Introdução
Portugal tem vindo a registar profundas transformações demográficas, caracterizadas pelo aumento da longevidade e da população idosa, e pela redução da natalidade e da população jovem. Com a maior expectativa de vida, o “saber envelhecer bem” torna-se crucial para uma vida saudável e feliz. Mas para os idosos, envelhecer de forma saudável e feliz, não é linear, é mais do que ter saúde, e pressupõe também o bem-estar psicológico e as relações interpessoais (Mantovani et al., 2016).
O envelhecimento saudável é assim compreendido pelos idosos como o processo de equilíbrio da capacidade física, da função cognitiva, da felicidade, da autonomia, do estilo de vida e da dinâmica afetiva e social (Mantovani et al., 2016). E como a sexualidade faz parte das necessidades do ser humano, esta não pode ser esquecida ou considerada inexistente nos idosos. Atualmente é reconhecida como uma dimensão importante para a qualidade de vida, que pode estar diretamente relacionada com a satisfação com a vida e com a felicidade (Portella et al., 2017; Teixeira et al., 2012).
No entanto, a sexualidade dos idosos é um tema muitas vezes esquecido pelos profissionais de saúde e pela sociedade, geralmente pelos estereótipos que lhes estão associados. É fundamental compreender e aceitar que a expressão da sexualidade é inerente à personalidade da pessoa, é uma componente natural, positiva e fundamental para a qualidade de vida (Lobo & Cândido, 2017) e para a autoestima da pessoa idosa (Vieira et al., 2014). Torna‐se importante a implementação de estratégias para permitir o envelhecimento e uma sexualidade saudável (Vieira et al., 2014). Com base nestes aspetos, definimos como objetivo descrever as vivências afetivas e sexuais dos idosos de uma Unidade de Saúde Familiar (USF) do Norte do País, que acreditamos ser indispensável para novas reflexões por parte dos profissionais de saúde, para promover uma abordagem centrada nas suas necessidades, em vez de ter por base os modelos baseados na doença (OMS, 2015). Os profissionais de saúde devidamente sensibilizados para esta problemática, podem ser determinantes para a promoção do bem-estar e do envelhecimento saudável, permitindo a aceitação da sexualidade, enquanto necessidade humana básica.
Enquadramento/fundamentação teórica
A sexualidade está presente durante toda a vida do ser humano, e envolve momentos de intimidade e todas as formas de prazer, do desejo ao ato sexual, sem medo, vergonha, violência ou intimidação (Alencar et al., 2014). A vivência da sexualidade é subjetiva, e traduz‐se em pensamentos, fantasias, desejos, crenças, atitudes, valores e comportamentos. Os fatores biológicos, psicológicos, sociais, económicos, políticos, culturais, religiosos, espirituais, estilos de vida e experiências individuais, influenciam o modo como a sexualidade é vivenciada (Vieira et al., 2014). Mas o relacionamento sexual muda com o passar dos anos, e o padrão comum é a diminuição da frequência sexual, e a diminuição do desejo (Antunes et al., 2010). É um processo natural, decorrente de mudanças fisiológicas associadas ao envelhecimento, juntamente com os fatores psicossociais (Campos et al., 2017; Silva Jr. et al., 2009). Isto não significa que a sexualidade termina na velhice, ela passa a ser “mais sensual do que genital, e um olhar ou uma carícia pode valer mais do que muitas declarações de amor” (Santana, 2017, p.39). Sexualidade não deve ser reduzida ao ato sexual (Paulo, 2021), envolve muito mais, pressupõe amor, carinho (Silva Jr. et al., 2009).
