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População e Sociedade

versão impressa ISSN 0873-1861versão On-line ISSN 2184-5263

População e Sociedade  no.38 Porto dez. 2022  Epub 02-Jan-2023

https://doi.org/10.52224/21845263/rev38v1 

Varia

Em defesa da verdade histórica nos Descobrimentos: o pioneirismo historiográfico de Sebastião Francisco de Mendo Trigoso Homem de Magalhães [1773-1821] às vésperas do Liberalismo

In defence of historical truth in the Discoveries: the historiographical pioneering spirit of Sebastião Francisco de Mendo Trigoso Homem de Magalhães [1773-1821] on the eve of Liberalism

Eurico José Gomes Dias1 
http://orcid.org/0000-0002-2989-4912

1ISCPSI - Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna, ICPOL - Centro de Investigação, Lisboa, Portugal.


Resumo

As indagações historiográficas desenvolvidas por Sebastião Francisco de Mendo Trigoso Homem de Magalhães [1773-1821], um dos primeiros secretários da Academia Real das Ciências de Lisboa, contribuíram indelevelmente para a legitimidade e a defesa da primazia dos Descobrimentos portugueses. Numa época revolucionária que se viveu entre a passagem dos séculos XVIII e século XIX, sucederam-se igualmente as apropriações e as reescritas historiográficas dos Descobrimentos europeus, sendo que o pioneirismo das nossas navegações portuguesas foi fortemente contestado nos meios académicos e universitários europeus. Por força dessas reações e numa tentativa de repor a verdade históricas sobre essas matérias, Sebastião Francisco de Mendo Trigoso Homem de Magalhães propôs-se indagar as fontes históricas coevas e a refutar os estudos científicos então em voga, assim como a corroborar outras opiniões historiográficas sobre um dos períodos mais importantes da nossa História. A profundidade e a cientificidade dos seus estudos históricos influenciarão novas gerações de historiadores portugueses, entre os quais, a excelência científica de Alexandre Herculano [1810-1877].

Palavras-chave: Descobrimentos; Historiografia; Verdade; Revisionismo; Liberalismo.

Abstract

The historiographical inquiries developed by Sebastião Francisco de Mendo Trigoso Homem de Magalhães [1773-1821], one of the first secretaries of the Academia Real das Ciências de Lisboa, contributed indelibly to the legitimacy and defence of the primacy of the Portuguese Discoveries. In a revolutionary period that took place between the turn of the 18th and 19th centuries, appropriations and historiographical rewritings of the European Discoveries also took place, with the pioneering spirit of our portuguese navigations being strongly contested in european academic and university circles. Due to these reactions and in an attempt to restore the historical truth about these matters, Sebastião Francisco de Mendo Trigoso Homem de Magalhães proposed to investigate contemporary historical sources and to refute the scientific studies then in vogue, as well as to corroborate other historiographical opinions about one of the most important periods in our history. The depth and scientific nature of his historical studies will influence new generations of portuguese historians, including the scientific excellence of Alexandre Herculano [1810-1877].

Keywords: Discoveries; Historiography; Truth; Revisionism; Liberalism.

Declarando o triunfo da Ciência e as infinitas possibilidades oferecidas pelas Luzes em Portugal, mesmo que excessivamente desequilibradas perante as diferentes categorias sociais, científicas e culturais, foi perentória a propagação de obras científicas entre os finais do século XVIII e as primeiras décadas do século XIX. Neste contexto, as Memorias de Litteratura Portugueza (vols. I-VIII, 1792-1814), à semelhança de outras Memorias editadas pela Academia Real das Ciências de Lisboa, enquadravam-se nas exigências da difusão científica, consideradas unanimemente como “mensageiras” do Enciclopedismo e do Iluminismo, ainda que tardios, em Portugal. Além das Memorias de Litteratura Portugueza terem auxiliado à disseminação enciclopédica, foram um veículo proficiente na apresentação de outros contributos historiográficos nas mais diversas temáticas.

O cultivo da historiografia, decerto, não seria o primeiro interesse na promoção dos conhecimentos enciclopédicos, embora, neste caso particular, todas as Memorias coligidas versassem sobre História ou detivessem um suporte histórico. Sem serem nitidamente dedicadas a um tempo ou assunto histórico singular, os escritores que cooperaram nas Memorias de Litteratura Portugueza preocuparam-se, fundamentalmente, em providenciar informações credíveis e sujeitas a revisões constantes, sempre com a maior preocupação científica, transparecendo, em si, um fascínio pela «escrita» da História.

