INTRODUÇÃO
A atelectasia pulmonar é uma condição pulmonar caraterizada por um colapso reversível, parcial ou completo das vias aéreas de pequeno calibre1. Pode acometer um lobo, segmento ou todo o pulmão, causando diminuição da relação ventilação/perfusão (V/Q)2 e comprometendo as trocas gasosas de oxigénio e dióxido de carbono1.
A atelectasia pulmonar constitui uma das complicações respiratórias que podem contribuir para uma significativa morbilidade3. As consequências da atelectasia incluem a redução da compliance pulmonar, hipoxémia, aumento da resistência vascular pulmonar, pneumonia, podendo ainda conduzir a insuficiência respiratória aguda (IRA)4.
A atelectasia pode ocorrer por diferentes processos sendo comummente categorizada em obstrutiva, não obstrutiva, pós-operatória e atelectasia arredondada3. No caso da atelectasia obstrutiva, esta pode resultar de obstrução por um tampão mucoso, como observado em doenças como a asma, bronquite ou pessoas sob ventilação mecânica2. Frequentemente referida como atelectasia de reabsorção, sucede quando existe uma baixa relação Ventilação/Perfusão (V/Q) e a obstrução inibe parcial ou completamente a ventilação, mas a perfusão na área é preservada, mantendo-se a absorção do ar alveolar distal à obstrução, com consequente diminuição da tensão de nitrogénio alveolar e colapso das vias aéreas4,5.
Normalmente, a atelectasia é assintomática3. As manifestações clínicas são pouco específicas e a intensidade das mesmas depende da extensão e gravidade da área afetada. Podem estar presentes sintomas como cianose, tosse, expetoração, dispneia, taquipneia e sudorese6.
O exame físico do tórax pode revelar diminuição da excursão torácica, retrações intercostais e a auscultação pulmonar é marcada pela diminuição (ou abolição) dos sons respiratórios ou a presença de crepitações finas que podem desaparecer após respiração profunda ou tosse6.
A atelectasia geralmente não é evidente em telerradiografias convencionais do tórax até que seja significativa, podendo evidenciar opacificação pulmonar, hiperinsuflação compensatória no pulmão adjacente não atelectásico e nos casos mais graves de atelectasia unilateral, o deslocamento ipsilateral das estruturas intratorácicas adjacentes em direção à área afetada7.
A gasometria arterial pode demonstrar hipoxemia arterial e alcalose respiratória. A pressão parcial venosa de dióxido de carbono (PaCO2) é geralmente normal podendo, no entanto, ser menor, secundária ao aumento da ventilação/minuto que frequentemente acompanha a atelectasia3.
Antes de se selecionarem as possíveis estratégias de tratamento, é importante compreender o mecanismo, a causa e o significado funcional da atelectasia, já que não existe evidencia que alguma terapia isolada seja eficaz em todas as formas de atelectasia5, sendo recomendada a implementação de uma abordagem multifacetada com base nas necessidades individuais da pessoa6.
O tratamento deve visar a identificação da causa subjacente da doença e envolver medidas de suporte como exercícios de reexpansão pulmonar, broncodilatação, inaloterapia e oxigenoterapia3,5. As estratégias de tratamento descritas na literatura incluem geralmente a reeducação funcional respiratória como tratamento tradicional de primeira linha e utilização de pressões inspiratória e expiratória positivas5. O mecanismo subjacente a essas medidas é um aumento transitório na pressão transpulmonar que permita a reexpansão dos segmentos pulmonares colapsados3.
No caso da atelectasia obstrutiva por tampão mucoso, importa reverter a sua causa, quer pela diminuição da viscosidade do muco e aumento da depuração ciliar, quer pelo aumento do fluxo expiratório aplicando forças de cisalhamento e alta energia cinética ao muco aderido à parede das vias aéreas8,9.
Há uma grande variedade de técnicas ao dispor, no entanto a técnica aplicada deve ser adaptada à preferência da pessoa, levando em consideração que técnicas simples e rápidas podem estimular a adesão ao tratamento10.