As alterações decorrentes da idade têm consequências na sexualidade dos casais idosos, abrindo espaço para a manifestação de sentimentos de proximidade, afeto, e companheirismo, e maior obtenção de prazer através das carícias, masturbação e fantasias sexuais (Campos et al., 2017). Também como consequência das alterações fisiológicas, as mulheres atravessam nesta fase a menopausa, e sofrem alterações hormonais relacionadas com o défice de estrogénios que podem levar a algum desconforto ou dor durante o ato sexual (Teixeira et al., 2012). No homem, o processo de envelhecimento é diferente. Fisiologicamente há redução na produção de testosterona, mas de forma lenta e pouco evidente. Embora estas transformações não ocorram de forma uniforme entre todos os homens, caracterizam-se por ereção mais flácida, sendo necessário mais tempo para alcançar o orgasmo, diminuição das ereções involuntárias noturnas, ejaculação retardada e redução do líquido pré-ejaculatório. Qualquer sinal de impotência sexual provoca grande preocupação nos homens em geral, e de forma mais acentuada no idoso (Alencar et al., 2014; Silva Jr. et al., 2009; Teixeira et al., 2012).
Acontece também, um aumento da prevalência de disfunções sexuais devidas a causas médicas, psicológicas, e/ou como efeito secundário da medicação crónica. Nessa situação pode ser difícil diferenciar as mudanças normais relacionadas com a idade, dos sintomas devidos a alguma patologia (Silva Jr. et al., 2009). Mas as causas da disfunção sexual vão para além dos aspetos físicos. Os fatores psicológicos também devem ser considerados, pois podem estar relacionados com a aceitação da própria imagem corporal, e com a capacidade de adaptação às mudanças fisiológicas ou patológicas. Para isto contribui a sociedade moderna, para a qual a juventude é um modelo de beleza e saúde, e consequentemente o “ser velho” tem valor negativo, e geralmente associado à doença e invalidez (Vieira et al., 2016).
As mulheres idosas são as que geralmente reagem mais negativamente às alterações do aspeto físico, que pode funcionar como um entrave à vivência da sexualidade nesta fase da vida (Alencar et al., 2016). Dessa forma, entende-se que um fator extremamente relevante para um bom aproveitamento das vivências sexuais, consiste na autoestima do idoso, pois é necessário que, em primeiro lugar ele goste de si, e se aceite como realmente é.
Esta fase da vida coincide por norma com a mudança nas relações sociais, relacionadas com o fim da atividade profissional, e por isso com o distanciamento dos colegas de trabalho, e falta de atividades alternativas, que podem influenciar a sexualidade. A falta de uma educação sexual saudável, e o facto de este ser um tema tabu e amplamente reprimido pela família, igreja e sociedade, fazem deste um “não tema” no seio dos idosos. As mulheres são as mais afetadas por esta repressão, pois foi-lhes incutido durante a educação que a sexualidade tem como finalidade apenas a reprodução (Bessa et al., 2010). Muitos idosos também sofrem com o preconceito no seio familiar, porque frequentemente não lhes é reconhecido pela família o direito à sexualidade e de refazer a sua vida amorosa (Uchôa et al, 2016). Isto pode ser agravado quando o idoso reside com outros familiares, uma vez que o convívio com outras pessoas pode criar um ambiente repressivo no que diz respeito aos afetos (Bessa et al., 2010). Infelizmente, os estereótipos, tabus, mitos e preconceitos, baseados na ideia de que os idosos são “assexuados” (Santana, 2017; Uchôa et al., 2016; Vieira et al., 2014; Vieira et al., 2016), não são atraentes fisicamente, e não têm interesse por sexo, ainda são frequentes na sociedade. São premissas facilmente assumidas pelos próprios idosos como verdadeiras, que condicionam a expressão da sexualidade e inibem a aposta em novos relacionamentos amorosos (Santana, 2017; Vieira et al., 2014).
Apesar das mudanças que ocorrem na vida sexual durante o envelhecimento, a sexualidade deve ser compreendida como “experiência”, que integra várias dimensões e que se reveste de subjetividade nas formas de se expressar e vivenciar, não sendo um fenómeno estático e definitivo (Uchôa et al, 2016).
Metodologia
Trata-se de um estudo descritivo, exploratório, transversal, de natureza quantitativa, em que a variável de investigação é a vivência afetiva e sexual, e as variáveis de atributo são as sociodemográficas (idade, sexo, estado civil, escolaridade, agregado familiar, atividade profissional, religião e renda mensal).
