Introdução
O envelhecimento demográfico e o número crescente de patologias crónicas geram o aumento de pessoas com incapacidades funcionais e cognitivas, o que constitui um desafio para os cuidadores de familiares dependentes (Koopman et al., 2020).
Estima-se que em 2030 haja na União Europeia 21,5 milhões de cuidadores informais com mais de 25 anos a prestar cuidados pelo menos 20 horas semanais e 10,9 milhões pelo menos 35 horas semanais (Teixeira et al., 2016).
Esta problemática tem ganho relevância entre os órgãos políticos, sociais e da investigação (Teixeira, 2015). O cuidador informal tem, assim, assumido uma crescente importância nos cuidados de saúde. Atualmente, a qualidade na prestação de cuidados inclui a necessidade de integrar o cuidador informal enquanto decisor, vinculando uma filosofia de cuidados centrada na pessoa doente e no cuidador informal, ambos a experienciar transições que podem ser facilitadas pela ação do enfermeiro (Marques, 2015; Teixeira, 2015). No entanto, um estudo recente retrata que o cuidador informal é, muitas vezes, visto como um recurso para possibilitar a “alta” da pessoa internada e não como um alvo da própria intervenção individualizada do enfermeiro (Nunes et al., 2022).
Apesar do reconhecimento deste fenómeno de evitamento por parte dos enfermeiros à capacitação do cuidador informal, priorizando-se tarefas mais práticas e centradas na pessoa dependente (Nunes et al., 2022; Vidinha et al., 2024), torna-se essencial uma continuidade e sistematização na ação da capacitação do cuidador, para que este se sinta apto a prestar cuidados de maior ou menor complexidade à pessoa cuidada. O enfermeiro deve, assim, providenciar ferramentas ao cuidador, treiná-lo e prescrever intervenções que garantam o exercício do seu papel.
Considerando que a capacitação do cuidador informal exige um acompanhamento de máxima disponibilidade, proximidade e trabalho sistemático do enfermeiro, este estudo teve como principal objetivo identificar estratégias facilitadoras da promoção da capacitação do papel do cuidador informal.
Enquadramento/fundamentação teórica
Os programas de educação para cuidadores devem ser uma prioridade nas políticas de saúde. É essencial que essas iniciativas integrem estratégias direcionadas à capacitação dos cuidadores, promovidas ativamente pelos enfermeiros. Nas respostas do sistema de saúde português persistem, contudo, carências nas soluções a adotar pelas instituições de saúde e no apoio social aos familiares cuidadores. As políticas mantêm-se demasiado centradas no doente, colocando o familiar cuidador e as suas necessidades em segundo plano. É reconhecida também uma lacuna ao nível das intervenções passíveis de pôr em prática pelos enfermeiros (Marques, 2015), conforme demonstrado em investigações conduzidas em contexto hospitalar que reconhecem evitamento do processo de capacitação do cuidador informal na preparação do regresso a casa (Vidinha et al., 2024). Num estudo realizado por França et al. (2023), que incluiu a criação e implementação de um Modelo de acompanhamento aos familiares cuidadores, identificou-se a necessidade de um maior investimento por parte dos profissionais e das instituições no processo de capacitação do cuidador informal.
No estudo de Nunes et al. (2022), é evidente a complexidade do processo de capacitação e a importância do enfermeiro em oferecer ao cuidador oportunidades para adquirir conhecimentos que o tornem mais competente, autónomo e confiante. Cuidadores que foram mais envolvidos no planeamento da alta hospitalar relataram melhor saúde e maior aceitação do seu papel (Bull et al., 2000).
Marques (2015) procurou compreender se os ensinos realizados pelos enfermeiros aquando do internamento da pessoa com AVC contribuíram para a capacitação do cuidador na perspetiva dos cuidadores informais. Verificou-se que aquilo que os enfermeiros percecionam como válido não corresponde à perspetiva evidenciada pelos cuidadores informais, pois estes são da opinião que as suas necessidades, capacidades, experiências prévias e motivação não são consideradas; os ensinos envolviam, sobretudo, os cuidados instrumentais; a metodologia delineada para a realização dos ensinos parecia variar consoante o enfermeiro e não de acordo com as capacidades dos cuidadores; a compreensão e disponibilidade dos enfermeiros descritas pelos cuidadores foram ao encontro das competências fundamentais para o processo ensino-aprendizagem, porém, a existência de atitudes contrárias, como pressa e desinteresse, também foi referida por alguns cuidadores; e estes percecionaram os ensinos como muito importantes, mas insuficientes.
