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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  n.196 Lisboa  2010

 

Políticas de identidade: perfil de DNA e a identidade genético-criminal

 

Helena Machado*, Susana Silva**, António Amorim***

* CICS, Departamento de Sociologia, Universidade do Minho, Campus de Gualtar 4710-057 Braga, Portugal. email: hmachado@ics.uminho.pt

** Departamento de Higiene e Epidemiologia, Unidade de I&D Cardiovascular e Instituto de Saúde Pública, Faculdade de Medicina, Universidade do Porto, Al. Prof. Hernâni Monteiro, 4200-319 Porto, Portugal. email: susilva@med.up.pt 

*** Faculdade de Ciências, Universidade do Porto, Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto, Rua Roberto Frias, s. n., 4200-465 Porto, Portugal. email: aamorim@ipatimup.pt 

 

O DNA é visto por muitos como a “verdadeira” base da identidade humana, por se tratar de uma estrutura biológica, em princípio, única em cada indivíduo. Esta noção de “unicidade”, pilar fundamental da investigação criminal e da genética forense, tem alimentado políticas de identidade da parte dos Estados modernos pela classificação e armazenamento de informação sobre “criminosos”. Neste artigo analisam-se estratégias médico-legais e burocrático-estatais de produção da identidade “genético-criminal” relacionadas com a criação, em Portugal, de uma base de dados forense de perfis de DNA. Discutem-se os impactos desta política de identidade na gestão, categorização e vigilância de indivíduos classificados como criminosos.

Palavras-chave: DNA; identidade; bases de dados; etnicidade.

 

Identity politics: DNA profile and the genetic-criminal identity

DNA is seen by many as the “true” basis of human identity, insofar as it is a biological structure that is, in principle, unique in each individual. This notion of “uniqueness”, a fundamental pillar of criminal investigation and forensic genetics, has fostered identity politics by modern states through the classification and storage of information about “criminals”. This article explores the alignment of science and state bureaucracy for producing the “genetic-criminal” identity in the context of the Portuguese forensic DNA database for forensic purposes. We discuss the impacts of this sort of identity politics for the management, categorization, and surveillance of individuals classified as criminals.

Keywords: DNA; identity; database; ethnicity.

 

Introdução

No âmbito deste texto pretendemos discutir os impactos societais das políticas de identidade dos Estados actuais apoiadas na tecnologia de perfis de DNA para identificação de criminosos. Mais especificamente, discutiremos os distintos elementos da identidade “genético-criminal” que emerge dos usos do DNA no âmbito de bases de dados que armazenam, informatizam e processam informação genética com objectivos de investigação criminal, referindo-nos em particular ao caso português[1].

A nossa análise dos impactos societais do uso da tecnologia de perfil de DNA apoia-se num conjunto de perspectivas que enquadram os usos da informação genética e a criação de bases de dados de perfis de DNA com objectivos forenses no âmbito de novas formas de governação, controlo social e de uso político de conhecimento sobre os cidadãos (Caplan e Torpey, 2001) apoiadas na construção de instrumentos de identificação civil, genética, biométrica e por videovigilância, com elevada incorporação científica e tecnológica (Frois, 2008b), e imbricadas em estratégias de vigilância dos indivíduos, de prevenção e combate à criminalidade e de coacção dos movimentos dos cidadãos (Garcia, 2008). Autores como Garland (2001), Rose (2000) e Lyon (2001) abordaram as formas como os Estados modernos prosseguem esforços de controlo dos indivíduos pelos usos de suportes científicos e tecnológicos para “corroborar a identidade dos sujeitos presentes e inferir a identidade dos elementos ausentes” (Williams e Johnson, 2004, p. 1), tendo como alvo privilegiado os corpos “suspeitos” (Aas, 2006).

As bases de dados de informação genética conjugam informação, pessoas e instituições e deste modo produzem redes de tecnociência e “centros de cálculo”, nas palavras de Bruno Latour (1987), que evidenciam a crescente extensão da vigilância burocrático-estatal como elemento de um aparato de biovigilância  com efeitos na governamentalidade dos corpos e na identidade daqueles que são alvo de captura, classificação, armazenamento e gestão de informação (Frois, 2008b). Utilizamos o conceito de governamentalidade na acepção desenvolvida por Michel Foucault, a propósito de formas de administração do bem-estar nas sociedades modernas, referindo-se a um conjunto formado por instituições, procedimentos, análises e reflexões, em que os cálculos e as tácticas que permitem o exercício deste tipo de poder específico e complexo têm a sua população-alvo, a sua principal forma de economia política do conhecimento e os seus principais meios  e aparatos técnicos de segurança (Foucault, 1979, cit. in Hannah, 2000, p. 22).

