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Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online

versão impressa ISSN 2183-8453

RPSO vol.16  Gondomar dez. 2023

https://doi.org/10.31252/rpso.25.11.2023 

Artigo de Revisão

OS PAIS NO LOCAL DE TRABALHO- GUIA PRÁTICO

PARENTS IN THE WORKPLACE- PRACTICAL GUIDE

N Pereira, Escolha do tema, revisão bibliográfica, redação do manuscrito, revisão do manuscrito1 
http://orcid.org/0000-0001-5556-6472

R Raimundo, Co-autoria, Revisão bibliográfica, redação do manuscrito2 
http://orcid.org/0000-0002-6461-1674

1Médico Interno de Formação Especializada em Medicina Geral e Familiar. USF São João de Sobrado, ACeS Grande Porto III- Maia/Valongo. Mestre em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. MORADA COMPLETA para correspondência dos leitores: Rua São João de Sobrado 2441, 4440-452, Sobrado, Valongo

2Médica Interna de Formação Especializada em Medicina Geral e Familiar. USF São João de Sobrado, ACeS Grande Porto III - Maia Valongo/Valongo, Portugal. Mestre em Medicina pela NOVA Medical School. 4445-026 Alfena


RESUMO

Introdução

Os trabalhadores com filhos em idade pediátrica são um grupo com importantes especificidades no local de trabalho. As equipas de saúde ocupacional e de saúde familiar, são frequentemente abordadas com preocupações sobre atuação em caso de doença do filho, direitos relacionados à amamentação, licença parental, ou horários flexíveis, sendo muitas vezes nos profissionais de saúde em quem os trabalhadores confiam para obter orientação e esclarecimento sobre os seus direitos e responsabilidades. Para além das questões legais, essas equipas identificam e mitigam riscos ocupacionais que afetam a saúde dos pais e filhos, protegendo as famílias.

Metodologia

Trata-se de uma revisão narrativa realizada em setembro de 2023, tendo sido utilizada como fonte o Código do Trabalho Português, assim como os guias práticos “Subsídio por assistência a filho”, “Subsídio por riscos específicos” e “Subsídio de Assistência a Filhos com Deficiência, Doença Crónica ou Doença Oncológica” do Instituto da Segurança Social, I.P.

Conteúdo

Os trabalhadores com filhos em idades pediátricas, especialmente nos primeiros anos de vida, têm consagrados no Código do Trabalho alguns direitos, com o objetivo de facilitar a transição para esta fase da vida. É o dever do profissional de saúde, no contexto da sua prática clínica, como integrante da equipa de saúde ocupacional, ou da equipa de saúde familiar, estar familiarizado com alguns desses direitos, nomeadamente relacionados com a licença parental, dispensa para amamentação, certificado de incapacidade por assistência a familiares, licença para assistência a filho com doença crónica, dispensa de trabalho suplementar e noturno, entre outros.

É ainda direito do trabalhador ter as suas condições laborais avaliadas e adaptadas, sob parecer do Médico do Trabalho, devendo os profissionais que contactam com esta população conhecer as particularidades específicas a considerar.

Conclusão

Os médicos de Medicina Geral e Familiar, médicos de Medicina do Trabalho e equipas de saúde ocupacional são fundamentais para proteger os direitos e a saúde dos pais trabalhadores. Compreender as complexidades das leis laborais relacionadas com a parentalidade e a gestão dos riscos ocupacionais torna-se essencial na promoção de ambientes de trabalho inclusivos, ajudando os trabalhadores a equilibrar a vida profissional e familiar.

PALAVRAS-CHAVE: Direitos laborais; Amamentação; Medicina do Trabalho; Medicina Geral e Familiar.

ABSTRACT

Introduction

Workers with pediatric-aged children are a group with important workplace specificities. Occupational health and family health teams are often approached with concerns about how to handle a child's illness, breastfeeding-related rights, parental leave, or flexible schedules. Often, healthcare professionals are the ones workers turn to for guidance and clarification on their rights and responsibilities. In addition to legal issues, these teams identify and mitigate occupational risks that affect the health of parents and children, ultimately protecting families.

