1. Introdução
No início do ano de 2020, não imaginávamos a dimensão que alcançaria a pandemia do novo coronavírus (COVID-19). A pandemia se alastrava pelos países asiáticos e europeus, mas no Brasil víamos um clima de certa “tranquilidade” com a população descrente que isso chegaria a ser um grande problema. Afinal, já havia ocorrido o surto de H1N1 em 2009/2010. Tal pandemia, na época, não alterou a rotina brasileira de forma geral. Continuou-se saindo para trabalhar, estudar, praticar esportes e outras atividades de lazer. Não havia uso constante de máscaras ou álcool em gel. Apesar disso, é importante o reforço do grupo de pesquisadores liderados por Coutinho et al. (2021) que afirma:
o mundo já havia enfrentado uma pandemia e uma epidemia devido à infecção pelos coronavírus SARS-CoV e MERS-CoV, ambos de origem em reservatórios animais, do gênero Betacoronavirus e subgênero Sarbecovirus. A primeira, ocorrida entre 2002 e 2003, foi ocasionada pelo SARS-CoV, assim identificado por ter causado a SRAG (severe acute respiratory syndrome - SARS) em indivíduos infectados; a segunda, ocasionada pelo MERS-CoV, responsável pela síndrome respiratória do Oriente Médio (Middle East respiratory syndrome - MERS) no ano de 2011. Por fim, surgindo, no final de 2019, uma pandemia ocasionada por outro coronavírus, também relacionada a doenças respiratórias, com alta patogenicidade. (p. 2)
As variantes da gripe, portanto, são responsáveis por várias das pandemias já enfrentadas na história. Em particular, todas as pandemias do século XXI foram causadas por vírus gripais. Contudo, sempre é importante relembrar da gripe espanhola que foi a pandemia mais devastadora da história.
Quando a pandemia de influenza espanhola irrompeu, em 1918, a comunidade médica internacional viu-se diante de um grande mistério. Como explicar que uma moléstia tão ordinariamente branda pudesse provocar tanta desordem e morte, como fazia por praticamente todo o mundo, no segundo semestre daquele ano? (Silveira, 2005, p. 92)
Analisando os impactos da COVID-19, parece até que vivemos um déjà-vu pandêmico da gripe espanhola. O brasileiro que costumava achar estranho asiáticos saindo de máscara durante as gripes aviária e suína, logo teve que se adaptar a uma nova rotina. No início era falado que só deveriam usar máscaras os que estivessem contaminados. Porém, logo se viu que todos deveriam adotar as medidas de proteção, fazer isolamento social e, em caso de extrema necessidade, confinamento.
Nesse meio caótico do ano de 2020, diversas medidas protetivas foram tomadas. Escolas e universidades tiveram seu funcionamento presencial interrompido e foram adotadas medidas de ensino remoto. Várias empresas também se adaptaram ao home office e algumas nem pretendem mais ter escritório físico. De certo modo, a pandemia impulsionou algumas mudanças que já começavam timidamente no Brasil. Mas entre seus impactos negativos, além do incalculável número de mortos e pessoas com sequelas respiratórias, está o fechamento de um dos maiores setores econômicos do país: o turismo.
O setor do turismo movimenta um número expressivo de trabalhadores no Brasil.
Não só redes de hotéis, pousadas e hostels como também espaços gastronômicos (restaurantes, bares, quiosques na orla da praia, dentre outros) e atrativos culturais. Gurgel (2017) ressalta:
o turismo cultural vem atraindo cada vez mais o interesse de visitantes nacionais e internacionais que viajam pelo Brasil. O país, que já ocupa o 8º lugar em recursos culturais em um ranking de 141 países, possui mais de 3 mil museus em funcionamento em todos os estados brasileiros. Somente os administrados pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), receberam em 2016 quase um milhão de visitantes. (para. 1)
Um dos mais famosos cartões-postais do Brasil, o Cristo Redentor, chega a receber quase 2.000.000 de turistas ao ano (Gandra, 2020). Dessa forma, a pandemia representou uma queda abrupta no setor do turismo de 36,7% (Alvarenga & Silveira, 2021). Esse fato somado à queda de outros setores principais da economia brasileira representou uma queda de 6,7% no produto interno bruto do país (Firjan, 2021). É a queda mais expressiva em anos.
Dessa forma, a pandemia de COVID-19 acarretou um impacto significativo também para os museus e outros espaços culturais1. Com o fechamento do setor por ocasião do isolamento social, várias empresas culturais de menor porte não conseguiram resistir e acabaram falindo. Com isso, houve demissão de diversos funcionários (Balbi, 2020). Mesmo em grandes instituições, alguns museus demitiram praticamente todos funcionários de algum dos setores (os mais comuns eram limpeza e recepção), diminuindo assim custos. Nesse sentido, o Conselho Internacional de Museus (ICOM) lançou um apelo, ainda em abril de 2020, para que os governantes fizessem um fundo-reserva para os museus (International Council of Museums, 2020b). Pouco tempo depois, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura também lançou uma declaração enfatizando a importância do período da COVID-19 para a salvaguarda documental (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization, 2020).