A reflexão desenvolvida neste artigo baseia-se, em larga medida, em debates recentes da sociologia e da antropologia do político e da ciência e nos chamados “estudos da vigilância”, centrados na questão da identificação e da identidade como elementos integrantes de acções de controlo governamental e policial sobre os cidadãos. Procederemos a essa discussão com base no eixo identidade-identificação-diferenciação. Partimos assim do pressuposto sócio-antropológico de que identificar significa produzir conhecimento sobre o outro e projectar formas de classificação social.

No caso que nos ocupa, a identificação de indivíduos por perfis de DNA no âmbito da investigação criminal significa uma forma de classificação biosocial, pela definição de grupos sociais a partir da partilha de um dado perfil genético. Como refere Catarina Frois num ensaio sobre bases de dados pessoais e vigilância em Portugal, a

identidade corresponde a identificação (conhecimento) e, no mesmo processo, a diferenciação (separação do outro), considerando que “identificar” e ser-se “identificado”, na sociedade contemporânea, corresponde a espaços de significação complexos, compreendendo noções de classificação social, categorização e elaboração de perfis [Frois, 2008a, pp. 111-112].

O termo “biopoder”, cunhado por Foucault há mais de três décadas (Foucault, 1994 [1976]), continua a figurar como uma referência clássica para a discussão das formas de administração, controlo e vigilância dos corpos. Nas palavras de Foucault (1994 [1976], p. 145), o biopoder é “o que faz entrar a vida e os seus mecanismos no domínio dos cálculos explícitos e faz do poder-saber um agente de transformação da vida humana”. Aplicando o conceito de biopoder ao caso específico das bases de dados de perfis de DNA com objectivos de identificação de criminosos, confrontamo-nos com um projecto securitário das sociedades contemporâneas. De facto, as utilizações destas bases de dados visam produzir, em simultâneo, conhecimento sobre os indivíduos (identificação) e sobre a sua identidade individual e social através de uma identidade genética, que é sobretudo numérica, conferindo primazia à biologia, em detrimento do contexto social e biográfico, potenciando, através desta classificação e da criação de perfis sociogenéticos, uma crescente marginalização dos membros mais vulneráveis da população (Lyon, 2008).

Analisaremos algumas das mais recentes políticas de identidade construídas em torno da identidade genético-criminal pela observação das práticas burocrático-científicas dirigidas a indivíduos condenados pela prática de crime, políticas essas que decorrem no contexto da base de dados de perfis de DNA criada em Portugal a 12 de Fevereiro de 2008 com propósitos forenses (Lei n.º 5/2008). Em particular, debruçamo-nos sobre os elementos contidos no formulário anexo à Deliberação n.º 3191/2008, referente ao “auto de colheita de amostras e de identificação de indivíduos condenados”. A colheita de uma amostra do corpo do condenado e a extracção do perfil de DNA permitirão definir a sua singularidade individual do ponto de vista biológico. Mas este processo de individualização biológica será cruzado com outros elementos que completam a biografia criminal do indivíduo, como o nome, residência, telefone, data de nascimento, estado civil, profissão, grupo étnico e naturalidade (dados específicos do indivíduo, logo da sua identidade pessoal). Posteriormente, a informação sobre cada indivíduo será inserida numa base de dados que contém informação genética (perfis de DNA e eventualmente amostras biológicas), mas também ficheiros de dados pessoais, o que permitirá associar o indivíduo a outros indivíduos que partilhem determinadas características, tais como o grupo étnico (agrupamento de indivíduos com características similares, logo identificação, mas também identidade social).

Em síntese, pretendemos descortinar as modalidades pelas quais uma entidade biológica — o DNA — é transformada em objecto de conhecimento e de intervenção (Hoeyer, 2003), constituindo um alinhamento da ciência com a burocracia estatal (Smart et al., 2008), com consequências assinaláveis para a gestão, categorização e vigilância dos indivíduos classificados como criminosos.

 

Individualização, identificação e identidade

A criminalística, ciência que tem por objectivo o reconhecimento de objectos extrínsecos relativos ao crime e à identidade do criminoso, é tradicionalmente descrita como a “ciência da individualização” (Kirk, 1963). A individualização significa a possibilidade de se definir uma única fonte como origem de um vestígio de uma cena de crime, dentro de um leque de várias fontes possíveis. A ciência forense distingue a individualização da identificação, uma vez que esta última apenas permite estreitar a fonte potencial de origem a um grupo ou classe de objectos (Cole, 2009, p. 235).

