INTRODUÇÃO
O envelhecimento resultante do aumento da esperança média de vida e as situações agudas de doença, levam muitas vezes, à perda da capacidade funcional do utente.
A Teoria de Enfermagem do Défice do Autocuidado, desenvolvida por Dorothea Orem define autocuidado como uma função humana reguladora, ou seja, uma ação realizada pelas pessoas de forma voluntária para regularem o seu próprio funcionamento e desenvolvimento, ações que permitem garantir o fornecimento de requisitos necessários ao funcionamento do organismo.
De acordo com a Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE), autocuidado é uma atividade autoexecutável: cuidar do que é preciso para se manter, assegurar a sobrevivência e lidar com necessidades básicas, individuais e essenciais, e atividades da vida diária. O autocuidado diz respeito à prática de atividades que os indivíduos iniciam em seu próprio benefício, para a manutenção da vida, da saúde e do bem-estar.
Importa salientar as diferenças entre os conceitos autonomia, dependência e independência. A autonomia é a capacidade individual de decisão e comando sobre suas ações. É a capacidade e/ou o direito de uma pessoa escolher por si mesma as regras da sua conduta.
Dependência significa um estado em que a pessoa é incapaz de existir de maneira satisfatória sem a ajuda de outrem. Ao contrário, independência é a capacidade de realizar atividades sem ajuda de outra pessoa. É a capacidade da satisfação das suas próprias necessidades de forma independente.
A monitorização de ganhos em saúde é um tema bastante atual e adquire particular importância quando se fala em estratégias de melhoria continua de qualidade, avaliação do grau de satisfação dos utentes e dos resultados obtidos. Monitorizar é portanto, avaliar a qualidade dos cuidados de saúde.
O domicílio é o local privilegiado para a prestação de cuidados a utentes, por proporcionar a possibilidade de avaliar e intervir sobre os fatores familiares, socioculturais e económicos, que influenciam o contexto e o resultado dos cuidados de enfermagem. É também neste contexto que melhor se avalia a capacidade funcional, uma vez que se confronta a pessoa com a sua realidade do dia-a-dia, o que permite que a reabilitação aconteça com um maior grau de adaptação à realidade do utente.
A equipa de cuidados continuados integrados (ECCI) é uma equipa multidisciplinar da responsabilidade dos cuidados de saúde primários e das entidades de apoio social para a prestação de serviços domiciliários, decorrentes da avaliação integral, de cuidados médicos, de enfermagem, de reabilitação e de apoio social, ou outros, a pessoas em situação de dependência funcional, doença terminal ou em processo de convalescença, com rede de suporte social, cuja situação não requer internamento, mas que não podem deslocar-se de forma autónoma 6.
O Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Reabilitação (EEER) tem um papel fulcral no estabelecimento de estratégias para ultrapassar os condicionalismos que afetam a funcionalidade.
O EEER, detém conhecimentos e competências especializadas que lhe permite planear, implementar e gerir programas de reabilitação, em que a pessoa e família são os protagonistas na reconstrução do seu percurso de vida e processo de saúde. Compete ao EEER monitorizar a implementação e os resultados dos programas de reabilitação, avaliando e efetuando os ajustes necessários no processo da prestação de cuidados, que lhe permitem analisar a eficácia da sua intervenção, para poder transmitir ganhos em saúde sensíveis aos cuidados de enfermagem de reabilitação, promovendo práticas mais seguras e eficazes, junto da pessoa e família.
Optou-se pela realização de um estudo cuja problemática geral é a evolução da funcionalidade em contexto domiciliário, tentando obter resposta à questão de partida: “Qual a evolução da independência funcional, resultante da prestação de cuidados por parte do enfermeiro de reabilitação, em contexto domiciliário?”.
No sentido de responder à questão de investigação enunciada delineamos os seguintes objetivos: analisar a evolução do utente desde a admissão até ao momento da alta da ECCI, do nível de dependência física, nomeadamente para as seguintes atividades de vida diária (AVD): alimentar, higiene pessoal, urinar, defecar, deslocação, mobilidade, WC, vestir, banho e subir/descer escadas; identificar os contributos das intervenções do enfermeiro de reabilitação para os ganhos em independência funcional do utente e comparar a evolução dos utentes mediante algumas variáveis de atributo.
