INTRODUÇÃO
Segundo a Organização Mundial de Saúde, estima-se que nos países desenvolvidos mais de dois milhões de mortes são atribuíveis ao sedentarismo, e que 60 a 80 % da população mundial não é suficientemente activa para obter benefícios na saúde (American Association for World Health, 2002). O desenvolvimento da actividade física e desporto para todos pode trazer benefícios socioeconómicos em termos de redução de custos de saúde (2,4% a 6,4 % do custo total do sistema de saúde), de custos sociais como a delinquência juvenil, aumento de produtividade, mais oportunidades de emprego, melhor integração social, meios ambientes mais saudáveis, melhor aproveitamento escolar, participação no desporto e recreação mais elevada, obtendo em consequência melhores resultados desportivos (WHO, 2002).
A revisão bibliográfica aponta para vários benefícios da actividade física, em que a prática sistemática está relacionada a benefícios a nível emocional (Becerro & Owen, 1988, 1989; Berger, 1996; Berger & Mclnman, 1993; Becker, 1996; Boutcher, 1993; Marques, 2000; Weinberg & Gould, 2001) e ainda mais, quando essa prática é mantida por longo tempo, esses benefícios fortalecem-se (Berger, 1996; Boutcher, 1990; Weinberg & Gould, 2001). Para os adolescentes, em idade de grandes transformações, bem como para adultos e idosos, a prática de actividade física favorece a prevenção de alterações de humor (Berger, 1993, 1996; Becerro, 1989; Berger & Mclnman, 1993), a atenuação da depressão, da ansiedade e da agressividade (Becerro, 1989; Becker, 1996; Dishman, 1986; Sime, 1981), bem como se repercute positivamente no autoconceito (Tomé & Valentini, 2006) e auto-imagem dos praticantes (Tucker; Maxwell, 1992).
O nosso trabalho de investigação tem como objectivo o estudo das relações entre actividade físico-desportivas, autoconceito e aproveitamento escolar de adolescentes portugueses. Com o intuito de pôr em evidência o quanto é proeminente a prática de actividade físico-desportivas, se existe então relação na construção do autoconceito, como para um bem-estar pessoal e consequente relacionamento interpessoal e analisando em paralelo o aproveitamento escolar.
A actividade física pode ser definida como qualquer movimento corporal produzido pelos músculos esqueléticos que resulte em gastos de energias” e a actividade físico-desportivas corresponde ao movimento corporal planeado, estruturado e repetitivo, executado para melhorar ou manter um ou mais componentes da boa forma física (Caspersen, Powell & Christenson, 1985).
Os benefícios inerentes à prática da actividade física são amplamente reconhecidos, quer do ponto de vista fisiológico, quer do ponto de vista psicológico (USDHHS, 1996). A actividade física reduz entre outros aspectos, o risco de morte prematura por doenças cardiovasculares, diabetes do tipo II e cancro do cólon. Reduz, ainda, os estados de depressão e de ansiedade, ajuda a controlar o peso corporal, a reduzir a tensão arterial em indivíduos hipertensos, a manter o bom funcionamento do sistema musculoesquelético, a melhorar a mobilidade em idosos e a promover o bem-estar psicológico. Além disso, melhora a auto-estima e promove afectos positivos, principalmente quando associada à interacção social. Apesar das fortes evidências que suportam o papel da actividade física na qualidade de vida, os estudos epidemiológicos sugerem que mais de metade da população é sedentária (Berger & Mclnman, 1993; Dunn, Marcus, Kampert, Garcia, Khol, & Blair, 1999).
