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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  n.194 Lisboa  2010

 

Estratégias de reprodução social de famílias senhoriais cariocas e minhotas (1750-1850)**

 

Manoela Pedroza

Departamento de História, IFCS, UFRJ, Largo de São Francisco, 1, CEP 20051-070 Rio de Janeiro, Brasil. e-mail: manoelap@gmail.com

 

Este artigo analisa as estratégias de reprodução social de famílias senhoriais num contexto colonial. O seu enfoque incide sobre algumas famílias que se estabeleceram na freguesia de Campo Grande, no Rio de Janeiro, de meados do século xviii a meados do século xix. Analisando o tipo de alianças matrimoniais que promoveram e a maneira como transmitiram a terra, o nosso objectivo é situar o caso brasileiro, sobretudo o carioca, em relação com os sistemas de transmissão patrimonial portugueses no mesmo período.

Palavras-chave: património; famílias senhoriais; reprodução social; Brasil; Portugal.

 

The social reproduction strategies of noble families in Rio de Janeiro and the Minho (1750-1850)

This article analyzes the strategies of social reproduction of noble families in a colonial context. The focus is on certain families in the civil parish of Campo Grande, in Rio de Janeiro, from the mid-18th to mid-19th centuries. By examining the types of marriages sought, and the manner of transmitting land ownership, we seek to understand the case in Brazil, especially Rio de Janeiro, in relationship to the Portuguese mechanisms of inheritance and estate transmission in the same period.

Keywords: patrimony; noble families; social reproduction; Brazil; Portugal.

 

Introdução

Iniciada a colonização na América, chegam à colónia imigrantes portugueses que aí se estabelecem, se casam, têm filhos, alimentam as suas famílias com o que conseguem plantar ou vender, compram escravos e, quando possível, novas terras e, provavelmente, pretendem legar aquilo que construíram. Portanto, tiveram de tomar decisões quanto ao futuro do património material e imaterial que conseguiram amealhar.

Neste artigo analisam-se as estratégias de reprodução social de famílias senhoriais num contexto colonial, comparando alguns aspectos desse processo no Brasil e em Portugal. Na historiografia europeia, a expressão “famílias senhoriais” refere-se às famílias detentoras de direitos senhoriais, tradicionais ou não capitalistas, como o feudo, os senhorios, e outros privilégios concedidos pelo rei, como o exercício de jurisdições e a cobrança de direitos reais (Villani, 1972; Aubin, 1989; Hespanha, 1994; Couvrette, 2003). O termo “senhorial” relaciona-se com o campo semântico da aristocracia e com o da feudalidade. Conjugados em análises recentes, permitem entrever modos de legitimação de um tipo específico de poder e estratégias que dependiam de mercês, privilégios, concessões ou direitos para a manutenção do seu status. Mais tarde, sobretudo durante o século xix, essas estratégias e direitos senhoriais seriam contestados ou suprimidos pelas reformas liberais (Malatesta, 1999; Congost, 2007).

No caso brasileiro poucas foram as famílias realmente nobres e mesmo os mais ricos e poderosos nunca detiveram prerrogativas como a isenção do pagamento de impostos e a total autonomia jurisdicional (Fragoso, 2003; Fragoso, Almeida e Sampaio, 2007). O direito de primogenitura e os morgados não se impuseram com força no Brasil, e mesmo as sesmarias, concedidas em grande número na colónia até ao século xix, não constituíam senhorios jurisdicionais (Monteiro, 2005).

Cabe ainda reforçar outra característica das famílias senhoriais brasileiras: elas situam-se na incómoda intersecção da vigência de um direito sucessório “plebeu” igualitário — já que não eram nobres por estatuto legal nem possuíam bens vinculados — e de uma cultura e práticas sociais aristocráticas, pois possuíam bens valiosos e indivisíveis, no caso dos engenhos de açúcar, dos quais dependia a manutenção da sua posição social elevada. Esta circunstância dúplice, associada a um contexto socioeconómico de fronteira aberta e ao amplo recurso a mão-de-obra escrava, dificulta enormemente o enquadramento destas famílias segundo os critérios clássicos da aristocracia europeia. Tais factores conferem-lhes características únicas e extremamente plásticas, alteram as suas estratégias de reprodução social e justificam largamente a necessidade de as estudar com mais pormenor.

Mesmo assim, as relações no campo da política permitiam a acumulação de capital, a obtenção de terras e de mão-de-obra forçada e a manutenção de privilégios comerciais (Fragoso, 2000). No Brasil, a nobreza dependia da graça ou mercê régia, existindo duas formas de enobrecimento: a primeira, quando o monarca declarava alguém fidalgo, e a segunda, quando aquele conferia alguma dignidade, posto ou emprego nobre, sobretudo cargos nas câmaras e nos concelhos (Almeida, 2007). Por isso, continuamos a lidar com um sistema em que a política, e não o mercado, geria a economia e em que a acumulação dependia de factores provenientes do ordenamento jurídico e social da metrópole portuguesa, considerados arcaicos ou feudais.

No contexto colonial aqui analisado, manteremos assim o adjectivo “senhorial” para indicar uma família em que algum descendente masculino se tenha tornado, em algum momento, senhor de engenho (Fragoso, 2000). Além disso, estas famílias nobres ou enobrecidas possuíam no seu património direitos e bens adquiridos no mercado (como terras e escravos) e outros de tipo senhorial (como a concessão de sesmarias e o apresamento de nativos). O adjectivo “senhorial” compreende também a dimensão simbólica das hierarquias sociais do Antigo Regime nos trópicos, que emergia em inúmeros rituais quotidianos de deferência, os quais afirmavam as prerrogativas desses senhores e dos seus séquitos em relação ao povo comum. Como afirmava um jesuíta da época, “ser Senhor de Engenho é título a que muitos aspiram, porque traz consigo o ser servido, obedecido e respeitado de muitos” (Antonil, 1982 [1711], p. 1).

 

A reprodução social rural: breve revisão de bibliografia

Em França, os artigos de Emmanuel Le Roy Ladurie (1972) e de Pierre Bourdieu (1972) publicados nos Annales constituem marcos fundadores na temática da reprodução social. Ambos mostravam a ligação entre práticas sucessórias, estruturas familiares, economia doméstica, estratégias matrimoniais e estrutura social, considerando a transmissão do património um “fenómeno social total”, que reenviava a um vasto conjunto de práticas, instituições e modos de pensamento. Os problemas que eles colocavam (Barthelemy, 1988) permanecem actuais: qual o papel da herança na estruturação da parentela e nos dispositivos de reprodução económica e social do campesinato?