Para além disso, a principal questão implicada era: como manter viva a instituição-museu para a manutenção de suas atividades durante o período de isolamento social? Pensando nessas questões, vários foram os museus que se organizaram em torno de atividades nas redes sociais. Porém, uma questão que se coloca é: tais atividades incluíram os educadores surdos de museus? É acerca dessa questão que refletiremos nesse artigo. Vale ressaltar que essa pesquisa encontra seu terreno no meio virtual, ou seja, foram analisadas as páginas em redes sociais dessas instituições e seus respectivos sites para saber se houve promoção de atividades acessíveis para surdos.
Para tal, levaremos em conta em nossa análise todos os museus e espaços culturais que possuam educadores surdos. Antes, contudo, é importante fazer uma breve contextualização sobre a importância da acessibilidade cultural e dos educadores surdos em museus.
2. Contrapontos Entre o Olhar Museológico e a Acessibilidade de Surdos a Espaços Culturais
“Nos museus, a surdez é julgada” (Ladd, 2003/2013, p. 2). Ao se deparar com essa frase, um museólogo é acometido de imediato por um imenso desconforto, porque a ideia é que o museu seja uma instituição acessível a diferentes públicos. Entretanto, a frase de Ladd (2003/2013) não está julgando os museus. Na realidade, ele a utiliza como uma metáfora para se compreender a relação dele com a língua de sinais. O museu nesse caso seria uma analogia à sociedade de forma geral. Em sua metáfora-museu, Ladd (2003/2013) apresenta a existência de dois prédios: o edifício majestoso à frente e o anexo que fica atrás. O prédio da frente possui diferentes tecnologias para se ouvir: “trombetas para ouvidos do século XVII, aparelhos auditivos do século XX, ( … ) num canto assinalado ‘O Futuro’ estão mais modelos, de operações cintilantes realizadas mesmo perto do cérebro” (Ladd, 2003/2013, p. 2). Os curadores do prédio da frente lacraram a porta do prédio de trás. Ladd (2003/2013), ao conseguir localizar uma brecha para o prédio de trás, descobre que em seu interior estavam quadros “que tinham sido todos virados para a parede. ( … ) Os quadros falavam de comunidades de todo mundo que vivenciavam a alegria da sua existência coletiva, um orgulho desafiador das suas línguas gestuais” (p. 3). Ladd (2003/2013) conclui que esse conteúdo deveria estar presente no prédio principal, intitulado de “Cultura Surda”, e que o conteúdo do outro prédio deveria ser movido para o anexo, sob o nome de “Relíquias Coloniais”.
Quando lemos essa metáfora com o olhar museológico, podemos notar que indiretamente Ladd (2003/2013) faz uso da expografia para organizar seu museu. O autor separa os itens desse museu em dois grupos distintos: um deles enxerga a surdez como uma deficiência que deve ser consertada (“Relíquias Coloniais”) e o outro enxerga o ser surdo como um indivíduo pertencente a um grupo social que possui elementos linguís ticos e culturais próprios (“Cultura Surda”). As duas salas da metáfora-museu de Ladd (2003/2013) abordam coleções com o mesmo conceito/tema, porém narram ideologias e posições políticas distintas. Contudo, não podemos pensar na expografia de Ladd (2003/2013) sem antes falarmos sobre essa instituição: o museu. A nova definição de museus, proposta pelo ICOM (International Council of Museums, 2019), esclarece que:
os museus são espaços democratizadores, inclusivos e polifônicos para o diálogo crítico sobre o passado e o futuro. Reconhecendo e enfrentando os conflitos e desafios do presente, eles mantêm artefatos e espécimes em confiança da sociedade, salvaguardam diversas memórias para as gerações futuras e garantem direitos iguais e acesso igual ao patrimônio para todas as pessoas. (para. 2)
Pensando os museus como instituições inclusivas, Mairesse (2012) aponta que o termo “museu inclusivo” foi incorporado à “literatura museal, principalmente para evocar as relações entre o museu e os visitantes deficientes, mas também de modo mais geral, o conjunto de públicos excluídos do museu” (p. 35). Assim, a partir das provocações instigadas por Ladd (2003/2013), algumas questões que podemos indagar são: os museus oferecem condições para que o público surdo possa realizar visitas de forma autônoma? Que iniciativas são tomadas para fomentar visitas de público surdo? Quais são as adaptações necessárias na expografia dos museus para serem realmente acessíveis aos surdos? Em quais cargos dos museus estão presentes funcionários surdos? A mediação em língua de sinais é realizada por tradutores/intérpretes ouvintes ou por funcionários surdos?
