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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  n.191 Lisboa abr. 2009

 

Judicialização da política no Brasil: controlo de constitucionalidade e racionalidade política

Ernani Carvalho*

 

 

No Brasil a Constituição de 1988 revelou um desenho institucional da revisão judicial altamente propício à judicialização da política. Veremos que o aumento das entidades com legitimidade para proporem uma revisão judicial e a autonomia do poder judicial são variáveis determinantes para a compreensão do fenómeno da judicialização da política no Brasil. Os dados demonstram, no entanto, que não existe uma participação crescente do Supremo Tribunal Federal no mundo político propriamente dito, pelo menos no que tange à revisão abstracta da legislação no contexto federal.

Palavras-chave: judicialização da política; revisão judicial; poder judiciário; controlo; Constituição.

 

 

The judicialization of politics in Brazil: monitoring constitutionality and political rationality

The Brazilian Constitution of 1988 revealed that institutional procedures for judicial review were organized in a way which was highly conducive to the judicialization of politics. This article will show that the increase in the number of bodies which could legitimately apply for judicial review, and the independent power of the judiciary, are key variables in understanding the phenomenon of the judicialization of politics in Brazil. The data also show, however, that there was no ongoing increase in the extent to which the Federal Supreme Court intervened in the world of politics as such, at least as far as the abstract revision of legislation in the federal context is concerned.

Keywords: judicialization of politics; judicial review; power of the judiciary; monitoring; Constitution.

 

 

Introdução

A judicialização da política é um tema que vem sendo estudado em todo o mundo. As democracias ocidentais têm observado que os tribunais são cada vez mais parte importante do processo político. Na Europa, o fenómeno da judicialização ganhou força com a democratização do continente, o mesmo se verificando na América do Sul.

O termo "judicialização da política" entrou no vocabulário da ciência política contemporânea pelo esforço analítico apresentado de forma colectiva em The Global Expansion of Judicial Power, coordenado por T. Vallinder e C. N. Tate (1995)1. Nos estudos desta colectânea existem várias tentativas para definir a judicialização da política. De uma forma geral, podemos afirmar que o termo procura abarcar causas e consequências da expansão do poder judiciário no processo decisório das democracias contemporâneas.

Na nossa análise, a judicialização será entendida como um fenómeno que potencia a participação dos membros do poder judiciário no policy-making. Distinguimos então o carácter potenciador, que é caracterizado pelos aspectos formais ou procedimentais, do seu carácter substantivo, que é a intenção dos operadores da lei em participarem no policy-making. Na nossa leitura, a dimensão substantiva ocupa-se de outro fenómeno, o activismo judicial.

A literatura neoinstitucional da ciência política que aborda o tema da judicialização tomou a revisão abstracta da legislação como foco do debate empírico e aponta o desenho institucional como elemento potenciador da judicialização. A proposta deste artigo é seguir a trajectória da literatura internacional e centrar a análise no desenho institucional de parte significativa do controlo de constitucionalidade no Brasil (controlo abstracto). Para tanto, o artigo vai tomar como ponto central a análise empírica das acções directas de inconstitucionalidade (ADINs) e duas abordagens explicativas do fenómeno da judicialização: a policy-seeking approach e a unconstrained courts approach.

Através de um estudo de caso, pretendemos demonstrar que os actores que intentem uma acção directa de inconstitucionalidade estão, em grande medida, racionalmente orientados pelos seus interesses, o que vai ao encontro da visão mais "optimista" da literatura brasileira sobre este assunto, que considera que as acções destes actores se pautam por uma ética republicana. Neste artigo procuramos argumentar que o Supremo Tribunal Federal não tem protagonizado um processo de interferência sem precedentes na história brasileira, como sustenta parte da literatura especializada no Brasil. Pelo contrário, actua de forma idêntica à dos seus congéneres no continente sul-americano, procurando evitar, sobretudo, os conflitos com um executivo extremamente poderoso. Entretanto, no caso brasileiro, é possível perceber uma pró-actividade bastante selectiva e pontual do Supremo Tribunal Federal (STF), mesmo que à margem das questões políticas centrais.

 

Abordagens Teóricas

O desenho institucional do controlo de constitucionalidade no Brasil, definido na Constituição de 1988, proporcionou uma situação inédita na história republicana do país ao garantir um grau de autonomia nunca antes visto. No que tange ao campo político, o controlo abstracto de constitucionalidade ganhou uma relevância especial, pois ampliou sobremaneira a capacidade de apresentar acções directas de inconstitucionalidade (artigo 103, CF). Este facto aproximou o Brasil do cenário europeu no que diz respeito à predominância do controlo de constitucionalidade abstracta no velho mundo. Deste modo, as abordagens explicativas utilizadas na Europa para o estudo deste fenómeno passam a ser aplicáveis ao cenário brasileiro.