Methodology

This is a narrative review conducted in September 2023, using the Portuguese Labor Code as a source, as well as practical guides such as "Childcare Allowance," "Specific Risks Allowance," and "Assistance Allowance for Children with Disabilities, Chronic Illness, or Oncological Disease" from the Institute for Social Security, I.P.

Contents

Workers with pediatric-aged children, especially in the early years of life, have certain rights enshrined in the Labor Code to facilitate the transition to this phase of life. It is the duty of healthcare professionals, within the context of their clinical practice, as members of the occupational health team or the family health team, to be familiar with some of these rights, particularly those related to parental leave, breastfeeding leave, certificate of incapacity for family care, leave for the care of a child with a chronic illness, exemption from overtime and night work, among others. It is also the right of the worker to have their working conditions assessed and adapted, based on the opinion of the Occupational Physician, and professionals who come into contact with this population should be aware of the specific particularities to consider.

Conclusion

Family doctors, occupational medicine physicians, and occupational health teams are essential in protecting the rights and health of working parents. Understanding the complexities of labor laws related to parenthood and occupational risks becomes essential in promoting inclusive work environments, helping workers balance their professional and family life.

KEYWORDS: Labor rights; Breastfeeding; Occupational Medicine; Family practice.

INTRODUÇÃO/ENQUADRAMENTO/OBJETIVOS

A saúde ocupacional desempenha um papel crucial na vida dos trabalhadores, pois visa garantir que o ambiente de trabalho seja seguro e saudável. Isso não apenas promove o bem-estar dos trabalhadores, mas também tem implicações significativas para as suas famílias. Os médicos de Medicina Geral e Familiar desempenham um papel fundamental na promoção da saúde dos seus pacientes, abordando questões que afetam diretamente a sua qualidade de vida, incluindo frequentemente aquelas relacionadas com o trabalho. Por outro lado, os profissionais das equipas de saúde ocupacional têm a competência necessária para avaliar e gerir os riscos laborais específicos, assim como garantir a saúde e a segurança dos trabalhadores no local de trabalho.

Entre os grupos que frequentemente apresentam questões sobre a sua relação laboral estão os trabalhadores com filhos em idade pediátrica, principalmente lactentes em amamentação ou crianças na primeira infância.

Nesta fase da vida de uma família, principalmente no período pós-parto e aquando do regresso ao trabalho, os trabalhadores encontram-se especialmente suscetíveis a sentimentos de culpa, por deixarem os filhos pelo trabalho, e assim em maior risco de burnout e outras patologias psiquiátricas (1).

Por esse motivo, encontram-se consagrados na lei certos direitos específicos a esta população, como a licença parental ou a dispensa para amamentação. A licença parental, está associada a um menor risco de depressão pós-parto, assim como a um menor risco de doença física da mãe (2). Da mesma forma, mulheres com licenças parentais de maior duração, têm maior probabilidade de se manter em aleitamento materno, assim como maior sensação de satisfação com a criança (3) (4).

Questões relacionadas com o direito laboral, como a licença parental, flexibilidade de horários, direitos relacionados à amamentação ou atuação em caso de doença do filho são exemplos de preocupações comuns apresentadas pelos trabalhadores. Perante a complexidade da lei, e o excesso de informação, muitas vezes incorreta, propagada em contexto dos media digitais, é frequentemente nos profissionais das equipas de saúde familiar e das equipas de saúde ocupacional, em quem os trabalhadores confiam para obter orientação e esclarecimento sobre os seus direitos e responsabilidades.

Para além das questões legais de direito laboral, as equipas de saúde intervenientes desempenham também um papel fundamental em identificar e mitigar riscos ocupacionais específicos que possam afetar a saúde dos pais e dos seus filhos. A evicção de fatores de risco específicos é de importância crítica e riscos ocupacionais não mitigados podem ter sérias consequências para a saúde dos trabalhadores, bem como para o desenvolvimento e a saúde de seus filhos.