Entendemos por “reprodução social” ou “reprodução familiar” o resultado do processo por meio do qual uma população consegue perpetuar, num dado território, as estruturas e relações que a constituem (Bouchard e Goy, 1992; Dérouet, 1995; Viret, 2008). Podemos dizer que a reprodução social de um grupo se constrói, microanaliticamente, através dos meios utilizados por uma família para transferir de uma geração para outra um capital que permita o estabelecimento dos seus descendentes (Bouchard, 1983). Sendo assim, a reprodução social está ligada à produção e reprodução de unidades domésticas e dos indivíduos, mediante estratégias individuais e cooperativas, mesmo com algum grau de tensão entre elas (Narotzky, 1989). Portanto, estudar as diversas modalidades de transmissão dos bens de uma família ajuda-nos a perceber se a reprodução social dos grupos domésticos é assegurada ou não (Lavallée, 1992).

Tratando-se de uma sociedade rural, o sucesso da reprodução social está bastante vinculado aos problemas ligados à transmissão da terra (Bouchard, 1983). Sobre essa transmissão pesam estratégias de sucessão, isto é, a maneira específica de transmitir o status e os papéis sociais, e estratégias de herança, isto é, as formas de transmissão do direito de propriedade (Augustins, 1982). É importante lembrar que em tempos pré-industriais a terra podia ser transferida por troca, presente, doação, herança ou mercadoria. Por isso, havia inúmeros arranjos institucionais para definir os direitos de propriedade e para decidir qual o meio mais adequado de os transferir (Dribe e Lundh, 2005).

Para as famílias camponesas europeias, a terra era praticamente o único bem do qual dependiam para a sobrevivência, e os mecanismos da transmissão da terra tinham suma importância para o destino social de grande parte da população. Segundo Gérard Bouchard (1983), o problema macro do crescimento demográfico em termos familiares pode ser assim traduzido: como é possível, partindo apenas de um património paterno, estabelecer vários filhos? Assim, desde tempos remotos, com o objectivo de preservar a viabilidade económica das pequenas parcelas, foram implementados pelos grupos camponeses sistemas de transmissão não igualitários, em que a terra familiar não era partilhada entre todos os filhos.

Bernard Dérouet (1997) reforça a ideia de que a funcionalidade destes sistemas podia extrapolar os grupos camponeses com pouca terra e também ser usada pelas elites — a aristocracia fundiária da época moderna — para a preservação e a continuidade de uma identidade nobre (linhagem, casa, património material e simbólico, nome, reputação), em detrimento da igualdade da partilha entre todos os herdeiros. As famílias nobres, historicamente, tentaram proteger-se da divisão e do fraccionamento dos bens, motivados por partilhas e por casamentos.

Existem dois tipos de casamentos que envolvem famílias com bens: aqueles em que o património aumenta, quando se recebem novos membros possuidores de bens, ou aqueles em que se perdem bens, cedendo filhos ou filhas com os seus dotes. Numa ordem perfeitamente homogâmica (em que todos os casais tivessem um casal de filhos e o mesmo património), o sistema funcionaria perfeitamente, recebendo-se e cedendo-se bens na mesma proporção ao longo do tempo. Entretanto, havendo mais filhos do que as possibilidades concretas de se contraírem casamentos vantajosos, o que era a regra, o risco de fragmentação do património era maior. Por isso, o sistema demográfico do Antigo Regime europeu ocidental, vigente desde finais da Idade Média, consistia em taxas de celibato definitivo superiores a 10% e numa idade média de casamento relativamente tardia (24-25 anos), o que funcionava como dispositivo de controlo da fecundidade e como forma de regular o crescimento populacional.

Os dispositivos que asseguravam a indivisibilidade do património de terras, legalmente disponíveis apenas para os nobres, eram o fideicomisso, o morgadio e o direito de primogenitura, que se propagaram na Europa ocidental a partir do século xvi. Accionando-os, sobre a terra eram colocados vínculos legais que a mantinham longe do mercado, e quem herdava a propriedade era, na prática, apenas um usufrutuário que tinha por função administrá-la e transmiti-la ao herdeiro designado (Malatesta, 1999).

Mas a liberalização do mercado fundiário e o igualitarismo sucessório são as bases do direito fundiário moderno. A França, pioneira nessas mudanças, iniciou esse processo com a revolução de 1789, depois continuado pelo Código Civil napoleónico e por várias reformas agrárias liberais (Congost, 2007, p. 124; Malatesta, 1999, p. 14). Portanto, no intervalo temporal que escolhemos para esse texto (1750-1850), os regimes jurídicos que regulavam a transmissão da propriedade fundiária apontavam para uma tendência mais igualitária na divisão dos bens entre os herdeiros.

Segundo Maria Malatesta (1999), as elites fundiárias europeias de Oitocentos não se mostraram hostis às inovações económicas, mas, ao mesmo tempo, quiseram manter a ideia do “privilégio nobre”, amplamente fundado na manutenção do direito de senhorio sobre grandes propriedades. A partir da segunda metade do século xix, quando o direito moderno se impôs com maior vigor, essa aristocracia passou a utilizar estratégias e subterfúgios legais para garantir a indivisibilidade da propriedade, uma vez que a posse ancestral de uma terra por parte da mesma família constituía uma marca distintiva do grupo. Portanto, para a sua reprodução social enquanto classe era necessário impedir a fragmentação dos seus domínios, então mais ameaçados com os novos regimes de transmissão de bens.

 

Portugal e a América Portuguesa nos séculos XVIII e XIX

Os sistemas de transmissão de bens das famílias portuguesas encontram-se mais bem estudados do que os brasileiros para o mesmo período. A trajectória de trabalhos em Portugal sobre esta questão é mais longa e diversificada, permitindo sínteses regionais e o conhecimento mais apurado das estratégias de reprodução social de diversos grupos ligados ao mundo rural: nobres, foreiros, grandes e pequenos proprietários, entre outros.

A grande quantidade de trabalhos sobre o assunto existintes para Portugal, obrigou-nos a fazer algumas escolhas para efeitos da comparação que se pretende levar a cabo neste artigo. Primeiro, optámos por sínteses bibliográficas dos trabalhos mais antigos, que nos apontaram as linhas mestras dos sistemas de transmissão de bens (Brandão, 1991; Durães, 1992 e 1995; Monteiro, 2003). Segundo, privilegiámos as informações sobre a região minhota, no Norte de Portugal, atendendo a que dela provinha a maior parte dos migrantes que chegavam ao Brasil. Deste conjunto de informações, exporemos sinteticamente algumas conclusões que nos parecem importantes.

