à autogestão dos sintomas adversos associados ao tratamento de QT. O termo “orientação terapêutica” refere-se, no âmbito deste projeto, a um conjunto de medidas não farmacológicas fornecidas à pessoa com a finalidade de prevenir, tratar e/ou minimizar os sintomas experienciados. Importa salientar que, apesar de o projeto iGestSaúde: Quimioterapia se focar nos sintomas adversos associados a este tipo de tratamento mais evidenciados na literatura, a presente revisão focou-se em quatro desses sintomas - anorexia, dor, diarreia e obstipação - sendo que, relativamente aos restantes sintomas, outros estudos de revisão foram efetuados com o mesmo objetivo.
Assim, o objetivo específico desta pesquisa consistiu em identificar na literatura orientações terapêuticas de suporte aos sintomas - anorexia, dor, diarreia e obstipação - associados ao tratamento de QT, com vista à autogestão dos mesmos por parte da pessoa com doença oncológica. Elaborou-se a seguinte questão de revisão: “Quais as orientações terapêuticas existentes na literatura de autogestão dos sintomas anorexia, dor, diarreia e obstipação associados ao tratamento de QT?”.
Método
Considerando a questão de investigação e os objetivos definidos, delineou-se a realização de uma RIL, seguindo a estratégia PEO (P-População; E- Exposição de interesse; O-Outcome), citada pelo Joanna Briggs Institute (JBI) (2017). Assim, conforme se apresenta na Tabela 1, foram incluídos estudos realizados com participantes adultos, com idade igual ou superior a 18 anos, portadores de doença oncológica e em tratamento ativo de QT. Os outcomes pretendidos foram orientações terapêuticas para os sintomas anorexia, dor, diarreia e obstipação associados ao tratamento de QT.
A pesquisa foi conduzida de forma independente por dois investigadores, com o intuito de identificar todo o tipo de estudos publicados em português, inglês ou espanhol, entre janeiro de 2008 e janeiro de 2018, nas bases de dados eletrónicas MEDLINE® e CINAHL®. Construíram-se frases booleanas definindo-se termos de busca específicos para cada uma das bases de dados, dos quais se destacam os seguintes descritores utilizados: anorexia, weight loss, apetite loss, cancer pain, pain, pain management, diarrhea, defecation, constipation, intestinal elimination, gastrointestinal diseases, cancer, neoplasms, cancer patients, oncology patients, chemotherapy, consolidation chemotherapy e maintenance chemotherapy (Anexo I - Frases booleanas utilizadas).
A pesquisa foi também alargada a estudos não publicados, de forma a identificar o maior número possível de orientações terapêuticas presentes na literatura, incluindo pesquisa no Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal; em agregadores de conteúdos específicos da área de enfermagem, como o Nursing Reference Center®; websites governamentais e associações médicas e de enfermagem nacionais e internacionais na área da doença oncológica (American Cancer Society [ACS]; National Cancer Institute [NCI]; National Comprehensive Cancer Network [NCCN]; British Columbia Cancer Agency [BC CA]; Sociedade Portuguesa de Oncologia; Associação de Enfermagem Oncológica Portuguesa; Oncology Nursing Society; European Society for Medical Oncology; American Society of Clinical Oncology; European Oncology Nursing Society; Canadian Association of Nurses in Oncology); motores de busca de acesso livre, como o Google Scholar e à literatura cinzenta.
O processo de seleção dos estudos compreendeu diferentes etapas. A primeira etapa consistiu na leitura criteriosa dos títulos e resumos de todos os artigos, sendo que, decorrente deste processo de análise, os artigos não relevantes foram removidos, selecionando-se apenas aqueles que responderam à questão de pesquisa. Subsequentemente, todos os artigos/documentos selecionados foram revistos com leitura do texto integral, de forma a determinar aqueles capazes de dar resposta à questão de pesquisa e aos objetivos definidos. Esta etapa foi realizada pelos dois investigadores, de forma independente, recorrendo-se a um terceiro investigador em caso de desacordo, sendo que o resultado final foi obtido após reunião de consenso. Com vista a sistematizar os dados extraídos de todas as fontes consultadas optou-se pela construção de tabelas resumo, nas quais foram descritas as orientações terapêuticas identificadas, para cada um dos quatro sintomas em estudo, assim como os dados relativos às respetivas fontes bibliográficas que as suportam.