Uma nova epistemologia da identificação forense (Cole, 2009) reclama hoje que é impossível alcançar a individualização “perfeita”, devendo-se falar de probabilidades, e não de certezas (Kaye, 2009; Saks e Koeler, 2010). As instâncias científicas, geralmente, defendem que a individualização absoluta é uma meta teórica, mas, mesmo excluindo os gémeos monozigóticos ou “verdadeiros”[2], a inclusão de mais marcadores na análise do perfil de DNA traz consigo o aumento da probabilidade da observação de mutações somáticas, ou seja, de alcançar a heterogeneidade intra-individual (Amorim, 2002). O perfil de DNA é assim uma tecnologia de identificação de indivíduos descrita por muitos como o “padrão de ouro para a identificação” na sociedade contemporânea, não obstante as incertezas e vulnerabilidades das suas aplicações (Lynch et al., 2008).

Hoje, a análise do DNA para finalidades de identificação de indivíduos é essencialmente usada para a identificação de suspeitos, vítimas de crimes e vítimas de catástrofes e para o estabelecimento dos laços de parentesco entre indivíduos, sobretudo para o estabelecimento da paternidade. A elevada credibilidade na eficácia do DNA como método de identificação reside no seu elevado potencial de individualização. A identificação de indivíduos pela tecnologia do DNA assenta na possibilidade de individualização facultada pela análise de extensas zonas genómicas, a que se costuma chamar “DNA não codificante”. Estas zonas inter ou intragénicas mostram certas sequências que se supõe serem características de cada indivíduo e que produzem, assim, uma “impressão digital genética”, ou seja, uma estrutura biológica que é única em cada indivíduo (exceptuando o caso dos gémeos monozigóticos, que, do ponto de vista genético, são um único indivíduo). Logo, a comparação das “impressões digitais ou dedadas genéticas” permite observar se diferentes amostras biológicas provieram do mesmo indivíduo ou de indivíduos diferentes; e ainda se há uma relação biológica entre os fornecedores de amostras comparadas. Saliente-se que com os avanços no conhecimento do genoma humano, mesmo o DNA não codificante pode futuramente vir a ser associado a informação sensível, como doenças e traços comportamentais (Williams e Jonhson, 2004).

Nas palavras de Simon Cole, sociólogo americano especialista em sociologia da ciência forense e ex-agente policial, o DNA representa uma espécie de “miraculosa demonstração do poder da ciência para atingir a verdade” (Cole, 2002, p. 169). No seio das sociedades actuais, marcadas pelo anonimato e fluidez das hierarquias de classe, sem um nome ou uma posição na sociedade que diferenciem um indivíduo dos outros, esta demonstração de poder científico torna o indivíduo um ser biológico, “definido simples e cruamente como um corpo único, distinguível, aos olhos da ciência, de todos os outros” (Cole, 2002, p. 53).

As ciências sociais e humanas têm analisado aquilo que alguns designam como “o problema da identidade” (Gleason, 1983), eternamente envolvido no debate sobre a singularidade e a determinação social e associado ao exercício constante e simultâneo de identificação e diferenciação (Frois, 2008b). No âmbito deste texto, importa-nos discutir a construção da identidade genético-criminal baseada em formas de governação assentes na biotecnologia e no uso político de conhecimento “científico” sobre os cidadãos, práticas que surgem facilitadas pelo apoio público prestado à luta contra o crime e contra o terrorismo e pela renovação da popularidade dos estudos que identificam causas genéticas como potenciadoras da prática do crime e de comportamentos violentos.

O nosso principal objectivo consiste em discutir o alinhamento complexo entre a biologia e a política, plasmado na tecnologia de codificação genética, que consideramos exemplar dos rumos que a noção de identidade vai adoptando nas sociedades da vigilância e do controlo (Garland, 2001). Trata-se de um processo pelo qual a identidade é co-construída pela biologia e pela política, apoiada em dispositivos tecnológicos e convertida num código numérico, pelo qual “a biologia substitui a biografia e os registos substituem a experiência” (Frois, 2008b, p. 183). A identidade humana conferida pelo perfil de DNA baseia-se num código binário de positivo/negativo, verdadeiro/falso, que produz a ilusão da certeza, a exclusão da dúvida e a percepção da infalibilidade da tecnologia, e, neste sentido, é ilustrativa da construção identitária dominante nas sociedades da vigilância, uma vez que minimiza as eventuais ambiguidades e complexidades, distancia-se da comunicação verbal e praticamente elimina as possibilidades de dúvida, negociação e incerteza (Aas, 2006, p. 151).

Em termos socioantropológicos, a identidade individual refere-se aos elementos que distinguem um indivíduo de todos os outros, e nas sociedades contemporâneas este tipo de identidade corresponde, geralmente, à identidade legalmente definida. Trata-se de um tipo de identidade que surge associado a processos de identificação, ou seja, de produção de conhecimento sobre o indivíduo, geralmente sob a forma de tratamento e de incorporação de dados pessoais em bases de dados e arquivos. Os elementos que fazem parte da identidade individual podem ser registados, visualizados e arquivados numa fotografia ou noutro suporte material e ser associados a outros factos sociais e biográficos, criando deste modo um feixe de actores e de acções que, ligados entre si, produzem um tipo de identidade que permite distinguir certo indivíduo de todos os outros. Este conceito de identidade é similar, em termos conceptuais, ao conceito de individualização oriundo da ciência criminalística.