Segundo Nuno Monteiro (1993, p. 50), a eficácia das estratégias de reprodução social da elite portuguesa repousava, desde a instalação da dinastia de Bragança, nos constrangimentos do direito, na autoridade paterna e em condicionantes menos compulsórias, como a existência de instituições eclesiásticas e a incorporação dos valores da “casa” pelos indivíduos, entendida esta como um conjunto coerente de bens simbólicos e materiais, a cuja reprodução alargada estavam obrigados todos os que nela nasciam ou dela dependiam (Rodrigues, 2002). Com o objectivo de preservar essa “entidade nobre” foram criadas inúmeras estratégias sociais, que podem ser verificadas em comportamentos demográficos, jurídicos, sucessórios ou matrimoniais.

O lugar e o destino de cada filho eram definidos em função das estratégias de reprodução das casas. Casamento e celibato eram dimensões complementares dessas estratégias: os sucessores tinham por dever casar e dar descendência, sendo o cônjuge escolhido pelas políticas de aliança da sua casa. Enquanto isso, cerca de metade das filhas e a maioria dos secundogénitos permaneciam solteiros, encaminhados para carreiras eclesiásticas, pois a sua “função” era engrandecer a casa, dando-lhe projecção social e política, ou doando os seus serviços para que estes garantissem as doações régias em títulos, tenças e comendas (Monteiro, 1993). Coerentes com estes princípios, encontraram-se as seguintes características em quarenta casas da aristocracia portuguesa entre 1640 e 1830: altíssima nupcialidade dos sucessores (94%); altíssima fertilidade (8 filhos nascidos e uma média de 5 sobreviventes); casamento feminino entre 18 e 24 anos; percentagem de celibatários em torno dos 50%; um terço dos filhos encaminhados para carreiras eclesiásticas. Até fins do século xviii, a prática era a endogamia familiar e a homogamia social estrita (Hespanha, 1993; Monteiro, 2003).

Interessa-nos ressaltar a correlação entre a instituição vincular e os padrões de reprodução social dessa nobreza, já que esse tipo de transmissão foi adoptado pela maioria das casas aristocráticas portuguesas, do reino e das províncias, e por todos os que pretendiam “viver nobremente” desde o século xvi até fins do século xviii (Hespanha, 1993, p. 368; Monteiro, 2005). O morgadio fazia parte de um “arquétipo fidalgo”, de um código de conduta que se impunha a todos os nobres e àqueles que o queriam ser. Até então, a terra continuava a ser a fonte de riqueza e poder e a manutenção da sua integridade prevalecia em todos os processos sucessórios, mesmo que a transmissão integral da propriedade para um único herdeiro tivesse custos muito elevados para as mulheres e para os filhos mais jovens.

Todavia, a partir de finais do século xviii começaram a desenvolver-se mecanismos que tentavam atenuar as desigualdades provocadas por esse sistema, restringindo a liberdade testamentária e protegendo todos os filhos. Nuno Monteiro (2003 e 2005) analisou detidamente a alteração desse padrão e as suas consequências para a grande nobreza do reino. Segundo ele, a partir da abolição dos vínculos, os filhos segundos e as filhas conseguiram fugir do destino de celibatários, casando-se crescentemente fora do círculo dos grandes, processo que, todavia, não implicou o desaparecimento dos procedimentos tradicionais nem a sua rejeição explícita.

Para os grupos camponeses e plebeus foi instituída a meação dos bens entre marido e mulher e estabeleceu-se que ao menos dois terços dos bens do cônjuge falecido fossem divididos igualmente entre todos os filhos, independentemente do seu género1, salvaguardando assim que os herdeiros ficassem prejudicados.2 No entanto, a própria legislação continha subterfúgios ao seu carácter igualitário. As Ordenações Filipinas previam que um terço do montante total pudesse ser legado a quem melhor aprouvesse ao testador (a concepção da terça é clara: ela visa compensar o igualitarismo da partilha e evidencia o processo de transição dos modelos de sucessão do Antigo Regime para o liberal).

Hoje sabemos que esse novo direito se construiu no longo prazo e foi plenamente estabelecido apenas no século xx. Margarida Durães (2003 e 2004) defende que o direito sucessório português no século xviii estava “em transição”. Assim, em Portugal, a partir do século xviii, vigoravam dois sistemas de transmissão de terras, um para bens livres e outro para bens vinculados. Para bens livres valia o princípio da protecção da família, o carácter sagrado da legítima, a igualdade entre herdeiros, a indicação de três linhas sucessórias, o afastamento do cônjuge da herança e a limitação do que podia ser testado. Para bens vinculados, como o morgadio, prazos e aforamentos, o princípio era outro: a manutenção da integridade da propriedade, a sucessão única, a prioridade do cônjuge, a possibilidade de carregar a nomeação do sucessor com encargos, a prioridade para filhos varões e a desigualdade entre os herdeiros (Durães, 1995, p. 131).

A Lei Geral do Reino, ao conjugar os princípios da igualdade entre herdeiros e da indivisibilidade da terra vinculada, permitiu a adopção de um sem-número de estratégias e a adaptação do sistema jurídico vigente às necessidades económicas das famílias envolvidas no problema da sua reprodução social. Segundo Margarida Durães (2002, p. 134, e 2004, p. 216), a lei era contornada sempre que circunstâncias particulares o exigiam. Ela notou que havia nítida preferência, em todos os grupos sociais, pela sucessão única e pela herança universal, cujo objectivo era manter a integridade da casa sem fraccionar a exploração, o que se fazia graças à utilização das regras do direito sucessório e da sucessão testamentária.

Essa prática parece perdurar à revelia da legislação. Tratando dos regimes de transmissão no século xix, Maria de Fátima Brandão comprovou que mesmo a promulgação do Código Civil português em 1867 não pode ser tomada como um marco da passagem do sistema de transmissão preferencial (em que se instituía um sucessor) para outro estritamente igualitário (em que todos os bens se partilhariam entre todos os herdeiros). No seu estudo de caso sobre o concelho de Vieira do Minho, a autora comprovou que se tentou “preservar a unidade dos bens que compunham o casal da família, através do avantajamento de um dos filhos com a quota disponível e a nomeação nos bens de prazo, muito antes e bem depois da promulgação do Código Civil” (Brandão, 1991, p. 624).

