Um paciente de 29 anos do sexo masculino heterossexual, saudável, recorreu ao Serviço de Urgência de Otorrinolaringologia referindo uma lesão de novo, indolor, friável e com crescimento progressivo na cavidade oral, com cerca de 3 meses de evolução. Associado a este quadro, o doente referia astenia, perda de peso e aparecimento subsequente de novas lesões purpúricas no tronco, couro cabeludo e extremidades inferiores. Ao exame objetivo da cavidade oral, constatou-se uma neoformação séssil vinosa com cerca de 2 cm na região central da mucosa gengival superior com infiltração equimótica (Fig. 1). O estudo analítico realizado revelou linfopenia, com contagem CD4+ de 11 linfócitos/µL. O estudo virológico realizado foi positivo para vírus da imunodeficiência humana (VIH) tipo I, com carga vírica 799 363 cópias/mL. O diagnóstico de sarcoma de Kaposi foi confirmado por biópsia das lesões da pele e análise histopatológica (Fig. 2). O doente iniciou terapêutica anti-retrovírica, assim como quimioterapia, com remissão, até à data, das lesões sarcomatosas e recuperação do seu status imunológico.
O sarcoma de Kaposi é um tumor angioproliferativo de baixo grau causado pelo vírus herpes simplex 8 (HHV8). Existem vários subtipos de sarcoma Kaposi, estando caracteristicamente associado a estados de imunossupressão, nomeadamente a infeção pelo VIH em fase de SIDA (doença definidora).1 Ocasionalmente, lesões sarcomatosas podem envolver a área da cabeça e pescoço, particularmente a nível da cavidade oral - no palato duro, gengivas, mucosa bucal ou dorso da língua - e assumir variados aspetos, podendo ser lesões maculares, nodulares ou ulcerativas, e dependendo do estadio, assintomáticas e eritematosas ou sintomáticas e escurecidas, pelo trauma e infeção secundários.2,3 O diagnóstico assenta na combinação de achados morfológicos e imunofenotípicos num contexto clínico-patológico único. O tratamento engloba o controlo da infeção VIH através da terapêutica anti-retrovírica altamente ativa (highly active antiretroviral therapy - HAART) e quimioterapia, tópica ou sistémica, com antraciclinas e taxanos em casos de doença rapidamente progressiva.1-3