A realização deste estudo levou à reflexão sobre a eficácia da prestação de cuidados de enfermagem de reabilitação no sentido da promoção de ganhos em independência funcional do utente em contexto domiciliário. Pensamos que o presente estudo possa contribuir para a melhoria da prestação dos cuidados de enfermagem de reabilitação e para a identificação de possíveis lacunas existentes nesta.
METODOLOGIA
Elaboramos um estudo descritivo, retrospectivo que teve como finalidade avaliar a evolução funcional do utente do momento de admissão à alta numa ECCI do Agrupamento de Centros de Saúde (ACeS) do Baixo Vouga, de modo a compreender se os cuidados prestados pelo enfermeiro de reabilitação em âmbito domiciliário contribuem para a diminuição do grau de dependência do utente e consequentemente representam ganhos em funcionalidade.
Analisamos os registos de Enfermagem de Reabilitação, referentes aos utentes referenciados para continuidade de cuidados de reabilitação, para a ECCI em que decorreu o estudo, no período de janeiro de 2015 a dezembro de 2019.
Utilizamos os processos manuais, o aplicativo GestCare da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) e o Sistema de Informação S-Clínico, respetivos aos utentes selecionados. Construímos os instrumentos de operacionalização das variáveis em estudo que posteriormente utilizamos. A colheita de dados assentou na construção de uma grelha de registo da qual constaram dados sociodemográficos, causa de solicitação, diagnóstico e o instrumento de avaliação do grau de dependência - Índice de Barthel, avaliado na admissão e no momento da alta da ECCI. Optou-se por uma amostragem não aleatória e intencional.
Definimos como critérios de inclusão: o utente ter sido referenciado para cuidados de enfermagem de reabilitação na ECCI selecionada e internamento igual ou superior a oito dias. Como critério de exclusão definimos: internamento igual ou inferior a sete dias.
A intervenção do EEER constou na realização de intervenções domiciliárias de reabilitação três vezes por semana durante todo o período em que o internamento de cada utente decorreu. Foram implementados planos de reabilitação com incidência no ensino, instrução e treino das AVD, de equilíbrio, de força muscular e de marcha. O cuidador informal esteve presente durante as visitas domiciliárias de forma a receber ensino e instrução nas áreas supramencionadas, contribuindo também para a continuidade de cuidados.
Na análise estatística descritiva utilizamos frequências absolutas (n) e relativas (%); medidas de tendência central: média (M); medidas de dispersão: mínimo (Min), máximo (Max) e desvio padrão (DP). O nível de significância para o tratamento estatístico foi de 5% (p≤0,05%). Na análise inferencial foi utilizado o Teste Wilcoxon para amostras emparelhadas e Teste t.
A recolha de dados foi autorizada pelo Conselho Diretivo e pela Comissão de Ética para a Saúde da Administração Regional de Saúde do Centro - parecer 003389/04.02.2014 e respetiva adenda de 09.01.2020. O estudo foi conduzido de acordo com os padrões éticos e legais exigidos. Foi aplicado consentimento informado a todos os participantes.
RESULTADOS
A amostra foi constituída por 63 utentes, que foram acompanhados por enfermeiros de reabilitação, e que apresentaram idades compreendidas entre os 56 e os 104 anos. A média de idades situou-se nos 78 anos (m=78,41; dp=10,28), sendo que a idade mais frequentemente encontrada foi de 80 anos.
Relativamente ao género verificou-se que os utentes se distribuíram maioritariamente pelo género feminino (76,2%; n=48), e a grande maioria dos elementos encontrava-se casado/ou residia em união de facto (52,4%; n=33) ou viúvo (42,9%; n=27). Existiram 3 utentes solteiros (4,7%).