Parte desse habitus senhorial português que acabámos de expor foi transferido para as colónias, sobretudo para a América portuguesa, sendo esta questão o nó central da nossa pesquisa. De facto, a partir da descoberta do ouro, no início do século xviii, o principal destino dos migrantes minhotos foi a capitania do Rio de Janeiro, ponto mais próximo para alcançar a região das minas (Russell-Wood, 1998). A chegada desses homens também estava relacionada com os mecanismos de reprodução social das suas famílias de origem, constituindo uma resposta às pressões e à necessidade de manutenção de um equilíbrio demográfico face às especificidades do sistema sucessório, do parentesco, da estrutura fundiária e dos níveis de fecundidade minhotos (Brettel, 1991; Durães, 2004). Expulsos, ou voluntariamente atraídos pela riqueza de ouro e de terras, o facto foi que, desde então, o espaço colonial abrigou nobres, fidalgos, clérigos, mercadores, homens de negócios e milhares de camponeses provindos do Norte e do Noroeste português (Oliveira, 2009).

Sendo assim, começaremos por traçar alguns paralelismos entre as práticas de transmissão de bens em Portugal e na sua colónia americana durante o período considerado.

 

Sistemas de transmissão

O primeiro elemento comum dos sistemas de transmissão portugueses e brasileiros tem por base a própria cultura senhorial do Antigo Regime, que defende a indivisibilidade do património fundiário e pode ser verificada nas práticas de famílias senhoriais. O segundo refere-se ao contexto de dominação legal de um regime colonial, no qual a legislação portuguesa vigiou e regeu o direito sucessório no Brasil até 1822. O terceiro é a evidência histórica, num mesmo contexto ocidental de liberalização fundiária do século xix, da coexistência de um direito sucessório cada vez mais igualitário com práticas sociais que se orientavam para a sucessão única.

Também no Brasil, a discrepância entre a lei e a prática foi atestada. Os trabalhos que se ativeram especificamente aos mecanismos de reprodução social dos senhores de engenho entre o século xviii e meados do século xix (João Fragoso, para o Rio de Janeiro, Carlos Bacellar, para São Paulo, e Sheila de Castro Faria, para Campos dos Goytacazes) parecem concordar que a legislação que pressupunha a partilha igualitária das terras era frequentemente desrespeitada.

Segundo Carlos Bacellar (1997, p. 127), o conflito entre uma legislação ultramarina, criada à revelia da sociedade colonial, e a realidade quotidiana de um sistema económico monocultor, em que o avultado capital investido nos engenhos de açúcar não era divisível, criou práticas diversas da lei, adaptadas às necessidades do momento e virtualmente desconhecidas pelos historiadores. Ele defendeu que, embora a legislação se orientasse para a partilha igualitária dos bens entre todos os filhos, nas regiões açucareiras paulistas a prática das famílias da elite ia em direcção contrária, lançando mão de dotes, de adiantamentos de heranças e do uso da terça testamentária para inviabilizar o igualitarismo. Para Sheila Faria (1994), a explicação para tal procedimento, ao menos para as áreas açucareiras fluminenses no século xix, residia na sobrevivência material e na continuação do padrão de vida das famílias, largamente dependentes da manutenção do conjunto do engenho. Mantendo-se os bens sob o controlo de um, todos poderiam usufruir deles.

Segundo João Fragoso (2009, pp. 24-28), para contornar a lei das heranças, que supostamente fragmentaria os bens da família, os pais transferiam os seus bens entre cunhados e irmãos seleccionados, ou recorriam aos cartórios dos tabeliães para vender o património a um parente cuidadosamente escolhido, mesmo contra a lei. Silvia Brugger (2007) também relativizou as práticas igualitárias de herança vigentes no Brasil (precisamente em Minas Gerais), sublinhando a necessidade de se pensar a transmissão de bens noutros momentos que não a sucessão post mortem. Carla Almeida (2007, p. 155), estudando as estratégias da elite mineira setecentista, mostrou que essas famílias também tinham por hábito vender todos os bens do casal a um membro escolhido como sucessor, como forma de impedir a dispersão gerada pela partilha.

Sheila de Castro Faria (1994) e Alida Metcalf (1992) identificaram padrões matrilineares de transmissão que privilegiavam a figura do genro e mantinham íntegro o património, com a exclusão total, e decorrente emigração, dos filhos homens. Dora Costa (1997) e Carlos Bacellar (1997), por sua vez, descobriram padrões patrilineares, em que a migração dos excluídos era impulsionada pelo adiantamento da herança ou pela venda da legítima.

A partir do nosso estudo de caso, a freguesia de Campo Grande, na província do Rio de Janeiro, também concluímos que para o habitus senhorial os grandes engenhos deviam permanecer íntegros e que o testador devia poder escolher o seu herdeiro preferencial. Percebe-se também que o arbítrio da vontade não dependia do tamanho nem da quantidade de terra e resistiu até ao final do século xix, embora a antiga legislação colonial e a lei de partilhas imperial, posta em prática a partir de 1835, consagrassem o contrário.

Em Campo Grande, quando se procedia ao inventário judicial, que arbitrava valores e pagamentos iguais a todos, é fácil reconhecer o núcleo do património a passar para um único sucessor, enquanto os outros dividiam desigualmente trastes, dinheiro e escravos. Todos entendiam que a transmissão devia preservar o património, de facto, ou ao menos que os direitos máximos sobre esse património deviam ser transferidos, integralmente, para um único herdeiro. Mesmo na colónia, estamos na presença de uma sociedade em que parecia natural que os indivíduos não fossem iguais e que não tivessem os mesmos direitos (Pedroza, 2009). Todos sabiam que possuíam qualidades, status e posições sociais muito distintas a zelar (Hespanha, 2006; Hespanha e Xavier, 2006).

 

Estratégias matrimoniais

Na Europa, a perda potencial do património familiar em benefício de outra família, motivada pelo casamento de filhas, foi solucionada de duas maneiras: o celibato e o dote. Os dados relativos ao celibato feminino já foram apresentados neste texto. Quanto ao segundo elemento, foram identificadas três formas de dotação: uma que preconizava a restituição obrigatória do dote ao montante geral a ser partilhado, outra que permitia uma restituição facultativa e uma terceira que permitia a restituição apenas do “excesso do dote”, ou seja, da parte superior ao que caberia ao filho pela legítima. Essas três formas interpretavam a dotação como um adiantamento da legítima paterna e distinguiam-na de uma quarta forma: aquela que entendia o dote como a exclusão do herdeiro da partilha (Goody, 1978, p. 33).

Os camponeses minhotos investiam muito no dote das filhas para lhes garantirem um bom casamento, já que para os filhos havia outras saídas (Durães, 1988). Quando se casavam, as filhas recebiam dinheiro, roupa de casa e de vestir, jóias, móveis, alguns animais e utensílios de trabalho. Mas, por via do dote, perdiam os direitos sobre a terra paterna. Portanto, estamos em presença do quarto tipo de dote, o que pressupõe a exclusão da herança (Durães, 2002).