Resultados
A pesquisa efetuada nas duas bases de dados eletrónicas constituiu uma amostra inicial de 605 estudos relacionados ao sintoma anorexia; 573 estudos relacionados ao sintoma dor; 652 estudos relacionados ao sintoma diarreia e 259 estudos relacionados ao sintoma obstipação. Decorrente da pesquisa efetuada em fontes de informação secundária foi possível a identificação de seis documentos relacionados aos sintomas anorexia, diarreia e obstipação e cinco documentos relacionados ao sintoma dor.
Após aplicação dos procedimentos de seleção de dados constituiu-se na RIL uma amostra final de 50 estudos/documentos, referentes aos quatro sintomas em estudo.
Na Figura 1 apresenta-se o processo de identificação e inclusão dos estudos/documentos incluídos na RIL.
Na tabela 2 apresenta-se uma sumarização dos estudos e documentos que compuseram esta RIL, incluindo informação relativa aos autores, ano de publicação, tipo de estudo e acesso/fonte. Salienta-se que da pesquisa realizada nas bases de dados eletrónicas obtivemos estudos em diferentes níveis de evidência, desde revisões narrativas (n=12), estudos quasi-experimentais (n=4), estudos randomizados controlados (ERC) (n=5), revisões sistemáticas (n=4) e guidelines (n=1). A pesquisa efetuada em fontes de informação secundária possibilitou também a inclusão de vários documentos, nomeadamente guias de boas práticas e guidelines, entre outros.
Do processo de análise dos diversos estudos/documentos foi possível identificar um conjunto de orientações terapêuticas de suporte à autogestão dos quatro sintomas em estudo, associados ao tratamento de QT. Na tabela 3 apresenta-se as orientações terapêuticas identificadas para cada um dos sintomas, assim como as fontes bibliográficas que as suportam, anteriormente apresentadas.
Discussão
Decorrente do processo de pesquisa, importa referir que se identificaram poucos estudos que abordam especificamente orientações terapêuticas de suporte à autogestão da sintomatologia associada ao tratamento de QT. Do mesmo modo, verificou-se que se para o sintoma dor foi possível identificar um número considerável de estudos científicos, com uma evidência científica mais robusta, o mesmo não se verificou para outros sintomas em estudo (e.g. diarreia ou obstipação).
A pesquisa efetuada em fontes de informação secundária constitui-se como uma mais-valia significativa, não só porque possibilitou a identificação de vários documentos, que foram ao encontro dos resultados obtidos na pesquisa realizada nas bases de dados, como também possibilitou a identificação de outras orientações terapêuticas. Constatou-se que grande parte destes documentos, pelo seu caráter mais prático, descrevem em maior pormenor as orientações terapêuticas. Alguns deles são dirigidos à pessoa com doença oncológica a realizar tratamento de QT, descrevendo orientações terapêuticas, com a finalidade de promover a autogestão dos sintomas associados a este tipo de tratamento (ACS, 2015; NCI, 2011). No entanto, identificaram-se outros documentos dirigidos aos profissionais de saúde, alguns deles especificamente aos enfermeiros, nos quais são disponibilizadas informações sobre os sintomas associados ao tratamento de QT, nomeadamente a sua definição, descrição de graus de gravidade, a forma como devem ser avaliados e a descrição de orientações terapêuticas específicas para cada um deles (BC CA, 2014a; BC CA, 2014b; BC CA, 2014c; BC CA, 2014d; Bonassa & Santana, 2005; Heering & Holle, 2017; Holle & Plgrim, 2017; NCCN, 2018; Schub & Heering, 2017; Stacey et al., 2016).