A população do estudo foi definida tendo em conta os seguintes critérios de inclusão: utentes com idade superior ou igual a 65 anos e inscritos numa Unidade de Saúde Familiar (USF) do Norte do país, onde decorreu o estudo. Para a definição da amostra aplicaram-se os seguintes critérios de exclusão: utentes com algum tipo de défice cognitivo, avaliado através do Mini Mental State Examination (MMSE) adaptado para português por Guerreiro et al. (1994), e utentes que não estivessem a vivenciar, no momento de aplicação do formulário, uma relação afetiva e sexual. Trata-se de uma amostra não probabilista, por conveniência. A recolha de dados decorreu entre janeiro e março de 2020.
O formulário aplicado foi estruturado em duas partes. A primeira parte integrou as variáveis que permitem a caracterização sociodemográfica dos idosos, e a segunda parte foi constituída pela versão adaptada da Escala das Vivencias Afetivas e Sexuais dos Idosos (EVASI) de Vieira (2012), com adaptação semântica para o português europeu (Faria et al., 2021). A escala admite três dimensões que representam a medida de Vivências Afetivas e Sexuais do Idoso (EVASI) e que demonstraram assumir parâmetros estatísticos satisfatórios. Para as diferentes dimensões, apresentou os seguintes valores de Alfa de Cronbach: para a dimensão ato sexual foi de 0,96; para a dimensão relações afetivas foi de 0,96 e para a dimensão adversidades físicas e social foi de 0,71. Tem um total de 38 itens, cujas respostas são do tipo Likert, com scores de 1(nunca) a 5(sempre), cujos valores oscilam entre 1 e 5, sendo que quanto maior a pontuação, maior a satisfação com as vivências afetivas e sexuais dos idosos. A escala encontra-se subdividida em três dimensões: “Ato sexual” “Relações afetivas” e “Adversidades físicas e socias”. A afirmação 36 da dimensão “Ato sexual” e as afirmações 30, 32 e 37 da dimensão “Adversidades físicas e sexuais”, são questões com leitura inversa.
O tratamento de dados foi efetuado com recurso ao programa informático Statistical Package for the Social Sciences (SPSS®), versão 26.0 para Windows. Para a estatística descritiva, utilizaram-se medidas de tendência central (média) e de dispersão (desvio padrão).
Para o desenvolvimento deste estudo foi solicitada autorização à comissão de ética da ARS Norte (parecer nº38/2020), e também de autorização ao Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) e à USF onde foi desenvolvido o estudo. Nesta investigação foi respeitada previamente a liberdade dos indivíduos em querer ou não participar no estudo, através da assinatura do documento em duplicado de consentimento informado adaptado da ARS Norte.
Resultados
Caraterização sociodemográfica
No estudo participaram 62 idosos, na maioria do género masculino (53,2%), com idades iguais ou superiores a 65 anos (M=71,1; DP=5,78). A maioria dos participantes era casada (91,9%), e os restantes divorciados/separados. Quanto às habilitações literárias, verificou-se que 74,2% dos participantes frequentaram apenas o 1º ciclo, 14,5% o 2º ciclo, e 11,3% o ensino secundário. Nenhum participante era analfabeto ou frequentou o ensino superior.
No que concerne à duração da relação, verificou-se que 91,9% dos participantes mantinha uma relação superior a 11 anos (M=43,83; DP=13,38). Os agregados familiares eram compostos maioritariamente por 2 pessoas, o próprio idoso e o(a) companheiro(a), e apenas 3 idosos viviam sozinhos (M=2,38; DP=0,96). Relativamente à atividade profissional, 79% dos participantes não exercia nenhuma profissão, e os restantes ainda se encontravam ativos profissionalmente.