Hui et al. (2022) exploraram os fatores de stresse e as estratégias de coping de cuidadores de pessoas com demência, concluindo que os profissionais de saúde devem reconhecer esses fatores e considerar as necessidades socioculturais individuais dos cuidadores para proteger o seu bem-estar psicossocial. A abordagem utilizada na capacitação dos cuidadores deve considerar as suas necessidades específicas, ajudando-os nas dificuldades e alcançando uma compreensão sobre as estratégias que utilizam (Chen et al., 2023).
Dado o contexto complexo dos sistemas de saúde, onde múltiplos fatores influenciam a qualidade dos cuidados prestados (Albsoul et al., 2021), é essencial estudar essa complexidade e reconhecer estratégias que facilitem a capacitação dos cuidadores. Isso requer uma intervenção de enfermagem adaptativa e holística, capaz de abordar os desafios dos cuidadores e profissionais de saúde, promovendo soluções dinâmicas, contextualizadas e sustentáveis, contribuindo assim para um processo de capacitação do cuidador mais eficiente.
Neste contexto, este estudo visa identificar estratégias que possam responder a estas necessidades, oferecendo soluções fundamentadas que contribuam para a melhoria da capacitação de cuidadores no sistema de saúde português.
Metodologia
Por forma a responder à questão de investigação: Quais as estratégias facilitadoras da promoção da capacitação do papel do cuidador informal?, foi desenvolvido um estudo exploratório, com abordagem qualitativa, num hospital central da região centro de Portugal.
Todos os pressupostos éticos inerentes ao estudo foram cumpridos, tendo sido obtido o parecer favorável de uma Comissão de Ética (OBS.SF.116/2022).
Os participantes selecionados foram enfermeiros especialistas, peritos na área dos sistemas de informação e documentação em enfermagem e da prática clínica, por se entender que estes poderiam ter uma visão crítica e abrangente do fenómeno em estudo. A saturação dos dados foi obtida com uma amostra de 9 enfermeiros.
Foram realizadas entrevistas exploratórias, com apoio num guião semiestruturado construído pelos investigadores. As entrevistas foram realizadas com gravação em áudio por dois investigadores, após consentimento informado escrito dos participantes, com posterior transcrição em verbatim. Os áudios foram destruídos após conclusão da transcrição.
Os dados foram analisados através do método de questionamento e comparação sistemática com recurso ao software NVivo 10®. Inicialmente, foi realizada a codificação, atribuindo códigos preliminares aos segmentos de texto relevantes. Posteriormente, as categorias foram refinadas, emergindo subcategorias a partir da análise comparativa. A triangulação foi utilizada para validar as categorias e garantir a consistência dos achados.
Resultados
Deste estudo exploratório emergiram sete categorias relativas às estratégias a utilizar pelos enfermeiros para promover a capacitação do papel do cuidador informal. Essas categorias e respetivas subcategorias são apresentadas na tabela 1.
Tabela 1 Síntese das estratégias a utilizar pelos enfermeiros para promover a capacitação do papel do cuidador informal
| CATEGORIAS | SUBCATEGORIAS |
| Sistematização do processo de capacitação do cuidador informal | Método para identificação do cuidador informal Avaliação familiar da pessoa dependente Planeamento do regresso ao domicílio Inclusão da temática na passagem de turno Operacionalização do processo de capacitar o cuidador informal Identificação de ganhos e motivação do enfermeiro |
| Método de organização dos cuidados de enfermagem por enfermeiro de referência | Identificação e avaliação das necessidades do cuidador informal Responsabilização sobre a preparação da alta Valorização e preparação atempada da alta Relação enfermeiro-utente/cuidador informal mais próxima Garantia da continuidade dos cuidados |
| Formação sobre o papel do cuidador informal | Baseada em evidências científicas Testemunhos de cuidadores informais |
| Aquisição de competências comunicacionais para a complexidade | |
| Necessidade de assessoria do enfermeiro especialista ao enfermeiro generalista | |
| Importância das lideranças nos processos | Liderança e empoderamento do enfermeiro Lideranças promotoras do processo Liderança e alocação de recursos |
| Articulação com as equipas dos Cuidados de Saúde Primários |
Da categoria sistematização do processo de capacitação do prestador emergiram seis subcategorias: método para identificação do cuidador informal; avaliação familiar da pessoa dependente; planeamento do regresso ao domicílio; inclusão da temática na passagem de turno; operacionalização do processo de capacitar o cuidador informal; e identificação de ganhos e motivação do enfermeiro.