A principal causa de solicitação da intervenção da enfermagem de reabilitação foi a área traumática/ortopédica (60,3%; n=38), seguindo-se a área não traumática/médica (27;0%; n=17), a área neurológica (9,5%; n=6) e por último a área respiratória (3,2%; n=2). No que concerne ao diagnóstico principal pôde-se afirmar que a solicitação da intervenção de enfermagem de reabilitação se deveu na maior parte dos casos ao diagnóstico de fratura do fémur e posterior colocação de prótese total da anca (38,1%; n=24), destacando-se também a presença da Síndrome de Imobilidade (27,0%; n=17); o diagnóstico de coxartrose (9,5%; n=6), o diagnóstico de Gonartrose e o de Acidente Vascular Cerebral (AVC) (6,3%; n=4 cada).
Seguidamente apresentar-se-ão os resultados obtidos nas atividades da vida diária nos dois momentos de avaliação analisados. Assim, na tabela subsequente verificou-se que na avaliação inicial a maior parte dos utentes era independente em alimentar-se (mais propriamente 68,3%; n=43), mas a percentagem de elementos independentes na alimentação aumentou para 81,0% (n=51). Da mesma forma, também na atividade da higiene pessoal a percentagem de utentes independentes aumentou de 36,52% (n=23) para 81,0% (n=51) da primeira avaliação para a apreciação das capacidades após a intervenção de enfermagem de reabilitação.
Nas atividades de eliminação, nomeadamente no urinar, verificou-se que na avaliação inicial a maior parte dos utentes já era continente (68,3%; n=43), tendo esta percentagem aumentado ligeiramente para 76,2% (n=48) na avaliação final. No que respeita ao defecar o número de elementos sem problemas manteve-se da avaliação inicial para a final (81,0%; n=51), sendo que se verificou uma diminuição dos elementos incontinentes 11,1% (n=7) para 6,3% (n=4).
Por sua vez, e no que concerne à deslocação, observou-se que inicialmente poucos elementos se mostravam capazes de se deslocar de forma independente (9,5%; n=6) e a maior percentagem era incapaz de se deslocar (42,9%; n=27). No entanto, na avaliação final já existia 66,6% dos utentes que exibiu a capacidade de se deslocar sem qualquer ajuda (n=42) e somente 17,5% (n=11) se manteve incapaz de se deslocar. Na mobilidade o aparecimento de elementos independentes não foi tão visível, embora o valor de 39,7% (n=25) tenha adquirido a capacidade de marchar sem qualquer ajuda e constatou-se que decresceu o número de utentes totalmente imobilizados de 38,1% (n=24) para 17,5% (n=11).
Na utilização do WC a alteração percentual foi bastante expressiva. Na avaliação inicial somente 22,2% (n=14) eram independentes na utilização do equipamento, enquanto na apreciação final a percentagem de utentes independentes nesta atividade foi de 66,6% (n=42). Também na capacidade em vestir-se a percentagem de utentes totalmente dependentes decresceu de 31,7% (n=20) para 9,5% (n=6), e surgiu a percentagem de 58,7% (n=37) que passou a ser independente nesta tarefa.
No que respeita ao banho pôde-se afirmar que na primeira avaliação quase a totalidade de elementos era dependente antes da intervenção de enfermagem de reabilitação (98,4%; n=62), mas após a intervenção a percentagem de 42,9% (n=27) conseguia tomar banho sem qualquer ajuda. Por fim, no que concerne a subir e descer escadas, o valor de utentes incapazes decresceu de 68,3% (n=43) para 3,2% (n=2) e surgiu o correspondente a 41,3% (n=26) que na avaliação final foi independente em subir e descer escadas.