Dimensão “Ato sexual”
A afirmação 1, “Tenho uma atitude positiva relativamente à sexualidade na velhice”, foi a que apresentou resultado mais elevado (M=4.63, DP=0.63), com 71% da amostra a responder no score “Sempre”. A afirmação 5 “Eu e o(a) meu (minha) companheiro(a) temos relações sexuais”, obteve o valor mais baixo (M=2.69, DP=1.12), dado que 11,3% da amostra respondeu “Raramente”, e 22,6% respondeu “Nunca”.
No entanto, na afirmação 36 “Com o passar da idade considero que perdi o interesse pelo sexo” de 38,7% respondeu “Nunca”, 14,5% respondeu “Raramente” (M=3.52, DP=1.46), e na afirmação 26 “Sinto-me bem quando temos relações sexuais”, 56,5% dos participantes respondeu “Sempre”, e 24,1% respondeu “Nunca” (M= de 3.69, DP=1.71). Quanto à afirmação 20 “As vivências sexuais fazem-me sentir mais vivo(a)”, 61,3% da amostra situou a sua resposta no score “Sempre” (M=3.76, DP=1.7). Relativamente à afirmação 29, “Preciso da sexualidade para viver”, 32,2% da amostra mencionou “Sempre”, e quase metade da amostra, 46,8%, “Nunca” e “Raramente” (M=3.03, DP=1.62).
Outro aspeto relevante é a autoimagem dos idosos, tendo em conta o seu resultado positivo (M=4.13, DP=1.17) na afirmação 24 “Considero que continuo a ser uma pessoa bonita na velhice”, em que 56,5% respondeu no score “Sempre”. Na afirmação 35 “Eu e o(a) meu (minha) companheiro(a) costumamos namorar” obteve-se o resultado (M=3.21, DP=1.19), com a maioria das respostas, 33,9%, a concentrarem-se no score “Frequentemente”.
Dimensão “Relações afetivas”
Os resultados refletem valores de média superior a 4 em quase todas as afirmações que integram a dimensão “Relações afetivas”, sendo que a afirmação 7 “Eu e o meu (minha) companheiro(a) somos amigos” (M=4.82, DP=0.56), e a afirmação 27 “Sei que posso contar com o(a) meu (minha) companheiro(a)” (M=4.76, DP=0.78), obtiveram o resultado mais elevado, com 88,7% das respostas situadas no score “Sempre”.
A afirmação 3 “Eu e o(a) meu (minha) companheiro (a) temos momentos de intimidade”, foi a que obteve média mais baixa nesta dimensão (M=3.02, DP=1.14), sendo que 45,2% dos participantes respondeu “Às vezes”.
Dimensão “Adversidades físicas e sociais”
Na afirmação 30 “Sinto-me incomodado pelas mudanças na minha sexualidade, causadas pelo envelhecimento”, 30,6% das respostas situaram-se no score “Nunca”, e 27,4% no score “Raramente” (M= 2.5, DP=1.36). Quando questionados acerca do estado de saúde e a sua interferência na sexualidade, na afirmação 32, a resposta situou-se no score “Raramente” (M=2.85, DP=1.62), com 33,8% da amostra a expressar que o seu estado de saúde “Nunca” interfere nas suas vivências sexuais, e 24.2% a expressar o contrário- “Sempre”.
Relativamente à afirmação 37 “Sinto que existe preconceito e discriminação por parte da sociedade em relação à sexualidade na velhice”, as respostas situaram-se no score “Às vezes” (M=3.02, DP= 1.22). A maioria assumiu na afirmação 34 que “vive a própria sexualidade sem se importar o que os outros vão pensar” (M= 4.15, DP=1.23), sendo o valor mais elevado no score “Sempre”, com 59,7% das respostas.
Quanto à avaliação global das vivências afetivas e sexuais, observamos na Tabela 1, que a dimensão “Relações afetivas” apresentou resultados mais positivos (M=4.45; DP= 0.58), seguida da dimensão “Ato sexual” (M=3.59; DP=0.98), e por último, a dimensão “Adversidades físicas e sociais” (M=2.79; DP 1.29).
