INTRODUÇÃO
Nas Unidades de Cuidados Intensivos (UCI) o repouso prolongado no leito é utilizado como uma medida terapêutica necessária à estabilização clínica das pessoas internadas. No entanto, os efeitos deletérios da imobilidade podem ser mais graves do que a situação clínica geradora da mesma, transformando uma redução da capacidade funcional temporária em incapacidade1 reconhecendo-se que a imobilidade compromete a qualidade de vida das pessoas2. Além disso, atualmente verifica-se um aumento do número de sobreviventes da doença crítica com sequelas de disfunção neuromuscular e deficiência física, relacionadas com o seu internamento nas UCI3,4.
Os efeitos nocivos da imobilidade prolongada nas pessoas em situação crítica, têm como consequência, entre outras, disfunções severas no sistema osteomioarticular5, como o desenvolvimento de contraturas articulares6. Outro estudo7, afirmam que a fraqueza muscular generalizada é uma consequência comum nas pessoas que se encontram imobilizadas e particularmente nas que necessitam de suporte ventilatório invasivo. Nestas pessoas a fraqueza muscular associada à ineficácia do revestimento ciliar reduz a efetividade da tosse, o que contribui para o aumento da acumulação de secreções e risco acrescido de infeções respiratórias1. A ventilação e a perfusão pulmonar também ficam afetadas, o que se traduz em episódios de hipoxémia, capacidade de reserva ventilatória reduzida, aumento da dispneia e maior dificuldade no processo de desmame ventilatório8. Outro problema associado à imobilidade é o aparecimento de úlceras por pressão que representam um grave problema de saúde, com repercussões na pessoa, ao nível da mortalidade e morbilidade e os valores de prevalência destas tendem a aumentar nas populações de risco, nomeadamente as pessoas em estado crítico1.
Estas são algumas das razões que que justificam o investimento na prevenção das consequências da imobilidade e é fundamental encontrar evidência e evidência que aborde intervenções de enfermagem eficazes na prevenção e redução do problema9.
Neste sentido, os enfermeiros especialistas em enfermagem de reabilitação (EEER), que exercem funções nas UCI, possuem um papel fulcral na elaboração e implementação de programas de reabilitação que visem a minimização das consequências da imobilidade. A prevenção de complicações, com o intuito de evitar as incapacidades ou minimizando as mesmas é um dos aspetos chave de atuação da Enfermagem de Reabilitação10, que ganha maior relevo em contexto de UCI, visto que uma das finalidades da prestação de cuidados de Enfermagem de Reabilitação às pessoas em situação crítica consiste em evitar e reduzir complicações decorrentes da imobilidade no leito11, nomeadamente as respiratórias, motoras e funcionais12. Sublinha-se que um dos contributos essenciais para prevenção das consequências da imobilidade é o planeamento adequado de cuidados de Enfermagem de Reabilitação, que inclua intervenções promotoras da mobilidade e subsequente do autocuidado1. Outros autores13 reforçam a importância dos programas de reabilitação e mobilização precoce, direcionados para as pessoas em situação crítica, com início precoce, ou seja, imediatamente após a estabilização das funções vitais, normalmente nos primeiros dois a cinco dias de internamento das pessoas nas UCI.
Além disso, a promoção da segurança das pessoas cuidadas é um objetivo importante na prática da Enfermagem de Reabilitação14 e a prestação de cuidados de Enfermagem de Reabilitação na prevenção das consequências da imobilidade das pessoas em situação crítica permite que sejam evitadas situações e efeitos adversos que comprometam a sua segurança.
O internamento na UCI e as consequências que daí advêm, como a imobilidade, são eventos que desencadeiam várias transições nas pessoas, mais concretamente transições de saúde/ doença e situacionais15. Na medida em que os enfermeiros possuem um papel preponderante na facilitação das transições, esse papel ganha um significado particular nos processos de transição saúde/doença e nestes, é fundamental que adotem uma postura de escuta e aceitação do outro, educação e orientação, promoção do autocuidado e conforto16, podendo também intervir nos períodos antecipatórios, de preparação para a mudança de papéis, de prevenção dos efeitos negativos da doença sobre as pessoas17, como é o caso das consequências da imobilidade.
Através da revisão da literatura, constatou-se que os estudos desenvolvidos por enfermeiros na área da prevenção das consequências da imobilidade na pessoa em situação crítica são escassos, comparativamente com os estudos desenvolvidos por outros profissionais da área de reabilitação.
Com o intuito de poder contribuir para a prevenção das consequências da imobilidade, e descrever esses contributos, foi desenvolvido um projeto de intervenção precoce de Enfermagem de Reabilitação que incidiu sobre as pessoas em situação crítica acometidas à imobilidade, internadas numa UCI, às quais foram prestados cuidados de Enfermagem de Reabilitação organizados e sistematizados.
O foco é por definição da Classificação Internacional da Prática de Enfermagem (CIPE®) uma área de intervenção que é pertinente para a enfermagem18 e no contexto deste projeto os focos identificados como relevantes foram a limpeza das vias aéreas, a ventilação, a rigidez articular e a úlcera por pressão, associados às consequências respiratórias, articulares e tegumentares da imobilidade.