Segundo a legislação portuguesa vigente no Brasil colonial, os dotes não eram restituíveis, e no inventário devia-se contabilizar apenas meio dote, deduzindo-o da legítima do herdeiro. A Igreja, a moral e os costumes preconizavam o casamento socialmente homogâmico, isto é, aquele em que os noivos pertencessem ao mesmo grupo social e tivessem aproximadamente o mesmo nível de rendas e recursos (Almeida, 2007; Bacellar, 1997, p. 98). Nas palavras de Silvia Brugger (2007, p. 226), “ser igual, numa sociedade patriarcal, é ter o que trocar”.

A eficiência do dote como forma de atrair bons cônjuges era proporcional ao seu valor, mas a sua composição foi variável dentro da mesma família, dependendo da vontade paterna ou do momento do ciclo de vida familiar. Sem que houvesse regras que fixassem o seu montante, os pais transmitiam aos filhos noivos o que queriam, ou quanto podiam, mostrando que os filhos já eram tratados desigualmente. A importância decrescente do dote entre os meados do século xviii e os meados do século xix já foi destacada por alguns autores (Bacellar, 1997, p. 128; Kuznesof, 1986; Nazzari, 1984; Samara, 1980).

Segundo João Fragoso (2009, pp. 24-28), as famílias senhoriais cariocas preferiram restringir as suas alianças matrimoniais e reforçar elos com algumas famílias amigas através do tempo, reproduzindo casamentos entre aparentados. Para Carla Almeida (2007, p. 155), a prevalência de casamentos endogâmicos e economicamente homogâmicos era uma estratégia para reforçar a condição da “nobreza da terra” e manter unido o cabedal construído pelos pais dos noivos. Carlos Bacellar (1997, p. 92) e Alida Metcalf (1992) demonstraram que o local de residência mais isolado restringia o mercado nupcial e incrementava os casamentos consanguíneos entre as famílias mais abastadas.

Na colónia, em períodos de estabilidade económica, famílias longamente radicadas num certo local formavam redes de parentela complexas que podiam prescindir de elementos externos, tornando-se, inclusive, um valor cultivado o casamento entre parentes e vizinhos pertencentes a essa mesma rede, como foi verificado em Minas Gerais (Brugger, 2007). Bacellar (1997, p. 95) e Metcalf (1992) também notaram que uniões escalonadas no tempo, envolvendo homens e mulheres de duas famílias, serviam como compensação, ou seja, eram uma oportunidade para “ganhar” uma nora após haver “perdido” uma filha para a mesma família, e que essa troca abrangia o dote de ambas as raparigas, que eram “compensados verbalmente” um pelo outro.

Por outro lado, a diversificação das estratégias matrimoniais foi um dos elementos idiossincráticos verificados no comportamento da elite colonial mineira. Esse grupo destinou algumas filhas para casamentos endogâmicos ou economicamente homogâmicos, valorizando o sangue nobre, preservando os bens da casa e reforçando vínculos locais (reiterados no tempo por compadrios entre parentes próximos), e outras para selarem alianças mais vantajosas economicamente com genros vindos do reino já enriquecidos pelas suas actividades mercantis (Almeida, 2007).

No nosso estudo de caso vimos que, embora o dote das filhas fosse uma decisão importante para lhes proporcionar bons casamentos, sobretudo quando se tratava de alianças ascendentes, essa não parece ter sido a tónica do relacionamento entre famílias vizinhas. As famílias senhoriais relacionavam-se com famílias mais nobres de fora da freguesia apenas esporadicamente. De resto, quase todos os filhos, mesmo de pais sesmeiros ou senhores, teriam como expectativa casar com as congéneres locais herdeiras ou, como era mais comum, com os vários grupos abaixo desse nível ideal, sobretudo primas e vizinhas mais pobres. Em Campo Grande parece ter prevalecido a lógica do equilíbrio de longo prazo, segundo a qual numa ponte entre famílias senhoriais circulariam mulheres por várias gerações, mesmo sem dotes expressivos, que se compensariam no episódio seguinte, reequilibrando a balança (Pedroza, 2008b).

 

Sucessores e excluídos

Devemos abordar brevemente a questão da escolha do sucessor e de que forma esse procedimento se vinculava tanto a sistemas de transmissão não igualitários quanto a uma visão corporativa e hierarquizada da família. Segundo Carla Almeida (2007, p. 158):

Havia um reconhecimento por parte dos demais membros da família da legitimidade da gestão e condução dos bens da casa por aquele que havia sido escolhido pelo patriarca [...] só quando essa figura desaparece é que os herdeiros se dão o direito de recorrer à justiça para reaver parte dos bens de que eram os herdeiros legítimos. Ou seja, essa família partilhava de uma forte noção de casa.

Carlos Bacellar (1997), embora não tenha conseguido desvendar o motivo da escolha precisa de um ou de outro filho como sucessor dos pais, ressaltou o carácter carismático ou consensual da sua liderança, já que esses arranjos sucessórios eram discutidos e aceites pelos outros membros da família. No nosso caso, preferimos transformar a “liderança carismática” num feixe de relações sociais que personificava heranças imateriais de todo um modo de vida tradicional. Encarnando inúmeras expectativas de reciprocidades, esses sucessores perpetuavam conscientemente a dinâmica social que os amarrava a irmãos e parentes menos aquinhoados, já que era esse capital relacional a sua principal fonte de legitimidade social e de poder (Pedroza, 2008b).

O sucessor deveria esperar a morte dos pais para se casar e gerir a exploração, enquanto os co-herdeiros não sucessores deveriam esperar por esses legados para se poderem casar e estabelecer-se fora da casa a partir dos 25 anos. Se isso tardava, eram constrangidos ao celibato, à dependência do irmão sucessor e a considerar a sua legítima um empréstimo, do qual iriam receber os juros a partir dos 25 anos (Durães, 1988).

Já que a manutenção da integridade da exploração impossibilitava que todos os descendentes se mantivessem ligados à terra paterna, e tendo consciência da situação precária na qual se encontravam os filhos não designados como sucessores, os pais camponeses minhotos, na medida das suas capacidades económicas, investiam ainda em vida no estabelecimento de seus filhos fora da propriedade familiar. Casamento, sacerdócio, colocação noutro ofício, emigração, estas eram as principais finalidades da constituição dos “legados por conta da legítima”, mais tarde descontados em inventário (Durães, 2004; Marques, 2003).