É, portanto, essencial que os médicos de Medicina Geral e Familiar e Medicina do Trabalho estejam preparados para identificar e abordar esses riscos, garantindo que as famílias não sejam prejudicadas pela exposição a condições de trabalho inadequadas.

É objetivo desta revisão narrativa, realizar uma síntese dos principais temas abordados por esta população em relação com o direito laboral, assim como uma síntese dos principais riscos laborais específicos a abordar em trabalhadores com filhos em idade pediátrica, com ênfase nas mães em aleitamento.

METODOLOGIA

Em função da metodologia PICo, foi considerado:

- P (population): trabalhadores com filhos em idade pediátrica

- I (interest): reunir conhecimento sobre os direitos laborais da população em estudo, assim como sobre a exposição laboral a fatores de risco

- C (context): saúde e segurança ocupacionais.

Trata-se de uma revisão narrativa realizada em setembro de 2023, tendo sido utilizada como fonte o Código do Trabalho Português, assim como os guias práticos “Subsídio por assistência a filho”, “Subsídio por riscos específicos” e “Subsídio de Assistência a Filhos com Deficiência, Doença Crónica ou Doença Oncológica“ do Instituto da Segurança Social, I.P.

CONTEÚDO/RESULTADOS

Licença parental e licença parental complementar

A mãe e o pai trabalhadores têm direito, por nascimento de filho, a uma licença parental inicial de 120 ou 150 dias consecutivos, que pode ser partilhada por ambos e gozada em simultâneo. Caso optem pela partilha da licença, esse período é acrescido em 30 dias (5).

No que diz respeito exclusivamente à mãe, esta é obrigada a gozar 42 dos dias de licença, consecutivamente, a seguir ao parto. Caso opte, pode ainda gozar 30 dos dias de licença parental antes da data provável do parto, devendo para este efeito informar o empregador desse propósito com uma antecedência de 10 dias antes do início do período.

O pai é obrigado ao gozo de 28 dias de licença parental, que podem ser consecutivos ou gozados em períodos interpolados de no mínimo 7 dias, nos 42 dias seguintes ao parto.

A licença é ainda prolongada em situações específicas: nos nascimentos múltiplos, o período é acrescido de 30 dias, por cada gémeo para além do primeiro; nos casos de internamento da criança, a licença é prolongada por toda a duração do internamento em crianças nascidas com menos de 33 semanas de gestação, ou até um máximo de 30 dias para crianças nascidas após as 33 semanas de gestação e, no caso de parto prematuro (até às 33 semanas de gestação), a licença é acrescida de 30 dias.

Existe ainda uma licença parental complementar, para pais com filhos com idade não superior a 6 anos, e que consiste num período de licença suplementar de três meses, num período de trabalho a tempo parcial durante 12 meses, ou em períodos intercalados de licença parental alargada e de trabalho a tempo parcial, iguais a 3 meses de ausência.

Dispensa para amamentação ou aleitação

Uma das preocupações da mulher durante o período de amamentação ou aleitação e que retoma a sua atividade laboral nessa condição, prende-se com dúvidas relacionadas com a dispensa de trabalho.

De acordo com o Artigo 47º do Código do Trabalho, a mãe que se encontra sob condição de amamentação, tem direito a dispensa de trabalho para o efeito, durante o período correspondente (5). A dispensa diária para amamentação ou aleitação é usufruída em dois tempos distintos, com a duração máxima de uma hora cada, exceto caso exista outro acordo com o empregador. Caso se verifiquem nascimentos múltiplos, a dispensa referida anteriormente é acrescida de 30 minutos por cada gémeo além do primeiro. Na situação em que qualquer um dos progenitores trabalhar a tempo parcial, a dispensa diária para amamentação ou aleitação é reduzida na proporção do respetivo tempo normal de trabalho, com ressalva de que não poderá ser inferior a 30 minutos; nesta situação, a dispensa diária é gozada em período não superior a uma hora e, sendo caso disso, num segundo tempo com a duração remanescente, com exceção de caso haja outro acordo com o empregador. Por outro lado, no caso de não haver amamentação, se ambos os progenitores exercerem atividade profissional, qualquer um deles ou ambos, após decisão conjunta, têm direito a dispensa para aleitação, até perfazer um ano de idade do respetivo filho.