O projeto de intervenção apresenta como objetivo geral prevenir as consequências da imobilidade das pessoas internadas numa UCI e como objetivos específicos, realizar uma avaliação inicial das pessoas que inclua a avaliação da função ventilatória e dos mecanismos de limpeza das vias aéreas, avaliação da integridade cutânea e do risco de compromisso e a avaliação da amplitude articular, através da observação direta e da aplicação de instrumentos de avaliação adaptados à população portuguesa; identificar o risco de desenvolvimento de alterações respiratórias, tegumentares, e músculo-esqueléticas e formular diagnósticos associados; implementar um programa de intervenção de Enfermagem de Reabilitação respiratória e motora; descrever os contributos do programa de intervenção através da reavaliação da pessoa, incluindo a função ventilatória e os mecanismos de limpeza das vias aéreas, integridade cutânea e amplitude articular.
MÉTODO
Para a elaboração do projeto de intervenção foi adotada a metodologia de estudos de caso, uma vez que esta estratégia de pesquisa destina-se sobretudo a descrever, compreender e explicar19, permitindo estudar um fenómeno (neste caso as consequências da imobilidade nas pessoas em situação critica) numa perspetiva holística e num contexto real, com diversas fontes de evidência, obtendo uma riqueza de informações descritivas, permitindo também a reflexão e a procura de alternativas para a solução dos problema20. Apesar de apresentar como limitação a impossibilidade de generalizar os resultados obtidos na enfermagem, possibilita conhecer em profundidade os aspetos do fenómeno em estudo21.
O presente projeto descreve os casos de pessoas internadas numa UCI de um Centro Hospitalar de Lisboa, que apresentavam potencial risco para desenvolverem alterações tegumentares, músculo-esqueléticas e respiratórias, associadas à imobilidade, critério de selecção para a participação no projeto de intervenção. Realizou-se no período de outubro a novembro de 2018, após a sua aprovação pela Comissão de Ética para a Saúde e autorização do Conselho de Administração do referido Centro Hospitalar.
A importância da enfermagem enquanto ciência teórico-prática deve ser sensível aos múltiplos focos de interesse e intervir no processo de transição e essa intervenção prática basear-se-á na facilitação das transições dos doentes e famílias onde a saúde e o bem-estar são percebidas como resultados16,17. Por isso, o projeto de intervenção baseou-se na metodologia do processo de enfermagem.
Com base nos quatro focos de enfermagem definidos e critérios sustentados no Padrão Documental dos Cuidados de Enfermagem da Especialidade de Enfermagem de Reabilitação22 e outros considerados relevantes e descritos na literatura, da avaliação inicial das pessoas constou a avaliação dos parâmetros vitais, monitorização da integridade cutânea, auscultação pulmonar e a avaliação do reflexo de tosse e do padrão respiratório, através da observação direta; a avaliação do estado de consciência através da aplicação da Escala de Coma de Glasgow (ECG)23; avaliação do risco de desenvolvimento de úlceras por pressão, com a aplicação da escala de Braden24. Foi também avaliada a amplitude do movimento (ADM) das articulações ao nível dos ombros, cotovelos, joelhos e tornozelos, através da goniometria. A utilização de instrumentos, de avaliação uniformizados, permite a documentação dos cuidados especializados, a sua continuidade e também o desenvolvimento de projetos de investigação que se possam assumir como boas práticas e serem replicados 25.
Após a identificação dos problemas reais e potenciais a partir dos dados colhidos na avaliação inicial, foram elaborados diagnósticos de Enfermagem de Reabilitação relacionados com cada foco de enfermagem, recorrendo à linguagem CIPE® e estratificaram-se intervenções baseadas na evidência científica e explanadas no Padrão Documental dos Cuidados de Enfermagem da Especialidade de Enfermagem de Reabilitação, no âmbito da Reeducação Funcional Motora (RFM), prevenção de úlceras por pressão e Reeducação Funcional Respiratória(RFR).
Foi definido que a avaliação dos focos de enfermagem limpeza das vias aéreas e ventilação seria realizada no início e no final de cada sessão de RFR, uma vez que se espera que as intervenções realizadas em cada sessão promovam, em princípio, uma melhoria imediata. Relativamente à avaliação dos focos de enfermagem rigidez articular e úlcera por pressão definiu-se que seria realizada em três momentos do plano de intervenção - inicial, intermédio e final - uma vez que a visibilidade dos resultados ocorre num período mais alargado, por contraponto com os focos anteriores.
Para garantir a integridade da investigação, todas as fases do presente projeto apresentam-se fundadas nos princípios éticos defendidos pela enfermagem, respeitando e salvaguardando a confidencialidade e o anonimato, quer da instituição na qual decorreu o projeto, quer dos participantes, tendo sido representados por letras. Foram também tomadas todas as medidas necessárias para se proceder a um consentimento informado, esclarecido e livre
RESULTADOS
A informação obtida foi sujeita a procedimentos de análise de natureza descritiva, que possibilitam descrever as características dos casos estudados e os valores obtidos pela medida das variáveis26.
Descrição dos Casos
Procede-se à descrição de cada caso, salvaguardando que durante as sessões de RFM verificou-se que todos os participantes mantiveram estabilidade hemodinâmica, tendo sido assegurada a segurança das intervenções efetuadas nas pessoas. Antes de cada sessão de RFR procedeu-se à visualização das radiografias de tórax dos participantes com a finalidade de detetar possíveis alterações que comprometessem a sua função respiratória.
Caso da pessoa A
Pessoa de 44 anos de idade, do sexo masculino, casado. Foi admitido na UCI com os diagnósticos de traumatismo crânio encefálico (edema cerebral difuso com fina lâmina de hematoma subdural frontal direito); fratura de C2 e de D9; pneumotórax à direita; fratura dos metacarpos da mão esquerda. Durante o internamento apresentou diversos problemas clínicos, como trombose venosa profunda do membro inferior esquerdo. Este problema ainda não se encontrava resolvido no momento da avaliação inicial que ocorreu no 30º dia de internamento (Quadro n. º1), pelo que se optou por não avaliar nesse momento a ADM do membro inferior esquerdo, devido ao risco de agravamento da situação.