Por seu turno, o autoconceito é um construto multidimensional que abrange atitudes e sentimentos acerca das capacidades, aparência e aceitabilidade social dos indivíduos (Faria & Fontaine, 1990, 1992; Faria & Azevedo, 2004), sendo composto por imagens acerca do que nós próprios pensamos que somos, o que pensamos que conseguimos realizar e o que pensamos que os outros pensam de nós e, também, de como gostaríamos de ser (Rosenberg, 1965). Contudo apesar da variedade de definições existentes, aceita-se a ênfase no carácter multifacetado do autoconceito, pois o indivíduo constrói diferentes imagens acerca de si próprio, que variam de acordo com os diferentes contextos e com a fase do ciclo de vida em que se encontra (Faria, 2005; Faria & Azevedo, 2004).
Como elemento nuclear da personalidade, o autoconceito assume um papel regulador e preditor do comportamento futuro, motivando-o e fomentando os investimentos diversos, e concomitantemente serve de agente verificador e guia orientador para as respostas comportamentais, particularmente diante de acontecimentos desafiantes e importantes (Faria & Azevedo, 2004).
No que se refere a manifestações diferenciais do autoconceito, mais propriamente durante a adolescência, o autoconceito torna-se diferenciado, multifacetado e estruturado (Faria & Fontaine, 1990), e os indivíduos abandonam as categorias globais e indiferenciadas para se descreverem e avaliarem, adoptando as específicas e diferenciadas, sendo mais capazes de integrar no conceito de si mesmo o feedback avaliativo dos outros, aumentando, com a idade, a relação entre o autoconceito e as realizações pessoais (Faria, 2005) sendo que este se pode subdividir em académico e não académico. O académico engloba o autoconceito na língua materna, na matemática e o escolar geral. Enquanto o não académico abrange o físico total e o social total. Assim, o físico total engloba a dimensão que se refere à aparência física e também às actividades físicas e desporto. Por sua vez, o social total inclui a relação com os pares do sexo oposto, a relação com pares do mesmo sexo e a relação com os pais. Por fim, temos o autoconceito relacionado com a estabilidade emocional, com a honestidade/integridade e, consequentemente aquele em que todos se contemplam-o auto-conceito geral (Shavelson, Hubner & Stanton, 1976; Marsh & Shavelson, 1985; Marsh, Byrne & Shavelson, 1988; Marsh & Hattie, 1996).
De acordo com a revisão bibliográfica, a prática regular de actividade física parece constituir um meio privilegiado para melhorar o autoconceito em várias dimensões, muito particularmente na física, uma vez que conduz a uma melhoria da imagem corporal e da auto-estima física, assim como a um maior ajustamento e adaptação aos contextos de vida (Falsom-Meek, 1991; Marsh, 1993; Melnick & Moorkerjee, 1991; Mota & Cruz, 1998). Na verdade, o adolescente desenvolve diferentes autoconceitos em função dos diferentes papéis sociais que tem que assumir, entre outros, por exemplo, como filho, aluno, colega, namorado e atleta. Assim, as várias medidas de avaliação do autoconceito abrangem múltiplas dimensões, que vão aumentando à medida que avançamos no ciclo de vida. Concretizando, na adolescência são importantes as dimensões académicas, com o autoconceito para a matemática, para a língua materna e para as disciplinas artísticas, bem como a dimensão não académica social, que abrange a relação com pares e pais, e a dimensão não académica física, que compreende a aparência física e a competência ou habilidade físico-desportiva (Marsh, 1989).
Na tentativa de diferenciar as auto-percepções nos vários domínios, Shavelson et al. (1976) desenvolveram um modelo do autoconceito cuja estrutura se revelou multidimensional e hierarquicamente ordenado. Estes autores identificaram sete características consideradas críticas na definição do autoconceito, podendo este ser descrito como: organizado e estruturado, multifacetado, hierárquico, estável, desenvolvimental, avaliativo e descritivo, e diferenciado de outros constructos.