Discussão
Relativamente à Dimensão “Ato sexual”, os participantes consideram as suas vivências sexuais boas, importantes na velhice, melhorando a qualidade de vida e proporcionando bem-estar. Para estes idosos, a sexualidade não se resume ao ato sexual em si. Nota-se que, nesta fase da vida, atribuem menos importância à relação coital, e que esta é cada vez menos frequente nas vivências da sexualidade. Este resultado vai ao encontro do estudo de Cambão et al. (2019), ao concluírem que a importância atribuída à vida sexual diminuiu com o avançar da idade, sendo que “os idosos com vida sexual ativa têm uma média de idades (72 anos) inferior aos que não têm vida sexual ativa (75 anos)” (p.16).
No entanto, os participantes confirmam que existe desejo e se sentem bem quando têm relações sexuais. Estes dados são corroborados pelo estudo de Rozendo e Alves (2015), que concluiu que 69% da amostra mantinha desejo sexual, e 75% afirmava ter necessidade em manter relações sexuais. Relativamente ao desejo na relação, também Antunes et al. (2010), referiram que este não tem necessariamente de acabar, até porque é uma fase da vida em que os filhos já são adultos, e a maioria das dificuldades já foram superadas, o que pode facilitar o desejo e o impulso sexual.
Relativamente à afirmação 29 “Preciso da sexualidade para viver”, este resultado mostra que apesar da importância que os idosos atribuíram a outras afirmações nesta dimensão, estes não vêm a sexualidade como uma prioridade ou condição obrigatória para continuar a viver. Também Santos et al. (2020), confirmam a relatividade da sexualidade, perante tantas dificuldades vivenciadas no processo de envelhecimento.
Na Dimensão “Relações afetivas” a literatura é unânime ao considerar que a sexualidade no idoso é muito mais do que o ato sexual, mas sim maioritariamente estabelecida por relações de afeto (Alencar et al., 2014; Alencar et al., 2016; Antunes et al., 2010; Bessa et al., 2010; Cavalcante et al., 2019; Lobo & Cândido, 2017). Para Bessa et al. (2010) “na velhice faz-se amor com valores e desejos” (p.23), e para Antunes et al. (2010) “não se deixa de amar, mas reinventam-se formas amorosas” (p.136).
O resultado relativo à afirmação “Eu e o(a) meu (minha) companheiro (a) temos momentos de intimidade”, demonstra que quando se aborda a sexualidade, os idosos tendem a associar a momentos que implicam proximidade e confiança. A comprovar este resultado, Alencar et al. (2014) referem que “o significado da sexualidade se reduz na sua maioria ao órgão genital e ao coito” (p.3538), sendo necessário saber separar a genitalidade da sexualidade. Num outro estudo realizado por Alencar et al. (2016), com 235 idosos, verificou-se que a conceção dos idosos sobre a sexualidade ainda se encontra vinculada à genitalidade, e apenas 20,4% referiu que a sexualidade envolve muito mais do que sexo.
Os resultados obtidos na Dimensão “Adversidades físicas e sociais” também se verificaram no estudo de Vieira (2012), onde a autora refere que “as mudanças fisiológicas normais que acompanham o processo de envelhecimento humano, podem ter pouca ou nenhuma interferência na sexualidade das pessoas idosas” (p.63). Contrariando estes resultados, Antunes et al. (2010) referem que o avançar da idade pode prejudicar a eficiência, ou ainda provocar uma dificuldade de desempenho, tanto para o homem como para a mulher. Também no estudo de Alencar et al. (2016), as mulheres apontaram a secura vaginal e a diminuição do desejo sexual, enquanto os homens mencionaram a dificuldade na ereção, como os principais problemas fisiológicos que interferem na sexualidade. Para Bessa et al. (2010), muitos fatores alheios à idade podem interferir negativamente na sexualidade, e uma das dificuldades mencionadas pelos idosos, estava relacionada com as patologias de origem física.