Tabela 1 Avaliação das Atividades de Vida Diárias Antes e Após a Intervenção de Enfermagem de Reabilitação
Inicial - Admissão | Final - Alta | ||||
---|---|---|---|---|---|
n | % | n | % | ||
Alimentar | Incapaz | 7 | 11,1% | 1 | 1,6% |
Com ajuda | 13 | 20,6% | 11 | 17,5% | |
Independente | 43 | 68,3% | 51 | 81,0% | |
Higiene pessoal | Com ajuda | 40 | 63,5% | 12 | 19,0% |
Independente | 23 | 36,5% | 51 | 81,0% | |
Urinar | Incontinente/algaliado | 8 | 12,7% | 7 | 11,1% |
Problemas ocasionais | 12 | 19,0% | 8 | 12,7% | |
Continente | 43 | 68,3% | 48 | 76,2% | |
Defecar | Incontinente | 7 | 11,1% | 4 | 6,3% |
Problemas ocasionais | 5 | 7,9% | 8 | 12,7% | |
Sem problemas | 51 | 81,0% | 51 | 81,0% | |
Deslocação | Incapaz | 27 | 42,9% | 11 | 17,5% |
Grande ajuda | 8 | 12,7% | 6 | 9,5% | |
Pequena ajuda | 22 | 34,9% | 4 | 6,3% | |
Normal | 6 | 9,5% | 42 | 66,7% | |
Mobilidade | Imobilizado | 24 | 38,1% | 11 | 17,5% |
Independente/cadeira de rodas | 1 | 1,6% | 5 | 7,9% | |
Marcha com ajuda | 36 | 57,1% | 22 | 34,9% | |
Independente | 2 | 3,2% | 25 | 39,7% | |
WC | Dependente | 27 | 42,9% | 11 | 17,5% |
Com ajuda | 22 | 34,9% | 10 | 15,9% | |
Independente | 14 | 22,2% | 42 | 66,7% | |
Vestir | Dependente | 20 | 31,7% | 6 | 9,5% |
Com ajuda | 39 | 61,9% | 20 | 31,7% | |
Independente | 4 | 6,3% | 37 | 58,7% | |
Banho | Dependente | 62 | 98,4% | 36 | 57,1% |
Sem ajuda | 1 | 1,6% | 27 | 42,9% | |
Subir/Descer escadas | Incapaz | 43 | 68,3% | 2 | 3,2% |
Com ajuda | 20 | 31,7% | 35 | 55,5% | |
Independente | 0 | 0,0% | 26 | 41,3% |
Através da tabela anterior foi possível verificar que existiu uma alteração percentual ao nível de todas as atividades avaliadas. Desta forma, e de modo a verificar se existe uma diferença significativa entre as duas avaliações, recorreu-se ao teste de Wilcoxon para testar a diferença entre as médias obtidas na avaliação inicial e a avaliação final.
Assim, constatou-se que a diferença significativa pôde ser assumida quase na totalidade de atividades de vida diária, exceto nas de eliminação em que a diferença não foi estatisticamente significante. Pelos resultados foi possível afirmar que os níveis de independência foram claramente mais elevados na avaliação final (momento da alta), após a intervenção de enfermagem de reabilitação, já que se pôde verificar que a média foi sempre mais elevada na avaliação final, consoante se apresenta na tabela 2.
Tabela 2 Comparação das Médias das Atividades de Vida Diária entre a Avaliação Inicial e a Avaliação Final
N | Média | dp | Teste t | |||
---|---|---|---|---|---|---|
t | p | |||||
Alimentar | Inicial | 63 | 7,86 | 3,45 | -3,380 | ,001 |
Final | 63 | 8,97 | 2,23 | |||
Higiene pessoal | Inicial | 63 | 1,83 | 2,43 | -6,629 | ,000 |
Final | 63 | 4,05 | 1,98 | |||
Urinar | Inicial | 63 | 7,78 | 3,57 | -1,761 | ,083 |
Final | 63 | 8,25 | 3,38 | |||
Defecar | Inicial | 63 | 8,49 | 3,32 | -1,000 | ,321 |
Final | 63 | 8,73 | 2,84 | |||
Deslocação | Inicial | 63 | 5,56 | 5,40 | -9,261 | ,000 |
Final | 63 | 11,11 | 5,99 | |||
Mobilidade | Inicial | 63 | 6,27 | 5,08 | -6,819 | ,000 |
Final | 63 | 9,84 | 5,46 | |||
WC | Inicial | 63 | 3,97 | 3,93 | -7,350 | ,000 |
Final | 63 | 7,46 | 3,90 | |||
Vestir | Inicial | 63 | 3,73 | 2,84 | -11,009 | ,000 |
Final | 63 | 7,46 | 3,35 | |||
Banho | Inicial | 63 | ,08 | ,63 | -6,819 | ,000 |
Final | 63 | 2,22 | 2,50 | |||
Subir/Descer escadas | Inicial | 63 | 1,59 | 2,35 | -9,510 | ,000 |
Final | 63 | 6,19 | 4,464 |
Da mesma forma que se constatou que existe uma diferença significativa em quase todas as atividades de vida diária, verificou-se se esta diferença se estende igualmente ao total do nível de independência. Na tabela 3 confirmou-se que na avaliação inicial a média encontrada é de 47,14 (dp=25,27) tendo passado para 74,86 (dp=30,92) na avaliação final. Esta diferença foi considerada estatisticamente significativa (t=-14,000; p <0,000), o que indicou que o nível de independência funcional dos utentes estudados aumentou consideravelmente após a intervenção de reabilitação.