O autoconceito, enquanto parte integrante que é da personalidade, influencia o comportamento de diversas formas. No caso particular das actividades desportivo-motores, a percepção que os indivíduos possuem das suas capacidades é entendida como um indicador fundamental para a reavaliação das suas atitudes e comportamentos face a essas actividades (Carapeta, Ramires, & Viana, 2001). Segundo Vaz Serra (1988a, 1988b) existem quatro tipos de influências que determinam o desenvolvimento do autoconceito. São elas: 1 - A forma como os outros observam um indivíduo e o consequente feedback que lhe transmitem; 2 - A percepção que o indivíduo tem do seu desempenho nas várias situações; 3 - A comparação que faz do seu comportamento numa dada situação, com a dos seus pares sociais; 4 - A avaliação que faz de um determinado comportamento relativamente aos valores aceite pelo seu grupo de referência.
O envolvimento das pessoas em actividades físicas e desportivas implica uma exposição aos outros, a sistemática auto-avaliação face ao desempenho que alcançam, e a avaliação social que daí advém, em geral, e em particular a aceitação entre os pares. São escassos os estudos que abordam estas temáticas, assim o presente estudo visa aprofundar conhecimentos sobre a relação entre actividade física, autoconceito e aproveitamento escolar. Para o efeito procuráramos resposta para as seguintes hipóteses nulas e todas em função das múltiplas dimensões do autoconceito:
H01: não há diferenças significativas entre rapazes e raparigas nas múltiplas dimensões do auto conceito
H02: não há diferenças significativas entre quem atinge ou não os níveis de prática de actividade física recomendada nos níveis de auto-conceito.
H03: não há diferenças entre os níveis de envolvimento em actividade física (inactivos, insuficientemente activos, moderadamente activos e muito activos) nos níveis do autoconceito;
H04: não há diferenças ao nível do aproveitamento escolar em adolescentes que têm um alto e baixo autoconceitos nas suas diferentes variáveis;
H05: não há diferenças ao nível da influência da actividade física em adolescentes com alto ou baixo aproveitamento escolar.
MÉTODOS
O presente estudo caracteriza-se como sendo transversal, uma vez que os seus dados foram recolhidos em apenas um único momento. Encontra-se assente numa perspectiva ética e modelo nomotético, onde se procurou a compreensão de padrões gerais de comportamento e a generalização dos resultados, e num paradigma investigacional quantitativo, sendo de uma natureza quasi-experimental, uma vez não há manipulação de variáveis independentes.
Amostra
A amostra global é constituída por 624 adolescentes com idades compreendidas entre os 12 e 19 anos (DP 14.84±1.77 anos), cujas respostas foram recolhidas em quatro distritos do norte de Portugal. Quanto ao sexo, a amostra distribuiu-se em 268 indivíduos do sexo masculino (42.9%) e 354 do sexo feminino (56.7%) sendo que a média de idades, respectivamente é de 14.79±1.67 e 14.89±1.84 anos, com uma mortalidade da amostra por responderem a esta pergunta. Para alguns factores, o valor da amostra é menor do que o total, uma vez que alguns sujeitos não os responderam. Será indicado para cada um deles o valor da dimensão da amostra dos mesmos. Estes adolescentes encontram-se matriculados nos segundo e terceiro ciclos de escolaridade.
Quanto à frequência da prática de actividade físico-desportivas, com a duração mínima de uma hora, e na última semana, 121 pessoas afirmam não praticar em qualquer dia da semana (20.2%) enquanto 478 (79.8%) afirmam fazê-lo, sendo que dentro dos que não praticam são 26 os rapazes (21.5%) e 95 as raparigas (78.5%). Em relação à frequência da prática de actividade físico-desportivas com a duração mínima de uma hora, na última semana, 121 indivíduos respondem que não praticam (20.2%), 99 praticam num dia (16.5%), 112 em dois dias (18.7%), 103 em três dias (17.2%), 50 em quatro dias (8.3%), 62 em cinco dias (10.4%), 22 em seis (3.7%) e os indivíduos que praticam actividade físico-desportivas com duração superior a uma hora em todos os dias da semana 30 (5.0%). 25 indivíduos não responderam a esta questão, sendo esse número subtraído na dimensão total da amostra para as percentagens acima.