Pensar a acessibilidade em museus pelo ponto de vista de alguém imerso em um grupo social marginalizado pode trazer à tona novas compreensões e possibilidades acerca desse tema. Porém, antes de entrar propriamente na questão da acessibilidade, é necessário entender algumas peculiaridades do grupo social do qual trataremos nesse artigo. Quando falamos a respeito desse grupo, é importante compreender que muitas vezes se usa o termo “deficiente auditivo” no lugar de “surdo”. A respeito desse fato, Veiga-Neto e Lopes (2006, como citados em Strobel, 2008a) explicam que:
na relação com o ouvinte, o surdo foi ensinado a olhar-se e a narrar-se como um deficiente auditivo. A marca da deficiência determinou, durante a história dos surdos e da surdez, a condição de submissão ao normal ouvinte. Dessa história de submissão, criaram-se práticas corretivas derivadas de saberes que informam e classificam os sujeitos dentro de fases de desenvolvimento lingüístico, cronológico e de perda auditiva. (p. 80)
Contudo, o que se vê na história dos surdos é que o movimento de resistência contra o ouvintismo/audismo fez emergir muitos marcadores sociais dessa comunidade e o principal deles é se entenderem identitariamente como surdos e não deficientes auditivos, uma vez que o termo “deficiente” está impregnado de um olhar patologizante da surdez (Garcia, 2011).
Sou surdo! O meu jeito de ser já marca a diferença! ( … ) Ser surdo, viver nas diferentes comunidades dos surdos, conhecer a cultura, a língua, a história e a representação que atua simbolicamente distinguindo a nós surdos e à “comunidade surda” é uma marcação para sustentar o tema em questão. (Miranda, 2001, como citado em Strobel, 2008a, p. 24)
Ao refletir sobre as culturas surdas, é possível contextualizar e compreender os principais anseios desse grupo social no que tange ao acesso a espaços culturais. Como ressaltado anteriormente, os surdos não se consideram pessoa com deficiência auditiva, mas sim como membros de uma comunidade linguística distinta. Assim, é importante que a abordagem com um visitante surdo seja diferente do contato com um visitante com deficiência auditiva.
É evidente que da mesma forma que surdos não querem ser tratados como pessoas com deficiência auditiva, o contrário também ocorre. Portanto, ao identificar um visitante com deficiência auditiva não é indicada a comunicação em sinais. Uma iniciativa de acessibilidade a esses públicos que podemos apontar é a do Instituto Smithsoniano. Em seus museus e espaços culturais, para o atendimento de visitantes surdos ficam à disposição tradutores/intérpretes de língua de sinais e todos os vídeos possuem legendas - ainda que o ideal fosse uma janela em língua de sinais. Já para o atendimento de visitantes com deficiência auditiva se opta por aparatos de amplificação sonora (Sarraf, 2013). Inclusive, é importante ressaltar que visitantes com deficiência auditiva em sua grande maioria utilizam aparelhos auditivos e possuem um domínio maior da língua portuguesa escrita. No caso dos surdos, usuários da língua de sinais como L1, isto ocorre de forma diferente. Garcia (2017) aponta que:
em sua maioria, os surdos brasileiros são analfabetos (em língua portuguesa escrita) e, mesmo entre aqueles que possuem algum nível de escolaridade, é comum não possuírem proficiência na língua portuguesa. Muitos abandonaram precocemente a escola, mantêm difíceis relações familiares (no que tange à comunicação) e, por não possuírem qualificação profissional adequada às demandas do mercado atual, têm dificultado seu acesso ao mercado formal de trabalho. (p. 414)
Dessa forma, levando em consideração o acesso de surdos a museus, apesar de existirem textos em língua portuguesa que explicam detalhes das exposições, muitas vezes esses visitantes não conseguem apreender o que está sendo passado. Uma das pesquisadoras do presente artigo, em sua graduação em museologia, presenciou um fato curioso em uma visita de museu por ocasião de uma das disciplinas. O professor pediu aos estudantes que preenchessem um questionário sobre alguns aspectos gerais, dentre eles a expografia e acessibilidade. Muitos estudantes notaram que não havia acessibilidade para cadeirantes, uma vez que não havia elevador e muitos elementos da exposição estavam em altura desproporcional a esse grupo; outros que não havia acessibilidade para cegos, pois não tinha audiodescrição, braille e piso tátil. Decerto que existiam essas dificuldades, mas existia também um elemento não mencionado e que gerou certa angústia à pesquisadora: onde está a mediação na língua brasileira de sinais (Libras)? Ao mencionar tal fato, automaticamente todos se deram conta que tinham esquecido os surdos e começaram a corrigir suas respostas. É compreensível essa questão. Afinal, cadeirantes e cegos são “identificáveis”, enquanto o surdo pode passar despercebido em uma multidão. E se mesmo a acessibilidade - aqui colocada de forma geral na sociedade - é negligenciada para diferenças “visíveis”, que dirá para as “não-visíveis”? Que voz a pessoa surda possui, se a sociedade como um todo nem sequer compreende sua língua?