A vibração consiste na aplicação de movimentos oscilatórios com os objetivos teóricos de alterar as propriedades reológicas do muco, induzir tosse por estimulação mecânica das vias aéreas e aumentar o pico de fluxo expiratório (PFE)11. Na literatura é recorrentemente referido que a vibração da parede torácica de alta frequência na faixa de 11-15Hz aumenta a taxa de depuração do muco, sendo a frequência ideal de 13Hz12, a qual corresponde à frequência de batimento do sistema ciliar9. Atualmente existem vários mecanismos de vibração, entre os quais dispositivos de oscilação da parede torácica de alta frequência e dispositivos de vibração percussiva intrapulmonar.
A oscilação da parede torácica de alta frequência é realizada através de um colete insuflado com pressão (1-10) e frequência variáveis (5-20Hz). O fluxo de ar oscilatório na parede torácica externa gera aumentos transitórios no fluxo de ar expiratório nas vias aéreas, diminuição da viscoelasticidade do muco8,13, aumento da frequência do batimento ciliar14,11 e melhoria da distribuição da ventilação15. No entanto, o dispositivo não fornece meios de ventilar atrás das vias aéreas obstruídas, ao contrário de outros dispositivos oscilatórios que fornecem pressão expiratória positiva (PEP)9.
A vibração percussiva intrapulmonar tem sido progressivamente usada na pessoa com secreções excessivas ou para intervir na presença de atelectasias16. Esta consiste na administração de pequenos volumes correntes pulsáteis (entre 1 ml e 300 ml) a alta frequência nas vias aéreas, criando um efeito global de vibropercussão interna dos pulmões sobrepondo-se à ventilação espontânea do paciente17. Tem como objetivos promover a limpeza das vias aéreas, recrutar unidades alveolares colapsadas (graças à PEP que permite uma distribuição mais homogénea do ar na árvore brônquica evitando a hiperinsuflação de territórios saudáveis) e melhorar as trocas gasosas14,17,18.
O presente relato de caso apresenta como questão de partida: “Na pessoa portadora de atelectasia pulmonar, qual a efetividade da intervenção do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Reabilitação, na melhoria da função respiratória com recurso a terapia vibro-oscilatória?
O presente relato de caso apresenta como objetivo geral: avaliar a efetividade da intervenção do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Reabilitação (EEER) na pessoa portadora de atelectasia pulmonar, com a aplicação de um programa de reabilitação respiratória com recurso a terapia vibro-oscilatória.
Identificam-se, ainda, os seguintes objetivos específicos:
MATERIAL E MÉTODOS
Trata-se de um estudo descritivo, do tipo Relato de Caso, construído com base nas guidelines da CAse REport (CARE), pois permite uma estruturação fomentadora de pensamento crítico, reflexão sobre as práticas de cuidados e objetivação dos ganhos na pessoa19.
O estudo descreve o caso de uma pessoa portadora de atelectasia pulmonar obstrutiva secundária a tampão mucoso, fazendo alusão ao desenho do programa de reabilitação respiratória implementado em contexto de internamento e os resultados na pessoa sensíveis ao programa instituído. A colheita de dados foi realizada mediante anamnese e consulta do processo clínico, com a aprovação da comissão de ética do Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, E.P.E.
O programa de reabilitação respiratória decorreu no mês de julho de 2021, com início no decurso do internamento.
A avaliação de Enfermagem de Reabilitação incidiu nos sinais e sintomas da doença respiratória: tosse e expetoração, avaliadas na sua eficácia e aspeto macroscópico. A função respiratória foi avaliada através do exame físico (auscultação), gasometria arterial e telerradiografia do tórax.
APRESENTAÇÃO DO CASO
Anamnese
O presente caso retrata uma pessoa de 73 anos de idade, do género masculino, caucasiano e de nacionalidade portuguesa, casado e pai de dois filhos e atualmente reformado. Apresenta como antecedentes pessoais conhecidos: dislipidemia, hipertensão arterial, enfarte agudo do miocárdio, fibrilação auricular paroxística, neoplasia gástrica, carcinoma medular da tiróide, hipotiroidismo, fibrose pulmonar sequelar a pneumonite rádica, hérnia diafragmática e bronquiectasias. Regime medicamentoso habitual: Apixabana 5mg, 2 vezes/dia; Pantoprazol 20mg, 1 vez/dia; Levotiroxina 137/125mg, em dias alternados; Bisoprolol 2,5mg, 1 vez/dia; Atorvastatina 40mg, 1 vez/dia; Amiodarona 100mg, 3 vezes/semana; Furosemida 20mg, 1 vez/dia.