Na sequência da análise crítica dos estudos/documentos incluídos na RIL e à luz do conhecimento teórico existente, foi possível constatar que os sintomas em estudo - anorexia, dor, diarreia e obstipação - caracterizam-se por uma prevalência elevada na pessoa com doença oncológica, sendo essa prevalência e incidência geralmente potenciadas aquando do tratamento de QT.
A prevalência do sintoma anorexia na pessoa com doença oncológica, embora influenciada por vários fatores, tais como o tipo de cancro e o estádio da doença, pode variar entre 6% e 74% (Dy et al., 2008). Este sintoma quando presente e não controlado tem o potencial de afetar significativamente o estado de saúde da pessoa, podendo originar quadros graves de desnutrição e desidratação (Holle & Plgrim, 2017). As orientações terapêuticas identificadas para este sintoma centram-se essencialmente em aspetos relacionados com o aconselhamento nutricional, defendendo os autores que a abordagem deve ser individualizada e adequada a cada pessoa. Deste modo, são apresentadas orientações terapêuticas que se focam na descrição de estratégias para reduzir o desconforto, associado à ingestão de alimentos e assegurar um aporte calórico e proteico adequado (ACS, 2015; Arends et al., 2017; BC CA, 2014a; Bonassa & Santana, 2005; Calixto-Lima et al., 2012; Holle & Plgrim, 2017; NCI, 2011; Stacey et al., 2016; Witham, 2013).
A prática de exercício físico, adaptado à tolerância da pessoa, é também indicada como uma medida importante, não só porque promove o apetite, mas também porque permite a manutenção da força e massa muscular, função física e padrão metabólico (Arends et al., 2017; Bonassa & Santana, 2005; Calixto-Lima et al., 2012; NCI, 2011; Stacey et al., 2016). Ainda no contexto do sintoma anorexia, de realçar o papel da acupuntura. Na revisão sistemática de Garcia et al. (2013) sobre a utilização e eficácia da acupuntura no contexto do tratamento oncológico, esta terapia é sugerida como um tratamento adjuvante apropriado para as náuseas/vómitos associados ao tratamento de QT. Os autores acrescentam que, para o controlo e tratamento de outros sintomas, a eficácia desta técnica permanece indeterminada, sugerindo a realização de estudos mais robustos. Considerando que a presença de náuseas/vómitos pode condicionar quadros de anorexia, estando estes dois sintomas muitas vezes relacionados entre si no contexto do tratamento de QT, e tendo em linha de consideração o estudo de Yoon et al. (2015), que defende o potencial da acupuntura na melhoria do apetite e na prevenção da redução de peso, optou-se por incluir esta orientação terapêutica.
A dor constitui-se como um dos sintomas mais presentes e referenciados pela pessoa com doença oncológica em tratamento de QT. Fujii et al. (2017) realizaram um estudo, com 740 doentes com doença oncológica em tratamento de QT, com o objetivo de avaliar a prevalência e intensidade da dor nestas pessoas. A dor foi referida por mais de 50% dos doentes, quer no início do tratamento, quer nas avaliações de seguimento, tendo sido classificada em moderada ou grave em cada avaliação por 14% dos participantes. Das orientações terapêuticas identificadas nesta revisão para este sintoma, a prática de exercício físico é sugerida como tendo o potencial de diminuir a experiência de dor (Griffith et al., 2009; Raphael et al., 2010). A atividade física adequada, graduada e adaptada a cada pessoa, tem o potencial de aumentar a tolerância à atividade, a autonomia, a integração social e a autoestima (Raphael et al., 2010). A massagem terapêutica, podendo ser acompanhada ou não de aromaterapia, as terapias periféricas (tratamento com frio e calor), a restrição de movimentos e o posicionamento têm também demonstrado ser úteis para aumentar o bem-estar da pessoa, reduzindo os níveis de ansiedade, podendo deste modo contribuir para o controlo da dor (Greenlee et al., 2014; Raphael et al., 2010; Singh & Chaturvedi, 2015). Alguns autores realçam também a importância da utilização destas terapias como medidas de suporte/adjuvantes importantes, do tratamento farmacológico da dor (NCCN, 2018; Scialdone, 2012). Ainda no contexto deste sintoma, as terapias cognitivo-comportamentais, nomeadamente os exercícios de relaxamento e a imaginação guiada, surgem com algum destaque, podendo ser utilizadas separadamente ou em conjunto. Apesar de reconhecerem o potencial destas terapias na melhoria do bem-estar da pessoa, alguns autores questionam não só a sua eficácia a longo prazo como também referem que a evidência atual não apresenta robustez suficiente que comprove a sua eficácia e efetividade no controlo direto da dor (Raphael et al., 2010; Singh & Chaturvedi, 2015). Contudo, considerou-se pertinente incluir estas orientações terapêuticas, porque vários estudos têm demonstrando que a sua utilização pode ser eficaz, quer de forma isolada, quer como medida adjuvante do tratamento farmacológico no controlo da dor (Charalambous et al., 2016; Kwekkeboom et al., 2010; Kwekkeboom et al., 2012; Scialdone, 2012).