Referindo-nos à prática de actividade físico-desportivas, com duração mínima de uma hora, durante uma semana normal, 100 indivíduos não praticam qualquer actividade físico-desportivas em qualquer dia de uma semana normal (16.7%) enquanto 498 (83.3%) praticam. Em relação à frequência deste, e para além dos 100 indivíduos que não praticam actividade físico-desportivas (em qualquer dia de uma semana normal) (16,7%), 86 praticam num dia (14.4%), 141 em dois (23.6%), 96 em três (16.2%), 67 em quatro (11.2%), 59 em cinco (9.9%), 20 em seis (3.3%) e os que praticam actividade físico-desportivas, numa semana normal, com duração superior a uma hora em todos os dias da semana são 29 (4.8%). Nesta pergunta obtivemos 26 respostas ausentes, sendo esse valor subtraído na dimensão amostral para as percentagens acima.
Sexo | Masculino | Feminino | Amostra Total | ||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
n = 268 (42.9%) | n = 354 (56.7%) | n = 624 (100%) | |||||||||
Idade | Min | Max | M±DP | Min | Max | M±DP | Min | Max | M±DP | ||
12 | 19 | 14.79±1.67 | 12 | 19 | 14.89±1.84 | 12 | 19 | 14.84±1.77 | |||
Residência | Urbano | Rural | Urbano | Rural | Urbano | Rural | |||||
140*** | 121*** | 170** | 171** | 311* | 292* |
*n = 603; **n = 341; ***n = 261
Instrumentos
Os dados relativos ao autoconceito foram recolhidos sobre a forma de um questionário de autopreenchimento denominado de Self-Description Questionnaire II (SDQII) (Marsh, 1990) na versão portuguesa de Gonçalves e Vasconcelos-Raposo (2001). Este instrumento é respondido numa escala de Likert de 6 pontos (1: discordo plenamente a 6: concordo plenamente), que contempla 11 dimensões de autoconceito, distribuídos por 102 itens, sendo portanto multidimensional: autoconceito relativo a língua materna, a matemática, a escolar geral [os três englobados no autoconceito académico], à aparência física, às actividades físicas e desporto, à relação com os pares do mesmo sexo, à relação com pares do sexo oposto, à relação com os pais, à honestidade/integridade, à estabilidade emocional e ao autoconceito geral [englobados no auto-conceito não académico] que, por sua vez, correspondem à Rosenberg Self-Esteem Scale, com as devidas alterações. Em relação à consistência interna, os valores de alpha de Cronbach oscilaram entre o menor valor de .709 e .935.
Conjuntamente com o SDQ-II, foi também perguntada a idade, sexo, meio de residência, ano de matrícula e curso a que pertenciam. Para além destas informações, como medida de análise do aproveitamento escolar, perguntou-se se o sujeito alguma vez ficou retido num ano lectivo, em que ano e quantas vezes. Adicionalmente, perguntou-se também a classificação nas disciplinas obtida no período transacto. Por razões processuais não se incluíram estas informações no presente estudo, bem como o curso a que pertenciam uma vez que estariam relacionados.
Para medir o nível de actividade físico-desportiva praticada pelos sujeitos fizeram-se duas perguntas distintas: na última semana em quantos dias praticaste actividades físico-desportivas mais do que 1 hora; e numa semana normal em quantos dias praticas actividades físico-desportivas mais do que 1 hora. O uso do valor “uma hora” é intencional na medida em que para a faixa etária em que o nosso estudo incide, os valores recomendados pela Organização Mundial de Saúde, com base no American College of Sports Medicine/American HeartAssociation (2007) e Strong et al (2005) são de 60 minutos por dia, tendo em conta também a proposta de Biddle, Sallis e Cavill (1998). Os sujeitos teriam que responder, excluindo as aulas de educação física, se praticam zero, um, dois, três, quatro, cinco, seis ou sete dias por semana actividade física, numa semana normal e na última semana, mais do que uma hora. Posteriormente obteve-se a média de ambas as perguntas, para calcular a variável final que utilizámos para indicar o nível de actividade físico-desportiva.