No decurso das iniciativas defendidas pelas Memorias de Litteratura Portugueza para a revisão historiográfica dos Descobrimentos portugueses, um primeiro ensaio de Sebastião Francisco de Mendo Trigoso Homem de Magalhães [1773-1821] tentou recuperar a memória histórica da família Corte-Real, célebre pelas suas navegações no Atlântico Norte (Sá, 1825, p. LXVII-XC). Este ensaio foi lido publicamente em meados de 1813, não deixando o Autor de prometer uma exposição ampliada, em virtude da profundidade do tema, então quase esquecido (Figueiredo, 1927, p. 52-53).

Além de fidalgo com assento na Casa Real, Sebastião Francisco de Mendo Trigoso - abreviando-se o seu nome completo, como o próprio habitualmente o assinalava -, frequentou o Real Colégio dos Nobres e completou o bacharelato em Filosofia na Universidade de Coimbra. Aquando a reação lisboeta ao invasor francês em 1807, chegou a ser nomeado tenente-coronel do Regimento de Voluntários Reais de Milícias a Cavalo de Lisboa, corpo militar que não chegou a organizar-se, sendo substituído pelo Regimento de Voluntários Reais do Comércio [1809] (Dias & Dias, 1980, p. 828).

Além de sócio de renome e um dos primeiros secretários da Academia Real das Ciências de Lisboa, com quem sustentou a mais profícua colaboração científica e literária, são de registar as suas solicitudes como censor régio da Mesa do Desembargo do Paço e nas comissões de censura criadas após a Revolução Liberal de 1820 (Ribeiro, 1873, p. 129-130). Um ataque fulminante de gota e o excesso de trabalho terão acelerado a sua morte a 18 de Maio de 1821, no preciso dia em que completou 48 anos de idade.

Este breve Ensaio engloba, portanto, uma revisão crítica das crónicas e dos autores portugueses sobre estas questões, complementada com as últimas notícias estrangeiras sobre as descobertas nas zonas setentrionais atlânticas. Por conseguinte, o Autor defendia a primazia das navegações portuguesas nesta região, devidas ao ímpeto dos irmãos Corte-Real e o velho ensejo de encontrar a ‘mítica’ passagem do Noroeste. Apesar da Coroa portuguesa apostar na circum-navegação africana, não deixou de acarinhar o projeto norte-atlântico e a possibilidade de alcançar os confins da Ásia navegando para ocidente, por entre as perigosíssimas rotas árticas.

Os irmãos Corte-Real são conhecidos por terem alcançado a Terra Nova, reclamando o seu domínio para Portugal, tendo explorando o Golfo de S. Lourenço. Estas costas recortadas abruptamente para o Atlântico, de florestas densas e gelos eternos, continuavam quase desconhecidas nos inícios do século XIX, como o Autor narrava (Magalhães, 1814, p. 317-319). Sebastião Francisco de Mendo Trigoso recordava as navegações vikings e as várias tentativas de colonização entre os séculos IX-XI, embora o registo dessas expedições estivesse circunscrito ao domínio das sagas nórdicas e em menções cartográficas imprecisas até aos inícios do século XVI (Arbman, 1967; Cohat, 1991; Kennedy, 2002).

Nas últimas décadas do século XV, as viagens portuguesas que buscavam um caminho para a Índia não deixaram de considerar uma via alternativa pelo ocidente para alcançar a parte mais oriental da Ásia. As viagens de Cristóvão Colombo [1451-1506] são um testemunho do interesse neste percurso, mas ocorreram numa latitude distante da Terra Nova, como se sabe (Marques, 1992). Foram numerosas as expedições que reivindicaram a descoberta de territórios que não se sabe se alguma vez foram verdadeiramente avistados. Neste contexto, poder-se-á incluir a eventual descoberta da Terra Nova em 1471, ou 1472, por João Vaz Corte-Real [c. 1420-1496] e Álvaro Martins Homem [?-?], numa missão luso-dinamarquesa apoiada por D. Afonso V (Larsen, 1925; Lopes, 1994, p. 499). Contudo, a Inglaterra, a França e a Espanha também promoveram algumas tentativas de atingir a costa nordeste do continente americano, explorando toda a Terra Nova, como foi o caso de Giovanni Cabot, ou John Cabot [c. 1450-1499], de Sebastian Cabot [c. 1474-1557] ou Jacques Cartier [1491-1557], entre outros navegadores mencionados neste Ensaio ( HYPERLINK \l "mkp_ref_036" , 1882, 1968; Williamson, 1962; Ramsay, 1993).