Estado de consciência (pontuação da ECG) |
Pontuação de 11T (abertura ocular espontânea-4; resposta verbal ausente pela presença do tubo endotraqueal (TET) -1 e obedece a ordens-6) |
Integridade Cutânea | Ausente - Úlcera por pressão categoria 3 na região occipital, associada à utilização permanente do colar cervical; - Úlcera por pressão categoria 3 na região sagrada. |
Risco de úlcera por pressão (pontuação da escala de Braden) |
Risco elevado de úlcera por pressão (13 pontos) |
Avaliação do movimento articular | - Mantido repouso prolongado no leito. - Avaliada a ADM de forma passiva nos membros superiores e membro inferior direito com movimento articular e muscular diminuído. - Na flexão do cotovelo esquerdo apresentou fácies de dor, no momento final do movimento. |
Ventilação | - Ventilação espontânea, com oxigenioterapia por peça em T com fração de oxigénio inspirado (FiO2) de 28%. -Padrão respiratório regular, superficial, de predominância abdominal (com expansão torácica mínima), simetria torácica mantida e sem utilização dos músculos acessórios. Sem esfoço respiratório. - Auscultação pulmonar com ruídos adventícios |
Mecanismos de Limpeza das vias aéreas (Reflexo de tosse) |
Reflexo de tosse diminuído; mobiliza as secreções até ao TET. Aspiração de secreções frequentes. |
Fonte: elaboração própria.
Na sequência da avaliação inicial efetuada, foram estabelecidos os seguintes diagnósticos de enfermagem:
Diagnóstico 1 - Risco de rigidez articular;
Diagnóstico 2 - Risco de úlcera por pressão em grau elevado; Diagnóstico 3 - Limpeza das vias aéreas ineficaz;
Diagnóstico 4 - Ventilação comprometida.
Ao longo do período de intervenção a pessoa A manteve o mesmo estado de consciência. Realizaram-se 7 sessões de RFM, tendo sido sempre realizadas mobilizações passivas, com aumento do número de repetições por movimento a partir da 5ª sessão. Por questões de segurança, os exercícios de mobilização passiva do membro inferior esquerdo foram apenas introduzidos na 4ª sessão, momento em que se avaliou a ADM do membro inferior esquerdo.
Nas primeiras sessões apresentou fácies de dor durante a rotação externa do ombro esquerdo, flexão do cotovelo esquerdo e na supinação do antebraço esquerdo, pelo que se realizaram movimentos de menor amplitude. Foi sugerida e administrada terapêutica analgésica. Nas restantes sessões não apresentou dor durante as mobilizações. Salienta-se que, por ter havido um maior tempo de contato com a pessoa A, foram realizados três momentos de avaliação da ADM, enquanto que os restantes participantes foram submetidos a dois momentos avaliativos. Assim, a avaliação intermédia da ADM ocorreu na 3ª sessão e no final da 7ª sessão foi reavaliada a ADM.
Das articulações avaliadas nos três períodos verificou-se que houve um aumento linear da ADM ao nível da abdução do ombro direito, flexão do cotovelo direito e flexão do joelho direito. A ADM da abdução do ombro esquerdo e da dorsiflexão do tornozelo direito aumentou da avaliação inicial para a intermédia e manteve-se na avaliação final.
Observou-se uma diferença nas ADM dos membros inferiores, em que as articulações do membro inferior direito apresentam maior amplitude, o que é compreensível visto que o membro inferior esquerdo esteve mais tempo imobilizado, no entanto apresentou aumento da ADM ao nível da flexão do joelho e dorsiflexão do tornozelo.
Na flexão dos ombros e na flexão plantar do tornozelo direito houve uma diminuição da ADM da avaliação intermédia para a avaliação final. Também se verificou uma diminuição da ADM ao nível da flexão plantar do tornozelo esquerdo entre as duas avaliações efetuadas. A ADM da flexão do cotovelo esquerdo apresentou um decréscimo linear desde a primeira avaliação. É de ressalvar que durante as primeiras sessões foi um dos movimentos onde a pessoa A apresentou dor.
Quanto às medidas preventivas de úlcera por pressão, além da aplicação de creme hidratante e manutenção da pele seca, foi reforçada a alternância de decúbitos, com ajuda total, e a remoção do colar cervical uma vez dia (no mínimo), para inspecionar e limpar a pele; para prevenir a úlcera por pressão no mento, devido ao colar cervical, foram realizados cuidados à pele e aplicada compressa redutora de pressão em silicone que abrange a região do mento até à região supraclavicular.
Nas três avaliações efetuadas a pessoa A manteve a mesma pontuação na escala de Braden, o que se traduz num elevado risco de úlcera por pressão, no entanto, não desenvolveu mais nenhuma úlcera por pressão.
No âmbito da RFR foram realizadas 6 sessões. A partir da 2ª sessão foi aumentado o número de repetições na reeducação costal inferior, pela diminuição do murmúrio vesicular nas bases pulmonares, e na 3ª sessão foi aumentado o número de repetições dos restantes exercícios respiratórios.
Importa referir que no período em que decorreu o projeto de intervenção a pessoa A foi extubada endotraquealmente (um dia antes da 3ª sessão), no entanto por descompensação respiratória procedeu-se a uma nova reentubação endotraqueal (antes da 4ª sessão) e na 6ª sessão tinha sido removido o TET no turno anterior.