Recorreu ao serviço de urgência no dia 19 de junho de 2021 por um quadro arrastado e progressivo de dispneia agravada desde há 3 meses, com sintomatologia associada de epigastralgias e vómitos. Realizada toracocentese evacuadora, com drenagem de 900ml de líquido citrino. No dia seguinte, por prostração com dessaturação periférica, acidemia respiratória (pH 7,18; PaCO2> 115 mmHg; PaO2 84 mmHg; lactatos 2,2 mml/L) e hipotensão, foi iniciada ventilação não invasiva e fluidoterapia. Nesse contexto, foi admitido no serviço de medicina intensiva com os problemas sequenciais de derrame pleural bilateral, insuficiência cardíaca descompensada, insuficiência respiratória mista e infeção respiratória por Klebsiella Pneumoniae. Foi transferido para o serviço de pneumologia a 15 de julho. A 2 de agosto de 2021, por atelectasia total à esquerda é referenciado para reabilitação funcional respiratória por Enfermagem de Reabilitação. Após implementação de programa individualizado de reeducação funcional respiratória teve alta a 18 de agosto de 2021.
Avaliação de Enfermagem de Reabilitação
A avaliação foi realizada com base no exame físico e exames complementares de diagnóstico, os quais são descritos no Quadro 1.
Com base na Avaliação Inicial de Enfermagem de Reabilitação, identificaram-se os diagnósticos e intervenções de enfermagem por forma a serem objetivados os ganhos na pessoa sensíveis aos cuidados de enfermagem de reabilitação.
Parâmetro | Caraterísticas |
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Telerradiografia torácica | Opacificação à esquerda - Derrame pleural de médio/grande volume |
Auscultação pulmonar | Direita: murmúrio vesicular (MV) diminuído e fervores crepitantes. Esquerda: MV abolido |
Tipo de respiração Ritmo Amplitude |
Mista Irregular Diminuída |
Recrutamento músculos acessórios | Sim |
Muco Cor Viscoelasticidade |
Presente Amarela Alta |
Tosse Pico de fluxo |
Ineficaz 180 L/min |
Aerossolterapia | Não |
Oxigenoterapia | 2 L/min |
SpO2 | 93% |
Sinais Vitais TA FC FR Dor Temperatura |
95/66 mmHg 80 (Bpm) 20 (Ciclos/min) 0 36,0º |
Diagnósticos de Enfermagem de Reabilitação
Tendo como ponto de partida a avaliação inicial de Enfermagem de Reabilitação e de acordo com as necessidades e possibilidades da pessoa, foram identificados quatro diagnósticos de enfermagem relacionados com os focos “ventilação” e “expetorar”, tendo como referencial a linguagem da Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE)® (2015), e tendo como base o padrão documental dos cuidados de Enfermagem da Especialidade de Enfermagem de Reabilitação(20) e o Guia Orientador da Boa Prática da Reabilitação Respiratória(21):
Ventilação comprometida;
Expetorar ineficaz;
Potencial para melhorar conhecimento sobre técnica da tosse;
Potencial para melhorar a capacidade para usar a técnica da tosse.
Os diagnósticos anteriormente identificados permitem sustentar o Programa de Reeducação Funcional Respiratória, apresentado de forma detalhada no Quadro 2.