Ainda neste ponto, nomeadamente face ao procedimento de dispensa para amamentação e aleitação, o Artigo 48º do Código do Trabalho, declara que para este efeito, a trabalhadora comunica ao empregador, com a antecedência de 10 dias relativamente ao início da dispensa, que amamenta ou aleita o filho; no caso de a dispensa se prolongar para além do primeiro ano de vida do filho, deve apresentar atestado médico (5). Deve ainda apresentar um documento onde conste a decisão conjunta e caso o outro progenitor esteja a gozar esta dispensa deve declarar qual o período. Por fim, deve provar que o outro progenitor exerce atividade profissional e, na situação de ser trabalhador por conta de outrem, que informou o respetivo empregador da decisão conjunta.

Riscos específicos para mulheres em amamentação

O aleitamento materno exclusivo, sempre que possível e na ausência de contraindicações, é a forma de alimentação recomendada pela Organização Mundial de Saúde até aos seis meses de idade. Após a introdução de outros alimentos, o aleitamento materno está indicado como complemento até aos dois anos de idade (6) (7).

A amamentação apresenta inúmeros benefícios para o desenvolvimento saudável da criança, estando esta prática associada a uma diminuição no risco de desenvolver infeções (respiratórias, urinárias, otites), síndrome de morte súbita do lactente, a um melhor desempenho escolar e a um menor risco futuro de desenvolver obesidade e doenças crónicas como, a diabetes, patologia cardiovascular ou doença inflamatória intestinal (7).

Apesar dos benefícios estabelecidos, a mulher em lactação deve, durante este período, manter alguns cuidados específicos relacionados com fatores que podem afetar a qualidade do leite produzido. Entre eles a dieta, a ingestão de álcool, a utilização de medicação, a realização de exames radiológicos com necessidade de utilização de marcadores radioativos e o contacto com determinados agentes químicos.

Consequentemente, também no local de trabalho, a mulher a amamentar pode estar sujeita a perigos evitáveis, que possam colocar em risco a sua saúde e/ou do lactente, bem como a qualidade do leite produzido. Para mitigar estas questões, a Lei nº102/2009 de 10 de setembro (e as suas subsequentes atualizações), que regulamenta o regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho, e o “Guia Técnico nº 2 - Vigilância da Saúde dos Trabalhadores Expostos a Agentes Químicos Cancerígenos, Mutagénicos ou Tóxicos para a Reprodução” da Direção-Geral de Saúde, estabelecem as atividades proibidas ou condicionadas à trabalhadora lactante, descritas no Quadro 1 (8) (9).

Quadro 1 Atividades proibidas ou condicionadas à trabalhadora lactante, de acordo com a Lei nº 102/2009, de 10 de setembro, e as suas atualizações 

Atividades proibidas a trabalhadora lactante Artigo 54º - Agentes proibidos à trabalhadora lactante
É proibida à trabalhadora lactante a realização de qualquer atividade que envolva a exposição aos seguintes agentes físicos e químicos:
a) Radiações ionizantes;
b) Substâncias e misturas que preencham os critérios de classificação ao abrigo do Regulamento (CE) nº 1272/2008, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativo à classificação, rotulagem e embalagem de substâncias e misturas, numa ou em várias das seguintes classes e categorias de perigo com uma ou várias das seguintes advertências de perigo:
i) Classificadas como tóxicas para a reprodução, categorias 1A, 1B ou 2 ou com efeitos sobre a lactação ou através dela (H360, H360D, H360FD, H360Fd, H360Df, H361, H361d, H361fd, H362).
c) Chumbo e seus compostos na medida em que esses agentes podem ser absorvidos pelo organismo humano.