Tabela 3 Comparação das Médias do Nível de Independência entre a Avaliação Inicial e a Avaliação Final
n | Média | Dp | Mediana | Moda | Teste t | |||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
t | p | |||||||
Total Inicial | 63 | 47,14 | 25,27 | 55,00 | 75 | -14,000 | ,000 | |
Total Final | 63 | 74,86 | 30,92 | 90,00 | 100 |
Ao confirmar os dados obtidos anteriormente através da comparação percentual entre os vários níveis de dependência observou-se que na avaliação inicial o equivalente a 20,6% (n=13) apresentou dependência total, o valor de 44,4% (n=28) manifestou dependência grave e 34,9% (n=22) estava moderadamente dependente. Após a reabilitação o valor de dependentes totais é de 12,7% (n=8) e surgiu a presença de dependência ligeira e de independentes (15,9%; n=10 e 33,3%; n=21 respetivamente). Através do teste de Wilcoxon confirmou-se que a diferença percentual foi significativa (Z=-7,106; p=0,000), reiterando, deste modo, que efetivamente o grau de independência aumentou consideravelmente após a reabilitação de enfermagem, conforme se apresenta na tabela 4.
Tabela 4 Comparação de Percentagem do Nível de Dependência entre a Avaliação Inicial e a Avaliação Final
Inicial | Final | Wilcoxon | ||||
---|---|---|---|---|---|---|
n | % | N | % | Z | p | |
Dependência Total | 13 | 20,6 | 8 | 12,7 | -7,106 | ,000 |
Dependência Grave | 28 | 44,4 | 12 | 19,0 | ||
Dependência Moderada | 22 | 34,9 | 12 | 19,0 | ||
Dependência Ligeira | 10 | 15,9 | ||||
Independente | 21 | 33,3 | ||||
Total | 63 | 100,0 | 63 | 100,0 |
DISCUSSÃO
A média das idades dos utentes em estudo situou-se nos 78 anos (78,41±10,28anos), corroborando com outros estudos,,.
Relativamente ao género, no nosso estudo, verificou-se que os utentes se distribuíram maioritariamente pelo género feminino em concordância com outros estudos que referem que a pessoa que recebe maioritariamente cuidados, tende a ser do sexo feminino,,.
Em relação à situação conjugal, a grande maioria dos elementos era casado ou viúvo, dados que vão de encontro aos estudos de outros autores que referem que as situações de viúvos e casados eram igualmente as que apresentavam maior frequência de pessoas idosas, embora com algumas diferenças de percentagem entre si,,.
A principal causa de solicitação da intervenção da enfermagem de reabilitação foi a área traumática/ortopédica, seguindo-se a área não traumática/médica, a área neurológica e por último a área respiratória, resultados contrários a outros estudos que evidenciam que a principal causa de solicitação foi a área neurológica ,,.
