Introdução
O pneumomediastino espontâneo (PME) é uma entidade pouco frequente e habitualmente autolimitada. É caracterizado pela presença de ar livre no mediastino não precedido por trauma torácico, cirurgia ou qualquer outro procedimento médico.1) Foi descrito pela primeira vez por Louis Hamman em 1939, porém a fisiopatologia foi descrita anos mais tarde, em 1944, por Macklin e Macklin, que propuseram a presença de um gradiente de pressão intersticial-alveolar.2 O aumento da pressão das vias aéreas leva à rutura alveolar e, consequentemente, à dissecção do ar ao longo da bainha broncovascular em direção ao mediastino, que pode se estender ao tecido subcutâneo cervical, pleura, pericárdio, cavidade peritoneal e espaço epidural. O PME poderá passar despercebido e consequentemente a sua incidência real é desconhecida, variando de 1:7000 a 1:45 000 das admissões hospitalares, dependendo das séries avaliadas.3 O PME afeta principalmente jovens do sexo masculino longilíneos. Os principais fatores predisponentes são as infeções do trato respiratório, manobra de Valsalva, rutura esofágica e consumo de substâncias ilícitas, contudo, frequentemente, o fator desencadeante é desconhecido.4 Os principais sintomas são a toracalgia e a dispneia.4
Caso Clínico
Jovem de 25 anos do sexo masculino, caucasiano, de morfologia longilínea com hábitos tabágicos 5 unidades maço-ano, sem outros antecedentes pessoais de relevo e sem medicação habitual. Recorreu ao serviço de urgência por dor torácica retrosternal persistente, com agravamento com os movimentos inspiratórios, irradiada à região cervical com nove horas de evolução associada a tumefação ao nível do pescoço. A toracalgia iniciou-se após um grito a celebrar um golo num jogo de futebol. O jovem negava febre, dispneia, disfagia, tosse, assim como história recente de trauma, infeção respiratória ou abuso de drogas. Ao exame físico apresentava-se hemodinamicamente estável, eupneico com via aérea patente com saturações periféricas de oxigénio de 100% em ar ambiente. A auscultação pulmonar não apresentava alterações, e à auscultação cardíaca apresentava um som estridente síncrono com os batimentos cardíacos (sinal de Hamman4). Apresentava, ainda, a presença de crepitações à palpação da fossa supraclavicular bilateralmente compatível com enfisema subcutâneo. A radiografia de tórax (RT) póstero-anterior demonstrava a presença de PME (Fig. 1) e confirmava a presença de enfisema subcutâneo (Fig. 2) sugerido na exploração física. A tomografia computorizada (TC) torácica confirmou o diagnóstico de PME, excluindo a presença de doença pulmonar (Fig.s 3 e 4). Os restantes exames complementares de diagnóstico não apresentavam alterações. O paciente permaneceu em observação durante 48 horas sob terapêutica conservadora. Realizou TC-torácica de controlo compatível com reabsorção, tendo tido alta assintomático com indicação de cessação tabágica e seguimento em consulta de follow-up, não havendo registos de recorrência.
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Figura 1: Radiografia de tórax, póstero-anterior, com presença de pneumomediastino e enfisema subcutâneo.
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Figura 2: Radiografia de tórax superior, ântero-posterior, evidenciando a presença de pneumomediastino e enfisema subcutâneo na região cervical.
Discussão
O PME não complicado tem um prognóstico benigno e autolimitado.5 Deverá ser considerado no diagnóstico diferencial da toracalgia súbita, especialmente, em jovens de morfologia longilínea. Um dos fatores desencadeantes é a manobra de Valsalva, como por exemplo, um esforço vocal intenso na forma grito apresentado pelo jovem. A exploração física poderá ser normal em até 30% dos casos.5 Os sinais que podem sugerir o PME são a presença de enfisema subcutâneo e o sinal de Hamman. Este último sinal identifica-se em cerca de um terço dos casos.6,7 Trata-se de um som patognomónico, que poderá contribuir como uma pista importante no diagnóstico do PME, a auscultação criteriosa do mesmo poderá ser melhorada colocando o doente em decúbito lateral esquerdo.8,9 O diagnóstico é habitualmente confirmado pela RT podendo ser necessário a realização de TC pela sua maior sensibilidade. O tratamento é habitualmente conservador com taxas de recorrência inferior a 5% dos casos.10