As diferenças existentes entre os países europeus que adoptaram a revisão abstracta da legislação não impediram a construção de um marco teórico-analítico encarregado de explicar a adjudicação constitucional. As consequências políticas desta revisão da legislação tornaram-na parte significativa do processo de judicialização da política na Europa do pós-guerra. Uma boa parcela da literatura europeia que trata do tema da judicialização da política toma como base o modelo arquitectado por Kelsen (Stone, 1995; Sweet, 2000; Magalhães, 2003), destacando-se dois tipos de abordagens.

A primeira abordagem é aquela a que a literatura se refere como policy-seeking approach, ou seja, a expansão da jurisdição constitucional sobre o policy-making governamental (ou as políticas da maioria), como resultado da habilidade e disposição dos actores políticos que perderam no processo legislativo em provocarem decisões judiciais sobre a constitucionalidade das políticas aprovadas pela maioria parlamentar. Trazer a Corte Constitucional para dentro do processo legislativo é muitas vezes um comportamento irresistível para a oposição. A litigância é geralmente de baixo custo e não se traduz em punição política, seja porque a decisão judicial é pertinente ao direito público, seja porque a oposição possui um interesse forte em mostrar ao eleitorado a sua alegada falta de compromisso em relação às políticas em questão2.

A policy-seeking approach baseia-se em duas premissas: primeiro, o litigante, quando acciona a justiça constitucional, fá-lo contra uma legislação que vai contra a sua preferência; segundo, não existe custo sobre qualquer matéria associada com a revisão abstracta da legislação ou, pelo menos, os benefícios potenciais da litigância pesam mais do que os custos potenciais.

Uma segunda e forte explicação para a judicialização vem das regras institucionais e do seu formato. Sendo os tribunais constitucionais completamente independentes dos interesses das maiorias parlamentares e dos executivos, podem decidir sem constrangimento. É aquilo a que podemos chamar unconstrained courts approach da decisão judicial. Para essa abordagem, os juízes funcionam como agentes livres nas suas relações com os partidos políticos e com as maiorias legislativas. Além disso, os juízes possuem uma grande preocupação com a expansão da relevância das leis constitucionais e da sua revisão. Os tribunais constitucionais não possuem constrangimentos porque os actores políticos que foram afectados pela sua decisão não possuem meios hábeis, coerentes e sustentáveis para reverter a sua decisão, portanto, esses actores não podem constranger o poder judicial nem ao menos punir o juiz ou a corte.

Nesse sentido, existe uma relação assimétrica entre o Parlamento e a corte. Este último pode revogar uma lei do primeiro através do voto de uma maioria simples ou qualificada. Já o primeiro só pode derrubar um veto da corte através de uma emenda constitucional ou através de procedimentos que exigem maioria qualificada no Parlamento.

Apesar de todos estes entraves, parte da literatura alerta para a força dos constrangimentos internos (justificar a sua decisão por escrito, a pressão dos pares, a tradição do tribunal, etc.) e dos externos (impacto da sua decisão perante outras autoridades, media, opinião pública, etc.), que, dependendo das circunstâncias, podem tornar-se determinantes (Epstein e Knight, 1998).

 

Dados e Metodologia da Pesquisa

A base de dados utilizada por Matthew Taylor (2004) serviu de ponto de partida para este artigo. As informações daí retiradas foram adaptadas e ampliadas para os fins deste estudo. Os dados complementares foram obtidos através da página do Supremo Tribunal Federal (www.stf.gov.br). A nossa estratégia é metodologicamente semelhante à utilizada por Vianna et al. (1999), mas existem algumas diferenças no processamento dos dados. Trataremos apenas das ADINs que possuem a legislação federal como objecto jurídico, portanto daquelas que envolvem a legislação estadual, não considerando no universo pesquisado as outras esferas da federação.

De resto, o que temos é semelhante ao estudo desenvolvido por Vianna et al. (1999), ou seja, trabalharemos com as categorias de "decisão liminar" e de "decisão do mérito" como forma de aferir o desempenho dos requerentes e actores junto do Supremo Tribunal Federal. A ideia central é compreender melhor o processo de judicialização da política, tomando como pano de fundo as consequências da revisão abstracta da legislação. Os dados da pesquisa foram obtidos a partir de 1073 casos e referem-se ao período de 1988-2002. As categorias criadas para análise são as seguintes:

a) Requerente I (todos);

b) Requerente II (actores políticos, jurídicos e sociais);

c) Requerido;

d) Tipo de lei;

e) Tópico da lei;

f) Decisão liminar;

g) Decisão de mérito.