Antes e após de cada sessão foram avaliados os parâmetros vitais. Os valores de frequência cardíaca e de pressão arterial média apresentaram ligeiras variações, verificando-se que na 3ª sessão houve um aumento da pressão arterial média após a sessão de RFR, contudo não comprometeram a estabilidade hemodinâmica da pessoa.
Na 3ª e a 4ª sessão observou-se um aumento da frequência respiratória, no entanto os seus valores encontraram-se circunscritos ao intervalo de referência da frequência respiratória. Além disso, ao aumento da frequência respiratória esteve associado um aumento da amplitude da onda da frequência respiratória, com melhoria do padrão respiratório.
Ao longo de todas as sessões de RFR avaliou-se a ventilação e a presença de esforço respiratório, verificando-se que a pessoa A não apresentou sinais de esforço respiratório, com melhoria na amplitude e no tipo de respiração. Destacamos que na sessão nº 4 houve um retrocesso em termos do padrão respiratório que poderá estar associado ao período de descompensação prévio e que culminou na reentubação da pessoa. Apesar disso, e a partir dessa sessão a evolução foi favorável.
Os valores de spO2 aumentaram nas primeiras três sessões, mantiveram- se constantes na 4ª e 6ª sessão e na 5ª sessão diminui ligeiramente de 100% para 96%. É de salientar que durante as sessões o débito de oxigénio oscilou, de acordo com as necessidades de oxigenioterapia da pessoa A.
A auscultação pulmonar realizou-se antes e após de todas as sessões, verificando-se que a pessoa A não apresentou ruídos adventícios (RA) no final das sessões e o murmúrio vesicular (MV) nas bases pulmonares apesar de se manter diminuído tornou-se mais audível.
Apesar de na 1ª sessão ter apresentado um acesso de tosse vigoroso, quando desconectado de fonte de oxigénio, tendo sido capaz de expulsar pelo TET secreções, na globalidade das sessões, enquanto esteve entubado endotraquealmente, a pessoa A apresentou reflexo de tosse diminuído, mobilizando as secreções até ao TET, sendo necessária a aspiração de secreções.
Na 3ª sessão e na última sessão encontrava-se extubado, apresentando reflexo de tosse diminuído, contudo após a realização das técnicas de RFR planeadas, foi capaz de expelir as secreções. Quando incentivado a tossir, ficou mais sonolento tendo sido necessário aspirar as secreções.
Caso da pessoa B
Pessoa de 60 anos de idade, do sexo masculino e divorciado, vivendo sozinho. Admitido na UCI por AVC isquémico cerebeloso direito. Realizou-se a avaliação inicial no 7º dia de internamento (Quadro n.º2).
Estado de consciência (pontuação da ECG) |
Pontuação de 10T (abertura ocular ao som-3; resposta verbal ausente pela presença do TET -1 e obedece a ordens- 6) |
Integridade Cutânea | Presente |
Risco de úlcera por pressão (pontuação da escala de Braden) |
Risco elevado de úlcera por pressão (12 pontos) |
Avaliação movimento articular | - Mantido repouso no leito. -Avaliada a ADM de forma passiva nos membros superiores e inferiores com movimento articular e muscular diminuído. - Dor ausente no movimento articular |
Ventilação | -Sob ventilação mecânica invasiva, em modo ventilatório de pressão controlada. -Padrão respiratório superficial, misto, com simetria torácica mantida; sem ciclos respiratórios próprios, realizando aqueles previamente regulados no ventilador. - Auscultação pulmonar com RA |
Mecanismos de Limpeza das vias aéreas (Reflexo de tosse) |
Reflexo de tosse diminuído; não mobiliza as secreções até ao TET. Aspiração de secreções frequentes. |
Fonte: elaboração própria.
De acordo com a avaliação inicial, foram elaborados os seguintes diagnósticos de enfermagem:
Diagnóstico 1- Risco de rigidez articular;
Diagnóstico 2 - Risco de úlcera por pressão em grau elevado;
Diagnóstico 3 - Limpeza das vias aéreas ineficaz;
Diagnóstico 4 - Ventilação comprometida.
A pessoa B apresentou uma melhoria do estado de consciência ao longo do projeto de intervenção, apresentando no último dia uma pontuação na ECG de 14 (abertura ocular espontânea, discurso confuso, cumprindo ordens).
Realizaram-se 4 sessões de RFM, tendo sido efetuadas, numa primeira fase, mobilizações passivas. A partir da 3ª sessão o doente estava mais desperto e quando incentivado era o próprio a iniciar o movimento, pelo que se iniciaram exercícios de mobilização ativa assistidas.
Nas primeiras duas sessões apresentou fácies de dor à mobilização da região cervical, pelo que se suspendeu a mobilização da mesma. Nas restantes sessões sem queixas álgicas. No final da 4ª sessão reavaliou-se a ADM, de modo passivo, para serem comparados os resultados obtidos com os da avaliação inicial.
Globalmente a ADM foi mantida ou aumentada, observando-se uma diminuição da ADM ao nível da abdução do ombro direito, flexão do cotovelo direito e da flexão plantar de ambos os tornozelos.