Os participantes consideram que o processo de capacitação do prestador deve ser planeado e integrar o plano de trabalho do enfermeiro, e não deve ser contextual e depender do acaso: “tem que haver um plano bem elaborado, bem definido, em que as metodologias de organização, o método melhor dizendo, contemple este momento” (E1); “e ser equacionado corretamente para o plano de trabalho, como qualquer outro tempo de prestação, que é para não fugir disto” (E4).
Nesse sentido, considera-se fundamental o uso de um método para a identificação da pessoa que assumirá o papel do prestador, de modo a agilizar todo o processo: “definir uma metodologia de identificação (do prestador) e como se identifica” (E1).
Após a identificação do cuidador informal, é importante avaliar as suas condições para a assunção desse papel e compreender aprofundadamente todo o processo familiar. Frequentemente, o enfermeiro tem de lidar com dificuldades partilhadas pelo familiar. Este aspeto deve ser trabalhado para facilitar o seu envolvimento: “começar a preparar é pelo menos conhecer mais profundo que só a estrutura interna. É saber como é que aquela família se organiza” (E3).
“Acho que o pressuposto inicial é o explorar se a pessoa quer ser e se há um papel assumido ou não, ou se quer assumi-lo, e depois, se for assumido, em quê, e o que é que a pessoa necessita, e se é o momento exato para assumir esse papel e em que áreas” (E4).
O processo de capacitação do prestador deverá ocorrer ao longo do internamento de forma atempada e precoce, evitando que aconteça próximo do momento da alta, pelo que se torna fulcral a definição de horizontes temporais.
“Do ponto de vista metodológico, encontrar-se aqui um conjunto de possibilidades (…) que se criassem mínimos de horizontes temporais, onde de facto se objetivasse (…) a transição do regresso ao domicílio, para que de facto haja uma intervenção o mais precoce possível” (E1).
Outra estratégia identificada pelos entrevistados passa pela abordagem do processo no momento da transição de cuidados, o que permite a partilha de dificuldades em equipa e a sinalização de situações a resolver a curto prazo: “Porque a preparação do regresso a casa não está na ordem do dia (…) deveria ser um item obrigatório na passagem de turno” (E9).
Por forma a operacionalizar a capacitação do cuidador informal, os participantes afirmam a importância da criação de momentos formais e específicos para o efeito, de maneira a consolidar a consciencialização da família e prepará-la para o momento de transição após a alta.
“Temos de criar condições com momentos formais, para de facto capacitar essa pessoa. Por isso, é que falo aqui de organização de cuidados e do papel individual (…) enfermeiros marcam entrevistas, telefonam a essas pessoas (…) para certificar que de facto existem condições para a pessoa assumir esse papel ou não” (E1).
De acordo com os entrevistados, a sistematização de todo o processo de capacitação tornar-se-ia mais facilitada se os enfermeiros envolvidos vissem identificados pelas instituições os ganhos obtidos decorrentes do seu desempenho no processo, contribuindo para uma maior motivação profissional: “uma sistematização destas áreas também seria importante, se sistematizássemos corretamente as áreas de ensino, as áreas a adquirir, e houvesse ganhos bem avaliados, o próprio profissional sentiria uma maior valorização do seu desempenho” (E5).
A categoria método de organização dos cuidados de enfermagem por enfermeiro de referência subdividiu-se em cinco subcategorias: identificação e avaliação das necessidades do cuidador informal; responsabilização sobre a preparação da alta; valorização e preparação atempada da alta; relação enfermeiro-utente/cuidador informal mais próxima; e garantia da continuidade dos cuidados.
De um modo geral, os enfermeiros entrevistados consideram o método de organização dos cuidados de enfermagem por enfermeiro de referência o mais adequado a todos os níveis, designadamente na preparação do cuidador informal, pois permite uma maior proximidade enfermeiro-família facilitando uma certa vinculação e relação de confiança.
“Precisamos de um método de organização de cuidados diferente, que me permita saber que aquela família me tem a mim, e eu sou responsável pela preparação deste prestador, e alguma vinculação do prestador também (…) ter pessoas de referência, que é um dos critérios de um bom indicador de uma transição saudável, os prestadores sentirem-se ligados a profissionais de saúde” (E3).
São várias as vantagens identificadas e atribuídas ao método do enfermeiro de referência. Por um lado, permite uma melhor identificação do prestador e das suas necessidades: “mudança de metodologia nos cuidados ou mudar para o enfermeiro de referência, em que nós conseguimos identificar logo o cuidador informal e conseguimos ter uma visão diferente” (E6); e “nós conseguimos, logo no primeiro contacto que temos com o prestador, identificar quais são as necessidades” (E6).
