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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.202 Lisboa  2012

 

Interação comercial e contextos organizacionais na restauração e lojas de vestuário*

 

Sofia alexandra Cruz**

**Instituto de Sociologia, Faculdade de Economia – Universidade do Porto; E-mail: sacruz@fep.up.pt

 

Resumo

Os empregos interativos nos serviços apresentam singularidades relacionadas com a natureza da atividade de trabalho e o perfil dos trabalhadores. ­Partindo de uma investigação sobre os trabalhadores das lojas de restauração e vestuário localizadas em centros comerciais, este artigo analisa a interação comercial nestes contextos de trabalho, procurando refletir sobre as características valorizadas na mão-de-obra, os objetivos e regras de funcionamento das lojas e as perturbações que os trabalhadores declaram sentir no quotidiano laboral. Trata-se de indicadores relevantes para perceber estes contextos sociais de trabalho e as suas lógicas de procura e oferta de mão-de-obra.

Palavras-chave: trabalho; interação comercial; lojas de restauração; lojas de vestuário.

 

Commercial interaction and organizational contexts in restaurants and clothing shops.

Abstract

Interactive service jobs have singularities related to the nature of work and to employees’ characteristics. Starting from research on employees in restaurants and clothing shops located in shopping centers, this article seeks to analyze interactive service work in these contexts, the type of employees required, objectives and rules of operation among the shops, and the difficulties experienced by employees in everyday work. These are relevant indicators to understand organizational contexts of work and the logic of demand and supply of skilled labor in these labor markets.

Keywords: work; commercial interaction; restaurants; clothing shops.

 

INTRODUÇÃO

Os empregos interativos nos serviços reúnem particularidades decorrentes da natureza da atividade de trabalho e dos perfis dos trabalhadores. O tipo de interação protagonizada por quem trabalha constitui uma parte importante do serviço que está a ser prestado e exige trabalho emocional (Hochschild, 2003 [1983]; Leidner, 1993; Bolton, 2006), traduzido na construção de expressões de emotividade singulares com vista à produção de determinados estados em terceiros, como clientes ou utilizadores. Para além deste trabalho emocional, é fundamental ponderar também a existência de um trabalho estético (Warhurst e Nickson, 2001, 2007; Pettinger, 2006) associado à imagem ou aparência dos trabalhadores inseridos nestes contextos profissionais. Na pesquisa realizada sobre a mão-de-obra nas lojas de restauração e vestuário localizadas em centros comerciais1, discutiu-se precisamente que para a compreensão da atividade laboral destas lojas é necessário considerar, em simultâneo, o trabalho emocional e o trabalho estético que aí têm lugar, e ainda os desafios que estes encerram para a população trabalhadora. Ambas as modalidades de trabalho se inserem em práticas gestionárias que visam a concretização dos objetivos comerciais e financeiros das lojas. Estas práticas pretendem a naturalização de comportamentos, atitudes e saberes no espaço social de trabalho e a aquisição do que é definido como atitude de profissionalismo (Fournier, 1999; Evetts, 2005, 2006).

A partir de informação recolhida em entrevistas semi-diretivas e em grupos focalizados envolvendo trabalhadores que lidam diretamente com clientes no espaço físico das lojas de restauração e vestuário em centros comerciais, este artigo pretende refletir sobre a interação comercial nestes espaços profissionais, tendo por base tipologias de lojas construídas mediante duas grandes dimensões: o momento da aproximação do cliente e a organização do trabalho. Trata-se fundamentalmente de captar as singularidades organizacionais existentes nestas lojas e de analisar a natureza da interação comercial, as características valorizadas nos trabalhadores e as perturbações que estes manifestam no seu quotidiano laboral. A primeira parte do artigo fornece indicações de caráter metodológico sobre a pesquisa realizada e localiza, em termos globais, a realidade dos grupos profissionais em que se integram os trabalhadores. Na segunda parte analisa-se a interação comercial nas lojas de restauração e ­vestuário e reflete-se sobre os aspetos valorizados na mão-de-obra, os objetivos e regras de funcionamento das lojas e as consequentes perturbações que os trabalhadores declaram sentir no âmbito da sua atividade laboral.