Diagnóstico de enfermagem: Ventilação comprometida | |
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Intervenções de Enfermagem de Reabilitação | - Observar exame [gasometria arterial e telerradiografia do tórax]; - Monitorizar oximetria periférica de oxigénio; - Monitorizar os sinais vitais; - Auscultar tórax [identificar murmúrio vesicular e ruídos adventícios, antes, durante e após intervenção]; - Vigiar ventilação [expansibilidade, tipo, ritmo, amplitude, tempos inspiratórios e expiratórios, utilização de músculos acessórios, antes, durante e após intervenção]; - Otimizar a ventilação através da técnica de posicionamento [correção postural, posição de descanso e relaxamento; elevação da cabeceira a 30-45º]; - Executar técnicas respiratórias [controlo e dissociação dos tempos respiratórios; expiração com lábios semicerrados; reeducação abdominodiafragmática; reeducação costal bilateral]; - Executar cinesiterapia respiratória [abertura costal global e seletiva à esquerda com foco na inspiração até à capacidade pulmonar total e pausa teleinspiratória]; - Otimizar ventilação através de dispositivos respiratórios [vibração percussiva intrapulmonar, oscilação extratorácica de alta frequência]. |
Diagnostico de enfermagem: Expetorar ineficaz | |
Intervenções de Enfermagem de Reabilitação | - Avaliar reflexo da tosse; - Incentivar a tossir; - Incentivar a ingestão de líquidos; - Executar inaloterapia através de inalador; - Executar cinesiterapia respiratória [abertura costal global e seletiva à esquerda com foco na inspiração até à capacidade pulmonar total e pausa teleinspiratória, vibração percussiva intrapulmonar, oscilação extratorácica de alta frequência]; - Assistir a tossir [tosse assistida, tosse dirigida]; - Vigiar a expetoração. |
Diagnóstico de enfermagem: Potencial para melhorar conhecimento sobre técnica da tosse | |
Intervenções de Enfermagem de Reabilitação | - Avaliar conhecimento sobre técnica da tosse; - Ensinar sobre técnica da tosse [modulação do fluxo expiratório de baixo a alto volume; huffing e técnica da expiração forçada]; - Instruir técnica da tosse; - Treinar técnica da tosse. |
Diagnóstico de enfermagem: Potencial para melhorar capacidade para usar técnica da tosse | |
Intervenções de Enfermagem de Reabilitação | - Avaliar capacidade para usar a técnica da tosse; - Instruir sobre técnica da tosse [modulação do fluxo expiratório de baixo a alto volume; huffing e técnica da expiração forçada]; - Treinar a técnica da tosse. |
RESULTADOS
O programa de reeducação funcional respiratória foi concretizado durante cinco dias consecutivos, com duração aproximada de 60 minutos cada sessão.
Perante este caso de uma pessoa portadora de atelectasia obstrutiva por tampão mucoso com fluxo de tosse ineficaz, o processo de reabilitação teve como resultados esperados a diminuição da viscosidade do muco, o aumento do fluxo expiratório, da depuração ciliar e reexpansão pulmonar. Para tal, foi implementada terapia vibro-oscilatória intra e extratorácica (com o objetivo de modificar a reologia do muco, induzir a tosse por estimulação mecânica das vias aéreas e promover a reexpansão pulmonar), intercalada com modulação do fluxo expiratório de baixo a alto volume, huffing e técnica da expiração forçada.
A terapia de oscilação extratorácica de alta frequência foi utilizada com recurso a colete vibratório da marca Vest® durante três sessões de 16 minutos/cada. O protocolo usado foi diariamente adaptado com a definição dos parâmetros segundo a tolerância da pessoa, sendo descontinuada quando se constatou diminuição da viscoelasticidade do muco e aumento do fluxo de tosse, como se pode verificar no Quadro 3.
A terapia de vibração percussiva intrapulmonar de alta frequência foi utilizada durante os 5 dias do programa com recurso ao dispositivo Metaneb®, tendo o protocolo usado sido igualmente diariamente adaptado segundo a tolerância da pessoa, diminuição da viscoelasticidade do muco e aumento da expansibilidade pulmonar, como se constata no Quadro 4.