Aos processos de identificação e diferenciação atrás descritos juntam-se práticas sociais que criam a chamada “identidade social”, referindo-se esta  a processos de categorização e de classificação social dos indivíduos. No caso das identidades apoiadas na biometria e na genética, estes processos determinam em que categoria os indivíduos são colocados e relacionam-na com características corporais e comportamentais, afastando-se de quaisquer referências às narrativas daqueles que são identificados e da discussão das implicações éticas dessa categorização (Lyon, 2008).

A construção da identidade social agrupa indivíduos com base numa série de atributos, nomeadamente cognitivos, atitudinais, pessoais e sociais. Este tipo de identidade forma um conjunto de dispositivos úteis na interacção social, na medida em que organiza um padrão externo de classificação que define o que é entendido como verdadeiro ou específico em relação a cada grupo de pessoas e o que podemos esperar das mesmas. A identidade social pode assim ser entendida como o pilar das políticas de identidade do Estado (Williams, 2003), por permitir definir colectividades com continuidade e através de uma única identidade (os portugueses, os criminosos), e pode assumir particular importância nos processos de administração das identidades no seio de uma cultura do controlo (Garland, 2001). Este processo de construção da identidade equivale ao conceito de identificação, discutido atrás no contexto dos conceitos associados à epistemologia da identificação forense.

 

A construção das identidades suspeitas 

Actualmente, na genética, o conceito de “identidade” já não se refere a “identificação”, mas sim a “individualização”  (Hauskeller, 2004). Nas práticas correntes em vários países europeus, ao nível das bases de dados de perfis de DNA para efeitos forenses, o agrupamento dos indivíduos por categorias ou grupos (a identificação), por “grupo étnico”, por exemplo, conjuga-se com a individualização (unicidade genética), o que, em determinadas situações, tem contribuído para a discriminação de minorias, de que é exemplo a sobrerrepresentação de jovens negros do sexo masculino na base de dados de perfis de DNA inglesa (Nuffield Council on Bioethics, 2007, p. 56).

A concepção, hoje vulgarizada em várias instituições científico-estatais de investigação criminal e de medicina forense, de que a identidade humana (“o que somos”) é sobretudo genética pode encontrar uma aplicação mais plausível junto do que aqui vamos chamar “identidades suspeitas”. Estas são identidades instáveis, imprevisíveis e sem posição social definida, quando comparadas com as identidades dos indivíduos classificados como “respeitáveis”, os cumpridores da lei (Van der Ploeg, 2003). Daí que as identidades suspeitas possam ser mais facilmente aprisionadas nas malhas da identidade biológica: o DNA é algo que não muda substancialmente ao longo da vida e isso gera a segurança da classificação, da previsão e da esperada domesticação da parte das instituições científicas e jurídicas e do Estado.

A identificação de criminosos tem sido objecto da preocupação dos Estados já desde meados do século xix. Data dessa época o início da mobilização sistemática das ciências biológicas para esse efeito, utilizando-se diversas formas de individualização através da observação e medição do corpo, práticas que foram evoluindo para técnicas científicas mais apuradas, como a dactiloscopia (identificação por impressões digitais) ou a antropometria (identificação por medidas físicas do corpo humano) (Garcia, 2008). O criminalista e polícia francês Alphonse Bertillon, por exemplo, tornou-se famoso quando, em finais do século xix, usou um sistema antropométrico para medir o comprimento dos ossos com o objectivo de estabelecer identidades individuais. E hoje em dia temos infra-estruturas e sistemas cada vez mais complexos de identificação e de informação, também usados na identificação civil, comuns em aeroportos, e apoiados em métodos biométricos, pelos quais se procede a um reconhecimento de indivíduos por características físicas, nomeadamente padrões da retina, impressões digitais, perfis de DNA e reconhecimento da face (Adey, 2004; Aas, 2006).

Tal como noutros países, a criação em Portugal de uma base de dados de perfis de DNA com intuitos forenses localiza-se numa estratégia política e governamental mais ampla de identificação de indivíduos por atributos físicos, associada a objectivos de prevenção e redução do crime. Apoiada numa retórica de valorização da eficácia e fiabilidade da genética forense, o espaço para vozes dissonantes e críticas reduz-se, assim, de forma considerável. 