 

Aspectos gerais da revisão abstracta no Brasil

O quadro n.º 1 demonstra o perfil de quem procura o tribunal, ou seja, de quem judicializa a disputa. Numa primeira análise é possível afirmar que as teorias europeias se confirmam. Como vimos, a revisão abstracta da legislação reforça a relação entre a oposição e o tribunal na adjudicação constitucional3. Os partidos políticos são os que movem mais acções (34,3%), sendo logo seguidos pelas confederações sindicais ou pelas entidades de classe (32,6%).

 

Requerente (todos)

[Quadro n.º 1]

Fonte: Banco Nacional de Dados do Poder Judiciário (BNDPJ), Supremo Tribunal Federal (1988-2002).

 

Na verdade, se adicionarmos às acções das entidades de classe da burocracia jurídica (4,3%) as acções das confederações sindicais ou das entidades de classe (32,6%), estas últimas passam a ser as entidades que mais processos instauram junto do tribunal constitucional brasileiro (36,9%). A participação activa das confederações sindicais ou das entidades de classe é, sem dúvida, a grande novidade no cenário teórico, pois, em termos gerais, a participação destes actores é vedada na maioria dos países europeus (Magalhães, 2003; Sweet, 2000). Elas, em tese, aumentam a capacidade de intervenção do tribunal no cenário político. A Procuradoria da República também possui algum destaque, apresentando 15,2% das ocorrências.

Criámos também uma variável categórica mais ampla para os requerentes e distribuímo-la em três categorias: actores políticos, jurídicos e sociais. Como sabemos, no Brasil o número de entidades com legitimidade para este efeito é comparativamente superior ao dos países europeus, o que de certa forma possibilita essa reclassificação e uma reflexão maior sobre a acção em conjunto destes actores. Ao alargar essas entidades para categorias maiores, é possível observar, como mostra o quadro n.º 2, que os actores políticos correspondem a 41,9%, sendo seguidos pelos actores sociais com 32,6% e pelos actores jurídicos com 24,3%.

 

Requerente (actores)

[Quadro n.º 2]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

Um aspecto importante da nossa pesquisa é compreender que tipo de lei vem sendo questionada no Tribunal Constitucional. Para cumprir este propósito incluímos uma variável categórica que define o tipo de lei, obedecendo às seguintes especificações:

1) Legislação ordinária: foi classificado como legislação ordinária todo o texto legal produzido pelos poderes executivo e legislativo que possua função de ordenação, regulação e controlo do quotidiano da administração pública e que foi alvo de uma acção directa de inconstitucionalidade. Portanto, decisão administrativa, acto declaratório, resolução, portaria, consolidação das leis do trabalho (CLT), decretos, deliberações, convénios, comissão parlamentar de inquérito (CPI), lei federal, instrução normativa, entre outras;

2) Decisão judicial e/ou administrativa: aqui foram classificadas todas as decisões judiciais e actos administrativos do poder judiciário e do Ministério Público e ainda os actos administrativos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB);

3) Medidas provisórias: todas as medidas provisórias, inclusive as que apareciam em conjunto com as resoluções, decisões administrativas e circulares, bem como as que foram convertidas em lei;

4) Lei complementar;

5) Emenda constitucional;

6) Constituição.

Como demonstra o quadro n.º 3, a legislação ordinária corresponde a mais de metade dos casos (50,3%), sendo seguida pelas medidas provisórias (25,9%) e pela decisão judicial (13%). Por outras palavras, 89,2% da legislação impugnada diz respeito a decisões ordinárias dos poderes representativos e do judiciário, com destaque para a vigilância exercida sobre as medidas provisórias.

 

Tipo de lei

[Quadro n.º 3]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

 

Para obtermos o peso real dos tipos de lei que foram judicializados temos de fazer uma análise proporcional, como se vê pelo quadro n.º 4.

 

Proporção da judicialização por tipo de lei

[Quadro n.º 4]

Fonte: Taylor (2004).

 

De uma forma geral, o quadro n.º 4 reforça a ideia de que o litígio constitucional brasileiro ocupa um espaço significativo nas leis que auxiliam o funcionamento da Constituição, como é caso, por exemplo, das leis complementares. Além disso, existe uma vigilância acentuada sobre as prerrogativas legislativas do poder executivo.

A lei complementar ocupa uma função importante no cenário de regulação brasileiro, pois cabe-lhe regulamentar parte da Constituição. Como esta ocorre quase sempre num terreno legal movediço, e a maioria necessária para a aprovação é a absoluta, é de esperar uma forte contestação por parte dos segmentos afectados4.

A medida provisória, pelo seu carácter legislativo especial e pela falta de um debate parlamentar ex ante, atrai uma vigilância forte dos mais diversos sectores. Aqui também é possível observar uma preponderância no acto de judicializar por parte dos partidos políticos e das confederações sindicais e entidades de classe.