Relativamente ao papel da acupuntura no controlo da dor, as duas revisões sistemáticas, de Chiu et al. (2017) e Paley et al. (2015), sugerem que não há evidência científica suficiente que permita comprovar a efetividade da acupuntura na redução da dor. No entanto, e à semelhança das terapias descritas anteriormente, a acupuntura é considerada como uma terapia integrativa e adjuvante das intervenções farmacológicas (Lu & Rosenthal, 2013; NCCN, 2018; Raphael et al., 2010; Scialdione, 2012; Singh & Chaturvedi, 2015), motivo pelo qual se optou pela sua inclusão, como orientação terapêutica para este sintoma.
Os fármacos antineoplásicos provocam frequentemente alterações na mucosa intestinal, aumentando a inflamação das células e diminuindo a absorção intestinal, originando a ocorrência de diarreia (Andreyev et al., 2014; Shaw & Taylor, 2012). As orientações terapêuticas identificadas para este sintoma focam-se essencialmente na importância da avaliação contínua da pessoa e na introdução de modificações dietéticas, com o objetivo de aliviar a sintomatologia e evitar a desidratação, os desequilíbrios eletrolíticos, a deficiência nutricional e a perda de peso (Bonassa & Santana, 2005; Calixto-Lima et al., 2012). As modificações dietéticas passam pelo incentivo da hidratação oral, um aumento no consumo de calorias, proteínas, minerais, vitaminas, líquidos e eletrólitos e uma diminuição/eliminação de alimentos que exacerbem o quadro de diarreia (ACS, 2015; BC CA, 2014c; Bonassa & Santana, 2005; Calixto-Lima et al., 2012; Cherny, 2008; Faiman, 2016; Guimarães et al., 2015; Muehlbauer et al., 2009; NCI, 2011; Schub & Heering, 2017; Shaw & Taylor, 2012; Stacey et al., 2016).