As condições meteorológicas do Atlântico Norte não eram favoráveis a uma navegação direta, a um rumo oeste, desde a Grã-Bretanha até ao continente americano, mas os navegadores ingleses há muito que conheciam as rotas entre as ilhas Faroé e a Islândia. Aqui praticava-se desde há muito a pesca do bacalhau, sobretudo nas vastas zonas piscatórias entre a Gronelândia e a Nova Inglaterra, mas só se dispunham de informações superficiais que pouco acrescentariam ao conhecimento geográfico de então:

Em quanto os Portuguezes, no Reinado do Sr. Rei D. Manoel, affrontavão as tormentas do Cabo da Boa Esperança; reconhecião, e pela primeira vez circum-navegavão toda a Costa d’Africa, e se empegavão no grande golfo da India; espalhando pelo Mundo, com a gloria dos seus descobrimentos navaes, a noticia do novo caminho que tinhão aberto para o Oriente (Peres, 1960, 1991; Fonseca, 1999): em quanto, desde o Tejo até ao Indo, quasi todos os Povos se tinhão feito tributarios da Coroa Portugueza, e a as outras Nações Europeas erão obrigadas a vir ao porto de Lisboa prover-se das nossas especiarias (Godinho, 1963), e applaudir com inveja os nossos triunfos: outros navegadores tambem Portuguezes, não contentes com seguir os vestigios de seus contemporaneos, intentárão huma empresa igualmente nova e atrevida (Brasão, 1965); a qual talvez por não ter tido hum exito tão feliz como a primeira, mereceo pouco a attenção dos antigos, e foi depois deixada em esquecimentos pelos modernos, que quizerão attribuir ás suas Nações descobrimentos, que propriamente nos pertencem: objecto que em parte conseguírão facilmente, por ter havido pouco quem revendique estes trofeos de nossos Maiores (Santarém, 1960). E na verdade, se alguns Escritores têm forcejado por desapossar-nos da originalidade daquelles descobrimentos, a favor da qual temos o voto unanime de authoridades coevas (Santos, 1814, p. 327-364), e pelo espaço de trezentos annos se attribuírão quasi constantemente aos Portuguezes o que succederá quando as provas e documentos em nosso abono são em pequeno numero, e pouco conhecidas? Neste caso hum silencio, mais fatal que as dúvidas da critica, será o fructo dos nossos trabalhos; e este destino, por certo não merecido, estava reservado aos nossos Corterreaes (Brasão, 1965; Vaz, 2000), que corrião os mares do Norte, quasi ao mesmo tempo que Vasco da Gama navegava pelos do Sul, e buscavam huma passagem ás Indias pelo Polo Artico (Quesada, 1978), quando realmente se effeituava outra pelo Cabo da Boa Esperança (Magalhães, 1814, p. 305-306).

Recordando a façanha histórica de Gaspar Corte-Real, navegador ao serviço de D. Manuel I e do qual, embora muitos dados biográficos sejam dúbios, era filho do navegador João Vaz Corte-Real, com quem terá começado a percorrer os mares, tendo, por volta de 1500, realizado uma viagem por sua iniciativa. Não sendo claro qual o seu destino, tudo leva a crer que se tenha dirigido para ocidente. Realizou no ano seguinte uma segunda viagem, mas também não é conhecido o seu destino, julgando-se que terá perecido num naufrágio (Harrisse, 1883, 1900).

Apesar da escassez de dados documentais, terá explorado o extremo meridional da Gronelândia, dobrando o cabo Farewell e seguindo a costa até ao Estreito de Davis. Ao não expedir notícias, Miguel Corte-Real partiu de Lisboa com o objetivo de levar provimentos ao seu irmão Gaspar, mas foi obrigado a regressar devido ao clima adverso. Em 1502, iniciou outra expedição, acabando por desaparecer misteriosamente. Segundo alguns investigadores, Miguel Corte-Real terá sido o autor das inscrições gravadas na «pedra de Dighton» (David, 1994, p. 355-356) enquanto explorava as costas da Terra Nova, mas tal interpretação há muito que foi desacreditada:

Se porém estas razoes não mostrão convincentemente, que a navegação de Cabotto he posterior á de Gaspar Corterreal (David, 1994, p. 301-302), tornar-se-ha isto indubitavel quando se reflectir, que sendo o testemunho de Ramusio o unico, ou para melhor dizer o mais authentico, pelo qual se lhe fixa aquelle anno; he este mesmo Ramusio o que nos assegura […] não já pelo que ouvio, mas pelo que concluio depois de todas as averiguações que pôde fazer, que Gaspar Corterreal fôra o primeiro que tentara pôr por obra a grande idéa de abrir hum caminho para a India, a travéz dos gelos do Polo Artico (Ramusio, 1606, p. 437). Os tres principaes Historiadores Portuguezes (Brochado, 1960), que fallão desta expedição, Galvão (Galvão, 1987, p. 94), Goes (Góis, 1749, p. 87-88), e Osorio (Osório, 1576, p. 63-64) fazem o Capitão della muito da privança do Sr. Rei D. Manoel, já desde o tempo em que era Duque de Béja. Criado pois na casa daquelle grande Principe, plenamente instruido das suas idéas e vastos conhecimentos, munido das instrucções que seu pai lhe podia communicar melhor do que ninguem, até a altura da Terra nova, dotado de hum animo capaz de superar as difficuldades e trabalhos, foi-lhe facil alcançar para a sua empreza huma licença, que se fez tanto mais graciosa, que o mesmo Monarca quis tomar parte nella, concorrendo com muitas das despezas necessarias (Lopes, 1991). Em a primavera do anno de 1500 desaferrárão do porto de Lisboa as duas embarcações, que para isto se tinhão apparelhado, pois ainda que Galvão affirme que partírão da Ilha Terceira (Galvão, 1987, p. 94), parece que isto se não deve entender senão pela demora, que ali tiveram em quanto refrescavão, tomavam alguma gente, e Gaspar Corterreal dizia o ultimo adeos á sua familia, parte da qual se achava estabelecida naquella Ilha; daqui seguindo huma derrota, em parte huma só vez trilhada, em parte totalmente nova para os navegadores Portuguezes, abordarão a huma Costa situada para o Norte, a que pozerão o nome de Terra verde (Sori, 1867, p. 79-80). O mesmo Galvão marca (ainda que com pouca exactidão) a posição della em 50 gráos (Galvão, 1987, p. 94), e os outros dois, principalmente Goes, descrevem as qualidades do Paiz (Góis, 1749, p. 87-88), e alguns usos dos seus habitadores (Magalhães, 1814, p. 311-312).

Posteriormente, Vasqueannes Corte-Real [?-?], irmão dos anteriores navegadores, solicitou permissão à Coroa para continuar as buscas pelos desaparecidos, mas D. Manuel I não lho autorizou (David, 1994, p. 305). A partir de então, as viagens à Terra Nova passaram a ser frequentes e com interesses comerciais que nada tinham a ver com a procura de um acesso para a Ásia. Portugal consolidava a rota do cabo da Boa Esperança para a Índia e os navios que buscavam o noroeste do Atlântico dedicavam-se, quase em exclusivo, à pesca do bacalhau. A presença portuguesa na região intensificou-se, pois desde 1504 as representações cartográficas da Terra Nova estão repletas de topónimos portugueses, alguns dos quais ainda existem ou foram adaptados para a língua anglo-saxónica. Desde então, as principais atividades da população residente continuam a ser a pesca e a exploração mineira. Deste modo, a relevância comercial deste circuito comercial deveria ser novamente reivindicada, princípio que Sebastião Francisco de Mendo Trigoso defendeu, a bem da economia mercantil portuguesa:

E não pareça que era sómente ao mar da Terra nova, que neste tempo reputavamos ter direito (Carvalho, 1994, p. 1026-1028); ainda mesmo que ignoremos se prosperou a Colonia, para ali mandada no principio deste estabelecimento (Albuquerque, 1987, p. 149-156); he fóra de toda a dúvida, que hum systema analogo ao que seguiamos nas outras partes, aonde tinhamos trato mercantil, devia ter ali feito estabelecer huma ou mais Feitorias, não só para prover as necessidades da nossa marinha, mas para proteger hum local proporcionado a hum tão grande trafico (Silva, 1869, p. 547-548). Foi sem dúvida para exprimir isto mesmo, e a pacifica posse em que estavamos, ao menos de huma porção daquelle territorio, que em alguns Mappas que ainda existem (Pereira, 1990, p. 286-287), e principalmente em hum, feito em 1563 por Lazaro Luis (Albuquerque, 1994, p. 629), o qual se conserva em o Cartorio da Academia (ACL, 1991), se desenha huma porção da Costa da Terra nova, onde se pescão os bacalháos, não só com muitos nomes Portuguezes, mas com o Estendarte das Quinas, fluctuando dentro daquelle Paiz (Matos, 2001, p. 8-20). Com bem sentimento conhecemos, que tão grande prosperidade passou como hum sonho: hum genero, que fazia grande parte do anno o principal sustento do povo, e em cuja extracção, preparação, e commercio, achavão subsistencia hum grande numero de indivíduos, cahio de todo nas mãos dos Estrangeiros, a quem somos obrigados a comprallo a peso d’ouro (Kurlansky, 2000, p. 49-56). As revoluções politicas conspirárão com as revoluções da Natureza, para nos fazer perder o fructo de todas as nossas fadigas. Ao pesado dominio dos Filippes (Bouza Álvarez, 2000); á aniquilição da nossa Marinha de Guerra e Mercante, e ás desastrosas guerras de Hollanda (Pedrosa, 2009); ajuntou-se a decadencia da Barra de Vianna (Moreira, 1995, p. 233-245), e a perdição da de Aveiro (Carvalho, 1814, p. 49-83): o seu commercio, até mesmo a sua população soffrêrão tanto, que em 1690 pouco mais se conservava (Amorim, 2004, p. 153-164), do que a lembrança de huma opulencia já de todo extincta: porém ainda neste tempo a maior parte dos Geografos Estrangeiros se servião dos nomes Portuguezes para descrever a Costa da Terra nova: isto mesmo foi desapparecendo pouco a pouco; as outras Nações, que não dormem sobre os seus interesses, se aproveitárão do letargo em que a força das circunstancias tinha sepultado a nossa; e apoz a perda de tantos lucros, seguio-se a da memoria das emprezas dos Portuguezes daquelle memoravel Seculo, e o nome dos Corterreaes ficou quasi de todo desconhecido (Vidago, 1965, p. 123-140). A pezar de tudo não se abandonou o projecto que tinha dado origem a estas nossas viagens. Se dessemos credito a alguns Authores, serião os Portuguezes os que achassem esta nova Pedra Filosofal, do caminho ás Indias pelo Norte da America, que tanto trabalhárão até aos nossos dias as Nações Maritimas da Europa Malo de Luque, 1788, p. 584-585; Brosses, 1756, p. 77), principalmente a Inglaterra. Não he do nosso assumpto referir as diligencias dos Capitães Midelleton (Middleton, 1744), Smith (Neves, 1996), Moore (Moore, 1744), e ultimamente do celebre Philipps nesta tentativa (O’Reilly, 1818, p. 55-56), que até agora ficou frustrada: a viagem deste ultimo, combinada com a terceira que fez o immortal Cook (Lisboa, 1795, 1819), parecem bastantes para fazer ver a impossibilidade de semelhante descobrimento por aquelle lado do Globo (Magalhães, 1814, p. 323-326).