Nas representações populares existe a convicção de que o perfil de DNA é uma tecnologia absolutamente infalível na identificação de indivíduos. Mesmo que essa visão persista e seja dominante em instituições científico-burocráticas, de acordo com vários peritos forenses, trata-se de uma visão idealizada e irrealista do trabalho do perito em investigação criminal, na medida em que numa cena de crime a recolha de amostras biológicas não contaminadas não ocorre com muita frequência, o que impossibilita muitas vezes a sua utilização em tribunal (Podlas, 2006, pp. 434-435). Logo, a probabilidade de fundamentar um caso ou mesmo de obter uma condenação apenas com base em provas que resultam da análise de perfis de DNA é muito reduzida. Não obstante a intensa discussão em torno dos limites desse tipo de prova, dos potenciais erros de interpretação dos resultados das análises de DNA e da ocorrência de erros laboratoriais (Nuffield Council on Bioethics, 2007), esta tecnologia é geralmente encarada como mais fiável do que qualquer outro tipo de prova (Jasanoff, 2006; Lynch et al., 2008).

A legislação que regula o funcionamento da base de dados de perfis de DNA portuguesa estabelece um feixe de relações entre diferentes actores sociais (magistrados, cientistas forenses e condenados) que desenvolvem distintas acções de recolha de informação sobre os indivíduos. Esse conjunto de procedimentos é revelador de um conjunto de estratégias que definem aquilo que aqui chamamos “políticas de identidade”, materializando-se de modo exemplar no “auto de colheitas de amostras e de identificação de condenados”.

A lei estipula que é um magistrado quem ordena a recolha das amostras (artigo 7.º da Deliberação n.º 3191/2008)  e que a “autenticidade da identificação” é assegurada por laboratórios que procedam à realização da análise de perfis de DNA, nomeadamente pela recolha da impressão digital, fotografia e cópia de bilhete de identidade, sendo todos estes elementos anexados ao “ficheiro de dados pessoais” (artigo 6.º da Deliberação n.º 3191/2008).

O “auto de colheita de amostras e de identificação de condenados”  contém vários campos de preenchimento e no da informação referente ao condenado é necessário indicar a residência, o telefone, a data de emissão do documento de identificação, a data de nascimento, o estado civil, a profissão, o grupo étnico, a naturalidade e também o grupo étnico e a naturalidade dos progenitores. O examinado deve ainda declarar que não recebeu transfusão de sangue ou transplante de órgãos; declarar que aceitou que lhe fosse tirada uma fotografia e registados dados pessoais relevantes para a perícia; declarar que é titular do documento de identificação apresentado e que tomou conhecimento de que os seus dados pessoais vão ser inseridos num ficheiro de dados pessoais, que o seu perfil de DNA pode ser cruzado com outros perfis existentes na base de dados e que a sua amostra biológica pode ser conservada num biobanco, mas sendo imediatamente destruída após a obtenção do perfil (artigo 34.º da Lei n.º 5/2008). A amostra pode ser colhida por zaragatoa bucal (saliva), mancha de sangue ou outra (não especificada).

Este formulário de recolha de amostra biológica e de identificação do indivíduo condenado revela que o objectivo do Estado não é só identificar, mas também individualizar o corpo criminoso, pela sua unicidade biológica proporcionada pelo perfil de DNA. A identificação do indivíduo pelo perfil de DNA permite a criação de uma “identidade estável” (Cole, 2002, p. 55), conjugada com a história genético-familiar do indivíduo e que também pode ser cruzada com informação sobre reincidência da actividade criminal e sobre o estado mental, moral e social do condenado (elementos presentes, respectivamente, no registo criminal e em relatórios sociais elaborados pelas instituições penitenciárias). Deste modo, a trajectória criminal torna-se visível para o Estado, e os corpos potencialmente perigosos tornam-se mais susceptíveis de controlo: cria-se uma ligação entre determinado corpo (único, identificado e individualizado) e um arquivo estatal. Trata-se de uma “ligação credível” tanto para cientistas, burocratas e actores judiciais como para o público em geral (Cole, 2002).