Relativamente ao sintoma obstipação, este surge na pessoa a realizar tratamento de QT não só como consequência da toxicidade dos fármacos antineoplásicos, como também associada a efeitos secundários da utilização de fármacos antieméticos e opioides (Bonassa & Santana, 2005; Calixto-Lima et al., 2012; Hanai et al., 2016; Shin & Park, 2018; Woolery et al., 2008). Devido a esta natureza multifatorial, a gestão deste sintoma pode ser complexa, exigindo uma abordagem individualizada e proativa, no sentido de evitar complicações. A evidência sugere que as três primeiras linhas orientadoras, para o tratamento e controlo da obstipação são a realização de atividade física, o aumento da ingestão de fluídos e o aumento da ingestão de alimentos ricos em fibras (ACS, 2015; BC CA, 2014b; Bonassa & Santana, 2005; Calixto-Lima et al., 2012; Heering & Holle, 2017; NCI, 2011; Stacey et al., 2016; Woolery et al., 2008). Hanai et al. (2016) implementaram junto de um grupo de pessoas com cancro, a realizar tratamento de QT, um programa de autogestão da obstipação induzida por fármacos antieméticos. O programa incluía realização de massagem abdominal e realização de exercícios para fortalecer os músculos abdominais, sendo acompanhados de exercícios de respiração profunda e instrução para adoção de uma posição adequada de defecação. Considerou-se pertinente incluir estas orientações terapêuticas, uma vez que o programa revelou ser eficaz no alívio da gravidade da obstipação, tendo sido também avaliado positivamente pelos participantes. De facto, a realização frequente de exercícios abdominais adaptados à condição física e tolerância da pessoa têm o potencial de promover a motilidade intestinal e fortalecer o tónus dos músculos abdominais. Do mesmo modo, a adoção de uma posição que propicia a defecação correta, instruindo a pessoa a adotar na sanita uma posição de semi-agachada, utilizando um apoio para elevar os joelhos acima da cintura demonstra ser benéfica, na medida em que favorece o relaxamento dos músculos do pavimento pélvico e a expulsão das fezes (BC CA, 2014b; Heering & Holle, 2017; NCI, 2011; Stacey et al., 2016).
A realização de acupuntura/acupressão auricular, apesar de ser apenas sugerida na ERC desenvolvido por Shin e Park (2018), foi incluída como orientação terapêutica para o sintoma obstipação, uma vez que os resultados deste estudo comprovaram que a terapia foi eficaz no alívio deste sintoma e também, porque nesta fase o objetivo seria identificar o todas as orientações terapêuticas possíveis.
Tendo em linha de consideração o contexto específico, das pessoas com doença oncológica a realizar tratamento de QT em contexto de ambulatório, importa refletir sobre as necessidades específicas destas pessoas, em cuidados de saúde, e de enfermagem em particular, nomeadamente necessidades de informação, necessidades psicossociais e necessidades de apoio no autocuidado. Acredita-se que o conjunto de orientações terapêuticas identificadas nesta revisão apresentam o potencial de ir ao encontro destas necessidades, uma vez que procuram informar e orientar a pessoa, monitorizar o seu estado de saúde/doença, apoiar na tomada de decisão e na mobilização dos recursos necessários.
Conclusão
Analisando o percurso efetuado e de acordo com os objetivos propostos, foi possível identificar, na evidência científica, um conjunto de orientações terapêuticas de suporte à autogestão dos sintomas anorexia, dor, diarreia e obstipação, associados ao tratamento de QT. A revisão efetuada alertou para a necessidade de desenvolver mais investigação nesta área, uma vez que se constatou existirem poucos estudos, que abordam e descrevem especificamente orientações terapêuticas de suporte à autogestão da sintomatologia, associada ao tratamento de QT. Por outro lado, determinadas orientações terapêuticas, apesar de referenciadas na literatura, carecem de mais investigação, que melhore a compreensão da efetividade do seu papel no controlo e redução da sintomatologia. São exemplos, as terapias cognitivo-comportamentais e as terapias não convencionais, como é o caso da acupuntura.
No contexto do projeto iGestSaúde: Quimioterapia espera-se que a inclusão destas orientações terapêuticas no aplicativo informático possam contribuir para a promoção de uma autogestão eficaz, por parte da pessoa, dos sintomas, anorexia, dor, diarreia e obstipação, associados ao tratamento de QT, monitorizando o tratamento e prevenindo eventuais complicações.
Para o contexto da prática clínica, considera-se que estas orientações terapêuticas poderão constituir-se como uma mais-valia e um recurso importante para o enfermeiro no desempenho do seu papel de agente facilitador da aquisição e desenvolvimento de conhecimentos e habilidades por parte da pessoa, que lhe permitam assegurar uma autogestão eficaz da sintomatologia vivenciada no decorrer do tratamento de QT. Pessoas informadas e capacitadas poderão tomar decisões conscientes e da forma mais autónoma possível, com o objetivo de melhor viver o seu projeto de vida, aderindo em simultâneo às indicações terapêuticas e mantendo a sua doença monitorizada e controlada.