A procura de novas rotas marítimas estimulou a edificação das economias europeias e afastado o rival napoleónico após a batalha de Trafalgar [1805], a Inglaterra dominaria os mares até às vésperas da Primeira Guerra Mundial. Com o progresso da Revolução Industrial que se avizinhava, os fluxos comerciais mundiais exigiriam rotas e itinerários mais rentáveis, daí o interesse em conhecer devidamente a Passagem do Noroeste. Assim, o Autor renderá homenagem às viagens de James Cook [1728-1779] e as principais expedições efetuadas, mantendo-se um assunto pautado pela maior atualidade no dealbar do terceiro milénio (Waterman, 2001; Williams, 2003; Huntford, 2009).

Finalmente, a última das 55 Memorias que compõem as Memorias de Litteratura Portugueza foi consagrada à vida e obra do quase ignorado Martin Behaim [Nuremberga, 1459-Lisboa, 1507], conhecido entre os nossos autores por Martim, ou Martinho, da Boémia (Pohle, 2007). Aqui seria evidenciada a sua participação no campo da Cartografia portuguesa (Crone, 1961) - é famoso o Erdapfel [ou «Maçã do Mundo»], o globo terrestre que fabricou -, e a sua experiência atlântica, sem deixar de referir a sua ingerência no arranque da colonização do Faial, nos Açores (Serpa, 1929, p. 27-28).

Retomando a publicação de trabalhos historiográficos com novas abordagens metodológicas, onde sobressaía a contestação, ou corroboração, de autores estrangeiros, esta Memoria contou com a supervisão de António Ribeiro dos Santos, ainda que Sebastião Francisco de Mendo Trigoso discordasse daquele erudito em alguns pormenores. Por conseguinte, alude às razões porque este aventureiro alemão subsistia uma personagem polémica na História dos Descobrimentos. Pela cientificidade e o debate que ocasionou no seio da Academia Real das Ciências de Lisboa, esta Memoria conserva-se atualíssima (Amado, 1994, p. 127-128). Os Behaim pertenciam à classe burguesa de Nuremberga e prosperaram com o comércio internacional, pelo que não seria de admirar a formação mercantil de Martin Behaim, a qual começou em Antuérpia. Encontrava-se familiar e profissionalmente ligado aos Hirschvogel, uma das casas comerciais de Nuremberga financiadoras do comércio das especiarias (Pedreira, 1998, p. 171).

Em resultado destes contactos comerciais, Martin Behaim partiria para Portugal em meados de 1484 e, perante as suas credenciais, seria armado cavaleiro por D. João II em Alcáçovas [1485]. Logo após, faria parte de uma missão à costa ocidental de África (Alegrete, 1998, p. 94-95), capitaneada por Diogo de Azambuja [1432-1518], embora esteja por provar cabalmente a sua participação noutra viagem capitaneada por Diogo Cão [?-?] (Peres, 1943, p. 201-210). Ainda na década de 1480 contraiu matrimónio com Joana de Macedo [?-?], filha do flamengo Josse van Hurtere [1430?-1495], primeiro capitão-donatário das ilhas do Pico e Faial, e de Brites de Macedo [?-1531], do qual nasceria um filho com o mesmo nome paterno [1489] (Oliveira, 1960).