Relativamente à afirmação “Sinto que existe preconceito e discriminação por parte da sociedade em relação à sexualidade na velhice”, o resultado demonstra que os participantes sentem discriminação e preconceito quando se aborda o tema da sexualidade para a população idosa. Este resultado também é corroborado por vários autores (Cavalcante et al., 2019; Vieira, 2012; Vieira et al., 2016; Lobo & Cândido, 2017; Vieira et al., 2014). A educação sexual é um fator importante no comportamento sexual, determinando a maneira como será vivenciada ao longo da vida. Face à média de idade dos participantes, podemos deduzir que estes provavelmente tiveram uma educação sexual e familiar repressiva, baseada no conceito de uma sexualidade com o objetivo da procriação. Lobo e Cândido (2017) confirmam que há uma “dessexualização” do idoso na visão da sociedade, assim como a perceção de que “a sexualidade é vivida com o sexo associado ao casamento, havendo pouca aceitação do idoso como um ser que tem plena capacidade e direito de viver a sua sexualidade de várias formas” (p.594), e devido a esta pressão cultural, muitos idosos que ainda possuem desejo sexual, sentem algumas vezes, sentimentos de culpa e de vergonha.
Conclusão
Em resumo, as relações afetivas assumem maior importância na conjugalidade dos idosos, e os valores como o amor, companheirismo, cumplicidade, carinho e amizade, são aqueles que nutrem e mantêm estas relações. Apresentam uma atitude positiva em relação à sexualidade, e as vivências sexuais são importantes para a autoestima e qualidade de vida.
O ato sexual em si é cada vez menos frequente nas vivências da sexualidade dos idosos, e que é normal haver perda de interesse pelo sexo com o avançar da idade. Apesar disso, reconhecem que as relações sexuais melhoram a relação do casal, aumentam o sentimento de bem-estar, e de reciprocidade no desejo sexual. As diversas formas de sexualidade, como o namoro, os beijos, e as carícias, estão presentes nos casais idosos, e assumem um papel importante nas suas relações afetivas. Aceitam as mudanças causadas pelo envelhecimento, e apresentam uma autoimagem positiva em relação ao aspeto físico atual. Apesar de sentirem que existe discriminação e preconceito quando se aborda o tema da sexualidade na população idosa, os idosos vivem a própria sexualidade relativizando a opinião dos outros.
Confirmou-se a importância das vivências afetivas e sexuais dos idosos, contribuindo para a desmistificação da sexualidade na população idosa. O desenvolvimento do presente estudo possibilitou uma melhor compreensão do processo de envelhecimento, habitualmente, caraterizado como um período de declínio e perdas. É importante que a sociedade perceba as qualidades e potencialidades desta fase do ciclo vital, reconheça que a sexualidade na velhice é possível, e promotora de prazer e bem-estar. A investigação sobre os fatores que interferem na vivência da sexualidade dos idosos, sem os estigmas comuns nesta faixa etária, deve ser debatida no campo científico e nos espaços sociais, tendo como mentores do processo educativo os profissionais de saúde, nomeadamente os Enfermeiros especialistas em Enfermagem de Saúde Comunitária na área da Enfermagem de Saúde Familiar.
As limitações desta investigação estiveram maioritariamente relacionadas com a escassez de estudos e de instrumentos de avaliação direcionados para a sexualidade nesta fase da vida, e com a necessidade de aplicação do Mini Mental State Examination. De qualquer forma, consideramos a fase da recolha de dados muito gratificante, e percebemos, como enfermeiros, que se não abordarmos o tema da sexualidade com a pessoa idosa, não é fácil que ela tome iniciativa para partilhar a sua experiência e preocupações. Neste sentido, os profissionais de saúde devem proporcionar espaços e tempo de escuta ativa, de abertura e respeito, desvinculando-se de juízos de valor ou de estereótipos sociais.
Esperamos que este estudo seja uma mais-valia para a Enfermagem de Família, principalmente pela visibilidade positiva que foi dada ao envelhecimento, e ao tema das vivenças afetivas e sexuais nos casais idosos, e que estes resultados possam contribuir para a reflexão sobre a temática e promover o desenvolvimento de pesquisas futuras.