Relativamente ao diagnóstico principal pôde-se afirmar que a solicitação da intervenção de enfermagem de reabilitação se deveu na maior parte dos casos ao diagnóstico de fratura do fémur e posterior colocação de prótese total da anca, destacando-se também a presença da Síndrome de Imobilidade; o diagnóstico de coxartrose e com menor incidência o diagnóstico de Gonartrose e o de Acidente Vascular Cerebral (AVC). Existem autores que defendem que as doenças cerebrovasculares como é o caso do AVC são as que prevalecem na situação clínica,.
Na avaliação inicial, a maioria dos utentes admitidos na ECCI, referenciados para continuidade de cuidados de reabilitação apresentavam elevados níveis de dependência grave, corroborando com os estudos ,,.
No que respeita às atividades de vida diária importa referir relativamente à alimentação que a maior parte da amostra era independente quando foi referenciada para cuidados de enfermagem de reabilitação, 43 utentes independentes para 20 dependentes. Outros estudos mostraram que nesta atividade de vida diária, a maior parte dos utentes necessitavam de ajuda,.
Relativamente à higiene pessoal no momento da admissão dos utentes na equipa a percentagem de utentes independentes nesta atividade era de 36,5%. Após a intervenção do enfermeiro de reabilitação, no momento da alta o número de utentes independentes aumentou significativamente comprovando o demonstrado noutros estudos,.
No que respeita à AVD urinar mais de metade da amostra era continente. Dos restantes 20 que apresentavam algum tipo de dependência, 8 eram incontinentes. A incontinência verificou-se essencialmente nos grupos etários superiores. Estes dados contrariam os encontrados por outros autores em que a maior percentagem das pessoas estudadas eram incontinentes na avaliação inicial e verificou-se uma diferença estatisticamente significativa para a avaliação final no número de utentes que adquiriram continência,,.
Na AVD defecar, quase a totalidade da amostra era continente. Dos restantes 12 que apresentavam algum tipo de dependência, 7 eram incontinentes. Também outros autores verificaram que a maior percentagem de pessoas idosas era independente para esta atividade de vida diária, não necessitando de ajuda,. Nesta AVD também não se verificou uma diferença estatisticamente significativa na evolução da independência do momento de admissão para o momento da alta, no entanto, outros estudos verificaram que existiu essa diferença ,,.
Na análise global dos autocuidados, no nosso estudo foi percecionado que o autocuidado defecar se revelou como aquele em que existia um menor nível de dependência. Outros estudos demonstraram que foi o autocuidado arranjo pessoal que representou o menor nível de dependência 9), (10), (14).
Efetuando uma comparação entre as duas atividades de vida diária de eliminação o nosso estudo mostrou que a dependência na eliminação urinária é superior à dependência na eliminação fecal. De encontro a este resultado, outros autores verificaram que as pessoas idosas no geral necessitavam de uma maior prestação de cuidados no que se refere à incontinência urinária relativamente à incontinência fecal , ,.
Efetuando uma análise comparativa relativamente ao momento de admissão e alta da ECCI, na AVD deslocação podemos afirmar que inicialmente apenas 6 utentes se mostrava capaz de se deslocar independentemente, e a maior percentagem era totalmente incapaz em concordância com outros estudos ,, . No entanto, no momento da alta verifica-se que 66,7% dos utentes já exibia a capacidade de se deslocar sem qualquer ajuda e somente 17,5% se manteve incapaz, como demonstra também o estudo de outros autores,.
Na mobilidade numa fase inicial a maioria da amostra marchava com ajuda e 38,1% dos utentes encontravam-se completamente imobilizados, dados discordantes com outro estudo que refere que na avaliação inicial mais de metade da amostra se encontrava imóvel . No momento da alta o aparecimento de elementos independentes foi visível e constatou-se que decresceu o número de utentes totalmente imobilizados, o que também se verificou noutro estudo .
No que respeita ao uso do WC verificou-se que apenas 22,2% dos utentes eram independentes nesta atividade de vida diária, dados concordantes com os de outros estudos ,,. A evolução nesta atividade de vida diária durante o internamento foi bastante expressiva, sendo que na apreciação final a percentagem de utentes independentes nesta atividade foi de 66,7%.