Artigo 55º - Condições de trabalho
É proibida à trabalhadora grávida e lactante a prestação de trabalho subterrâneo em minas.
Atividades condicionadas a trabalhadora lactante Artigo 58º - Agentes biológicos
São condicionadas à trabalhadora grávida, puérpera ou lactante todas as atividades em que possa existir o risco de exposição a agentes biológicos classificados nos grupos de risco 2, 3 e 4, de acordo com a legislação relativa às prescrições mínimas de proteção da segurança e da saúde dos trabalhadores contra os riscos da exposição a agentes biológicos durante o trabalho.

Artigo 59º - Agentes químicos
São condicionadas à trabalhadora grávida, puérpera ou lactante as atividades em que exista ou possa existir o risco de exposição a:
a) Substâncias e misturas que preencham os critérios de classificação ao abrigo do Regulamento (CE) nº 1272/2008, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativo à classificação, rotulagem e embalagem de substâncias e misturas, numa ou em várias das seguintes classes e categorias de perigo com uma ou várias das seguintes advertências de perigo:
i) Mutagenicidade em células germinativas, categoria 1A, 1B ou 2 (H340, H341);
ii) Carcinogenicidade, categoria 1A, 1B ou 2 (H350, H350i, H351);
iii) Toxicidade reprodutiva, categorias 1A, 1B ou 2, ou a categoria suplementar para efeitos sobre a lactação ou através dela (H360, H360D, H360FD, H360Fd, H360Df, H361, H361d, H361fd, H362);
iv) Toxicidade para órgãos-alvo específicos após exposição única, categoria 1 ou 2 (H370, H371).
d) Auramina;
e) Mercúrio e seus derivados;
f) Medicamentos antimitóticos;
g) Monóxido de carbono;
h) Agentes químicos perigosos de penetração cutânea formal;
i) Substâncias ou misturas que se libertem nos processos industriais referidos no artigo seguinte.

Artigo 60º - Processos industriais e condições de trabalho São condicionadas à trabalhadora grávida, puérpera ou lactante as atividades em locais de trabalho onde decorram ou possam decorrer os seguintes processos industriais:
a) Fabrico de auramina;
b) Trabalhos suscetíveis de provocarem a exposição a hidrocarbonetos policíclicos aromáticos presentes nomeadamente na fuligem, no alcatrão, no pez, nos fumos ou nas poeiras de hulha;
c) Trabalhos suscetíveis de provocarem a exposição a poeiras, fumos ou névoas produzidos durante a calcinação e eletrorrefinação de mates de níquel;
d) Processo de ácido forte durante o fabrico de álcool isopropílico;
e) Trabalhos suscetíveis de provocarem a exposição a poeiras de madeiras de folhosas.

Tal como nas situações de gravidez de risco, também as mulheres que tenham sido mães recentemente e/ou a amamentar, que se encontram impossibilitadas de trabalhar pela existência de riscos específicos que põem em risco a sua saúde e segurança, podem requerer o subsídio por riscos específicos, da Segurança Social (10).

A exposição a agentes biológicos relacionada com o trabalho, nomeadamente no setor da saúde, é um exemplo do possível contato com patógenos de risco para as lactantes, que podem estar associados a diversas patologias, incluindo doenças infeciosas (11). Nesse contexto, o Artigo 58º da Lei º102/2009 de 10 de setembro, define que estão condicionadas à trabalhadora puérpera ou lactante, todas as atividades em que possa existir exposição a agentes biológicos classificados nos grupos de risco 2, 3 e 4 (tal como definidos no Artigo 4º do Decreto-Lei nº84/97, de 16 de abril) (8) (12).