Por outro lado, e como referido atrás, proporciona uma melhor relação entre o enfermeiro e a família, responsabilizando-o de certo modo: “a relação também é melhor (…) por vezes, quando nós não tínhamos o enfermeiro de referência, hoje estava um, amanhã falava outro, quando era preciso fazer os ensinos já era outro, amanhã outro e não havia uma pessoa de referência para o cuidador informal abordar (…) Antigamente, nós, se calhar, deixávamos andar… ninguém era realmente responsabilizado por identificar aquele cuidador informal e agora há essa preocupação” (E6).
Para além disso, os entrevistados consideram que a metodologia pode proporcionar uma preparação mais atempada e, portanto, prévia aos momentos que antecedem a alta do doente, tal como contribuir para a continuidade dos cuidados no domicílio. “E se calhar consegue-se uma melhor preparação mais atempadamente” (E6); e “identificar realmente quem é que vai dar continuidade aos cuidados daquela pessoa” (E6).
Um outro benefício atribuído a este método de organização dos cuidados de enfermagem prende-se com uma maior valorização do momento da alta e com a necessidade de o preparar da melhor forma.
“Eu penso que não há demora … sei lá, às vezes podemos deixar andar um dia ou dois, mas depois nós temos que capacitar aquele cuidador informal para o doente poder ir para casa” (E6).
Na categoria formação sobre papel do prestador foram identificadas duas subcategorias: trazer resultados de investigação e trazer testemunhos de prestadores.
Os enfermeiros entrevistados consideram que deveria existir uma formação mais adequada e direcionada à capacitação do papel de cuidador informal. Essa formação deverá ser consubstanciada no aprofundamento do conhecimento teórico de conceção de cuidados e numa constante renovação: “Isto deve ser uma área de formação profissional, e de constante renovação, não se lê uma vez e está adquirido, porque as famílias estão em constante mutação” (E4).
Como estratégias sugeridas para operacionalizar essa formação profissional, emergiram o uso dos resultados da investigação e a inclusão de testemunhos de prestadores para aproximar o momento da realidade: “uma das questões pode passar por aí, pela análise desses trabalhos e discutir esses trabalhos, por exemplo em sessões de formação” (E9); e “trazer o testemunho de alguém que tenha feito um percurso de cuidador informal” (E9).
Os participantes referiram também a importância dos enfermeiros demonstrarem competências comunicacionais para a complexidade, de modo a conseguir caracterizar e compreender os vários processos familiares, aproximando-se assim das diferentes dinâmicas apresentadas pelas famílias: “precisamos de enfermeiros com mais capacidades de comunicação e mais confortáveis em estar próximo dos familiares” (E3).
Um outro aspeto apresentado como estratégia a ser utilizada pelos enfermeiros neste processo de capacitação do prestador foi a relevância da assessoria do enfermeiro especialista ao enfermeiro generalista, colocando no processo as suas competências específicas com maior entendimento dos processos familiares e maior sensibilização para as áreas da formação e investigação.
“A intervenção do especialista e do enfermeiro de cuidados gerais é e deve ser determinante. E deve ser o enfermeiro especialista que deve tomar a dianteira ao nível daquilo que são os aspetos de congregação de um comportamento da equipa para levar a um fim” (E1).
Da categoria importância das lideranças no processo emergiram três subcategorias: liderança e empoderamento do enfermeiro, lideranças promotoras do processo e liderança e alocação de recursos.
Decorrente da análise de conteúdo efetuada, fica claro o importante papel que os líderes devem ter junto das suas equipas de modo a prepará-las para uma tomada de decisão sólida e fundamentada ao longo do processo de capacitação do prestador, com uma atitude ativa e proativa na disponibilização de recursos necessários ao processo, nomeadamente humanos: “tem que haver da parte de quem é responsável pela gestão operacional, para que traga um poder aos enfermeiros, para que eles se sintam confortáveis na tomada de decisão” (E1); “precisamos de ter lideranças que questionem e que ajudem os seus enfermeiros também a preparar os regressos a casa destes doentes” (E3); e “tem que ser incutido em termos de gestão, nas áreas superiores, que isto é uma necessidade e que é algo que precisa de tempo, que tem que ter profissionais suficientes” (E4).