No Brasil, Carlos Bacellar (1997) descobriu que as famílias senhoriais do Oeste paulista também tiveram de encontrar uma fórmula que recompensasse os herdeiros cedentes. Se estes saíam prejudicados no processo sucessório, era porque havia uma causa mais importante: a preservação da integridade do engenho e da fortuna familiar, em detrimento da igualdade entre os filhos. Todavia, eles não eram deixados de lado. No caso paulista, a solução para a exclusão dos co-herdeiros foi enviá-los para a frente pioneira.

Voltando ao Minho, os pais camponeses vinculavam a nomeação do sucessor a um conjunto de condições e de reservas para que esse “privilegiado” não deixasse de assegurar a subsistência e o bem-estar de toda a família. As mais importantes obrigações assumidas pelo sucessor eram as reservas de casas de morada, que impediam a coabitação de membros de uma mesma geração, e o pagamento de dotes e legados por conta das legítimas, para facilitar a saída dos não sucessores (Durães, 2003, p. 172). Pagar as dívidas, entregar legados, assumir pensões, disponibilizar usufrutos, dotar e entregar legítimas aos outros descendentes, zelar pela salvação da alma do testador, eram os custos ou condições que o sucessor tinha de pagar pela sua nomeação (Brandão, 1991, p. 626).

Quando os pais morriam, em geral, todos os filhos já estavam estabelecidos, mas, caso ainda não estivessem, essa tarefa seria passada ao sucessor, pois de outra forma os outros filhos ficariam sob a sua dependência económica, o que potenciaria os conflitos e as animosidades (Durães, 1992, p. 139, e 1995). Percebe-se que a estratégia familiar minhota de manter as terras unidas, sem perder de vista o destino dos filhos excluídos das terras, acarretou custos para o casal e para o seu sucessor, que podem ser verificados, inclusive, nas listas de dívidas arroladas e reconhecidas nos inventários e cartórios. É importante não descurar o papel do mercado de terras e do crédito como forma de fazer face às compensações económicas inerentes a esse sistema (Brandão, 1991, p. 626).

Revelador das dificuldades e obrigações que o sistema de herança preferencial acarretava é o facto de inúmeros testamentos indicarem uma sequência de sucessores preferenciais, caso o primeiro nomeado não aceitasse as condições inerentes à sua nomeação. O incumprimento dessas condições por parte dos sucessores era habitual. O sistema tinha todos os ingredientes para gerar tensões e conflitos familiares. Mesmo assim, os casos de ruptura total entre pais e filhos eram raros: os conflitos eram decididos em família e não punham em causa a continuidade da casa (Durães, 2003, p. 176).

No Brasil verifica-se uma situação parecida. Em São Paulo, a partir de 1840, o açúcar perdeu a sua primazia em prol do café, que se tornou mais atraente para muitos senhores de engenho. Mas os solos nas zonas de ocupação mais antiga eram impróprios para esta cultura. Assim, herdar uma propriedade paterna com engenho montado e permanecer na produção de açúcar nessa fase específica de busca de novas terras para o café pode não ter sido uma opção ou um privilégio para os sucessores (Bacellar, 1997, p. 175). O nosso estudo de caso numa freguesia ainda mais precocemente decadente na produção de açúcar mostrou-nos que, desde o final do século xviii, não se instalaram novos engenhos e os existentes foram continuamente desmontados ou transferidos. Portanto, os sucessores de engenhos cariocas a partir de então foram senhores de terras cansadas, endividados, cujo padrão de vida pouco se afastava do dos médios lavradores vizinhos (Pedroza, 2008b)

Neste contexto, quais seriam, portanto, as vantagens de ser o sucessor de um engenho? Segundo José Augusto Marques (2003), pela ideologia da casa, o herdeiro recebia circunstancialmente como direito e como dever um produto cultural cujos componentes eram não só a casa com as suas terras e animais, mas a casa como um repositório de ideias, valores e símbolos. Se o preço a pagar era, em geral, demasiado elevado, se comparado com os rendimentos de que iria beneficiar, podemos concluir que as vantagens relacionadas com o ser-se escolhido para suceder na exploração agrícola seriam mais simbólicas do que materiais. Paralelamente aos bens (e dívidas) materiais, herdava-se o nome, o lugar detido na comunidade, o prestígio e o poder, e por esta herança imaterial não se davam compensações.

Segundo Edward Thompson (1978, p. 328), “na terra que é transmitida através de herança, frequentemente a principal propriedade não está na terra, mas no usufruto. É a posse, e as funções, papéis e símbolos ligados à posse, que se transmitem”. Era, portanto, nas componentes simbólicas que integravam a sucessão que os herdeiros nomeados colhiam o benefício ou a vantagem em relação aos descendentes preteridos (Durães, 2003, p. 181, 2004).

Em nossa opinião, para os sucessores, romper com as obrigações associadas ao seu papel social significava perder todo o lastro do poder senhorial tradicional: a parentela, os sitiantes, o trabalhador obrigado moralmente. Em contextos economicamente menos pujantes, eram esses outros distintivos que alçavam socialmente um indivíduo, ou que ditavam a sua pertença e manutenção no grupo dos senhores, independentemente das suas dívidas. Sem esse prestígio não era possível manter trabalhadores nas plantações e engenhos, não se criavam vínculos de reciprocidade vertical, não se cobravam dívidas, não havia lugar a demonstrações de respeito e deferência, não se arregimentavam batalhões, não se casavam os filhos excluídos da herança.

E quanto aos filhos não sucessores? Como vimos, no Minho a casa deveria garantir-lhes o tecto e o sustento (Durães, 1988, p. 52). Mesmo assim, como é que esses indivíduos superaram os entraves colocados às suas vidas familiares e afectivas? Segundo Silvia Volpi Scott (1999), no Minho eles encontraram formas alternativas de união e reprodução: concubinato, uniões não legítimas e geração de filhos naturais. Sobretudo as mulheres procuraram superar a imposição do celibato.

Na freguesia de Campo Grande, a saída encontrada foi diferente.

 

Os excluídos senhoriais da freguesia de Campo Grande

Nesta última parte do texto exporemos algumas conclusões que emergiram do nosso estudo de caso, considerando que alguns elementos podem trazer novas perspectivas sobre as velhas questões que abordámos. Em primeiro lugar, uma breve contextualização do objecto de estudo e das fontes utilizadas neste trabalho. A paróquia de Campo Grande foi criada em 1673 com a fundação de uma capela particular nos campos de Bangu e em 1834 fundou-se a freguesia, que fazia parte do bispado da província do Rio de Janeiro, mais tarde integrada no município neutro da Corte (Fróes e Gelabert, 2004; Mattos, 1987; Santos, 1965 [1900]). A freguesia de Campo Grande inseria-se no recôncavo da Guanabara, entorno da baía de Guanabara, onde, no século xviii, prevalecia a produção de açúcar para exportação (Lamego, 1942; Várzea, 1945). Em 1813, segundo o “rol da desobriga”, a freguesia comportava 432 fogos e tinha 3058 moradores3.