Procedimentos
Na aplicação dos questionários, cada membro da equipa de pesquisa ficou encarregue de se dirigir a uma escola distribuindo-os, sempre que possível, por pelo menos uma turma por ano, do sétimo ao décimo segundo ano, com a aplicação a decorrer nos primeiros dez a quinze minutos das aulas (houve necessidade de alargar o tempo em diversas aplicações devido a vários factores). Garantiu-se naturalmente a confidencialidade e anonimato dos dados. O preenchimento foi sempre precedido de uma breve declaração relativamente à importância de respostas sinceras para o nosso estudo. Os dados foram tratados recorrendo Statistical Package for the Social Sciences (SPSS®).
RESULTADOS
A amostra do nosso estudo foi de 624 indivíduos. Para analisar a normalidade dos dados usou-se o Skewness e Kurtosis: embora os valores não tenham oscilado apenas entre -1 e 1, o que indicaria normalidade, como apenas o valor relativo ao autoconceito na relação com os pais ultrapassou esse limite (-1.146), e tendo em conta que esse valor se refere a uma extremidade da curva normal relativa a uma média elevada (4.965) no processamento estatístico considerou-se a normalidade. Os dados de ambos encontram-se no Quadro seguinte:
M | DP | Skewness | Kurtosis | α | |
---|---|---|---|---|---|
AC Língua Materna | 3.88 | .88 | -.192 | .025 | .820 |
AC Matemática | 3.36 | 1.37 | .004 | -1.019 | .935 |
AC Escolar Geral | 4.29 | .90 | -.460 | .107 | .877 |
AC Aparência Física | 4.10 | 1.05 | -.504 | .079 | .886 |
AC Actividades Físicas/ Desportivas | 4.38 | 1.05 | -.668 | .010 | .861 |
AC Relação com pares do mesmo sexo | 4.99 | .71 | -.900 | .759 | .823 |
AC Relação com pares do sexo oposto | 4.66 | .79 | -.500 | .042 | .783 |
AC Relação com os Pais | 4.97 | .85 | -1.146 | 1.281 | .813 |
AC Honestidade/Integridade | 3.76 | .77 | -.266 | -.249 | .709 |
AC Estabilidade Emocional | 4.88 | .65 | -.628 | .281 | .734 |
AC Geral | 4.51 | .78 | -.431 | -.280 | .830 |
AC TOTAL | 4.34 | .54 | -.327 | -.118 | .946 |
Posteriormente procedemos à comparação dos valores médios dos diferentes factores do autoconceito e dos níveis de actividade físico-desportiva em ambos os sexos, como patenteado pelo Quadro, bem como os valores do teste t e suas significâncias.
Masculino M±DP | Feminino M±DP | t | p | |
---|---|---|---|---|
AC Língua Materna | 3.71±.89 | 4.00±.86 | -3.98 | .00 |
AC Matemática | 3.44±1.36 | 3.29±1.38 | 1.31 | .19 |
AC Escolar Geral | 4.26±.90 | 4.31±.89 | -.69 | .49 |
AC Aparência Física | 4.34±.96 | 3.92±1.08 | 4.62 | .00 |
AC Actividades Físicas/Desportivas | 4.79±.89 | 4.08±1.06 | 8.74 | .00 |
AC Relação com pares do mesmo sexo | 4.90±.77 | 5.04±.67 | -2.18 | .03 |
AC Relação com pares do sexo oposto | 4.70±.78 | 4.63±.80 | 1.00 | .32 |
AC Relação com os Pais | 4.99±.77 | 4.94±.91 | .60 | .55 |
AC Honestidade/Integridade | 4.03±.68 | 3.56±.78 | 7.39 | .00 |
AC Estabilidade Emocional | 4.67±.70 | 5.03±.57 | -6.69 | .00 |
AC Geral | 4.58±.72 | 4.45±.81 | 1.89 | .06 |
AC TOTAL | 4.41±.53 | 4.28±.54 | 1.95 | .05 |
Actividade físico-desportiva Final | 1.96±.91 | 1.27±.88 | 9.29 | .00 |
Já o seguinte Quadro permite-nos comparar os valores médios do autoconceito em indivíduos que atingem as recomendações de actividade físico-desportiva e naqueles que não a atingem, dados obtidos de um teste t para amostras independentes.