Por último, foi vincada a necessidade de articulação com as equipas dos cuidados de saúde primários, no sentido de poderem acompanhar todo o processo de transição para o domicílio e sua monitorização, também com a possibilidade de análise e discussão de aspetos com as equipas hospitalares: “uma melhor articulação com os Cuidados de Saúde Primários” (E3).
Discussão
A análise dos resultados destaca a necessidade de uma maior sistematização do processo de capacitação do cuidador informal, especialmente no âmbito das intervenções realizadas por enfermeiros. A definição de um planeamento estruturado é crucial para assegurar que os cuidadores informais recebam a formação e o apoio necessários ao longo do internamento e na preparação para o regresso ao domicílio. Estudos sugerem que uma sistematização do processo de capacitação melhora significativamente os resultados de saúde das pessoas e reduz a sobrecarga e o stress dos cuidadores informais, nomeadamente através da implementação de modelos ou programas (Andrade, 2014).
Essa abordagem está alinhada com a necessidade de se considerar a complexidade dos sistemas de saúde, onde múltiplos fatores influenciam diretamente a qualidade dos cuidados prestados (Albsoul et al., 2021). Reconhecer essa complexidade e adotar estratégias adaptativas e holísticas são essenciais para uma intervenção eficaz. A criação de modelos e programas podem facilitar esse processo, advogando, por exemplo, a identificação precoce do cuidador informal e respetiva avaliação das suas condições para compreender e assumir esse papel (Dixe et al., 2020). A preparação precoce do regresso ao domicílio, com a definição de horizontes temporais, e a inclusão dessa temática nas passagens de turno são práticas recomendadas.
Por exemplo, Dixe et al. (2020) desenvolveram o "Modelo de Capacitação do Cuidador Informal para Cuidar da Pessoa com Dependência" enquanto modelo educativo para cuidadores informais que assistem pessoas dependentes. Enfatiza a importância de fornecer recursos, educação e suporte contínuo aos cuidadores, considerando as suas necessidades específicas, habilidades e contexto. O objetivo é melhorar a qualidade dos cuidados prestados e o bem-estar do cuidador e da pessoa cuidada, com estratégias que incluem intervenções educativas personalizadas e a criação de um ambiente de suporte colaborativo entre profissionais de saúde e cuidadores.
É necessário formalizar encontros para conhecer, envolver e operacionalizar a capacitação do cuidador informal, através de contactos telefónicos, entrevistas e oportunidades de participação ativa nos cuidados (Bull et al., 2000). Além disso, a identificação de ganhos, com indicadores da qualidade nestas áreas, favorecerá a própria motivação dos enfermeiros (Vidinha et al., 2024).
O método de enfermeiro de referência foi sugerido como estratégia de organização de cuidados que permite uma identificação mais precisa do cuidador informal, o fortalecimento e proximidade da relação entre enfermeiro e família e uma preparação mais atempada e contínua do cuidador informal. Este método é também referido na literatura como facilitador de uma transição mais suave e eficaz, valorizando o momento da alta e promovendo a continuidade dos cuidados no domicílio (Chen et al., 2023; Parreira et al., 2021). Facilita uma abordagem mais humanizada e menos centrada no modelo biomédico, essencial para a capacitação integral dos cuidadores (Parreira et al., 2021). Os autores salvaguardam, porém, que este método depende fortemente das qualificações dos enfermeiros, podendo causar maior envolvimento emocional e stress, requerendo ainda mais recursos humanos.
Decorrente da análise comparativa com outros métodos de organização dos cuidados, este é considerado o mais completo em termos de planeamento, autonomia, responsabilização e continuidade de cuidados, promovendo uma elevada qualidade de cuidados e satisfação, quer da pessoa quer da sua família/cuidador informal (Parreira et al., 2021).
Deste estudo também emerge a importância do aprofundamento contínuo do conhecimento teórico e a atualização constante dos enfermeiros para a conceção e prestação de cuidados de qualidade, enfatizada nas normas da Ordem dos Enfermeiros (OE) e nos Padrões da Qualidade dos Cuidados de Enfermagem (OE, 2001, 2015). Estudos como os de Meleis e Dean (2012) e Albsoul et al. (2021) reforçam a necessidade de uma base teórica sólida para a prática de enfermagem, especialmente em contextos complexos. A integração de resultados de investigação e exemplos práticos, como testemunhos de cuidadores, pode enriquecer a formação e a prática profissional, mantendo os enfermeiros atualizados e capazes de aplicar os conhecimentos mais recentes na prática clínica (Teixeira et al., 2016).