Em 1490, Martin Behaim regressaria a Lisboa e daí seguiria uma última vez para Nuremberga, onde permaneceria até 1493. Aproveitou a estadia na sua cidade natal para fazer o célebre Erdapfel, o mais antigo globo terrestre ainda existente, coadjuvado por Ruprecht Kolberger [1470-1505] (Muris, 1943). Após uma breve paragem no regresso a Portugal, logo visitaria os Países Baixos como enviado de D. João II e representante do seu sogro em negócios tocantes ao açúcar. Embora possuísse casas nos Açores, perde-se o rasto de Martin Behaim até algum tempo antes da sua morte. Sabe-se que se encontrava em Lisboa, onde morreu doente e completamente arruinado, a 29 de julho de 1507:

Os Escritores, que fallárão de Martim de Bohemia, diversificão muito a respeito do lugar do seu nascimento; Robertson o faz nascido em Portugal (Robertson, 1812, p. 367-368), Herrera na Ilha do Fayal (Tordesillas Herrera, 1730, p. 2), Christovão Cælario o reputa natural de Krumlau na Bohemia (Celari, 1730, p. 203), e os nossos Historiadores dizem em geral que era Alemão: com effeito está hoje demonstrado, que elle nasceo na Cidade de Nuremberg, onde ainda nos nossos dias se conservavão restos daquella familia, em cujo poder existem os documentos authenticos, d’onde algumas destas noticias são tiradas (Murr, 1802). Seu pai chamava-se tambem com o mesmo nome, e descendia de huma antiga linhagem Alemã; tinha elle casado em Nuremberg com huma Senhora, por nome Agnes Scopper de Schoppershof, e desta união nascerão huma filha, e cinco filhos; o mais velho dos quaes foi este de quem tratamos, que veio ao mundo em os fins do anno de 1430 [sic] . […] Em 1474 falleceo o Pai de Martim de Bohemia; e de 8 de Junho de 79 data a ultima carta deste para seu Tio (Jansen, 1787, p. 299); era ella escrita de Anvers, onde nesse tempo as cousas de Portugal estavão muito em voga (Almeida, 1993), não só pelos Soberanos daquelle Paiz serem proximos parentes da Real Casa Portugueza (Martins, 2011), mas porque faziamos alli hum commercio consideravel, e era frequente a emigração dos Flamengos para o nosso Reino, e para as Ilhas dos Açores: he mesmo provavel que desde então datasse a amizade entre elle e Job de Huerter, a quem os nossos chamárão Jos de Utra, […]. O que he certo he, que ou fossem estes, ou outros quaesquer motivos que o obrigassem, nesta occasião he que elle se resolveo a passar a Portugal, onde chegou estando ainda no throno o Sr. D. Affonso V., isto he antes de Agosto de 1481 (Silva, 1945, p. 327). […] Entretanto porém que isto não tinha lugar, não estava ocioso o seu espirito, antes pelo contrario buscava todos os meios de aperfeiçoar a Arte da Navegação: os Mathematicos, e Cosmographos do seu tempo tinhão a certeza de receber delle hum acolhimento honroso; e Martim de Bohemia, ainda que não tivesse outro titulo, senão o de discipulo de Monte Regio (Campos, 1985, p. 515-518), podia estar seguro de fazer a sua fortuna (Magalhães, 1814, 367-369).

Embora a sua participação nos Descobrimentos não esteja definida em toda a sua plenitude, tal como Sebastião Francisco de Mendo Trigoso recordou, importava divulgar a importância o globo de Martin Behaim, praticamente desconhecido à época [e não só] em Portugal. Apesar de representar o mundo nos preceitos pré-colombianos, é revelador dos enormes contributos da Expansão portuguesa para uma nova imago mundi, ocasionando uma discussão erudita, especialmente em Nuremberga, e por nas esferas intelectuais germânicas. É considerado um dos primeiros globos cartográficos, visto não existir notícia de outras representações em forma de globo, o qual demonstrava indubitavelmente o conceito da esfericidade do planeta (Marques, 1987, p. 220-222).

Nesta discussão, até o imperador Maximiliano I de Habsburgo [1459-1519] tomaria parte, como documenta uma epístola do humanista alemão Hieronymus Münzer [1437-1508] a D. João II, datada de 1493, na qual era proposto ao rei de Portugal uma expedição conjunta, via ocidente, com destino a Cataio, onde se esperava encontrar as prometidas terras das especiarias (Otto, 1805, p. 265-275; 352-362). Não se sabe em quantas expedições marítimas Martin Behaim terá participado, mas, pelas indicações que se encontram no referido globo e outras fontes, deve ter visitado o Golfo da Guiné e participado na luta contra os muçulmanos.