O acto de recolha da amostra e de preenchimento dos diferentes campos do referido formulário assenta na estratégia de recolher o mínimo de informação, mas obtendo o máximo de informação, sendo esta uma prática corrente nos “centros de cálculo” (Latour, 1987). Neste centro de acumulação de informação, que representa um processo de constituição mútua de poder e conhecimento (Foucault, 1987), está implícita uma representação social sobre o perfil de DNA típica do “minimalismo genómico”, comum entre peritos forenses (Williams, Johnson e Martin, 2004), e que sustenta o carácter “inofensivo” da análise do DNA não codificante, que apenas permite a identificação dos indivíduos: o “referente nulo” (empty signifier) nas palavras de Cole (2002, p. 100). Note-se, contudo, que as amostras colhidas do indivíduo condenado e a respectiva extracção e análise do perfil de DNA podem revelar muita informação sensível, nomeadamente sobre laços de parentesco do indivíduo (talvez desconhecidos do próprio) e sobre o seu grupo étnico de pertença, sendo certo que este último aspecto pode potenciar a discriminação (Williams e Jonhson, 2004). Veja-se o caso do Reino Unido, onde, em determinadas circunstâncias, é possível fazer a “pesquisa familiar” (familial searching) (Nuffield Council on Bioethics, 2007, p. 19), o que tem despertado intensas críticas das comissões de ética pelo potencial informativo sensível dos resultados obtidos por esta técnica. Por esse processo, quando um perfil de uma cena de crime não coincide com nenhum perfil da base de dados, é possível procurar “perfis parciais”, o que significa que a amostra da cena de crime foi deixada por um parente biológico de um indivíduo cujo perfil, inserido na base de dados, parcialmente coincide com a informação encontrada na cena de crime, procurando-se desta forma encontrar um suspeito.

O esvaziamento de informação sobre o indivíduo através da análise do DNA não codificante, ou a redução ao mínimo essencial, é substituído por acções de preenchimento de significados quando se recolhe informação sobre o grupo étnico do condenado e seus ascendentes, profissão e outros elementos de identificação civil. Trata-se de reconstruir a identidade do condenado, criando aquilo que designamos por “identidade genético-criminal”. Este tipo de identidade, cujos traços descrevemos na próxima secção deste texto, permite governar o corpo do condenado pela operação de tornar visível para o Estado a sua história criminal e a sua unicidade biológica. Com este dispositivo, as autoridades encontram uma forma de controlar os corpos potencialmente perigosos e de estabelecerem os pilares do exercício de uma “economia política do corpo”, nos termos descritos por Foucault: são práticas e métodos de observação geralmente difusos, não sistematizados, ou não explicitados pelos discursos, mas que visam tornar o corpo observável e sujeito ao controlo dos peritos (Foucault, 1977, p. 26; Williams e Johnson, 2008, p. 25), conectando o corpo ao exercício do poder. Limita-se também a possibilidade de o biopoder emergir como um “contrapoder” (Latour, 2009), ao mesmo tempo que se evidenciam as “tecnologias moralizadas” (Verbeek, 2006) na gestão pública dos corpos e das identidades.

 

Grupo étnico, classificação genética e domesticação das resistências 

No âmbito das práticas científico-burocráticas do Estado português, especificamente de constituição de bases de dados de perfis de DNA com propósitos forenses, são recolhidas, registadas e manuseadas informações sobre o grupo étnico do indivíduo e progenitores directos. No seio da comunidade científica, uma das visões prevalecentes é a de que a etnicidade tem um significado genético relacionado com a ascendência biológica, o que significa que pode ser usada como marcador externo de diferenças genéticas, potenciando a possibilidade de individualização e criando ligações entre ideias populares de raça e o DNA, supostamente socialmente neutro (Fullwiley, 2008). Mas o conceito genético de grupo étnico é também (ou sobretudo) uma construção sócio-política, e a sua inserção no auto de colheita de amostras e de identificação do condenado representa um alinhamento da ciência com a burocracia do Estado (Smart et al., 2008) através de uma modalidade de reinscrição biológica da etnia (Duster, 2005), reveladora de novas expressões de políticas de identidade que utilizam a biologia e a etnia (Skinner, 2006). Existem, assim, riscos de reemergência da ideia biológica e genética de etnia relativamente à manifestação da criminalidade, ancorados em modalidades nomológicas deterministas, que tornam a subjectividade, agência e liberdade humanas “algo secundário, acessório e mesmo aparente” (Garcia, 2008, p. 62). Estas ideias podem emergir de três formas, eventualmente inter-relacionadas: (1) naturalização e institucionalização de categorias sociopolíticas que marcam diferenças entre grupos populacionais com base no pressuposto de diferenças biológicas; (2) diferenças sociais a serem interpretadas como diferenças genéticas; (3) bases de dados que contêm informação genética e uma classificação em termos de grupo étnico podem levar os investigadores a explorar as inter-relações entre pertença étnica e comportamento criminoso.

Uma classificação serve para conferir sentido e ordenar o mundo. O uso maciço de bases com dados pessoais é um dos mais poderosos instrumentos de classificação social nos nossos dias (Frois, 2008a). As classificações construídas pelos cientistas forenses são similares a outras classificações que usamos no quotidiano e são concebidas para poderem ser usadas por outros cientistas no seio da comunidade científica. Contudo, na prática, as classificações são histórica e socialmente contextualizadas, podendo as classificações de grupo étnico ser consideradas “objectos de fronteira” (Star e Griesemer, 1999), ou seja, conceitos capazes de circular em diferentes contextos com a potencialidade de serem operacionalizados de modo diferente em cada um destes. Da mesma forma, o formulário de “auto de colheita de amostras e de identificação de indivíduos condenados” é um objecto que simultaneamente incorpora a autoridade e a credibilidade da ciência e o poder do Estado, adoptando assim a condição de “móvel imutável” (Latour, 1987) comum a outros objectos que “fixam” o conhecimento científico e que permitem o seu transporte à distância.