 

METODOLOGIA

A investigação que sustenta este artigo mobilizou uma estratégia metodológica diversificada, articulando a consulta de fontes estatísticas com vista a analisar a estrutura do emprego no comércio e na restauração e a realização de entrevistas semi-diretivas, grupos focalizados, e observação direta para examinar as características dos trabalhadores e do seu espaço social de trabalho (Cruz, 2010). Atendendo à configuração da análise aqui apresentada, de seguida esclarece-se em grandes linhas o contexto da aplicação das entrevistas semi-diretivas e dos grupos focalizados.

A intenção de empreender uma análise intensiva sobre os perfis dos trabalhadores e seus contextos de trabalho levou desde logo à opção pela técnica da entrevista semi-diretiva. Simultaneamente, o interesse em captar o universo das representações da população trabalhadora sobre a atividade laboral nas lojas de centro comercial através da construção de um debate que a envolvesse, e compreender em que medida o mesmo era revelador de entendimentos convergentes e divergentes, implicou numa fase posterior a condução de grupos focalizados.

O arranque do processo de realização das entrevistas beneficiou de contactos privilegiados estabelecidos com estudantes universitários de sociologia que trabalhavam em centros comerciais portuenses. Tais contactos foram ­fundamentais, pois eles próprios se disponibilizaram para conceder ­entrevistas, e, numa fase seguinte, contribuíram para a concretização de um conjunto alargado de outras entrevistas através da mobilização das suas redes de ­relacionamentos interpessoais. Porém, houve necessidade de diversificar o perfil dos entrevistados, o que implicou acionar outra estratégia ao longo da qual os trabalhadores foram abordados diretamente no seu local de trabalho (tendo em linha de consideração a variável sexo, o tipo de lojas de vestuário e restauração, a diversidade de marcas aí existentes, os diferentes centros comerciais da Área Metropolitana do Porto), em diferentes momentos do dia e da semana. Nessa interpelação aos trabalhadores indagou-se acerca da sua disponibilidade para serem entrevistados em dia, hora e local a combinar, tendo sido previamente identificados os objetivos formais da pesquisa e a sua responsável. Desta forma, entrevistaram-se sessenta trabalhadores em oito centros comerciais localizados na Área Metropolitana do Porto, um número de entrevistas claramente devedor do designado “princípio da saturação” (­Burguess, 2001), ou seja, de uma estratégia que consiste na recolha de informação até ao momento em que se torna redundante. Analisaram-se dois universos, o da restauração e o do vestuário, por corresponderem às atividades mais representadas no espaço do centro comercial.Do total de entrevistados, cerca de 58,3% eram do sexo feminino e 41,7% do sexo masculino: 62,9% das mulheres entrevistadas concentravam-se nas lojas de vestuário e 37,1% nas lojas de restauração, enquanto 60% dos homens entrevistados laboravam no segundo tipo de lojas e 40% no primeiro.

Relativamente à técnica dos grupos focalizados, inicialmente estipulou-se a realização de quatro grupos focalizados, dois em lojas de restauração (de diversas marcas), e dois no contexto das lojas de vestuário (de marcas diferentes), com um número de seis a dez participantes de ambos os sexos e com cargos diferentes na loja. Porém, tal não se pôde concretizar dada a extrema dificuldade em reunir os vários trabalhadores. O confronto com este constrangimento, desde logo revelador da forte rotatividade dos horários de trabalho, implicou alterar o contexto inicial da aplicação desta técnica, e não o seu abandono, pois ainda que não seguindo rigorosamente os protocolos da investigação que lhe subjazem, poder-se-iam obter resultados importantes para a pesquisa, tal como de facto sucedeu. Deste modo, realizaram-se dois grupos focalizados, um na loja de restauração Hot Point2, e outro na loja de vestuário Space. No primeiro grupo focalizado participaram nove trabalhadores, cinco mulheres e quatro homens, enquanto o segundo integrou apenas três trabalhadoras, das cinco que se haviam comprometido a colaborar. É de referir que nem todos participantes dos grupos focalizados foram entrevistados previamente a título individual, o que implicou, após cada sessão, a recolha de elementos de caracterização sobre os seus respetivos perfis.