Terá conhecido inteiramente o arquipélago dos Açores, onde o prendiam laços familiares. Independentemente da sua intervenção pessoal nos Descobrimentos, é de reconhecer que Martin Behaim simboliza a primeira estirpe de comerciantes germânicos estabelecidos em Portugal (Winter, 1961; Daehnhardt, 1998, p. 64-69), os quais foram extremamente importantes para o progresso das relações luso-alemãs nos séculos XV-XVI:

Os Authores que escrevêrão a sua Historia, ao menos a maior parte, fundados em hum supposto documento de Nuremberg, fazem-no armar Cavalleiro da Ordem de Christo aos 18 de Fevereiro de 1485; mas além de que esta época he visivelmente falsa, porque então estava elle ainda nas vizinhanças do Congo, as circunstancias do tal diploma são de todo inverosímeis (Radulet, 1988, p. 115-116). O Sr. Antonio Ribeiro dos Santos, em huma muito erudita Memoria sobre os Mathematicos Portuguezes (Santos, 1812, p. 164-165), fallando neste de passagem, diz que o Sr. Rei D. João II. lhe dêo as honras de seu Escudeiro, mas não podémos ainda averiguar donde elle tirou aquelle facto: parece porém evidente que, ou por esta, ou por outra maneira, não deixaria de ser bem recompensado de hum Rei, que extremamente o estimava, e que delle fazia toda a confidencia. […] Não foi tambem menos sensivel ao regozijo, com que o recebêrão os outros habitantes daquella Cidade [Nuremberga], que o olhavão como hum homem extraordinario, e o maior viajador do seu tempo. Para de alguma sorte corresponder a estas demonstrações de obsequio, he que elle quiz deixar uma prova duravel do seu agradecimento; demorando-se ali até concluir o celebre Globo terrestre, […]; que Dopelmayer (Doppelmayr, 1730, p. 27-31) e Murr nos descrevêrão (Murr, 1802, p. 11-47); […] O Globo tem de diametro hum pé e oito pollegadas de París, e está assentado sobre hum alto pedestal de ferro; o seu Meridiano he tambem de ferro, porém o Horisonte he de latão, e foi feito muito tempo depois, como se vê de huma inscripção que tem no rebordo, a qual diz: Anno Domini 1510, die 5 Novembris. Os differentes senhorios das terras são indicados pelas bandeiras das Potencias respectivas, as quaes são coloridas, assim como as moradas, e figuras dos habitantes de cada Paiz. Os nomes dos lugares são escritos com tinta vermelha e amarella, sobre hum pergaminho bastante denegrido (Pinkerton, 1812, p. 395-420). Como alguns chegrárão a avançar, que já neste Globo vem desenhada a America, ainda que, […] sera conveniente certificar desde já, que he hum engano (Cortesão, 1935, p. 126-133). O Cypango he o Paiz que ali se vê mais avançado para o Este, e he representado como huma grande Ilha oblonga, que quasi rectangular, cortada superiormente na terça parte do seu comprimento pelo Tropico de Cancro. Superior a Cypango, e quasi no mesmo Meridiano, estão as Ilhas do Cathayo; e desde ali até o Meridiano da ultima Ilha de Cabo Verde, não se vê terra alguma, quer para o lado Austral, quer para o Meridional, senão a supposta Ilha de S. Brandão (Nascimento, 1998), e a outra a que elle chama Antilia ou Sete Cidades, quasi debaixo do mesmo Tropico de Cancer: em fim não se tira deste Globo a menor idéa de que seu Author tivesse, na epoca em que foi feito, noticia alguma da America (Sousa, 1801, p. 402-404). Continuando com a sua descripção; na parte inferior delle, e perto do Polo Antartico, está pintada em hum circulo de 7 pollegadas de diametro a Aguia de Nuremberg com a cabeça da Virgem, e por baixo as Armas da Familia de Nutzel; á direita as da Familia de Volkamer, e de Behaim; e á esquerda as das Familias de Groland e de Holzchuer (Stockler, 1819, p. 110) […]. Desde esta época, que foi tambem com pouca differença a da morte do Sr. D. João II., cessárão as peregrinações de Martim de Bohemia; e a sua vida na Ilha do Fayal passou tranquilamente, repartida entre o estudo, e o cuidado da sua Familia, augmentada com mais hum Filho, que parece não durou muito (Serpa, 1936, p. 402-411). Os seus conhecimentos, principalmente na Geografia e Astronomia, erão taes, que os seus amigos, e em geral todos aquelles Povos o olhavão com huma reverencia supersticiosa, tanto erão certos os seus calculos, e prognosticos. Podem ver-se em Fr. Gaspar Fructuoso (Frutuoso, 1998), e no Liv. 9. Cap. 8. da Historia Insulana sufficientes noticias a este respeito (Cordeiro, p. 322-323). Corria o anno de 1506. quando elle resolveo a vir com a familia para Lisboa, onde encontrou seu Irmão mais moço por nome Wolf, ou Wolfrath, que aqui veio ter (Strasen & Gândara, 1944, p. 99). Ainda que não saibamos ao certo o motivo desta ultima viajem, póde conjecturar-se com toda a probabilidade que ella foi feita por ordem superior, com o fim de aproveitar os seus conhecimentos Geograficos em a construcção de algumas Cartas Maritimas, de huma das quaes […] ainda se conserva memoria. Mas estes novos serviços forão de pouca duração, pois consta por documentos authenticos, que falleceo a 29 de Julho daquelle mesmo anno [corrija-se, a 29 de Julho de 1507, ao invés de 1506], e jaz enterrado na Igreja de S. Domingos junto ao Rocio (Magalhães, 1814, p. 376-385).