Atinge M±DP | Não Atinge M±DP | t | p | |
---|---|---|---|---|
AC Língua Materna | 3.94±.90 | 3.86±.89 | -.89 | .38 |
AC Matemática | 3.43±1.40 | 3.38±1.37 | -.41 | .68 |
AC Escolar Geral | 4.37±.91 | 4.27±.90 | -1.02 | .31 |
AC Aparência Física | 4.35±1.05 | 4.02±1.05 | -2.84 | .01 |
AC Actividades Físicas/Desportivas | 5.00±.86 | 4.23±1.01 | -7.36 | .00 |
AC Relação com pares do mesmo sexo | 5.10±.77 | 4.96±.69 | -1.67 | .10 |
AC Relação com pares do sexo oposto | 4.92±.79 | 4.59±.77 | -3.99 | .00 |
AC Relação com os Pais | 4.81±.86 | 5.00±.84 | 2.14 | .03 |
AC Honestidade/Integridade | 3.80±.82 | 3.73±.75 | -.85 | .39 |
AC Estabilidade Emocional | 4.71±.73 | 4.94±.62 | 3.09 | .00 |
AC Geral | 4.60±.83 | 4.48±.77 | -1.45 | .15 |
AC TOTAL | 4.50±.62 | 4.30±.52 | -2.16 | .03 |
O Quadro 5 apresenta os valores relativos às comparações por nível de actividade físico-desportiva com os valores do autoconceito e de aproveitamento escolar. Os resultados demonstra não existir diferença estatisticamente significativa em duas variáveis: Língua materna (p = .47) e número de reprovações (p = .16).
Inactivos M±DP | Insuficientemente activos M±DP | Moderadamente activos M±DP | Muito activos M±DP | F | p | |
---|---|---|---|---|---|---|
AC Língua Materna | 3.79±.89 | 3.82±.92 | 3.93±.84 | 3.94±.90 | .84 | .47 |
AC Matemática | 2.70±1.33 | 3.45±1.33 | 3.56±1.36 | 3.43±1.40 | 6.95 | .001 |
AC Escolar Geral | 4.05±1.10 | 4.28±.88 | 4.36±.81 | 4.37±.91 | 2.42 | .07 |
AC Aparência Física | 3.81±1.26 | 3.96±1.09 | 4.19±.89 | 4.35±1.05 | 5.12 | .001 |
AC Actividades Físicas/ Desportivas | 3.40±1.08 | 4.14±.96 | 4.74±.72 | 5.00±1.03 | 61.50 | .001 |
AC Relação com pares do mesmo sexo | 4.90±.76 | 4.93±.68 | 5.03±.67 | 5.09±.77 | 1.82 | .14 |
AC Relação com pares do sexo oposto | 4.32±.97 | 4.57±.72 | 4.70±.73 | 4.92±.79 | 8.49 | .001 |
AC Relação com os Pais | 4.81±.96 | 5.04±.81 | 5.04±.80 | 4.81±.86 | 3.03 | .03 |
AC Honestidade/Integridade | 3.42±.82 | 3.69±.72 | 3.92±.70 | 3.80±.82 | 7.37 | .001 |
AC Estabilidade Emocional | 4.91±.67 | 4.97±.59 | 4.90±.63 | 4.71±.73 | 4.22 | .01 |
AC Geral | 4.23±.89 | 4.44±.77 | 4.63±.66 | 4.60±.83 | 5.44 | .001 |
AC TOTAL | 3.85±.48 | 4.34±.46 | 4.45±.51 | 4.50±.62 | 12.84 | .001 |
Número de reprovações | .32±.66 | .36±.65 | .31±.52 | .47±.71 | 1.74 | .16 |
Procedendo às correlações de Pearson entre as variáveis, podemos verificar o seguinte: o autoconceito total tem uma correlação positiva (r = .267; p < .01) com a actividade físico-desportiva, e uma correlação negativa (r = -.157; p < .05) com o aproveitamento escolar, ambos com efeitos estatísticos pequenos.