Bourdieu e Darbel (1966/2007) apontam que a “freqüência dos museus - que aumenta consideravelmente à medida que o nível de instrução é mais elevado - corresponde a um modo de ser, quase exclusivo, das classes cultas” (p. 37). Por conta das dificuldades educacionais que tangem aos surdos, não é preciso dizer que o acesso a museus sempre foi algo distante de sua realidade. Dessa forma, a preocupação com a acessibilidade a museus por surdos é algo relativamente recente, apesar de o “tema da democratização e do acesso aos bens culturais não (ser) novo; ao contrário, é tema antigo, que ao longo do tempo vem passando por sistemáticos processos de renovação dos pontos de vista conceitual, político, social, jurídico e tecnológico” (Chagas & Storino, 2012, p. VII). Aidar (2003) acrescenta que “a inclusão social em instituições culturais deve ser compreendida como um passo além do trabalho de desenvolvimento de públicos, buscando ampliar suas atribuições e implicações sociais ao provocar mudanças qualitativas no cotidiano dos grupos envolvidos” (p. 6).
Uzeda (2018) analisa que é necessário o “respaldo em diferentes campos do conhecimento, competências ligadas à arquitetura, às artes plásticas e cênicas e ao design ( … ) com o objetivo de emocionar os visitantes das exposições” (p. 61). Assim, a inclusão de surdos em museus também deve considerar sua forma peculiar de interagir com o mundo, através de seu código linguístico distinto. Não basta pensar em uma mera tradução para língua de sinais dos conteúdos trazidos nas exposições. É necessário pensar na linguagem da exposição: o que se quer passar ao visitante? A resposta a essa pergunta deve nortear a tradução em língua de sinais, pois - por se tratarem de línguas distintas - as palavras podem variar de significado.
3. A Atuação de Educadores Surdos em Museus
Alguns museus e centros culturais brasileiros começam lentamente a contratação de educadores surdos que, além de realizarem a mediação em língua de sinais, também promovem diferentes atividades para incluir as comunidades de surdos nesse ambiente. Podemos citar o trabalho realizado no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM/SP) pelo arte-educador surdo Leonardo Castilho. Membro da equipe do MAM/ SP desde 2005, Castilho promove um grupo de trabalho chamado “Corposinalizante” que “recebeu alguns prêmios, como o 1º lugar no Prêmio Darcy Ribeiro 2009 (IPHAN/ MinC)” (Museu de Arte Moderna, 2019, para. 2).
Corposinalizante é um grupo de trabalho do Museu de Arte Moderna de São Paulo que pesquisa e produz arte, aberto a jovens surdos e ouvintes interessados na Língua Brasileira de Sinais (Libras). Considerando a dimensão pública da arte e o constante interesse em inventar formas de comunicação, o grupo desenvolve projetos culturais, documentários, performances e intervenções poéticas que dão visibilidade à identidade surda e à cultura dos jovens. (Museu de Arte Moderna, 2019, para. 1)
Um dos autores do presente artigo tem experiência como educador surdo em museus e, ao longo dessa trajetória profissional em diferentes espaços culturais, percebeu a preocupação cada vez mais frequente em tornar museus locais acessíveis por parte das atuais gestões de museus brasileiros. Muitos deles ainda tateiam nessa questão com trabalhos extremamente restritos ao setor educativo. É importante ressaltar que todos os profissionais atuantes em um museu devem saber lidar com as especificidades que cada grupo social requer. Algo para além do setor educativo, até mesmo para rececionistas ou seguranças.
Como já dito anteriormente, grande parte da comunidade surda não possui proficiência nem mesmo em português escrito, pois as línguas de sinais são ágrafas e sua estrutura frasal difere de uma língua oral-auditiva. Não que uma seja mais complexa do que a outra, são apenas diferentes. As línguas de sinais fazem parte de uma modalidade gesto-visual, na qual a configuração frasal é bem diferente das línguas orais-auditivas. E essa diferença por vezes está implicada no cotidiano dos surdos pelo enfrentamento comunicacional diário, uma vez que vivem imersos entre usuários de línguas áudio-orais que pouco, ou nada, dominam a língua de sinais. No caso dos museus, não adianta ter um conteúdo escrito em português se isso não fica compreensível ao público surdo. Em entrevista ao jornal O Globo em 2014, Castilho ressalta:
as pessoas, de forma geral, estão acostumadas a pensar no mundo como se todos fossem ouvintes. Ninguém pensa como surdo. A sociedade acha que basta dar uma bengala para o cego, colocar uma rampa para o cadeirante e botar um intérprete para o surdo que está tudo resolvido. Mas o acesso à vida, à arte, vai muito além disso. Temos o direito de entrar no museu e ter um videoguia para acompanhar a exposição, como temos no MAM (Museu de Arte Moderna), em São Paulo. Ou a ir ao teatro e ter um intérprete da língua de sinais. Ou assistir a um filme brasileiro com legendas em português. O surdo merece ter acesso à arte como qualquer um. (Vieira, 2014, para. 2)
Dessa forma, sobre a atuação de educadores surdos nos museus, Oliveira (2015) explica o quanto é positivo esse encontro surdo/surdo.