Durante o projeto de intervenção a pessoa B manteve a integridade cutânea, no entanto, devido à fricção (descaía constantemente no leito) apresentou rubor na região sagrada. Foi aplicado creme hidratante e adotados como posicionamentos preferenciais os decúbitos semi-dorsais e laterais. No turno anterior à última sessão, o sr. B tinha realizado o primeiro levante que decorreu sem intercorrências. Na última sessão a pessoa B apresentava a pele da região sagrada íntegra. Apesar de manter um risco elevado de úlcera por pressão, aumentou a pontuação na Escala de Braden de 12 para 15 pontos.
Foram realizadas 5 sessões de RFR. Na 1ª sessão a pessoa B encontrava-se submetida a ventilação mecânica invasiva e foi extubada no final desse dia. Nas restantes sessões manteve-se em ventilação espontânea, contudo houve necessidade de aumentar o oxigénio, permanecendo desde a 3ª sessão, inclusive, com máscara de venturi com FiO2 de 50%, o que coincidiu com o momento em que foram observadas radiografias do tórax com imagem sugestiva de derrame pleural direito.
De modo a melhorar a ventilação e a prevenir a estase de secreções brônquicas, foram reforçados os ensinos relativos ao controlo respiratório com dissociação dos tempos respiratórios e ensino da tosse. Uma vez que havia a suspeita de derrame pleural direito, foram reforçados os posicionamentos terapêuticos que promovessem drenagem dessa área.
No início e no final de cada sessão foram avaliados os parâmetros vitais. A pessoa B manteve estabilidade hemodinâmica durante as sessões de RFR.
Globalmente as frequências respiratórias diminuíram após a sessão, evidenciando-se a sessão nº 3 na qual a frequência respiratória prévia à sessão era superior ao valor máximo de referência da frequência respiratória. Quanto aos valores de spO2 ou mantiveram-se iguais (superior a 90%) ou aumentaram.
Avaliada a ventilação e a presença de esforço respiratório no início e no final de todas as sessões de RFR, constatando-se que a pessoa B na 2ª sessão apresentou padrão respiratório alterado e na 3ª sessão esforço respiratório a pequenos esforços e padrão respiratório alterado com adejo nasal e tiragem, não tendo sido possível modificar padrão respiratório, no entanto foi possível reduzir a frequência respiratória com as intervenções implementadas. Na 4ª e 5ª sessão houve melhoria na amplitude e no tipo de respiração, após incentivo no controlo respiratório com dissociação dos tempos respiratórios.
Verificou-se que, ao nível da auscultação pulmonar, antes das sessões apresentava Ruídos Adventícios, que estavam ausentes no final das sessões.
Durante as sessões de RFR a pessoa B manteve reflexo de tosse diminuído. A partir da 2ª sessão encontrava-se extubado endotraquealmente, apresentando dificuldade em expelir as secreções. Apesar de ensino de tosse dirigida manteve necessidade de aspiração de secreções, uma vez que apresentava secreções em moderada a grande quantidade.
Caso da pessoa C
Pessoa de 50 anos de idade, do sexo masculino e casado. Tinha como antecedente pessoal hipertensão arterial. Foi admitido na UCIP por Aneurisma roto da artéria comunicante anterior. A avaliação inicial realizou-se no 1º dia de internamento (Quadro n.º2).
Estado de consciência (pontuação da ECG) |
Pontuação de 15 |
Integridade Cutânea | Presente |
Risco de úlcera por pressão (pontuação da escala de Braden) |
Baixo risco de úlcera por pressão (17 pontos) |
Avaliação movimento articular | - Indicação terapêutica de manter repouso no leito. -Avaliada a ADM de forma ativa nos membros superiores e inferiores com movimento articular e muscular diminuído. - Dor ausente no movimento articular - Não executa técnicas de exercício muscular e articular |
Ventilação | -Ventilação espontânea, com oxigenioterapia por sonda binasal a 3 L/min - Padrão respiratório regular, de média amplitude, misto, simétrico, sem utilização dos músculos acessórios -Cansaço fácil a esforços moderados, com aumento da frequência respiratória, alteração do padrão respiratório e dificuldade em controlar a sua respiração - Auscultação pulmonar com MV presente e sem RA |
Mecanismos de Limpeza das vias aéreas (Reflexo de tosse) |
Sem acessos de tosse |
Fonte: elaboração própria.
Com base na avaliação inicial foram delineados os seguintes diagnósticos de enfermagem:
Diagnóstico 1: Risco de rigidez articular;
Diagnóstico 2: Potencial para melhorar capacidade para executar técnicas de exercício muscular e articular;
Diagnóstico 3: Potencial para melhorar conhecimento sobre autocontrolo do padrão respiratório;
Diagnóstico 4: Potencial para melhorar conhecimento sobre técnica respiratória;
Diagnóstico 5: Potencial para melhorar capacidade para autocontrolo do padrão respiratório;
Diagnóstico 6: Potencial para melhorar capacidade para usar técnicas respiratórias.
Ao longo do projeto de intervenção esteve consciente e orientado. Durante as 4 sessões de RFM a pessoa C não referiu dor.
Na 1ª sessão foi demonstrado, através das mobilizações passivas, os movimentos polisegmentares que podia efetuar para manter ou melhorar a ADM. A pessoa C foi capaz de assimilar e executar as técnicas demonstradas de forma independente, realizando-as várias vezes ao longo do dia. A partir da 2ª sessão iniciou transferência para cadeirão, duas vezes por dia, com carga total, que decorreu sem intercorrências. Na 3ª sessão foram introduzidos exercícios musculares e articulares ativo-resistidos ao nível dos membros superiores e inferiores, utilizando bandas elásticas, com boa assimilação dos mesmos por parte da pessoa C, que os executou de forma independente. No final da 4ª sessão foi reavaliada a ADM, com aumento das ADM avaliadas previamente. Considera-se que o fato da pessoa C ter tido um papel mais ativo no seu processo de reabilitação poderá ter contribuído para os ganhos obtidos ao nível da ADM.