Oscilação extratorácica de alta frequência (Vest®) | ||||||||||||
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Parâmetros | 02/08/2021 | 03/08/2021 | 04/08/2021 | |||||||||
Oscilação (Hz) | 7 | 9 | 11 | 11 | 7 | 9 | 11 | 14 | 7 | 10 | 12 | 15 |
Pressão (nível) | 4 | 4 | 5 | 5 | 4 | 5 | 5 | 6 | 4 | 6 | 6 | 6 |
Duração (min) | 4 | 4 | 4 | 4 | 4 | 4 | 4 | 4 | 4 | 4 | 4 | 4 |
Vibração percussiva intrapulmonar (Metaneb®) | |||||||||||
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Parâmetros | 02/08/2021 | 03/08/2021 | 04/08/2021 | 05/08/2021 | 06/08/2021 | ||||||
CHFO | Oscilação (Hz) | BF | AF | BF | AF | BF | AF | BF | AF | BF | AF |
Duração (min) | 4 | 2 | 4 | 2 | 4 | 2 | 3 | 3 | 3 | 3 | |
CPEP | Pressão (cmH2O) | 10 | 10 | 15 | 20 | 20 | |||||
Duração (min) | 6 | 6 | 4,5 | 4,5 | 3 | ||||||
Resistência (nível) | Baixa/Média | Média | Média | Média | Média | ||||||
Aerossol Duração (min) | 6 | 6 | 6 | 6 | 6 | ||||||
Duração total da sessão (min) | 18 | 18 | 16,5 | 16,5 | 15 |
Legenda: CHFO - oscilação contínua de alta frequência; CPEP - pressão expiratória positiva contínua; BF - baixa frequência; AF - alta frequência;
No decurso do processo de reabilitação foram sistematicamente avaliados os diferentes parâmetros em estudo. No início a respiração caraterizava-se por ser mista e irregular (abdominodiafragmática ao 3º dia), com amplitude diminuída (normal ao 4º dia) e com recrutamento dos músculos acessórios até ao 3º dia, verificando-se uma melhoria gradual do padrão respiratório. A alta viscoelasticidade do muco condicionava um baixo e ineficaz fluxo de tosse, verificando-se uma melhoria das características do muco ao 3º dia de tratamento em virtude da aerossolterapia, terapia vibro-oscilatória e aquisição da capacidade para usar a técnica da tosse, como se observa no Quadro 5.
Parâmetros | 02/08/2021 | 03/08/2021 | 04/08/2021 | 05/08/2021 | 06/08/2021 |
---|---|---|---|---|---|
Tipo de respiração | Mista | Mista | Abdomino- diafragmática |
Abdomino- diafragmática |
Abdomino- diafragmática |
Ritmo | Irregular | Regular | Regular | Regular | Regular |
Amplitude | Diminuída | Diminuída | Diminuída | Normal | Normal |
Músculos Acessórios | Sim | Sim | Não | Não | Não |
Muco Cor Viscoelasticidade |
Presente Amarela Alta |
Presente Amarela Alta |
Presente Amarela Média |
Presente Amarela Baixa |
Presente Branca Baixa |
Tosse | Ineficaz | Ineficaz | Pouco eficaz | Pouco eficaz | Pouco eficaz |
Aerossolterapia | Sim | Sim | Sim | Sim | Sim |
Oxigenoterapia (L/min) | 2 | 2 | 2 | 2 | 2 |
Os cuidados de enfermagem de reabilitação respiratória foram orientados mediante a avaliação periódica da auscultação pulmonar de forma a titular os parâmetros das terapias instituídas. No pulmão direito constatou-se inicialmente uma diminuição global do murmúrio vesicular (MV) com presença de fervores crepitantes, verificando-se uma recuperação total ao 4º dia de tratamento. No pulmão esquerdo, a atelectasia total condicionava uma ausência do MV na 1ª sessão, o qual foi progressivamente recuperado e mantido nos terços superior e médio até à 5ª sessão, em linha com o aumento do fluxo de tosse a maior expansibilidade pulmonar, verificando-se esses aspetos no Quadro 6.