Na atividade de vida diária vestir/despir na nossa amostra apenas 6,3% eram independentes. Tendo em conta a evolução durante o internamento a percentagem de utentes totalmente dependentes decresceu e 58,7% adquiriu independência nesta tarefa. Resultados semelhantes aos observados noutros estudos ,, , .
Relativamente aos cuidados no banho apenas um utente era independente. A restante amostra apresentava-se dependente nesta AVD, em concordância com os dados de outros estudos em que os utentes necessitavam de ajuda total nos cuidados de higiene , , . Após a intervenção de enfermagem de reabilitação verificou-se uma evolução positiva, sendo que 42,9% dos utentes já conseguia tomar banho sem qualquer ajuda.
O autocuidado onde se verificou uma maior dependência foi claramente o banho, seguindo-se o autocuidado vestir/despir, corroborando os achados de outros autores , , , .
Analisando a AVD Subir e Descer Escadas, na nossa amostra não existiram utentes independentes e os utentes incapazes representavam 68,3%, dados concordantes com o observado noutros estudos ,.
Os resultados obtidos demonstraram uma melhoria notória na independência funcional dos utentes, ao longo do período de internamento, o que nos leva a reconhecer a importância que os programas de reabilitação têm na promoção da independência funcional do utente, como defende outro estudo, ao afirmar que o enfermeiro de reabilitação é um dos profissionais que não só pelos conhecimentos técnico-científicos que possui, mas também pelo maior tempo de permanência próximo do utente, capacita-o para o autocuidado, e promove-lhe o máximo de independência.
Vários estudos comprovaram a existência de melhorias nas diferentes atividades de vida diárias, o que significa que a prestação de Cuidados Continuados Integrados teve um impacto positivo na funcionalidade dos utentes no que respeita ao autocuidado , , .
CONCLUSÃO
Os cuidados continuados domiciliários, prestados pelas equipas de cuidados continuados integrados, são cada vez mais importantes considerando a problemática atual e surgem como uma nova política de saúde.
Tendo em conta a filosofia dos cuidados continuados domiciliários o desafio profissional prende-se com a inclusão do utente e prestador de cuidados integrados no processo de decisão clínica. Só desta forma, num sistema de parceria, de partilha e de responsabilização é que é possível atingir a verdadeira eficácia da prestação dos cuidados. O enfermeiro de reabilitação tem um papel fundamental na continuidade de cuidados na medida em que ensina, instrui e treina competências do utente e prestador de cuidados informal de forma a que, também estes sejam os motores da evolução da funcionalidade na continuidade dos cuidados prestados.
O presente estudo pretendeu refletir sobre a problemática da evolução da funcionalidade em contexto domiciliário em utentes beneficiários de intervenções em enfermagem de reabilitação. Deste modo, tendo em atenção os objetivos do estudo a principal conclusão que podemos aferir foi que o teste de Wilcoxon comprovou no que respeita à funcionalidade que entre o momento da admissão (avaliação inicial) e o momento da alta (avaliação final) existiu uma evolução estatisticamente significativa em todas as atividades de vida diária exceto nas de eliminação. Pelos resultados é possível afirmar que os níveis de independência funcional foram claramente mais elevados nos utentes estudados, no momento da alta, após a intervenção de enfermagem de reabilitação.
O enfermeiro de reabilitação como gestor de caso dos utentes e parte integrante do sistema de saúde deve comprometer-se com a filosofia dos cuidados continuados. Consideramos que os resultados obtidos foram um importante contributo para a melhoria da prestação de cuidados de enfermagem de reabilitação ao nível domiciliário.
O estudo apresenta a limitação da amostra que se resume apenas a uma equipa de cuidados continuados integrados, o que reduz o leque do universo que poderia ser abrangido. Apesar das limitações inerentes a uma amostra por conveniência o estudo veio confirmar a importância do papel do enfermeiro de reabilitação como elemento-chave na evolução da independência funcional do utente no domicílio.