O uso do conceito de grupo étnico e a respectiva articulação com a criminalidade caracterizam-se pela incerteza, ou pelo menos pela não existência de definições ou teorias universalmente aceites (Williams e Johnson, 2008). Como sugere Nikolas Rose (2008), a raça ocupa um lugar “instável” entre as políticas de identidade e uma visão molecular do genoma humano. Mas, como chama a atenção Shim (2005), persiste na investigação científica, de modo ritualista, a inclusão das categorias de raça e etnia, pela via de práticas que valorizam elementos de generalização, comparabilidade e estandardização. De notar, no entanto, que a ritualização da inclusão do grupo étnico não deriva apenas de princípios científicos de estandardização, antes se apoia numa rede sociotécnica (Callon, 1987) pela qual se assiste a um alinhamento de requerimentos de estandardização de ordem científica, mas também burocrático-estatal. Em síntese, a intersecção entre etnia e genética representa a conjugação entre ciência, tecnologia, burocracia e políticas de identidade. Este alinhamento poderá ter consequências para a gestão e vigilância de grupos populacionais por parte do Estado, assim como para “novos” entendimentos da relação entre raça, etnia e criminalidade.

 

Conclusão

Do século xix à chamada “era da genética” há continuidades na história da identificação criminal, mesmo quando a ciência e a tecnologia mudam. De acordo com Cole (2002, p. 305), existem três modos principais de inquirição da identidade dos indivíduos em contexto de investigação criminal: (1) a identificação forense; (2) a identificação em arquivos; (3) a identificação por diagnóstico. No âmbito deste texto abordamos os modos de identificação forense e de identificação em arquivos e discutimos especulativamente as consequências prováveis de uma possível e futura identificação por diagnóstico. Enquanto o primeiro modo de identificação de um indivíduo condenado procura ligar um determinado acto criminoso a um determinado corpo, o segundo procura associar um determinado corpo criminoso a si próprio, através do espaço e do tempo, “com o objectivo de estabelecer a história de actividades criminosas passadas que possam ser inscritas com segurança num único corpo” (Cole, 2002, p. 305). Já a identificação por diagnóstico procura “ler” sinais de potencial comportamento criminoso a partir do próprio corpo. Este modo de identificação tem como pressuposto a ideia da origem biológica na etiologia da criminalidade, visando a prevenção do crime (Williams e Johnson, 2008) e procedendo pela identificação (e estigmatização) de corpos potencialmente criminosos.

Este uso burocrático e político do corpo (Foucault, 1977) assenta na possibilidade de o  examinar, colher uma amostra biológica, e reduzi-la ao “essencial” pela via da purificação presente no acto laboratorial de extracção de um perfil de DNA, com o objectivo de individualizar o corpo e de arquivar e manusear a informação obtida a partir deste. Visa-se tornar esse corpo identificável, criando uma relação entre identificação e corporeidade e consolidando formas de controlo e ordem social (Williams e Johnson, 2008).

O corpo humano sempre foi usado para classificar e identificar os indivíduos — pela cor da pele, género, aparência e linguagem corporal. Mas o que o perfil de DNA tem de novidade é possibilitar um novo método de identificação “menos consumidor de tempo e que introduz uma nova linguagem — a linguagem binária de uns e zeros, o que reduz radicalmente as possibilidades de negociação e de resistência” (Aas, 2006, p.150), ao mesmo tempo que produz a ilusão da certeza, a exclusão da dúvida e a percepção da infalibilidade da tecnologia. Outra novidade é que a tecnologia de identificação pelo DNA tem estimulado “a esperança de encontrar um método genético para descobrir a criminalidade potencial, o chamado gene do crime”(Cole, 2002, p. 3), numa espécie de revivalismo lombrosiano do século xxi.

Argumentamos que a conjugação entre individualização e identificação cria externamente uma identidade genético-criminal pela extracção do perfil de DNA e respectiva purificação em laboratório, reduzindo o indivíduo à sua entidade biológica e convertendo o corpo num mero meio de transmissão de dados descontextualizado dos aspectos sociais. Mas, simultaneamente, o perfil de DNA é algo que provém de “dentro” do corpo do indivíduo (da amostra biológica), acreditando-se que essa entidade biológica traduz a essência, a “verdade” do/sobre o indivíduo (Lynch et al., 2008). Deste modo, a prática científico-burocrática de extracção do perfil de DNA do indivíduo condenado e o armazenamento e gestão dessa informação conjugam a individualização com outros elementos de classificação e categorização do indivíduo, construindo um modelo de identidade genético-criminal que também serve (e sobretudo) os interesses do poder do Estado.