Assim, estas trabalhadoras devem ter o seu local de trabalho devidamente avaliado, com consequente adaptação das medidas de higiene e segurança no trabalho. Caso não seja possível assegurar a diminuição do risco de exposição de forma adequada, ou não seja possível a atribuição de outras tarefas que não impliquem o contacto com os agentes identificados por parte da entidade empregadora, a trabalhadora pode solicitar a atribuição do subsídio por riscos específicos (10) (13).

Certificado de incapacidade por assistência a familiares

Outra das preocupações dos pais prende-se com as faltas ao trabalho para prestar assistência por cuidados inadiáveis de saúde e/ou acidente dos filhos. Neste âmbito foi criado um apoio, em dinheiro, dado às pessoas que se encontram na situação supramencionada, o subsídio para assistência a filho (biológico, adotado ou do cônjuge). Este subsídio é um apoio monetário e aplica-se a filhos menores e maiores, e sendo maiores têm que fazer parte do agregado familiar do beneficiário. Este apoio aplica-se também aos filhos que sejam deficientes ou doentes crónicos, independentemente da idade (14).

Nos casos de filhos menores de 12 anos, ou sem limite de idade, em caso de filho com deficiência ou doença crónica, cada progenitor tem direito a faltar ao trabalho até 30 dias por ano civil, seguidos ou interpolados, ou durante todo o período de eventual hospitalização, tendo assim direito ao correspondente subsídio da Segurança Social durante os dias em falta, para assistência na doença ou acidentes a filhos. De ressalvar que esse direito não pode ser usado simultaneamente por ambos os progenitores.

Para a assistência na doença ou acidentes a filhos maiores de 12 anos, as condições alteram, sendo que cada progenitor tem direito a um período máximo de 15 dias de faltas ao trabalho, seguidos ou interpolados, em cada ano civil e o correspondente subsídio da Segurança Social durante esses dias de faltas.

Para ter acesso a este subsídio a criança ou jovem que beneficia da assistência tem que fazer parte do agregado familiar do beneficiário, se for maior de idade. Relativamente ao beneficiário, este tem que pedir o subsídio dentro do prazo, ou seja, nos seis meses a contar do dia em que deixou de trabalhar para prestar assistência ao filho.

Por fim, o valor deste subsídio para assistência a filho corresponde a 100% da remuneração de referência líquida, com o limite mínimo de 65% da respetiva remuneração de referência, sendo que a remuneração de referência corresponde à média de todas as remunerações declaradas à Segurança Social nos primeiros seis meses dos últimos oito meses anteriores ao mês em que se começa a faltar ao trabalho, excluindo os subsídios de férias, de Natal e outros de natureza análoga (14).

Licença e subsídio de assistência a filho com deficiência, doença crónica ou doença oncológica

Os progenitores de crianças e jovens com deficiência, doença crónica ou oncológica apresentam, por vezes, uma maior necessidade de ausências ao trabalho para assistência dos seus filhos que requerem mais cuidados de saúde e terapias. Neste sentido, beneficiam de um conjunto de direitos que lhes permite uma maior flexibilidade na ausência por assistência aos seus filhos. De acordo com o Artigo 53º do Código do Trabalho, os pais têm direito a licença por um período até seis meses, prorrogável até quatro anos, para assistência de filho com deficiência, doença crónica ou oncológica (5). No caso do seu filho com deficiência, doença crónica ou oncológica ter doze ou mais anos de idade, a assistência é confirmada por atestado médico. Esta licença supramencionada, pode ser prorrogável até ao limite máximo de seis anos, nas situações de necessidade de prolongamento da assistência, e neste caso, também confirmada por atestado médico. O limite máximo prorrogável dos seis anos, não se aplica no caso de filhos com doença prolongada em estado terminal e confirmada por atestado médico.

O subsídio de assistência a filho com deficiência, doença crónica ou oncológica, é um apoio monetário dado às pessoas que tiram licença no seu trabalho para acompanhar os filhos (biológicos, adotados ou do seu conjugue), portadores destas condições de saúde, por um período até seis meses, prorrogável até ao limite de quatro anos (15).