O aperfeiçoamento das competências comunicacionais dos enfermeiros é também considerado uma estratégia basilar para a promoção da capacitação do papel do cuidador informal. A comunicação eficaz é frequentemente destacada como uma competência crítica, nomeadamente em contextos complexos (Albsoul et al., 2021), e como uma componente central do processo de enfermagem, impactando diretamente no processo de capacitação dos cuidadores. Estudos e regulamentos advogam a necessidade de formação em comunicação para enfermeiros, sendo fundamental à melhoria da segurança e qualidade dos cuidados prestados, bem como à satisfação de todos os intervenientes nos cuidados (Albsoul et al., 2021; Direção-Geral da Saúde [DGS], 2017; OE, 2015).
A ação do enfermeiro especialista é reconhecida como essencial na assessoria aos enfermeiros generalistas. A especialização pode promover um maior entendimento dos processos familiares e uma maior sensibilização para áreas críticas como a formação e investigação, garantindo uma abordagem mais holística e fundamentada.
A especialização dos enfermeiros tem mostrado benefícios claros na capacitação dos cuidadores. Estudos demonstram que a educação e o suporte adequados, liderados por enfermeiros especialistas, podem melhorar significativamente a saúde física e mental dos cuidadores, bem como reduzir a sobrecarga e o stress associados aos cuidados (Tziaka et al., 2024).
Líderes proativos e empoderados podem, por sua vez, promover um ambiente de trabalho onde os enfermeiros se sintam confortáveis e apoiados na tomada de decisão clínica, garantindo a disponibilização de recursos humanos e materiais necessários para uma capacitação eficaz do cuidador informal. O estudo de Cho et al. (2020) verificou que líderes de enfermagem proativos e que alocam adequadamente os recursos contribuem para uma melhor qualidade dos cuidados e menor incidência de cuidados omissos. Além disso, a liderança forte é associada a uma maior satisfação dos enfermeiros, o que indiretamente beneficia os cuidadores (Koopman et al., 2020).
A articulação com as equipas de Cuidados de Saúde Primários é vital para a continuidade e monitorização dos cuidados após a alta hospitalar. Políticas integradas e uma colaboração eficaz entre as unidades de saúde podem assegurar que os cuidadores informais recebam suporte contínuo e coordenado, facilitando uma transição segura e eficiente para o domicílio. Estudos mostram que uma colaboração estreita entre diferentes níveis de cuidados resulta numa melhor continuidade e coordenação dos cuidados, melhorando os resultados para as pessoas doentes e a redução de sobrecarga dos cuidadores informais (Nunes et al., 2022). É necessário assumir políticas e orientações que favorecem esta visão integrativa para assegurar uma transição eficiente e segura das pessoas hospitalizadas para o domicílio (DGS, 2017).
Conclusão
Este estudo identificou várias estratégias facilitadoras da promoção da capacitação do papel do cuidador informal, destacando a importância da sistematização e do planeamento estruturado e antecipado deste processo. A organização dos cuidados de enfermagem através do método de enfermeiro de referência e a formação contínua são cruciais para garantir transições seguras e eficientes. A comunicação eficaz, a liderança proativa e a articulação com as equipas de cuidados de saúde primários são fundamentais para assegurar a continuidade e a qualidade dos cuidados, melhorando os resultados de saúde, quer da pessoa dependente quer do seu cuidador. A implementação destas estratégias informadas pelas evidências científicas contribui para uma transição mais saudável, promovendo a satisfação e o bem-estar das pessoas cuidadas.
Os resultados deste estudo sublinham a necessidade de desenvolver e implementar programas estruturados de capacitação para cuidadores informais, que possam ser integrados na prática clínica diária de enfermagem.
Reconhecemos que as estratégias para a capacitação do cuidador informal não se esgotam no estudo que apresentamos, estando conscientes de que existirão outras que não emergiram nos nossos dados. Entendemos necessário realizar investigações mais abrangentes para melhor compreender a dimensão do fenómeno da capacitação dos cuidadores informais a nível institucional. Futuras pesquisas devem incluir amostras maiores e mais diversificadas para validar e expandir os resultados deste estudo.
Agradecimentos
Agradecemos o contributo dos enfermeiros entrevistados, pela partilha do conhecimento e experiência, essencial para o desenvolvimento deste trabalho, assim como, ao Núcleo de Investigação em Enfermagem da ULS Coimbra pela colaboração ao longo de todas a etapas do mesmo, contribuindo de forma decisiva para a consecução dos objetivos.









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