Dentro do autoconceito, os factores mais fortemente correlacionados com a actividade físico-desportiva foram a actividade física e desportiva (r = .496), relação com pares do sexo oposto (r = .229), aparência física (r = .183), geral (r = .148), honestidade/integridade (r =.137), relação com pares do mesmo sexo (r = .123), e negativamente, a estabilidade emocional (r = -.111), todos com p < .01. Também significativos a 0.05 existe a correlação referente ao autoconceito matemático (r = .099) e ao escolar geral (r = .083), as últimas duas sem relevância estatística, uma vez que o seu valore está abaixo de .1. Já os factores do autoconceito mais fortemente correlacionados com o aproveitamento escolar são, negativamente, escolar geral (r = - .298), língua materna (r = - .271), matemática (r = - .161), geral (r = - .123) e estabilidade emocional (r = -.120), todos de p < .01 e com efeitos pequenos.
O gráfico seguinte permite-nos de uma forma mais imediata verificar a oscilação existente entre o autoconceito e o nível de prática de actividade físico-desportiva e a oscilação do aproveitamento escolar (número de reprovações) em relação aos níveis de prática de actividade físico-desportiva.
A figura e evidencia que quanto maior for o nível de actividade física maior é o número de reprovações.
DISCUSSÃO
Existem alguns dados presentes no nosso estudo que merecem alguma nota crítica devido ao seu conteúdo. Em relação aos factores do autoconceito, é digno de nota ver que, para além de se associarem, frequentemente, os factores matemática e língua materna têm os valores mais baixos. Revendo, é talvez de salientar que estes são dois dos três factores cujo feedback aplicado aos adolescentes é maior: enquanto normalmente ninguém os avalia e/ ou fornece algo exterior para a compreensão da relação com os seus pais, quer na matemática quer na língua materna, periodicamente recepcionam um conjunto de valores que avaliam, ou pretendem avaliar, o seu rendimento e capacidades nessas áreas. Tal como sugerido por Serra (1988a, 1988b) o feedback que recebem resulta da observação que fazem das reacções que os outros têm quanto à forma como se relacionam com estas dimensões do autoconceito.
Em relação à prática de actividade físico-desportiva, os nossos dados reflectem a longa tendência do senso comum em colocar o rapaz numa zona exterior, ao ar livre, e a rapariga fechada, cuidada e protegida. Na verdade, os rapazes têm maiores níveis de actividade físico-desportiva do que as raparigas (♂:1.96±.91 vs ♀:1.27±.88).
Os resultados menos esperados surgem quando comparámos os níveis de prática de actividade físico-desportiva ao nível do autoconceito. Os indivíduos que atingem as recomendações obtêm menor autoconceito em factores como relação com os pais e estabilidade emocional. Uma das possíveis razões para este facto seria a de assim passarem menos tempo com os seus pais e por essa razão obterem um menor autoconceito. As exigências laborais a que os pais na sociedade contemporânea estão sujeitos leva-os a terem de manter os filhos ocupados em actividades até mais tarde. Uma consequência desta prática é menor tempo em que se envolvem em actividades familiares com os filhos.