A construção de uma biografia de Martin Behaim contrasta entre uma intervenção menor na História dos Descobrimentos e a historiografia alemã, de pendor mais nacionalista, a qual continua a louvar as façanhas do seu compatriota (Ravenstein, 1908). As aventuras e os contributos cartográficos de Martin Behaim para os Descobrimentos permanecem marcos enigmáticos nas relações luso-alemãs dos séculos XV-XVI, tal como Sebastião Francisco de Mendo Trigoso elucidou os leitores das Memorias de Litteratura Portugueza. O percurso biográfico de Martim Behaim esteve sempre envolto em polémica, muito por força das inúmeras fantasias veiculadas quanto à sua pessoa, não raras vezes perduráveis:

Vê-se pois que nada ha mais natural, do que, na assistencia de Martim de Bohemia em Lisboa por aquelle tempo, ter elle redegido hum Mappa ou Globo, no qual viessem demarcados todos os descobrimentos modernos, e principalmente os de Americo. Póde mesmo dar-se que a sua vinda a Portugal fosse para este fim, visto o amor do Sr. D. Manoel pelos Estudos da Geografia, e a reconhecida pericia daquelle homem em a confecção das Cartas marítimas (Pereira, 2003, p. 78-80). A Inscripção que já citamos na primeira parte, e que o appellida de Cosmografo, e Mathematico daquelle Monarca, parece dar maior peso a esta asserção, pois não nos occorre outro objecto, em que elle podesse desempenhar então melhor aquelles títulos (Morris, 1855). Eis-aqui quanto pude averiguar com mais certeza a respeito de Martim de Bohemia, e posso assegurar a Academia, que puz da minha parte toda a diligencia para satisfazer as vista do Professor Gebauer (Gebauer, 1759, p. 121-125) na sua Historia de Portugal (Magalhães, 1814, p. 400-401).

Os seus apologistas atribuíram-lhe, algumas décadas após a sua morte, o engenho de ter sido o principal mentor de Cristóvão Colombo [1451-1506], assim como membro da oculta Junta de Matemáticos. Os seus dotes de cartografia e cosmografia foram amplificados, havendo quem defendesse que tinha introduzido o astrolábio, a balestilha a as tábuas astronómicas do astrónomo alemão Johann Müller, do qual Behaim “se gloriáua ser discipulo”, segundo a tradição assinalada pelo cronista João de Barros. a esfericidade é um axioma brilhante, contrariando a tablatura da Terra e abrindo o caminho para a compreensão loxodrómica, atendendo ao cálculo de rotas sem referenciais dicotómicos adequados (Barros, 1988, p. 127).

Convém recordar que não existem dúvidas que Martin Behaim tenha intentado os maiores esforços na propagação de notícias ligadas aos Descobrimentos portugueses por todo o Sacro Império Romano-Germânico, alimentando o intercâmbio comunicacional onde o estímulo da tipografia assumiu a maior pertinência, como António Ribeiro dos Santos demonstrou (Santos, 1812, p. 1-147). Os conhecimentos que transmitiu conduziram à intensificação dos intercâmbios comerciais e intelectuais entre os circuitos humanistas alemães com os meios renascentistas portugueses.

Nesse sentido, as investigações científicas de Sebastião Francisco de Mendo Trigoso Homem de Magalhães, ainda que perfeitamente esquecidas na atualidade, foram cruciais para a renovação dos estudos histórico-historiográficos na passagem do século XVIII para o século XIX. Indubitavelmente, estes trabalhos servirão de exemplo a seguir para as novas gerações de historiadores, de onde se sobressairá a figura de Alexandre Herculano [1810-1877], pugnando por uma História estritamente científica e sempre intimamente ligada à afirmação e consolidação do Liberalismo entre nós.

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Recebido: 24 de Outubro de 2022; Aceito: 06 de Dezembro de 2022

Correspondence: Eurico José Gomes Dias E-mail: egdias@psp.pt

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