Redução do tempo de trabalho para assistência a filho menor com deficiência ou doença crónica

Os pais de filhos menores com deficiência ou doença crónica apresentam um direito à redução do tempo de trabalho. Neste âmbito, o Artigo 54º do Código do Trabalho declara que os progenitores de menor, com deficiência ou doença crónica e com idade não superior a um ano, têm direito a redução de cinco horas de período normal de trabalho semanal, ou outras condições de trabalho especiais, para assistência ao filho (5). Neste seguimento, não se verifica o direito ao referido anteriormente, quando um dos progenitores não exerça atividade profissional e não esteja impedido ou inibido totalmente de exercer o poder paternal. No caso de ambos os progenitores serem titulares desse direito, a redução do período normal de trabalho pode ser utilizada por qualquer um deles ou por ambos em períodos sucessivos. Para usufruir da redução do período normal de trabalho, o trabalhador deve comunicar ao empregador a sua intenção com dez dias de antecedência, assim como apresentar atestado médico comprovativo da deficiência ou doença crónica, e declarar que o outro progenitor tem atividade profissional ou que está impedido ou inibido totalmente de exercer o poder paternal, e nesse caso, que não exerce ao mesmo tempo este direito. De ressalvar que a redução do período normal de trabalho semanal não implica diminuição de direitos consagrados na lei, salvo quanto à retribuição, que só é devida na medida em que a redução, em cada ano, exceda o número de faltas substituíveis por perda de gozo de dias de férias. Por fim, o empregador deve adequar o horário de trabalho resultante da redução do período normal de trabalho, tendo em consideração a preferência do trabalhador, sem prejuízo de exigências imperiosas do funcionamento da empresa.

Dispensa de trabalho suplementar e de trabalho em período noturno

Os trabalhadores com filhos de idade inferior a doze meses (assim como as grávidas), não se encontram obrigados a prestar trabalho suplementar, tal como definido pelo Artigo 59º do Código do Trabalho. O mesmo artigo define ainda que, se for necessário para a sua saúde ou para a da criança, a trabalhadora não se encontra obrigada a prestar trabalho suplementar durante todo o período que durar a amamentação (5).

De acordo com o Artigo 60º do Código do Trabalho, por ser considerado um fator de risco, a trabalhadora também está dispensada de prestar trabalho em período noturno, definido entre as 20 horas de um dia e as 7 horas do dia seguinte, por um período de 112 dias antes e depois do parto, dos quais pelo menos metade antes da data previsível do mesmo (5). O mesmo artigo define ainda que a dispensa pode ser prolongada durante todo o tempo que durar a amamentação, se for necessário para a sua saúde ou para a da criança, mediante a apresentação de atestado médico que comprove a necessidade, e com a antecedência de 10 dias.

Na impossibilidade de ser atribuído um horário diurno compatível, a trabalhadora pode ser elegível para a obtenção de subsídio por risco específico da Segurança Social (10).

Regime de teletrabalho

De acordo com o Artigo 166-Aº do Código do Trabalho, quando as funções a serem desempenhadas são compatíveis com o regime de teletrabalho, os trabalhadores que necessitem de cuidar do filho até aos três anos podem optar por trabalhar a partir de casa (5). Esse período é extensível até aos oito anos em famílias monoparentais, exceto em casos de empresas até dez trabalhadores. Se ambos os progenitores puderem desempenhar as suas funções em teletrabalho, devem repartir o regime entre si.

Nas situações de filhos com deficiência, doença crónica ou oncológica, pode ser solicitado o regime de teletrabalho independentemente da idade do filho.