Devido à relevância da administração pública enquanto objecto da adjudicação constitucional, resolvemos, para feitos analíticos, dividi-la em três categorias5. Outra diferença no tratamento dos dados em relação a Vianna et al. (1999) é que as normas relativas à reforma agrária estão dispostas no tópico de política social e, por fim, as normas que tratam do direito de greve foram alocadas no tópico de relações laborais:

1) Administração pública civil: reúne a legislação que versa sobre carreiras, remuneração e organização do serviço público, no âmbito do poder executivo e do poder legislativo;

2) Administração pública judicial: reúne a legislação que versa sobre carreiras, remuneração e organização do serviço público, no âmbito do poder judicial;

3) Administração pública militar: reúne a legislação que versa sobre carreiras, remuneração e organização do serviço público militar;

4) Política social: inclui normas que tratam dos sistemas de segurança social não afectos ao funcionalismo público, bem como a legislação reguladora do acesso a diferentes benefícios sociais. Também se incluem nesta categoria as normas relativas à reforma agrária;

5) Política económica: reúne as normas de regulação da economia afectas à política cambial, monetária, salarial e de preços, com excepção das de natureza tributária, tendo sido incluídas nesta categoria as normas sobre o programa de privatização;

6) Política tributária: reúne as normas que tratam da definição da base de cobrança e da parte alíquota dos tributos, também tendo sido classificadas nesta categoria as normas referentes à concessão de incentivos fiscais e à regulação das zonas de tributação especial;

7) Competição política: reúne normas relativas às eleições e aos partidos políticos;

8) Relações laborais: inclui as normas que regulam o mundo do trabalho, tais como os direitos dos trabalhadores, a organização sindical e o direito à greve;

9) Regulação da sociedade civil: inclui as normas que ordenam as relações entre particulares, como por exemplo a regulamentação da cobrança de mensalidades escolares, das corporações profissionais, do meio ambiente e das populações indígenas.

O quadro n.º 5 demonstra que a administração civil é a mais accionada (32,8%), sendo seguida pela administração judicial (16,8%), pela política tributária (11,1%) e pela competição política (9,6%).

 

Tópico da lei

[Quadro n.º 5]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

O quadro n.º 6 apresenta os dados sobre o tipo de lei que cada requerente acciona com mais frequência. Todos os requerentes demonstram uma preocupação com a legislação ordinária. Em quase todos, esse tipo de legislação aparece como a mais accionada, o que de certa forma se relaciona com o amplo campo jurisdicional desse tipo de legislação. O procurador-geral da República também revela grande atenção em relação às decisões judiciais, incluindo as administrativas. A OAB, os partidos políticos e as confederações sindicais ou entidades de classe (inclusive as da burocracia jurídica), têm realizado uma vigilância significativa sobre as medidas provisórias.

 

[Quadro n.º 6]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

É curioso notar que os actores jurídicos (OAB e entidades de classe da burocracia jurídica) e os actores sociais se juntam aos actores políticos (partidos políticos) na vigilância às medidas provisórias. Esse instrumento jurídico foi utilizado como uma grande arma legislativa do executivo. Os critérios de uso das medidas provisórias (MP) estabelecidos pela emenda constitucional n.º 32 de 2001 não interromperam a força legislativa do executivo. Recentemente, o presidente do Congresso Nacional fez duras queixas sobre o montante de medidas provisórias que entravam a acção do legislativo6:

O presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), defendeu um "legislativo mais activo [...]". O peemedebista ressaltou que o Senado está parado devido ao excesso de MPs (medidas provisórias): "É uma situação não apenas tensa, como inaceitável, estamos, com isso, ferindo nossa Constituição, a representação popular, a casa do povo" [Folha de São Paulo, 25 de Agosto de 2008].

No quadro n.º 7 é possível visualizar as áreas de interesse dos requerentes. Com este quadro fica claro que, de uma forma geral, os requerentes procuram impugnar tópicos relacionados com sua função ou interesse. As demandas dos governadores relacionam-se sobretudo com as questões da burocracia do seu estado (administração pública) e, quando muito, também com a política tributária e a competição política. O procurador-geral da República dedica grande parte da sua atenção à administração judicial. A OAB e as entidades de classe da burocracia jurídica estão divididas entre a administração pública civil e judicial. Os partidos políticos dirigem boa parte das suas acções para os temas relacionados com a administração civil e com a competição política. As confederações sindicais e as entidades de classe não apresentam uma concentração como os demais requerentes, fruto da sua composição numerosa e diversificada7.