A experiência que o grupo ou indivíduo surdo vivencia dentro do museu está intimamente relacionada com as experiências posteriores de seu próprio cotidiano, são referenciais simbólicos de seu próprio universo cultural. ( … ) Quando esse grupo se depara com um interlocutor surdo no processo de mediação, essa experiência se torna mais concreta. A possibilidade de se articular e de se expressar na sua própria língua - Libras - o coloca em um campo de atuação de menor tensão e de segurança, pois ele sabe que diante deste discurso ele tem condições de argumentar, concordar, questionar e opinar. (Oliveira, 2015, p. 33)
Além das iniciativas com educadores surdos em museus, há também uma série de tecnologias acessíveis para os visitantes com outras diferenças. Para os surdos, podemos citar o código QR para vídeo em língua de sinais ao lado dos textos em exposições. Apesar do encontro surdo/surdo ser muito fomentado pelas comunidades de surdos, essas tecnologias também surgem para dar liberdade ao visitante surdo que deseja visitar o museu sem a dependência de um mediador. Sobre o uso dessas tecnologias, Uzeda (2015) esclarece que:
os estudos no campo da museologia, tradicionalmente voltados aos aspectos técnicos do manejo e da conservação dos objetos, com a ampliação da ênfase comunicacional, passam a dirigir seu foco diretamente sobre o público, formatadores do discurso museológico. Entender como a mensagem emitida aos visitantes é construída a partir dos objetos expostos, das informações textuais e da interpretação individual de cada um constitui-se agora numa preocupação fundamental nos museus. (p. 11)
Os pesquisadores Chagas e Santos (2007) definem bem estas questões em uma pequena frase: “pensar os museus é inseri-los no mundo em que vivemos” (p. 12). Articulando essa afirmativa com as questões enfrentadas pelas pessoas surdas, percebemos que o movimento social desse grupo conseguiu alguns avanços na direção de seus anseios, ainda que a passos pequenos, tais como a oficialização da Libras (Decreto nº 5.626, 2005; Lei nº 10.436, 2002) e a regulamentação da profissão de tradutor/intérprete de Libras-português (Lei nº 12.319, 2010). Esses e outros avanços poderiam ser considerados grandiosos, não fosse o descumprimento constante da legislação em vigor, inclusive nas instituições públicas. Desse modo, Garcia (2017) aponta que:
o Brasil inicia timidamente o reconhecimento político das diferenças linguísticas e culturais dos surdos, visto que ainda não encoraja, efetivamente, o ensino bilíngue desse grupo. Isso posto, pensa-se que, mesmo sendo considerado um avanço inquestionável no campo do reconhecimento po lítico dos direitos linguísticos dos surdos, não se deve alimentar a crença equivocada e ingênua de que a oficialização da LIBRAS em território nacional, per si, implica mudanças concretas nas práticas sociais e educativas voltadas a essa população. (p. 421)
Por ser ainda recente o acesso de surdos aos museus, esses elementos devem ser considerados para nortear as concepções das pessoas surdas acerca do que vem a ser essa experiência de ida aos museus. Ao compreender suas visões sobre esse campo, é possível trazê-las para os projetos de acessibilidade cultural nos museus. Aos surdos deve ser possibilitada a acessibilidade a espaços culturais não só para consumir a cultura majoritária pré-existente, a dos ouvintes, como também para serem agentes transformadores da cultura. Meira e Silva (2013) assinalam que “os processos artísticos e criadores operam hibridismos que acionam transformações nas práticas e reflexão entre teoria, prática e contexto de vida” (p. 48). Assim, diante desses hibridismos - poderíamos aqui pensar até mesmo no termo “hibridismo cultural” de Burke (2000/2003) -, é necessário levar-se em conta que os surdos possuem uma cultura visual, uma cultura surda.
A cultura surda e as línguas de sinais constituem uma língua sociossemioticamente reconhecida, com particularidades próprias. Referenciar a temática da cultura surda e acessibilidade no turismo é, antes de tudo, aproximar um abismo de aleijamento social, criado por políticas públicas displicentes, pela negação das diferenças, o que sugere trabalho, pesquisas e envolvimento com os movimentos e com a cultura surda. (Soares et al., 2013, p. 3)
O primeiro passo para criar um ambiente realmente acessível a esse grupo social é fomentar o diálogo com pessoas surdas e demonstrar que elas podem participar ativamente desse espaço. Pensando nisso, o ensino de artes para crianças/adolescentes surdos, com o fomento de idas a museus, torna-se importante para que esse estudante possa ter ferramentas para exprimir e demarcar sua identidade cultural e linguística. De acordo com Strobel (2008b):
a cultura surda também envolve o artefato arte surda, assim como as pinturas, esculturas, teatro, poesias e outros. Muitos artistas surdos em diferentes contextos como, por exemplo, os atores, os poetas em língua de sinais, pintores, mágicos, escultores, contadores de histórias e outros. ( … ) Muitos sujeitos surdos têm talentos para a arte de expressão corporal e ela deve ser incentivada pela escola, família e povo surdo. (p. 64)
A atriz surda Sandrine Hermanse (como citada em Aniceto, 2019) relata em um trecho do filme Sou Surda e Não Sabia sua experiência ao assistir, pela primeira vez, um teatro misto de surdos e ouvintes: “todos usavam a língua de sinais (francesa)2. Por que não era assim na sociedade? Foi isso que me deu coragem de fazer teatro com a língua de sinais. Isso me permitiu construir minha identidade. Senti orgulho de mostrar minha língua” (p. 87).