Dispensa no âmbito dos processos de adoção e acolhimento familiar

Os trabalhadores que sejam candidatos a adoção ou a família de acolhimento também usufruem de direitos face a ausências da sua atividade laboral. De acordo com o Artigo 45º do Código do Trabalho, os trabalhadores que se encontrem na situação anteriormente mencionada têm direito a dispensas de trabalho para realização de avaliação ou para cumprimento das obrigações previstas na lei para os respetivos processos, sendo que deve apresentar a respetiva justificação ao empregador (5).

Proteção no despedimento ou não renovação de contrato

Existem restrições quanto ao despedimento de trabalhadoras puérperas ou lactantes, ou trabalhadores no gozo de licença parental. Neste caso, de acordo com o Artigo 63º do Código do Trabalho, a decisão carece de um parecer prévio da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), a ser solicitado pelo empregador (5).

Nas situações de não renovação de um contrato de trabalho a termo, quando se trata de uma puérpera, lactante, ou de um trabalhador no gozo de licença parental, o motivo deve ser comunicado à CITE, no prazo máximo de cinco dias úteis (5).

DISCUSSÃO/CONCLUSÃO

Após explorados os temas relacionados com os direitos laborais dos pais no local de trabalho e os fatores de risco a ser evitados, torna-se claro que os médicos de Medicina Geral e Familiar e elementos das equipas de saúde ocupacional desempenham papéis cruciais na promoção do bem-estar dos trabalhadores e de suas famílias.

O retorno ao trabalho após ter um filho pequeno pode ser um período desafiador, com o potencial para causar burnout se não for gerido adequadamente. Compreender as complexidades das licenças parentais, das dispensas para amamentação, dos certificados de incapacidade por assistência a familiares, entre outros, permite oferecer orientação precisa e valiosa aos trabalhadores que buscam um equilíbrio entre sua vida profissional e familiar. Essas orientações não apenas protegem os direitos dos trabalhadores, mas também contribuem para a criação de ambientes de trabalho mais inclusivos e solidários.

Além disso, a identificação e mitigação de riscos ocupacionais específicos são um elemento essencial da atuação dos médicos de Medicina do Trabalho e das equipas de saúde ocupacional. Ao evitarem a exposição a condições de trabalho inadequadas, desempenham um papel crucial na preservação da saúde dos trabalhadores e no desenvolvimento saudável de seus filhos. As mães em amamentação, por exemplo, enfrentam riscos específicos que exigem atenção cuidadosa, e é responsabilidade desses profissionais garantir que elas possam realizar essa tarefa em segurança.

Em última análise, a integração eficaz dos direitos laborais dos pais e a proteção da saúde no local de trabalho são essenciais para o bem-estar das famílias e da sociedade como um todo. Os médicos de Medicina Geral e Familiar e os profissionais das equipas de saúde ocupacional têm a responsabilidade de estar atualizados com as leis laborais e os riscos ocupacionais, mas também de serem agentes de mudança na promoção de ambientes de trabalho que respeitem e apoiem os pais trabalhadores. Ao fazê-lo, eles desempenham um papel crucial na construção de uma sociedade mais saudável, equitativa e comprometida com o bem-estar das famílias e de todos os seus membros.

AGRADECIMENTOS

Nada a declarar.

BIBLIOGRAFIA

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15 Instituto da Segurança Social, I.P.: Departamento de Prestações e Contribuições. Guia prático: Subsídio de Assistência a Filhos com Deficiência, Doença Crónica ou Doença Oncológica (3016 - v1.26). Junho de 2023. Disponível em: https://www.seg-social.pt/documents/10152/15006/3016_subsidio_assistencia_filhos_deficiencia_doenca_cronica/f69bd791-f3e5-443d-903b-b9a916e35104Links ]

Recebido: 10 de Outubro de 2023; Aceito: 04 de Novembro de 2023; Publicado: 25 de Novembro de 2023

CONFLITOS DE INTERESSE, QUESTÕES ÉTICAS/LEGAIS

Sem conflitos de interesse. De ressalvar que os temas abordados nesta revisão são meramente indicativos à data, sendo que não excluem a consulta da legislação propriamente dita.

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