Para conhecer as famílias senhoriais campo-grandenses no correr do século xviii utilizámos registos paroquiais de baptismo, casamento e óbito, depositados no arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, também sistematizados na obra do genealogista Carlos Rheingantz (1965). No final desse século, membros dessas famílias também compareceram às listagens governamentais e episcopais que se produziram na freguesia (1777, 1794, 1797) e que foram transcritas por José Nazareth Fróes (Fróes e Gelabert, 2004), Affonso Várzea (1945) e Alberto Lamego (1942). A par destas fontes, cotejámos uma sequência de inventários e processos judiciais ligados à partilha de bens depositados no Arquivo Nacional e o registo paroquial de terras de 1855 da freguesia de Campo Grande, depositado no Arquivo Geral da cidade do Rio de Janeiro.

Como já dissemos, se a preservação do património e a sucessão única foram uma preocupação constante, dois aspectos marcantes fazem diferir as estratégias patrimatrimoniais das famílias senhoriais brasileiras das suas congéneres europeias: a legislação “plebeia” e a abundância de terras. Já vimos que, não podendo valer-se de uma legislação protectora dos seus domínios, as famílias senhoriais brasileiras tiveram de adaptar ou contornar o direito fundiário vigente. E quais seriam as consequências para o sistema de transmissão de um contexto em que a principal fonte de subsistência, a terra, ainda era elástica e aberta?

Descobrimos que, num contexto de baixa densidade demográfica, terras livres e pouca pressão dos engenhos sobre o seu entorno, as famílias senhoriais de Campo Grande criaram no seio da fratria uma escala desigual de direitos entre herdeiros, que começava no grau máximo de sucessor do engenho e dos títulos do pai, passava por algumas gradações, como herdeiros de porções imóveis menores ou de porções móveis do património, filhas que recebiam dotes, e chegava ao nível dos filhos quase sem direitos de herança, a que chamamos “excluídos senhoriais”. Chamaremos assim aos filhos de famílias senhoriais que, pela cultura da herança desigual, não recebiam bens de raiz no momento da partilha, ou seja, não reproduziam a condição senhorial dos pais, nem como sucessores dos seus engenhos, nem ao menos noutras terras (como fizeram os filhos dos senhores paulistas, que, com o adiantamento da legítima, puderam migrar para a frente pioneira e comprar terras, reproduzindo noutro local a sua condição senhorial).

A partir da necessidade de garantir ao menos a sobrevivência desses filhos sem herança, a fórmula encontrada em Campo Grande consistia em fundar novos sítios dentro das sesmarias da família ou de outras famílias senhoriais amigas. Juridicamente, os filhos que receberam sítios dessa forma tinham o direito de usufrutus, mas não tinham o de abusus, que cabia ao herdeiro preferencial. Economicamente, teriam terra suficiente para alimentar a família, pois poderiam ainda ter posses mais distantes e ter outros partidos, o que contentava a maior parte dos casos. Socialmente, não sofriam constrangimentos relacionados com a escolha do cônjuge, sendo este, na maior parte das vezes, um vizinho do local, também sem posses.

Além disso, depois de casados, não eram afastados do circuito familiar, da “casa grande”, nem da vizinhança, e podiam mesmo usar o nome da família para ocasiões em que o prestígio, e não os recursos económicos, fossem a moeda de troca principal, como nos baptizados e testemunhos em processos. Por último, poderiam sempre alimentar a esperança, bastante confirmada pelos casos que estudámos, de que os seus filhos seriam a reserva matrimonial preferida dos tios e primos mais ricos, criando, com isso, um circuito matrimonial que repunha, para alguns, as condições económicas perdidas pelos pais (Pedroza, 2009).

Defendemos, portanto, que a escala de transmissão de direitos de propriedade entre co-herdeiros criada em Campo Grande respeitava três elementos: o direito à sesmaria familiar, a existência de terras devolutas e a manutenção de um único sucessor. Mas para o bem da casa nem a sucessão nem a exclusão do património seriam absolutas. Aí reside a originalidade dos campo-grandenses: o seu sistema de transmissão não contradizia a herança preferencial, a vontade do testador, nem a integridade do património fundiário, corroborando a cultura da época. Mas, por outro lado, não excluía os outros familiares do usufruto das terras da família nem os condenava à emigração ou ao celibato. Dessa maneira, os direitos sobre o território reproduziam-se desigualmente, é bem verdade, mas não com a exclusão absoluta daqueles que dependiam de pequenas porções de terra para viver (Pedroza, 2009).

A situação dos excluídos senhoriais que viviam nas terras dos pais, ou parentes, embora não descrita nesses mesmos termos, pode ser vislumbrada noutras regiões, como nos inventários paulistas analisados por Carlos Bacellar (1997, p. 136), onde se listavam os filhos que cultivavam mantimentos ou plantavam cana em terras do engenho paterno. Bacellar já reforçara que, neste caso, essas terras continuavam sob poder do pai, não sendo desmembradas em propriedades independentes.

Como dissemos anteriormente, as estratégias familiares dentro de sistemas não igualitários de transmissão podem-se reflectir em comportamentos demográficos bastante restritivos, como os que se verificam no continente europeu. Assim, mesmo sob o aspecto meramente demográfico, é necessário reconhecer as particularidades do Antigo Regime nos trópicos: as reconstruções genealógicas mostram famílias muito férteis, com grande número de filhos a atingir a idade adulta, e, facto expressivo, quase todos os filhos permaneciam no local, ao menos até final do século xix, casando-se e criando novos sítios nas redondezas dos engenhos das suas famílias. Os excluídos da herança não eram obrigados a deixar a casa nem a fazenda em que nasceram nem a permanecer solteiros como servos do irmão preferido. Podiam casar-se e ter filhos à vontade, como de facto fizeram.

Do ponto de vista fundiário, podemos dizer que a frouxa ocupação do território colonial trouxe soluções novas para o velho problema da transmissão de terras. Ao invés dos territórios sobrelotados da Europa, em que os meios de produção eram visivelmente menos elásticos e a exclusão da herança impunha o celibato ou a emigração definitiva, a novidade da colónia era a abundância e a consequente possibilidade da instalação de uma geração em terras diferentes da geração anterior. Além disso, esse processo reproduzia-se no tempo através do que chamamos “economia moral tradicional”, com regras e critérios de legitimidade próprios, sem passar pela consolidação da propriedade privada da terra, em termos modernos (Pedroza, 2008b). Sendo assim, defendemos que as famílias cariocas estavam imersas na mesma cultura senhorial e corporativa do Antigo Regime europeu, mas que nos trópicos puderam agir com outros recursos, dando origem a modelações diferentes das previstas.