Levando tudo isso em consideração, é importante ressaltar que o ideal é que as visitas mediadas em Libras em museus devem ser realizadas por educadores surdos e que o ensino de arte nas escolas também deve ser proporcionado por professores surdos. Aliás, ensinando não só essa, como todas as outras matérias das grades curriculares. Primeiramente por evitar o “ruído”: um professor ouvinte tendo que lecionar com a presença de um tradutor/intérprete faz com que muitas informações não sejam compreendidas por parte dos estudantes surdos, seja pela metodologia do professor em sala, seja pela má formação de intérpretes. E também, mas não menos importante, para haver a tro ca de experiências dos alunos surdos com seus pares. Como todas as crianças, os surdos também necessitam ter modelos nos quais se inspirar na sua construção como indivíduo.
Falando em escola, podemos citar a instituição educacional de surdos mais antiga do Brasil: o Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES). O INES foi fundado em 26 de setembro de 1857 pelo professor surdo francês Ernest Huet a convite de Dom Pedro II, uma vez que na família real existiam pessoas surdas. A trajetória dessa instituição passou pela proibição das línguas de sinais com a imposição do oralismo, dentre outras fases que marcam a história da educação de surdos. No que diz respeito à arte, o INES possui uma história de valorização do incentivo das artes visuais por parte de seus estudantes. Na década de 1930, o escultor surdo Antônio Edgard de Souza Pitanga, formado pela Escola Nacional de Belas-Artes, lecionou a disciplina Desenho e Trabalhos Manuais. Na década de 1960, diversos artistas de grande reconhecimento também lecionaram na instituição, tais como Lygia Clark (Zanellato, 2016). Dessa forma, os alunos possuíam classes de diversos tipos de artes manuais: pintura, escultura, costura, carpintaria, dentre outras. Essas classes atualmente não existem mais, pois o INES possui a mesma estrutura curricular que escolas regulares convencionais. Entretanto, esse é um legado que ainda se mantém forte na memória dessa instituição, uma vez que ao caminhar pelos seus corredores podemos ver diversas esculturas e pinturas de autoria de seus alunos.
4. O Impacto da Pandemia de COVID-19 nas Relações Com os Espaços Culturais
Como ressaltado anteriormente, com a pandemia de um vírus de altíssima transmissibilidade, foi preciso tomar medidas drásticas e urgentes em torno da segurança da população. Uma das várias instituições afetadas por esse cenário foram os museus. Não houve nenhum museu, dos menores até os mais famosos, que não tenham sentido os impactos dessa crise. Só o Museu Metropolitano de Arte de Nova York (The Met) estimou um prejuízo de mais de 100.000.000$ (Pogrebin, 2020).
Porém, acima dos prejuízos financeiros está o fechamento de importantes pontes culturais. Pensando nisso, grande parte dos museus se reestruturaram para poder abarcar o formato remoto (Beiguelman, 2020). Ainda que isso não signifique um repasse significativo de verbas aos museus - tendo em vista que: (a) grande parte dessas atividades promovidas pelos museus nos últimos 2 anos foi totalmente gratuita; e (b) o valor recebido pela monetização varia muito de perfil por perfil em redes sociais -, é uma maneira de ofertar a toda a população um sinal de esperança em meio aos tempos turbulentos que atravessamos. O diretor-geral de cultura da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura afirma que:
os museus são mais do que apenas lugares onde o patrimônio da humanidade é preservado e promovido ( … ). Eles também são espaços essenciais para educação, inspiração e diálogo. Numa época em que bilhões de pessoas em todo o mundo se separam umas das outras, os museus podem nos unir. (Ottone, 2020, como citado em Roque, 2020, para. 4)
O ICOM organizou um pequeno manual de como interagir à distância com o público, listando as seguintes medidas (International Council of Museums, 2020a): tornar as coleções acessíveis na internet3, organizar visitas mediadas através de lives4 e promover o engajamento do público nas redes sociais com votações e hashtags. No Brasil, uma das iniciativas de hashtag mais bem sucedida foi a “#pinadecasa” implementada pela Pinacoteca do Estado de São Paulo. O número de curtidas em suas redes sociais aumentou em 5.000 seguidores em apenas 1 mês (Racy, 2020). Outra medida também foi a promoção de oficinas gratuitas e/ou com certificado pago por um preço simbólico de assuntos relacionados aos museus. Uma das pesquisadoras desse artigo acompanhou algumas iniciativas nesse sentido do Museu de Arte Sacra de São Paulo e do Acesso Cultura (Portugal). O Museu do Prado é um dos grandes exemplos. Na pandemia, o engajamento em suas redes sociais aumentou mais de 120% (García, 2020). Através do aplicativo Google Arts & Culture, já é possível acessar visitas online em 2.500 museus (Glette, 2020). As visitas ao Museu do Louvre pela internet aumentaram dos 40.000 aos 400.000 em poucos meses (Covid-19: Fechados, Museus Europeus Buscam Novos Públicos na Internet, 2020).