 

Tópico da lei/requerente (todos)

[Quadro n.º 7]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

Se compararmos o perfil das ADINs das confederações sindicais e das entidades de classe, em geral, com o das entidades de classe da burocracia jurídica, podemos verificar que, quanto mais homogéneo é o grupo, maior é a concentração das acções. O interesse de cada confederação ou entidade é que dita a estratégia de actuação na adjudicação constitucional. No entanto, é preciso esclarecer que nem todos os entes com legitimidade activa podem propor qualquer ADIN e que se exige, para alguns, o requisito de pertinência temática, ou seja, deve existir relação entre a norma impugnada e as actividades institucionais do requerente (v. quadro n.º 8). Isto enfraquece um pouco o argumento de que os requerentes buscam intentar acções relacionadas com tópicos afins às suas funções ou interesses.

 

[Quadro n.º 8]

Fonte: Constituição da República Federativa do Brasil.

 

 

O Julgamento das ADINs

O julgamento das acções directas de inconstitucionalidade processa-se, basicamente, através de dois tipos de decisão. A primeira é a decisão liminar. O pedido de liminar no direito processual brasileiro justifica-se pela chamada "fumaça do bom direito". O juiz, no intuito de resguardar o requerente de uma possível violação do seu direito, a qual, num momento futuro, lhe causaria danos irreparáveis, autoriza liminarmente ou temporariamente (pelo menos até a sentença do mérito) uma protecção do direito atingido, que pode revestir diversas formas, dependendo do caso em questão. Por fim, a decisão de mérito põe fim ao litígio. Neste artigo, as decisões de mérito e as decisões liminares serão utilizadas como instrumentos de análise do processo de judicialização da política. A nossa intenção é descobrir e compreender que tipo de lei e, principalmente, que tópico de lei vem sendo revisto pela Suprema Corte brasileira. Essa estratégia também fornece informações sobre quais os actores e requerentes que são parceiros do Supremo Tribunal Federal na adjudicação constitucional.

No quadro n.º 9 podemos observar a relação existente entre os requerentes (todos) e a decisão liminar. Em termos proporcionais, destacam-se quatro requerentes, os quais foram atendidos, no todo ou em parte, nos seus pedidos de liminar.

 

Decisão liminar/requerente (todos)

[Quadro n.º 9]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

As entidades de classe da burocracia jurídica tiveram 17,4% dos seus pleitos liminares atendidos no todo ou em parte. Os governadores de estado e de distrito federal obtiveram 19,4% de êxito na mesma proporção. A ordem dos advogados do Brasil, através do seu conselho federal, atingiu os 25%. Por fim, o destaque fica para o procurador-geral da República, que, em termos proporcionais, é de longe o requerente que possui a maior taxa de sucesso na obtenção de uma liminar (57,7%).

Como é possível observar no quadro n.º 10, a taxa de concessão da decisão liminar, no todo ou em parte, dos actores políticos e sociais não ultrapassa os 11%, enquanto o desempenho dos actores jurídicos chega aos 44%.

 

Decisão liminar/requerente (actores)

[Quadro n.º 10]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

Esses dados permitem-nos sugerir a hipótese de que os argumentos levantados ou questionados pelos actores jurídicos possuem uma maior aceitação por parte dos juízes do Supremo Tribunal Federal. Para o Prof. José Afonso da Silva isso acontece porque o "mundo jurídico se organiza em face do próprio Supremo" (Silva, 2005). Ou seja, a argumentação técnica (jurisprudência) utilizada pelo Supremo é absorvida pelas corporações, que passam a actuar, levando-as em consideração. O professor lembra que o conselho federal da OAB mantém um grupo de estudo dedicado à revisão judicial que se reúne mensalmente.

Para o referido professor, os actores sociais não poderiam organizar-se num mesmo nível, pois precisam de justificar a sua pertinência temática:

Não dá para montar banca de advogados em função de eventualidades. Essas associações só podem entrar com pertinência temática. Essa pertinência temática não ocorre todo dia. Então montar uma banca de advogados em função de eventualidades seria um despautério. Não tem como manter uma estrutura permanente pensando nisso [Silva, 2005].

De entre as entidades que não necessitam de comprovar a sua pertinência temática, o procurador-geral da República e a Ordem dos Advogados do Brasil são os únicos que não possuem cargo electivo popular, ou seja, não pertencem aos actores políticos. Em certo sentido, esse quadro parece reforçar o tratamento diferenciado que os actores judiciais (ou pelo menos boa parte deles) possuem.

A pertinência temática não parece ser uma boa resposta para justificar o baixo desempenho dos actores sociais na obtenção de uma decisão liminar. Nessa linha de raciocínio, os actores políticos deveriam ter um nível de obtenção de liminar bem superior ao alcançado, já que eles também não precisam de comprovar a pertinência.