Verificámos que existe uma tendência para que os valores do autoconceito progressivamente aumentem em relação ao nível de prática de actividade físico-desportiva sendo que o menor valor de autoconceito é referente ao nível inactivo, e o maior em indivíduos muito activos (gráfico I). No entanto foi inesperada a correlação negativa entre actividade físico-desportiva e estabilidade, mas que nos parece coerente com a eventual falta de tempo que passam com os pais para participarem intensamente em sessões de treino onde o convívio social necessário para o desenvolvimento re laços afectivos é de baixa densidade.
Verificando que, numa base regular, 83.3% dos adolescentes portugueses praticam actividade físico-desportiva, é de notar que são apenas 19.1% os que cumprem as recomendações, o que os leva a não aproveitar devidamente os benefícios da prática de actividade físico-desportiva (WHO, 2002).
Tal também se repercute no autoconceito negativamente, como a nossa revisão bibliográfica já apontava, na medida que os maiores valores de autoconceito se verificam em indivíduos mais activos (Brown & Harison, 1986; Irvini, 1984; Sonstroem, 1982; Sonstroem & Potts, 1996; cits. por Tomé e Valentini, 2006).
CONCLUSÃO
Em forma de conclusão podemos observar que, no que diz respeito ao autoconceito, os valores mais elevados situam-se ao nível da relação com pares do mesmo sexo; relação com pares do sexo oposto; relação com os pais; honestidade/integridade; estabilidade emocional e auto conceito geral. Quanto aos valores mais baixos prendem-se com o autoconceito na língua materna e na matemática.
Em relação às diferenças entre sexos em função do envolvimento em actividade físico-desportiva, verificámos que a nível geral são os rapazes que revelam maiores níveis de prática. Já nos níveis de autoconceito, a comparação dá de uma forma geral um maior valor no autocon-ceito em indivíduos do sexo masculino. Porém analisando os vários factores, verificámos que os indivíduos de sexo masculino possuem menor autoconceito em factores como a língua materna, o escolar geral, na relação com pares do mesmo sexo e estabilidade emocional face ao sexo oposto.
Verificámos que em quase todos os factores os indivíduos que atingem as recomendações de actividade físico-desportiva (ACSM/AHA, 2007; Strong et. al., 2005) têm maiores níveis de autoconceito, com excepção feita nos factores relação com os pais e estabilidade emocional.
Quanto ao autoconceito geral, verificámos uma tendência de aumento deste com um maior grau de envolvimento em prática de actividade físico-desportivas. Quando transitamos de indivíduos inactivos para indivíduos muito activos (podemos verificar que os valores de autoconceito nos factores língua materna, escolar geral, aparência física, actividades físico-desportivas, relação com pares do mesmo sexo e do sexo oposto, apresentam esta oscilação tal como o autoconceito total). Verificámos os valores mais altos no autoconceito são entre os indivíduos que são moderadamente activos, excepto na dimensão estabilidade emocional onde esse pico acontece entre os que são insuficientemente activos. Já em relação ao aproveitamento escolar verificámos que, apesar de se constatar alguma oscilação, os indivíduos muito activos têm uma maior taxa de reprovação que os restantes. Porém verifica-se da mesma forma que indivíduos quer inactivos quer, e particularmente, insuficientemente activos, têm maiores valores de aproveitamento escolar que indivíduos moderadamente activos.
Em relação às correlações efectuadas, verificou-se que a actividade físico-desportivas está correlacionado com o autoconceito na actividade físico-desportiva e relação com pares do sexo oposto (positivamente) e autoconceito na estabilidade emocional (negativamente). Já no aproveitamento escolar, os factores do autoconceito maior correlacionados são os da língua materna, matemática e escolar geral.