No âmbito da RFR (realizada uma sessão), a pessoa C não tinha conhecimentos sobre o autocontrolo do padrão respiratório e as técnicas respiratórias utilizadas para otimizar a ventilação (técnica de relaxamento; posições de descanso; dissociação dos tempos respiratórios; respiração abdominodiafragmática), pelo que foram efetuados ensinos relativos aos mesmos. A pessoa C demonstrou-se recetiva à informação fornecida, sendo capaz de descrever a importância e as vantagens do autocontrolo do padrão respiratório e das técnicas respiratórias.
Além disso, após instrução de técnica de autocontrolo do padrão respiratório e restantes técnicas respiratórias, a pessoa C foi capaz de assimilá-las e realizá-las de modo independente, nomeadamente durante os exercícios. A pessoa C referiu que a utilização das referidas técnicas o auxiliaram a tolerar melhor os exercícios mais intensos, que exigiam mais esforço.
Caso da pessoa D
Pessoa de 49 anos de idade, do sexo feminino e casada, foi admitida na UCIP no pós-operatório de craniectomia descompressiva urgente por edema cerebral com desvio das estruturas da linha média, associado a um enfarte isquémico em território da artéria cerebral média esquerda. A avaliação inicial decorreu no 3º dia de internamento (Quadro n.º4).
Estado de consciência (pontuação da ECG) |
Pontuação de 9T (abertura ocular ao som -3; a resposta verbal ausente, pela presença do TET -1 e localiza a dor -5) |
Integridade Cutânea | Presente |
Risco de úlcera por pressão (pontuação da escala de Braden) |
Risco elevado de úlcera por pressão (10 pontos) |
Avaliação movimento articular | - Mantido repouso no leito. -Avaliada a ADM de modo passivo nos membros superiores e inferiores com movimento articular e muscular diminuído. - Dor ausente no movimento articular. |
Ventilação | -Ventilação espontânea a realizar oxigenioterapia a 0,5 L/min por peça em T. - Padrão respiratório regular, superficial e de predominância abdominal, com expansão torácica reduzida mas simétrica, sem utilização dos músculos acessórios. - Auscultação pulmonar com RA |
Mecanismos de Limpeza das vias aéreas (Reflexo de tosse) |
Reflexo tosse diminuído, dificuldade na mobilização de secreções; aspiração de secreções frequentes |
Fonte: elaboração própria.
A partir da avaliação inicial foram formulados os seguintes diagnósticos de enfermagem:
Diagnóstico 1- Risco de úlcera por pressão em grau elevado;
Diagnóstico 2 - Risco de rigidez articular;
Diagnóstico 3 - Limpeza das vias aéreas ineficaz;
Diagnóstico 4 - Ventilação comprometida.
Durante a implementação do projeto de intervenção a pessoa D melhorou o estado de consciência, apresentando um aumento da pontuação na ECG de 9 para 11T (abria os olhos espontaneamente e cumpria ordens simples).
Durante as 5 sessões de RFM a pessoa D não manifestou dor, tendo sido sempre realizados exercícios de mobilização passiva. No final da 5ª sessão foi reavaliada a ADM. Na generalidade a ADM manteve-se ou aumentou, contudo houve uma diminuição na ADM ao nível da flexão dos ombros e na flexão do cotovelo direito.
Relativamente às medidas preventivas de úlcera por pressão instituídas, foi reforçada a alternância de decúbitos, com ajuda total, a aplicação de creme hidratante e a manutenção da pele seca e na 4ª sessão foi realizada a transferência para o cadeirão sem carga (utilizado elevador). No final da 5ª sessão mantinha um elevado risco de úlcera por pressão, contudo passou de 10 para 12 pontos na Escala de Braden. Durante o projeto de intervenção manteve a pele íntegra.
O projeto de intervenção contemplou 5 sessões de RFR, verificando-se que a pessoa manteve estabilidade hemodinâmica. As intervenções de RFR permitiram diminuir as frequências respiratórias o que se pode traduzir num maior controlo da respiração. Os valores de spO2 foram sempre constantes, mantendo-se no valor máximo possível (100%), estando a pessoa D submetida a oxigenioterapia por peça em T a 1 L/min.
Ao longo de todas as sessões de RFR avaliou-se a ventilação e a presença de esforço respiratório. A pessoa D antes das sessões apresentava um padrão respiratório regular, superficial e predominantemente abdominal, com expansão torácica diminuída. Após as sessões, e a partir da 3ª sessão, houve uma melhoria da amplitude da respiração e após a 5ª sessão apresentou uma respiração mista. Quanto ao esforço respiratório, foi apenas observado na 1ª sessão após moderados esforços (associado à abertura costal seletiva).
Relativamente à auscultação pulmonar foi efetuada antes e após de todas as sessões, verificando-se que foi eliminada a presença de Ruídos Adventícios com as intervenções de RFR realizadas. O Murmúrio Vesicular que inicialmente se encontrava diminuído nas bases pulmonares nas primeiras três sessões, após a 3ª sessão de RFR esteve mantido em todos os campos pulmonares.
Durante as sessões a pessoa D apresentou o reflexo de tosse diminuído, com necessidade de aspiração de secreções na orofaringe e no TET. As características das secreções, quer na orofaringe quer no TET, variaram de sessão para sessão, no entanto no final da 4ª sessão apresentavam-se em menor quantidade.