Para a análise dos dados provenientes das entrevistas recorreu-se ao ­software NVivo7, que permitiu numa primeira fase a análise vertical das mesmas e a captação das singularidades subjacentes a cada uma delas, e posteriormente a sua análise horizontal com vista a discutir, para todas as entrevistas, as dimensões analíticas contidas no guião de entrevista semi-diretiva. Relativamente à informação oriunda dos grupos focalizados, conduziu-se uma análise de conteúdo qualitativa para aprofundar aspetos que não haviam sido explorados no contexto da técnica da entrevista. Durante esta fase analítica ponderou-se que a comparabilidade de resultados provenientes destas duas técnicas de investigação pudesse suscitar eventuais dissonâncias entre os dados recolhidos (Morgan, 1996), contudo tal não se chegou a verificar.

 

GRUPOS PROFISSIONAIS NA RESTAURAÇÃO E NO COMÉRCIO

A distribuição da população empregada em Portugal por setor de atividade económica revela-se bastante desigual. Os números demonstram que o setor terciário atinge um peso percentual consideravelmente elevado, quando comparado com os registados nos setores primário e secundário. Com efeito, no primeiro trimestre de 2011 o setor terciário absorvia 62,5% da população empregada, enquanto os restantes totalizavam, respetivamente, 27,5% e 10% (ine, 2011b).

A atividade laboral analisada no presente artigo insere-se neste universo do setor terciário, o qual é atravessado por uma composição heterogénea sob o prisma do emprego.3 Em termos concretos, esta atividade compreende o trabalho realizado pelos empregados de restauração (mesa e balcão) e vendedores de loja. De acordo com a Classificação Portuguesa das Profissões de 2010 (ine, 2011a), estes trabalhadores integram, respetivamente, os subgrupos profissionais “empregados de mesa e bar” e “vendedores em lojas”, que por sua vez se localizam no grupo profissional dos “trabalhadores dos serviços pessoais, de proteção e segurança e vendedores”. Os “empregados de mesa e bar” levam a cabo as “tarefas e funções do empregado de mesa e bar, com especial incidência no serviço de refeições e bebidas, em restaurantes, estabelecimentos de bebidas, cantinas e a bordo de navios e comboios” (ine, 2011a, p. 269). Já os “vendedores em lojas” realizam as “tarefas e funções do comerciante, encarregado e vendedor em loja, com especial incidência na venda de bens diretamente ao público ou por conta de estabelecimentos de comércio a retalho ou por grosso” (ine, 2011a, p. 277).

No que respeita ao subgrupo profissional dos “Vendedores em lojas”, verificámos nas últimas décadas o seu acréscimo visível e a sua feminização progressiva. Trata-se de atividades preponderantemente femininas (Cruz, 2003, 2004), com baixos recursos qualificacionais, fracas remunerações e com reduzidas oportunidades de progressão profissional. No caso do subgrupo profissional “empregados de mesa e bar” confirmam-se também as duas tendências apontadas para o subgrupo profissional anterior, embora as clivagens entre os contingentes feminino e masculino não se revelem tão expressivas. Tais dados traduzem processos de reestruturação interna destes subgrupos profissionais, dando corpo a um dos enredos de uma trama mais vasta como a dos dispositivos institucionais de classificação profissional, que espelha apenas parcialmente os cenários de mudança socioeconómica. Na verdade, ao percorrer-se a classificação institucional das profissões no contexto específico do comércio e da distribuição, nomeadamente a classificação proposta pelo Instituto para a Inovação na Formação (inofor) sobre os perfis profissionais específicos do setor do comércio e da distribuição (aavv, 2001), é possível perceber a difusão de lógicas que refletem por certo mais a classificação formal das atividades e perfis profissionais a elas associados do que a natureza concreta da atividade de trabalho e os perfis dos trabalhadores (Freidson, 1994).