 

Conclusão

Em Portugal, o Código Civil de 1867 restringiu o grau de desigualdade entre os herdeiros, ao mesmo tempo que manteve a indivisibilidade e a consequente sucessão única das terras aforadas (prazos de vida e prazos perpétuos). Mesmo assim, os investigadores continuaram a verificar a permanência de práticas de transmissão que preservavam a integridade do património (Brandão, 1991). No Brasil, o direito sucessório igualitário foi reforçado pelo Código Civil de 1916, mas ainda hoje, em áreas que dependem da integridade do património, persistem práticas de sucessão preferencial e sistemas não igualitários de transmissão de bens, como demonstram vários trabalhos de campo da antropologia rural (Andreazza, 2008; Anjos, Caldas e Costa, 2006; Santos, 2006; Several, 2006; Spanevello, 2008).

Analisando precisamente as estratégias de transmissão de uma família de imigrantes portugueses agricultores no Rio de Janeiro nos dias de hoje, a antropóloga Miriam de Oliveira Santos (2006) concluiu que, mesmo realizando-se uma divisão igualitária em termos do valor económico dos bens, as filhas e o filho que não moravam com a família receberam casas e lojas, mas não as terras, tractores e camiões, os bens de produção da família. A divisão funcionou efectivamente como uma forma de exclusão, a terra foi encarada como um património e não apenas como uma mercadoria, o que implicou uma partilha economicamente igualitária, mas simbolicamente desigual, porquanto dividiu e demarcou os “de dentro” e os “de fora”.

Analogamente ao que afirma Seyferth (1985), para Miriam Santos a divisão da herança teve como referente não o Código Civil, mas as práticas não igualitárias de transmissão camponesa, mantendo-se culturalmente ligada à ideia de casa. No mesmo sentido, a antropóloga Margarida Maria Moura (1978, pp. 88-89) concluiu que as heranças camponesas podem forçar uma lógica própria em tensão com os códigos nacionais devido às exigências inerentes à reprodução social do próprio campesinato.

A partir do nosso caso, podemos reforçar que linhas gerais não igualitárias existiram também em contextos de fronteira relativamente aberta, comprovando que esta não é uma variável determinante para a configuração de sistemas igualitários de transmissão de terras. Não nos deixemos enganar pelo suposto simplismo da existência de “terras livres”. Na verdade, o território já estava, em meados do século xviii, ao menos na freguesia de Campo Grande, completamente dividido em sesmarias. Só que as sesmarias concedidas eram muito maiores do que se podia efectivamente aproveitar e, mesmo estabelecendo os seus engenhos, casas-grandes e senzalas na porção mais nobre, essas famílias senhoriais possuíam muitas terras livres, ou devolutas, dentro da sesmaria reconhecida como sua.

Por isso, mais do que disponibilidade, julgamos mais adequado falar na diversidade de direitos sobre aquelas terras, diversidade que se mantém por quase todo o século xix e que a velha legislação metropolitana ou os novos códigos imperiais não foram capazes de constranger (Pedroza, 2008b).

Por outro lado, embora individualmente desigual e mais excludente para as filhas, o sistema de alianças matrimoniais num contexto local restrito em que abundavam os direitos de propriedade senhoriais, espaços ainda livres e famílias de poucos recursos não se limitou às negociações financeiras, à exclusão feminina ou à cessão de terras como transacção isolada.

Houve também outros meios pelos quais as famílias senhoriais cariocas conquistaram ou negociaram algum bem, material ou imaterial — terras, escravos, engenhos, status, patentes ou favores —, com o objectivo de reproduzir a sua condição social através do tempo, além daqueles que analisamos aqui. Seria necessário focar outros aspectos do processo de reprodução social dessas famílias, por exemplo, a forma como geriam os seus direitos tradicionais de propriedade num mercado de terras imperfeito (Pedroza, no prelo), as redes estabelecidas pelos compadrios rituais ou ainda a forma pela qual se recriou o contínuo monopólio de cargos públicos, de patentes militares e do poder religioso em âmbito local (Pedroza, 2008a).

Por fim, julgamos que a comparação e o estabelecimento de continuidades e rupturas entre os contextos europeu e americano são necessários para a boa compreensão de variáveis-chave dos processos de reprodução social de elites fundiárias em ambos os lados do Atlântico. Mas, sem desmerecê-las nos seus objectivos, é preciso reconhecer que tanto a história da família quanto a história agrária ou a história demográfica brasileiras não analisaram ainda devidamente estes assuntos. A temática da reprodução social ainda está pouco estudada no Brasil. Para José de Souza Martins, o tema do direito costumeiro que regula a herança da terra no meio rural brasileiro foi “lamentavelmente negligenciado” (v. Moura, 1978). Na opinião de João Fragoso, as alianças matrimoniais e as formas de transmissão de bens entre as famílias brasileiras ainda são, em grande parte, segredos não desvendados, opinião que foi corroborada pelos poucos pesquisadores que se debruçaram sobre esse problema (Bacellar, 1997; Brugger, 2007; Faria, 1994). Portanto, os estudos de caso são poucos e as sínteses mais amplas ainda são, em larga medida, provisórias, requerendo um plano específico de pesquisa para esse campo.

 

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Notas

1 Ordenações Filipinas, 1870, pp. 832 e 955.

2  ibid., pp. 832 e 835.

3 A desobriga foi instituída no Brasil em 1717 e era o instrumento legal de que os bispos dispunham para o levantamento populacional nas suas dioceses. O original do rol de desobriga, ou dos confessados, de 1813 foi extraviado do arquivo da Cúria da arquidiocese do Rio de Janeiro. Portanto, baseámo-nos na transcrição feita por José Nazareth Fróes (Fróes e Gelabert, 2004, pp. 101-115).

 

** Os resultados discutidos neste artigo provêm de uma pesquisa financiada pelo CNPq e PDEE-CAPES e foram defendidos como tese de doutoramento em Ciências Sociais na UNICAMP. A redação e revisão do artigo foram possíveis durante o estágio pós-doutoral no ano de 2008 na Universidade de Montréal, financiado pelo Ministério dos Assuntos Estrangeiros do governo do Canadá. Agradecemos especialmente ao professor Christian Dessureault e aos membros do grupo de pesquisa “Antigo Regime nos Trópicos” pelas sugestões.

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