Numa análise mais cuidadosa dos dados, é possível perceber que das 103 acções em que os actores jurídicos obtiveram a decisão liminar (concedida totalmente)8, 90 (87,4%) eram acções que tiveram como requerente o procurador-geral da República9. Portanto, se existe um domínio da linguagem, esse domínio transcende o aparato técnico da teoria do direito e penetra no estreito relacionamento institucional. Caso contrário, as instituições que dominam bem a linguagem, como o conselho federal da OAB e as entidades de classe da burocracia jurídica (Associação dos Magistrados Brasileiros, por exemplo), deveriam possuir um padrão semelhante aos obtidos pela Procuradoria da República.

O quadro n.º 11 trata da relação entre a decisão do mérito e todos os requerentes. Da sua análise ressaltam duas características marcantes: (i) a alta taxa de pedidos de mérito negados (663 casos, ou 61,8%); (ii) a alta taxa de decisões pendentes (332 casos, ou 30,9%). Noutras palavras, em catorze anos o Supremo Tribunal Federal resolveu interferir, ou rever, no todo ou em parte, 7,3% dos casos. A Corte Suprema também tem mantido um grande número de acções sem julgamento (cerca de um terço), embora tenha decidido aproximadamente 70% delas. Apenas a uma pequena parcela é efectivamente concedida revisão judicial. Os dados confirmam as conclusões obtidas para outros países sul-americanos. A trajectória de instabilidade política da região, os grandes períodos de autoritarismo e o seu consequente modelo político baseado no presidencialismo de coalisão propiciaram o desenvolvimento de uma estratégia de relutância face ao activismo (Helmke, 2005; Melo, 2007).

 

Decisão de mérito/requerente (todos)

[Quadro n.º 11]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

Os dados também apontam para uma posição de destaque do procurador-geral da República. O procurador possui uma taxa de sucesso muito superior aos demais requerentes (34,3%). A sua posição de relevo na aprovação das liminares reflecte-se nas decisões de mérito. As entidades de classe da burocracia jurídica são o tipo de requerente que mais se aproxima do procurador, com valores na ordem dos 6,5%, o que só enfatiza o desempenho do procurador.

Curiosamente, os requerentes que mais solicitam a intervenção do tribunal (partidos políticos e confederação sindical e entidades de classe) são também os que possuem, em termos proporcionais, os piores desempenhos. Parece que a ideia de uma adjudicação compartilhada defendida por parte expressiva da literatura brasileira sobre o tema não foi absorvida pelo Supremo Tribunal Federal10. A disposição de contribuir, de submeter à apreciação do tribunal os textos legislativos federais, é inquestionável. No entanto, para que a adjudicação constitucional se efective é necessário que os argumentos apresentados pelos requerentes sejam aceites. Nesse sentido, um grupo (actores jurídicos), ou melhor, um requerente (procurador-geral da República), destaca-se de forma isolada.

No quadro n.º 12 fica clara a superioridade da performance dos actores jurídicos na obtenção do mérito das suas acções junto do Supremo Tribunal Federal. Enquanto os actores jurídicos obtiveram êxito, no todo ou em parte, em 22,6% das acções intentadas, os actores políticos e sociais obtiveram apenas 2,7% e 2%, respectivamente.

 

Decisão de mérito/requerente (actores)

[Quadro n.º 12]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

O quadro n.º 11 reforça esta leitura, pelo sucesso das acções movidas pelo procurador-geral da República: das 49 acções concedidas por mérito (sem restrições), 47 delas foram propostas pelo procurador.

Em resumo, levando em consideração todo o ciclo de revisão judicial e no que diz respeito à taxa de sucesso na efectivação da adjudicação constitucional, o procurador-geral da República é, sem dúvida, o maior parceiro do Supremo.

No que toca à relação entre a decisão liminar e o tópico da lei em questão, o quadro n.º 13 sugere que o Supremo Tribunal Federal, através do julgamento de acções directas de inconstitucionalidade que possuem como objecto jurídico uma legislação federal, tem demonstrado existir uma tendência decisional ou jurisprudencial de controlo da política judicial por via da revisão abstracta da legislação. Portanto, o STF faz uso das suas prerrogativas constitucionais para rever a política judicial em todo o aparelho judiciário, e isso ocorre em estreita parceria com a Procuradoria da República. É interessante notar que essa disposição não entra em conflito com nenhum outro requerente, actor ou tópico de lei.

 

Decisão liminar/tópico da lei

[Quadro n.º 13]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

O quadro n.º 12 demonstra que a parceria entre a Procuradoria da República e o Tribunal Constitucional brasileiro tem como foco principal a administração judicial, que teve, no todo ou em parte, 48,3% das liminares aceites, sendo seguida pela regulação da sociedade civil (21,3%) e pela política tributária (16,8%).