Data | 02/08/2021 | 03/08/2021 | 04/08/2021 | 05/08/2021 | 06/08/2021 | ||||||
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Bilateralidade pulmonar | Dta | Esq | Dta | Esq | Dta | Esq | Dta | Esq | Dta | Esq | |
Murmúrio Vesicular | 1/3 superior | D | A | D | D | M | D | M | M | M | M |
1/3 médio | D | A | D | A | M | D | M | D | M | M | |
1/3 inferior | D | A | D | A | D | A | M | D | M | D | |
Ruídos Adventícios | 1/3 superior | FC | A | FC | FC | A | FC | A | A | A | A |
1/3 médio | FC | A | FC | A | A | FC | A | A | A | A | |
1/3 inferior | FC | A | FC | A | FC | A | A | FC | A | FC |
Legenda: Dta - Direita; Esq - Esquerda; M - Mantido; D - Diminuído; A - Ausente; FC - Fervores crepitantes
A evolução dos parâmetros vitais traduz a eficácia do tratamento instituído, pela melhoria da SpO2 (93% vs 97%) e redução da frequência respiratória (20 vs 15 ciclos/min) da primeira para a última sessão, com o mesmo aporte de oxigénio administrado, como explanado no Quadro 7.
Parâmetros | 02/08/2021 | 03/08/2021 | 04/08/2021 | 05/08/2021 | 06/08/2021 |
---|---|---|---|---|---|
Tensão Arterial (mmHg) | 95/66 | 90/59 | 97/56 | 118/83 | 119/79 |
Frequência Cardíaca (bpm) | 80 | 91 | 84 | 83 | 79 |
Frequência Respiratória (ciclos/min) | 20 | 28 | 22 | 17 | 15 |
Temperatura (ºC) | 36,0 | 36,2 | 36,1 | 36,8 | 36,1 |
Oximetria (%) | 93 | 89 | 95 | 97 | 97 |
Pela análise dos valores obtidos nas gasometrias arteriais, pode verificar-se que as 3 primeiras sessões são marcadas por hipoxémia considerável, que não teve repercussões observáveis no registo de SpO2 nem da frequência cardíaca. Estes registos foram obtidos nas sessões realizadas com maior intervalo de tempo. Na última sessão existe uma estabilização geral dos parâmetros dentro dos limites estabelecidos pela bibliografia e uma ligeira melhoria da hipoxémia. Ainda decorrente dos resultados advindos da gasometria arterial, elucidados no Quadro 8, pode observar-se uma evidente melhoria da oxigenação, comprovada pelo aumento significativo da SpO2 sob a mesma FiO2. Do ponto de vista imagiológico, através da análise das telerradiografias, explanadas na Figura 1, os resultados são demonstrativos da evolução, pois no dia 02/08/21 verificava-se uma hipotransparência pulmonar em praticamente todo o campo pulmonar esquerdo com desvio do mesmo, sugestivo de atelectasia, ao passo que no dia 06/08/21 era notória uma resolução praticamente completa da atelectasia pulmonar esquerda, com o mediastino centrado, com uma ligeira opacidade no ângulo costofrénico.
Data | O2 (L/min) | pH | pCO2 (mmHg) | pO2 (mmHg) | Lact (mmol/L) | SpO2 (%) | HCO3 (mmol/L) |
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03/ 08/ 2021 | 2L/min | 7.46 | 51 | 63 | 2.3 | 93% | 36.3 |
06/ 08/ 2021 | 2L/min | 7.44 | 66 | 106 | 1,7 | 98% | 31.8 |
09/ 08/ 2021 | 1L/min | 7.44 | 66 | 96 | 1,5 | 97% | 44.8 |
16/ 08/ 2021 | --- | 7.44 | 57 | 93 | 1,9 | 98% | 38,7 |
DISCUSSÃO
Perante o caso clínico de uma pessoa portadora de atelectasia pulmonar obstrutiva secundária a tampão mucoso, foi delineado e implementado um programa de enfermagem de reabilitação alicerçado em evidência científica e harmonizado com a condição clínica, permitindo, desta forma, uma abordagem de caráter particular, multidisciplinar, com um cuidado centrado na pessoa, como descrito na literatura (6,10.
O método exposto e os resultados alcançados permitem expressar que os cuidados de enfermagem de reabilitação representam um papel preponderante na recuperação e a efetividade das intervenções no controlo e redução da dispneia da pessoa, potenciando a qualidade de vida da pessoa e a rapidez de recuperação22.