Por ser turno, o público, confinado em casa, adere a estas iniciativas numa estratégia de fuga à ansiedade do isolamento e à angústia provocada pelas notícias de doença e morte. Vai a museus aonde nunca tinha ido, ou visita-os de uma forma diferente, reinventa percursos, observa as obras e procura leituras que lhes conferem sentido. ( … ) Esta é uma visão otimista e idílica em situação de crise. A realidade tem um lado negativo e obscuro, ainda escassamente compreendido na sua dimensão, e cujo impacto é difícil de prever. Depois de uma realidade fraturante como esta que estamos a viver, nada poderá voltar a ser exatamente como antes e, a par de alguns indícios positivos, há sinais preocupantes. Um estudo levado a cabo pela NEMO - The Network of European Museum Organisations (Rede Europeia de Organizações de Museus), até ao passado dia 3 de abril, com uma amostra de 650 museus de 41 países, revela que os impactos da crise estão a atingir severamente os museus europeus. O encerramento acarretou uma avultada perda de receitas provenientes de ingressos, lojas, restauração e outros serviços. Os principais museus, situados em áreas turísticas, registam perdas entre 75 e 80%, totalizando centenas de milhares de euros. (Roque, 2020, paras. 6, 9)
Roque (2020), longe de ser pessimista, apenas está a levar-nos para a seguinte reflexão: como equilibrar os dois mundos - virtual e presencial - nos quais os museus vivem atualmente? Afinal, por mais otimistas que possamos ser nada será como antes da pandemia. Como falado anteriormente, há empresas que simplesmente abandonaram o escritório físico e serão permanentemente convertidas ao home office. Daqui para frente, esse será um grande reflexo em nossa sociedade: cada vez com mais interação virtual e menos cara-a-cara. Dessa forma, há uma possibilidade real e extremamente grande de que os museus nunca mais venham a ter o mesmo fluxo de visitantes do que era antes da pandemia.
No Complexo da Catedral de Florença, na Itália, reaberto ao público em 22 de maio, os visitantes recebem um colar eletrônico, primeiro do gênero no mundo, que bipa, vibra e pisca, alertando sobre a aproximação excessiva de outra pessoa. No berço do humanismo renascentista, uma imagem talvez particularmente distópica do cotidiano sob o impacto da Covid-19. ( … ) Se colares que bipam e bastões coloridos ilustram mudanças que veremos a Covid-19 levar aos museus, o aspecto desse novo normal que mais deve impactar a experiência de visitação - e o funcionamento das instituições - é a redução do público, pelo menos nos museus acostumados aos grandes fluxos de visitação. (Fontoura, 2020, paras. 10, 17)
Um grande exemplo que deixa claro esse marco coletivo é a criação do Museu de Arte Covid (https://www.covidartmuseum.com/) que possui dois focos principais: divulgar a arte que vem sendo realizada durante a pandemia e refletir sobre como tudo que está ocorrendo impactou a maneira de se fazer arte. Essa não é a única iniciativa a esse respeito. O Museu Nacional da Finlândia foi precursor ao sair entrevistando moradores de Helsínquia para saber como os mesmos se sentiam em meio ao caos instaurado no último ano (Gobbi, 2020).
O Ibermuseus (2020), um programa de cooperação entre museus da IberoAmérica, realizou uma pesquisa com 434 instituições de 18 países da região. Nessa pesquisa, 60% das instituições de verba particular ou mista informaram ter demitido empregados, especialmente dos setores que estavam fechados como os mediadores de visitas guiadas e pessoal de serviços terceirizados (ver resultados da pesquisa em Ibermuseus, 2020).
Uma preocupação em meio a esse novo processo de adaptação dos museus a uma plataforma ainda pouco dominada por seus profissionais é o fato de que as poucas iniciativas de acessibilidade aos surdos praticamente sumiram. Isto porque grande parte dos educadores surdos trabalham nas visitas mediadas em língua de sinais que estavam entre os setores considerados parados. Inclusive, houve relatos de alguns educadores surdos que foram demitidos ou tiveram seus salários congelados no período de agravamento da pandemia.