Os dados indicam que essa parceria na adjudicação constitucional além de selectiva no que diz respeito ao requerente, é especializada num tema. Os dados apontam que o Supremo tem mais propensão para regular, ou melhor, para rever, a legislação que tenha como foco temático a administração da justiça.

O Ministério Público, representado aqui pelo seu dirigente maior, o procurador-geral da República, exerce uma função de parceria com o Supremo Tribunal Federal na administração do aparelho judiciário. Quais serão as razões desse activismo? Para Amaral (2004), a independência administrativa e funcional do Ministério Público e do Judiciário levou a um número relativamente alto de abusos, "tais como a concessão de reajustes de vencimentos através de meros actos administrativos, sem a necessária elaboração de projectos de lei a serem submetidos à discussão e à votação" (Amaral, 2004, p. 48). Além das questões pecuniárias, as relativas à organização e à composição também eram frequentes11. Esses factos, como mostram os dados, tornaram-se o alvo preferencial das revisões judiciais oriundas da parceria entre o procurador-geral da República e o Supremo Tribunal brasileiro.

Por fim, o quadro n.º 14 retrata a relação existente entre os tópicos da lei e a decisão de mérito e vem confirmar de novo as evidências no que concerne às decisões liminares. O tópico da administração judicial viu mais de um quarto das suas acções revistas judicialmente, no todo ou em parte. Os restantes tópicos registaram índices inferiores a 6,5%. É interessante notar também que, das 56 ADINs que obtiveram concessão do mérito sem restrição, 40 (ou 71,43%) versavam sobre a política ou administração judicial, ou seja, mais de dois terços.

 

Decisao de mérito/tópico da lei

[Quadro n.º 14]

Fonte: BNDPJ, STF (1988-2002).

 

As outras 16 ADINs (ou 28,57%) estão distribuídas entre outros cinco tópicos. Portanto, retirando as ADINs que tratavam de temas referentes à administração judicial, a revisão judicial com decisão de mérito efectiva restringe-se a 1,5% do total de ADINs. Se a iniciativa dos intérpretes (ou legitimados activos) da Constituição, constante da revisão judicial, está a conduzir o Supremo Tribunal Federal para a assunção de novos papéis12, esse novo papel não é de enfrentamento do poder soberano, e muito menos de uma terceira câmara legislativa (Sweet, 2000).

 

Considerações Finais

De uma forma geral, podemos afirmar que as teorias de médio alcance produzidas pela literatura europeia são fortemente aplicáveis ao Brasil. Nesse sentido, a policy-seeking approach13 não só explica o comportamento das oposições partidárias, como também explica, em boa medida, o comportamento dos demais entes com legitimidade activa14. Nesses casos, o litigante, quando recorre à justiça constitucional, fá-lo contra uma legislação que vai contrariar as suas preferências ou interesses; segundo, não existem custos sobre qualquer coisa associada com a revisão abstracta da legislação ou, pelo menos, os benefícios potenciais da litigação pesam mais do que os custos potenciais. O resultado disso é que, num período de catorze anos, os partidos políticos (principalmente a oposição) apresentaram 368 ADINs (34,3%) e as confederações sindicais e as entidades de classe (incluindo as da burocracia jurídica) cerca de 396 ADINs (36,9%). Essas duas entidades equivalem a 764 ADINs, ou 71,2% de todas as acções interpostas no cenário federal. Portanto, a judicialização da política, entendida como um fenómeno de chamamento do judiciário, de um convite à participação na adjudicação constitucional, é feita maioritariamente pelos partidos e confederações. Um relato que reforça essa lógica foi dado por um antigo ministro do Supremo Tribunal Federal:

Nós já tivemos o caso em que o partido tinha apenas um deputado que, em vez de discutir questões políticas de elaboração legislativa na Câmara, preferia assistir às sessões do STF, dizendo: "porque aqui posso pôr abaixo o que lá, minha voz isolada de nada adiantará". E mais ainda com propaganda, porque os jornais diriam "essa lei caiu graças ao esforço do deputado fulano de tal [Moreira Alves, 1997, p. 276].

Outro ponto relevante da teoria europeia é a ideia de que sem um aparelho judicial completamente separado do mundo político não haveria judicialização nem tão-pouco activismo judicial. É aquilo a que podemos chamar unconstrained courts approach da decisão judicial. Para essa abordagem, os juízes funcionam como agentes livres nas suas relações com os partidos políticos e com as maiorias legislativas. Sem essa liberdade não haveria independência e dificilmente os partidos e as demais entidades com legitimidade para o efeito apresentariam os seus pedidos. Vale a pena realçar que a institucionalização das garantias constitucionais dos juízes foi uma conquista histórica, não estando totalmente vinculada aos feitos da Constituição de 198815.