O programa de reabilitação na pessoa portadora de atelectasia pulmonar obstrutiva secundária a tampão mucoso deverá incidir sobre a ventilação, o expetorar e a capacidade e conhecimento sobre a técnica da tosse, pelo, que após a avaliação inicial de enfermagem de reabilitação foram identificados os focos e diagnósticos e delineadas intervenções de enfermagem de reabilitação assentes em: reeducação funcional respiratória, baseada nas técnicas de controlo e dissociação dos tempos respiratórios, expiração com lábios semicerrados, reeducação abdominodiafragmática, reeducação costal bilateral, abertura costal global e seletiva à esquerda com foco na inspiração até à capacidade pulmonar total e pausa teleinspiratória, vibração percussiva intrapulmonar e oscilação extratorácica de alta frequência. Perante o expetorar comprometido e o potencial de melhoria do conhecimento e da capacidade da técnica da tosse, foi realizado ensino, instrução e treino da técnica da tosse, com modulação do fluxo expiratório de baixo a alto volume, huffing e técnica da expiração forçada, tendo por base as intervenções efetivas descritas na literatura. Nesse sentido, o plano de intervenção concretizado teve como fundamento a evidência científica, sendo demonstrativo que uma prática baseada na evidência pode “melhorar os resultados do cuidado na pessoa ou criar diretrizes para a prática clínica”23.
A terapia vibro-oscilatória tem como objetivo promover a limpeza das vias aéreas, o recrutamento alveolar e melhorar as trocas gasosas. É uma técnica bem tolerada, não havendo efeitos adversos descritos na literatura11.
A implementação do plano de intervenção de enfermagem de reabilitação proporcionou ganhos em saúde na pessoa que se podem objetivar, nomeadamente na redução e controlo da dispneia, constatando-se igualmente melhoria das características da respiração, do muco, da auscultação pulmonar e analiticamente, como igualmente descrito na literatura científica (3,7. Estas melhorias foram obtidas de forma gradual e progressiva e são demonstrativas de um cuidado centrado na pessoa, onde o cuidar pode ser conceptualizado como uma “intervenção terapêutica focada em ações de cuidado que atendam às necessidades da pessoa e que resultem em melhorias positivas”24.
Apesar das limitações inerentes à condição clínica e particularidades da pessoa, é viável atestar que as intervenções do EEER são consideradas indispensáveis para alcançar os objetivos propostos e para a melhoria global da função respiratória, controlo e gestão dos sintomas (dispneia). Nesse sentido, é tácito que o EEER é detentor de conhecimentos específicos e fundamentados para avaliar, prescrever e implementar intervenções, concretizando o Processo de Enfermagem na pessoa com atelectasia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este relato de caso possibilitou evidenciar a relevância e efetividade das intervenções de enfermagem de reabilitação implementadas pelo EEER na pessoa portadora de atelectasia pulmonar.
Ao longo da implementação do programa foi necessária flexibilidade no sentido de um ajustamento, tanto das intervenções a implementar como dos objetivos previamente definidos. O cuidado centrado na pessoa surge como estrutura conceptual onde é suportada uma interação entre o enfermeiro e a pessoa e o cuidar como intervenção terapêutica que acarreta a possibilidade de resultados positivos para a pessoa.
O progresso da condição clínica da pessoa foi, de uma forma genérica, patente, ainda que as evidências se tenham revelado mais evidentes em determinados diagnósticos que culminaram na gestão de sintomas, como a dispneia. Nesse sentido, este relato de caso torna-se uma janela de oportunidade no sentido de evidenciar que o EEER é um dos elementos dinâmicos da equipa multidisciplinar promotor de uma recuperação mais célere e consequentemente uma gestão eficaz dos sintomas e concludentemente melhoria na qualidade de vida da pessoa, que se repercutiu numa alta precoce, reinserção na comunidade e diminuição do número de dias de internamento.
Estes dados reiteram a importância da intervenção do EEER junto da pessoa com alterações da função respiratória, através da implementação de um programa de reeducação funcional respiratória, de capacitação do utente e de gestão dos sintomas.
A técnica vibro-oscilatória aplicada neste caso concreto a um paciente com o diagnóstico de atelectasia pulmonar verificou-se eficaz. A utilização desta técnica deve ser ponderada, após consideração dos seus riscos/benefícios e mediante as características individuais da pessoa com necessidades de reabilitação funcional respiratória por Enfermagem de Reabilitação.