A inclusão do grupo étnico no conjunto de dados pessoais a inserir no formulário de auto de colheitas de amostras e de identificação de indivíduos condenados revela dispositivos de alinhamento da ciência com a burocracia estatal (Smart et al., 2008), com consequências assinaláveis para a gestão, categorização e vigilância dos indivíduos classificados como criminosos. A inserção desta informação em bases de dados de perfis de DNA pode potenciar a discriminação (Williams, Johnson e Martin, 2004). Além disso, a classificação do grupo étnico é baseada em categorias subjectivas, seja através da autoclassificação dos indivíduos, seja pela via de avaliações visuais da parte do técnico ou cientista forense, que podem não corresponder a tipologias de classificação usadas na genética populacional (Nuffield Council on Bioethics, 2007, p.  80). A informação sobre o grupo étnico dos indivíduos cujos perfis estão inseridos em bases de dados de perfis de DNA para investigação criminal conduz facilmente à tentação de explicar diferenças de comportamentos entre grupos de população em termos genéticos, em vez de sociopolíticos (Kahn, 2006), conduzindo-nos a um cenário de provável crescente genetização das relações sociais, que implicará uma redefinição do posicionamento social dos indivíduos com base no seu perfil de DNA (Have, 2001).

A inclusão da categoria do grupo étnico na informação recolhida sobre os indivíduos cujo perfil de DNA entrará na base de dados contraria a tendência que tem vigorado até agora na legislação portuguesa, no sentido da prevenção da discriminação ou “racialização da sociedade”, visível, por exemplo, no facto de as estatísticas criminais apenas registarem a nacionalidade, mas não registarem etnicidade ou fenótipo (Cunha, 2010). Acresce ainda que, de acordo com um estudo etnográfico levado a cabo numa prisão em Portugal, nas décadas de 80 e de 90 do século xx, as categorias de “raça” e etnicidade não são determinantes como plataformas de identidade ou mesmo de intervenção policial dirigida a determinados grupos sociais, parecendo ganhar muito mais peso a residência em determinado bairro urbano na formação de estratégias identitárias dos reclusos e de definição policial das “classes perigosas” (Cunha, 2010). Representará a inclusão do grupo étnico dos condenados na informação recolhida para a base de dados de perfis de DNA com objectivos forenses uma nova tendência ao nível da criminalização de determinadas franjas populacionais, doravante assente na identidade genético-criminal?

A tecnologia é a força centrípeta que conjuga, organiza e mantém juntos um conjunto diversificado de elementos sociais, políticos, tecnológicos, humanos e naturais (Latour, 1989), formando aquilo que Michel Callon designou por “actor-rede” (actor network) para descrever um conjunto de elementos heterogéneos associados por uma rede tecnológica, mas que “podem a qualquer momento redefinir a sua identidade e relações mútuas de uma forma nova e trazer novos elementos para a rede” (Callon, 1987, p. 93). A possibilidade de cruzar o perfil de DNA com o grupo étnico, associada aos mecanismos de inquirição da identidade dos indivíduos em contexto de investigação criminal, forma uma tecnologia de governo (Rose e Miller, 1992) constituída por mecanismos heterogéneos que, ao assentarem na autoridade epistémica da genética, tornam operacionais e levam à prática políticas e programas de governo.

 

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Notas

[1] A lei portuguesa que define os princípios básicos da constituição, organização e funcionamento de uma base de dados de informação genética para fins de identificação civil e criminal (Lei n.º 5/2008, de 12 de Fevereiro) usa a formulação “ADN” (correspondente a ácido desoxirribonucleico). Apesar de por vezes se encontrar o termo ADN, que é uma tradução, para português, da sigla DNA, considera-se habitualmente que esta sigla não se deve traduzir e deve ser sempre utilizada a sua designação em inglês, ou seja, DNA (Henriques e Sequeiros, 2007, p. 5), por ser a designação aprovada pela Sociedade Internacional de Bioquímica. O DNA é a molécula em que se encontram codificadas as características genéticas de cada pessoa. Cada uma das nossas células tem exactamente, no seu núcleo, a mesma quantidade e a mesma sequência de DNA, o que permite que as características genéticas de cada pessoa possam potencialmente ser estudadas a partir de qualquer tipo de material biológico, de qualquer parte do seu corpo.

[2] Os gémeos monozigóticos (ou, em linguagem popular, “idênticos” ou “verdadeiros”) correspondem ao desenvolvimento de um único ovo e são portanto geneticamente iguais.

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