Outra conclusão relevante é a forte vinculação existente entre o requerente e o tópico de lei submetido a juízo. Quase todos os requerentes concentram o seu raio de actuação em pelo menos dois tópicos (v. quadro n.º 6). Os actores políticos e jurídicos, por exemplo, possuem mais de 60% das suas ADINs concentradas em duas áreas temáticas (v. quadro n.º 7).

A vinculação de carácter utilitarista que explica a concentração dos tópicos de lei judicializados pelos requerentes também explica a dispersão. Como podemos observar (v. quadro n.º 7), os actores sociais também seleccionam os tópicos de lei de acordo com os seus interesses. A diferença reside na diversidade e pluralidade de interesses que as associações e as confederações sindicais representam.

No tratamento dos resultados da revisão judicial, ou seja, no que diz respeito ao julgamento das ADINs, podemos afirmar que a estratégia de julgamento do Supremo Tribunal Federal obedeceu a uma lógica de selectividade e especificidade. Por outras palavras, foi selectivo na escolha do parceiro e foi específico no tema que estava disposto a regular.

Não vamos repetir os dados expostos. Em todos eles, um após outro, o procurador-geral da República surge como o grande parceiro do Tribunal Constitucional brasileiro no rule making. Contudo, como foi visto, a parceria limita-se a um campo bem específico, o da administração judicial.

Por outro lado, a tese de que o Supremo Tribunal Federal, com base na revisão abstracta da legislação, vinha assumindo papéis importantes no processo decisório fica seriamente comprometida.

 

 

Bibliografia

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Notas

1 No Brasil, o termo foi introduzido pelo estudo de Castro (1997).

2 Baum (2001) demonstrou que no caso norte-americano a coisa não foi diferente. No litígio constitucional de grande interesse político os actores vão até as últimas consequências, mesmo que isso signifique uma derrota nos tribunais. Com este procedimento pretendem, pelo menos, conseguir demonstrar aos eleitores a sua defesa de uma posição contrária.

3 Os dados oferecidos por Vianna et al. (1999, pp. 95-101) demonstram que mais de 70% das ADINs promovidas pelos partidos políticos são oriundas da oposição.

4 No quadro n.º 6 é possível verificar que, das 41 leis complementares judicializadas, 78% tiveram como requerentes os partidos políticos, as confederações sindicais e as entidades de classe.

5 Nos dados apresentados por Vianna et al. (1999, p. 68), das 1928 ADINs analisadas, 1217 tiveram como objecto a administração pública.

6 São vários os factores que tornam a medida provisória uma legislação bem peculiar. Para um aprofundamento, v. Santos (1991).

7 Como bem afirmou Martins e Mendes (2001), existem mais de noventa confederações e entidades reconhecidas pelo Supremo Tribunal Federal aptas a propor uma acção directa de inconstitucionalidade.

8 V. quadro n.º 10.

9 V. quadro n.º 9.

10 "A judicialização da política, entre nós, longe de enfraquecer o sistema dos partidos, em especial os da esquerda e da oposição, tende a reforçá-lo, na medida em que propicia — é verdade que no campo de direito e de seus procedimentos _ uma conexão entre a democracia representativa e a participativa, para o que concorrem as ações públicas, em que a cidadania se encontra legitimada para deflagrar o processo judicial contra as instâncias do poder" (Vianna et al., 1999, p. 43).

11 V. as ADINs dos n.os 170, 194, 201, 256, 274, 694, 721, 728, 730, entre outras.

12 "[...] a presente pesquisa sustenta que a iniciativa dos intérpretes da Constituição, constante no recurso às ADINs, estaria induzindo uma atitude mais favorável por parte do STF no que se refere à assunção de novos papéis. O Tribunal começa a migrar, silenciosamente, de uma posição de coadjuvante na produção legislativa do poder soberano, de acordo com os cânones clássicos do republicanismo jacobino, para uma de ativo guardião da Carta Constitucional e dos direitos fundamentais da pessoa humana" (Vianna, 1999, p. 53).

13 Que nada mais é do que a expansão da jurisdição constitucional sobre o policy-making governamental, como resultado da habilidade e disposição dos actores políticos, que perderam no processo legislativo, em provocar decisões judiciais sobre a constitucionalidade das políticas aprovadas pela maioria parlamentar.

14 Embora, como deixámos claro no corpo do texto, a necessidade de pertinência temática para algumas entidades com legitimidade activa mitigue um pouco a força deste argumento (v. quadro n.º 1).

15 Na verdade, a institucionalização da autonomia judicial na América Latina, em geral, e no Brasil, em particular, é um tema pouco explorado na ciência política. Para a Argentina, v. Chavez (2004).

 

* Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Pernambuco, Rua Acadêmico Hélio Ramos, s. n., 14.º andar, CEP 50.670-901, Recife-PE, Brasil. e-mail: ernani_carvalho@hotmail.com.

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