DISCUSSÃO
Depois da avaliação inicial das quatro pessoas participantes no projeto foram formulados os diagnósticos de Enfermagem de Reabilitação, e realizadas as intervenções que melhor se adaptavam à situação de cada pessoa, tendo em conta a revisão da literatura efetuada. Verificou-se que os diagnósticos de Risco de úlcera por pressão em grau elevado; Limpeza das vias aéreas ineficaz e Ventilação comprometida estavam presentes nas pessoas A, B e D. O diagnóstico de Risco de rigidez articular era comum aos quatro participantes do presente projeto.
No total foram realizadas 37 sessões, 17 no âmbito da RFR e 20 de RFM como resultado da identificação dos diagnósticos. Paralelamente foi estabelecido um plano de cuidados de prevenção das úlceras de pressão, às pessoas que apresentaram um risco elevado.
Relativamente ao risco de rigidez articular, na pessoa C as intervenções de enfermagem instituídas contribuíram para atingir o resultado esperado, ou seja, a manutenção ou melhoria da ADM dos movimentos ao nível das articulações dos ombros, cotovelos, joelhos e tornozelos. Nas pessoas A, B e D constatou-se que a ADM manteve-se ou melhorou em alguns dos movimentos das articulações avaliadas.
Estes resultados alinham-se com casos semelhantes descritos na literatura, nomeadamente o estudo de Modragon-Barrera 27, cujos participantes eram pessoas internadas em UCI e onde também se verificou que após a realização de um programa de mobilizações articulares, houve um acréscimo da ADM ao nível da abdução e flexão dos ombros, abdução das ancas e dorsiflexão dos tornozelos, comprovando o defendido já algum tempo por outros autores28 sobre os benefícios da realização de exercícios de mobilização passiva, ativo-assistida nas pessoas em situação crítica.
Não obstante o resultado na pessoa A foi diferente do esperado, uma vez que este doente apresentou diminuição da ADM ao nível da flexão dos ombros, flexão do cotovelo e flexão plantar dos tornozelos; a pessoa B apresentou um decréscimo na ADM ao nível da abdução do ombro direito, flexão do cotovelo direito e flexão plantar dos tornozelos e a pessoa D também diminuiu a ADM ao nível da flexão dos ombros e na flexão do cotovelo direito. A diferença entre os resultados esperados e os obtidos nos programas de ER pode ser justificada a partir de múltiplos fatores entre eles o fato de as articulações do cotovelo, do tornozelo e ombro apresentarem uma maior predisposição para o desenvolvimento de contraturas6, e que o estudo de Nepomuceno Júnior, Martinez, Neto29 também comprovou mesmo com um programa de exercícios de mobilização articular nestas articulações. De um modo geral, nas pessoas que integraram o projeto de intervenção as amplitudes articulares foram mantidas ou melhoradas atestando a importância dos exercícios de amplitude de movimento e do posicionamento terapêutico, nas pessoas em situação crítica, já que estas intervenções contribuem para a prevenção dos efeitos deletérios da imobilidade prolongada e para a manutenção ou melhoria da funcionalidade motora das pessoas28,30,31.
No que se refere ao risco de úlcera por pressão, no período em que decorreu o projeto de intervenção as pessoas B e D diminuíram o risco (avaliado com a escala de escala de Braden) e o da pessoa A manteve-se constante. As intervenções antecipatórias que englobam a avaliação sistemática da integridade cutânea e avaliação do risco, o reposicionamento e utilização de superfícies de apoio e apósitos terapêuticos adequados, a par da promoção da hidratação cutânea e da redução da humidade na pele revelaram-se eficazes porque, apesar de manterem um risco elevado de úlcera por pressão nenhuma das pessoas desenvolveu esta consequência da imobilidade. Estes resultados vão de encontro a outros já descritos 32-35, comprovando que a monitorização sistematizada deste problema precedida da tomada de consciência do mesmo por parte de toda a equipa de enfermagem e a sua valorização, sobretudo por parte dos EEER, permitiu intervir individualmente nas pessoas e impedir o aparecimento de novas úlcera por pressão, confirmando tal como recomendado por parte da National Pressure Ulcer Advisory Panel, European Pressure Ulcer Advisory Panel and Pan Pacific Pressure Injury Alliance36 que a abordagem estruturada da avaliação do risco, que inclua uma avaliação da atividade/mobilidade e a condição da pele, que tem força de Evidência B deve ser fortemente recomendada.
Na globalidade, após as sessões de RFR, as pessoas A, B e D melhoraram o padrão respiratório, com aumento da amplitude respiratória e da expansão torácica, verificando-se que nas sessões finais apresentaram um padrão respiratório regular, de média amplitude e misto. Verificámos também que os episódios de esforço respiratório evidentes em algumas sessões (uma sessão da pessoa B e uma sessão da pessoa D), foram resolvidos, não tendo sido visível nas sessões subsequentes. Ainda que as pessoas A e B tenham apresentado pontualmente (no final de uma ou várias sessões) aumento da frequência respiratória, observámos que na maioria das sessões as frequências respiratórias diminuíram em todas as pessoas, após as intervenções de RFR. Estes resultados demonstram que os objetivos pretendidos com a intervenção de enfermagem na área da RFR foram alcançados, na medida em que as assinergias e deficiências ventilatórias foram corrigidas e prevenidas, o que poderá ter contribuído para uma melhoria da função respiratória, tal como é explanado por diversos autores 28,37-39.