Apesar disso, um dos países que mais se mobilizou a esse respeito foi o Brasil. Desde abril de 2020, tão logo a pandemia se instaurou no país, o MAM/SP iniciou a campanha “#MAMonline” com diferentes atividades, dentre elas lives semanais em Libras sobre assuntos como cultura surda e mediação cultural (Com Foco em Acessibilidade, MAM São Paulo Promove Lives em Libras, 2020). Em abril de 2021, o Museu do Amanhã lançou a proposta inovadora do Museu em Libras. A cada 2 meses uma nova exposição temporária é exibida em uma sala virtual de plataforma de videoconferência com um limitado número de convites. De acordo com o Sistema Estadual de Museus de São Paulo (2021):
assim, reconhecendo a atual complexidade vivida em face ao agravamento da pandemia em todo o país, somado às inúmeras barreiras linguísticas vivenciadas pela comunidade surda no acesso à informação e conhecimento para o seu enfrentamento, a primeira edição do Museu em Libras não poderia ter outra temática senão o coronavírus, que em diálogo direto com a nova exposição temporária Coronaceno - Reflexões em tempos de pandemia, busca provocar reflexões acerca dos conceitos e relações evidenciados desde a chegada da Covid-19. ( … ) Toda a mediação será realizada em libras e contará com a atuação de intérpretes. A atividade está comprome tida com a Agenda 20305 da Organização das Nações Unidas. ( … ) A ação, em parceria com o Museu da Inclusão, teve a participação dos educadores museais Bruno Baptista (Museu do Amanhã) e Harry Adams (Museu da Inclusão). (paras. 3-6)
O Espaço do Conhecimento da Universidade Federal de Minas Gerais também promoveu atividade de live recentemente (setembro de 2021). Contudo, o tema era um tanto peculiar: comunicação com surdos em museus. Aí nos perguntamos: qual o motivo de se frisar a comunicação com surdos? O espaço tem educador surdo? Não seria melhor uma comunicação de surdo para surdo? Além disso, a página da notícia enfatiza o termo “linguagem de sinais”, quando o correto é “língua de sinais” (Universidade Federal de Minas Gerais, s.d.). Vale ressaltar também que essa é uma iniciativa isolada por ocasião do “Setembro Azul”6.
Outra iniciativa um tanto questionável foi a do Centro Cultural Dragão do Mar que, a despeito de tantas lives super interessantes promovidas em seu canal, teve somente uma com tradução/interpretação de Libras-português e isso porque a palestrante era surda (Dragão do Mar, 2020). Ou seja, o surdo só pode acessar o que “diz respeito ao surdo”? Ele não pode acessar qualquer outro conteúdo de seu interesse? O mesmo ocorreu no Museu da Vida (Museu da Vida / Fiocruz, 2020). Pensando nisso destacamos também a iniciativa da Oi Futuro que conta com tradutor/intérprete de Librasportuguês em todos os vídeos do Papo de Futuro (Oi Futuro, 2021), dando possibilidade de acesso dos surdos a outros assuntos que não sejam tão-somente a acessibilidade cultural. Sobre isso, Savedra (2021, como citada em Rodrigues, 2021) alerta que a acessibilidade através das legendas e janelas em língua de sinais “só serão de fato efetivos se os surdos fizerem parte do processo de produção e pós-produção, da mesma forma que não há como planejar rampas de acesso sem que os cadeirantes testem as mesmas” (para. 4). É o velho - porém quase nunca respeitado - “nada sobre nós sem nós”. Um museu que tem buscado subverter essa lógica trazendo o “tudo sobre nós com nós” é o Museu da Inclusão, fundado em 2009, que em breve ganhará exposições virtuais, mas por enquanto tem promovido diversas lives totalmente acessíveis em Libras projetadas com toda a equipe do educativo, o que também inclui o educador surdo Harry Adams (anteriormente mencionado; https://portal.museudainclusao.org.br/).
5. Reflexões Finais
Pensamos que a instituição-museu tentou de fato se reinventar e se adaptar a esse novo momento que vivemos, mas ainda assim os esforços das instituições não parecem ter tido um enfoque específico para um dado grupo social. Não ficou evidente se o educativo desses museus esteve presente nas atividades refletindo sobre como dar a acessibilidade a diferentes grupos sociais. Assim, através de uma pesquisa muito inicial, foi possível verificar que, não só os museus tateiam no que se refere ao espaço virtual, como também as iniciativas que dizem respeito ao público surdo foram incipientes para suprir uma série de conteúdos muito relevantes que os museus têm promovido.
De qualquer forma, esperamos que esse momento pandêmico seja de profunda reflexão por parte dos profissionais de museus, para que hajam mais iniciativas e que não se pense apenas em utilizar os educadores surdos de museus nas visitas mediadas. Isso é fundamental sem dúvida, mas existe uma série de outras iniciativas que podem ser desenvolvidas: saraus, oficinas, dentre outros. Que dos tempos de incerteza (International Council of Museums Brasil, 2020) possamos reinventar nossas práticas. Afinal, os museus já superaram outras crises e se mantiveram firmes como instituições prontas para salvaguardar as memórias e para narrar tais acontecimentos às gerações futuras (International Council of Museums, 2020c).
Desejamos ainda que nossas breves reflexões possam auxiliar para que juntos todos esses atores sociais envolvidos nos museus e espaços culturais, sejam eles museólogos, educadores, dentre outros profissionais, possam reunir estratégias de modo a que esses locais efetivamente se coadunem com a nova definição do ICOM enquanto espaços em que haja uma plena democracia e acesso à informação.