No que diz respeito ao parâmetro de spO2, as percentagens nas pessoas A, B, e D mantiveram-se constantes após as intervenções de RFR, ou aumentaram ligeiramente. Apesar dos participantes do projeto não estarem ventilados, os resultados obtidos coadunam-se com os descritos na literatura, verificando-se que a implementação de um plano de intervenção no âmbito da RFR nas pessoas em situação crítica promove uma ventilação mais eficaz, sendo este efeito visível através do aumento da SpO2 40-44.
Ao longo de todas as sessões de RFR as pessoas mantiveram o reflexo de tosse diminuído, situação que pode estar associada à presença de uma via aérea artificial (TET) 45, ou à diminuição da força muscular devido à própria condição crítica e à imobilidade7. Verificou-se ainda que no início das sessões as pessoas apresentavam presença de RA (roncos) na auscultação pulmonar, indicativa da presença de secreções46. Assim, a associação de várias manobras de higiene brônquica contribuiu para que os resultados esperados fossem atingidos, evidenciada pela ausência de RA no final das sessões. Pode-se atestar que um plano de cuidados que conjugue distintas técnicas de mobilização e eliminação de secreções promovem uma maior limpeza das vias aéreas, como também foi constatado nos estudos efetuados por Avena, Duarte, Cravo, Sologuren, Gastaldi 40 e Naue, Forgiarini Junior, Dias, Vieira47, minimizando a estase de secreções e consequentemente os episódios de obstrução brônquica que precipitam a atelectasia48.
A pessoa designada por C, ao contrário das restantes pessoas, estava consciente e orientada, apresentando capacidade para assimilar a informação e a instrução das técnicas implementadas no plano de intervenção. Além disso demonstrou estar motivada para adquirir novos conhecimentos que possibilitassem prevenir as complicações que advêm da imobilidade e maximizar as suas capacidades em termos funcionais motores e respiratórios, o que foi essencial para que a nossa intervenção fosse bem-sucedida. Os diagnósticos de enfermagem potencial para melhorar capacidade para executar técnicas de exercício muscular e articular; potencial para melhorar conhecimento sobre autocontrolo do padrão respiratório; potencial para melhorar conhecimento sobre técnica respiratória; potencial para melhorar capacidade para autocontrolo do padrão respiratório e potencial para melhorar capacidade para usar técnicas respiratórias foram apenas identificados nesta pessoa. Assim, ao longo do projeto de intervenção a pessoa C assimilou os conhecimentos transmitidos e as técnicas instruídas, sendo capaz de realizar de modo independente os exercícios de amplitude do movimento e empregar de modo adequado as técnicas respiratórias ensinada, confirmando o que refere Habel49, que os EEER ao apostarem na educação das pessoas promovem o seu empowerment, uma vez que lhes são fornecidos os conhecimentos e as capacidades necessárias para gerirem os seus próprios cuidados e controlarem as suas vidas, ou seja, para serem o mais independentes possível.
Os resultados deste projeto de intervenção também permitiram verificar que o planeamento precoce da prestação de cuidados de enfermagem de reabilitação de forma adequada e individualizada, nas áreas da Reeducação Funcional Motora, da prevenção de úlceras por pressão e da Reeducação Funcional Respiratória, podem contribuir para a prevenção das consequências motoras, tegumentares e respiratórias da imobilidade nas pessoas em situação crítica. A Enfermagem de Reabilitação tem um papel crucial na promoção de práticas de cariz preventivo no seio da equipa multidisciplinar. Essas práticas orientadas para a segurança do doente vão ao encontro da primeira competência especifica dos EEER que é serem capazes de cuidar de pessoas com necessidades especiais em todos os contextos da prática e cuidados22 e que estão impossibilitadas de executar atividades básicas de forma independente, identificando as necessidades de intervenção especializada, implementando e avaliando programas que visem a redução dos riscos. E as suas formas de intervir são a execução, o ensino e a demonstração de técnicas promotoras do autocuidado.
Em síntese, de uma forma geral, os resultados obtidos neste projeto de intervenção comprovam a importância dos cuidados antecipatórios17, uma vez que o planeamento e uma intervenção de ER precoce previnem a ocorrência de eventos negativos, neste caso as consequências da imobilidade, que podem comprometer uma transição saúde/doença bem-sucedida, vivenciada pelas pessoas em situação crítica, o que vai de certa forma ao encontro ao que é defendido por Ludin, Arbon, Parker 15, que afirmam que as pessoas em situação crítica necessitam de um planeamento de transição mais abrangente, que implica um enfoque maior na sua antecipação e dos seus efeitos.
CONCLUSÃO
Os resultados obtidos neste projeto de intervenção permitiram verificar que os participantes mantiveram ou melhoraram amplitude do movimento, e, apesar do risco elevado, não desenvolveram úlceras por pressão, tendo também melhorado a sua condição respiratória. Apesar de não se poderem generalizar os resultados, por limitações metodológicas, os resultados esperados derivaram das intervenções planeadas implementadas, com a colaboração dos restantes elementos da equipa de enfermagem e foram alcançados.
A limitação do tempo para a implementação do projeto também foi uma limitação. Considera-se que numa replicação futura deste projeto seria pertinente alargar o seu tempo de implementação, possibilitando um maior número de casos.
Apesar das suas limitações, o presente projeto de intervenção pode ser um contributo para o desenvolvimento do conhecimento em Enfermagem de Reabilitação e um propulsor para que outros estudos sejam criados, uma vez que também demonstra a importância da intervenção do EEER direcionada às pessoas internadas na UCI.