 

INTERAÇÃO COMERCIAL NAS LOJAS DE RESTAURAÇÃO E VESTUÁRIO

A análise da interação comercial nas lojas de restauração e vestuário merece ser enquadrada nas tipologias de lojas construídas para estes dois universos.4 Entende-se aqui a interação comercial estabelecida entre trabalhadores e clientes no momento do atendimento, como o conjunto das suas ações sociais dotadas de sentido próprio e caracterizadas pela intenção e subjetividade. Atentemos no quadro seguinte, que reúne informação sobre cinco dimensões que permitem analisar a interação comercial no contexto destas lojas: o momento de aproximação do cliente; o enquadramento temporal e espacial da interação; os recursos mobilizáveis no decurso da interação pelo trabalhador, os suportes informacionais ao atendimento; as competências mobilizadas pelo trabalhador. Sublinhe-se que estas dimensões perspetivam-se tendo por base mais a figura do trabalhador do que a do cliente.

O momento de aproximação do cliente na restauração fast-food é muito orientado pelo trabalhador, o cliente frequentemente ainda se encontra em frente ao balcão a ler o menu e o trabalhador já está a cumprimentá-lo e a perguntar se necessita de ajuda. Para além de ser orientada pelo trabalhador, a clientela é também orientada por um conjunto de prescrições que pressupõem a deslocação ou transferência do trabalho anteriormente pago e realizado pelo trabalhador para si própria. Parece que os modelos comercial e de produção destas marcas trazem os clientes para o processo de trabalho, beneficiando de uma redução de custos, pois a estes nada lhes é pago pelas tarefas realizadas (Ritzer, 1998). Tal não sucede no tipo de restauração clássica, onde a clientela entra no espaço, escolhe a mesa, sendo depois interpelada pelo trabalhador, ainda que por vezes esta interpelação possa surgir mais cedo, logo à entrada. Na restauração mista, a situação do balcão é idêntica à de fast-food, e a de mesa semelhante à da restauração clássica.

Em termos temporais e espaciais, a interação na restauração fast-food dura entre 5 a 8 minutos no espaço do balcão, aliás como as próprias marcas prescrevem nos seus procedimentos, enquanto na restauração clássica se prolonga entre 20 a 50 minutos, e ocorre na sala de refeições. O caso da restauração mista agrega características dos dois tipos anteriores.

Relativamente aos recursos mobilizáveis pelo trabalhador no decurso da interação, destaca-se a venda sugestiva na restauração fast-food. Tal ocorre quando, por exemplo, face ao menu escolhido o cliente é informado que pode levar uma bebida maior por mais 20 cêntimos. A venda sugestiva tende, também, a emergir no contexto da restauração clássica, todavia aqui o trabalhador dispõe, em princípio, de mais tempo que lhe permite apresentar de forma pormenorizada os produtos. Na restauração mista conjugam-se ambas as ­situações.

 

Quadro 1

Interação comercial nas lojas de restauração

 

A dimensão respeitante aos suportes informacionais ao atendimento agrupa parte dos procedimentos adotados pelas marcas. Na restauração fast-food existe um painel bem sinalizado com as opções de menus e respetivos preços, enquanto na restauração clássica é entregue nas mãos dos clientes o menu com a descrição dos pratos disponíveis. Na restauração mista articulam-se ambas as modalidades.

Finalmente, as competências mobilizáveis pelo trabalhador remetem para um conjunto de saberes fazer sociais (Veltz, 2000) constituídos por dimensões técnicas (conhecimento do produto a vender), organizacionais (execução das tarefas localiza-se numa estrutura organizacional) e relacionais (dimensão da interação comercial). Estas últimas tendem a sobressair nos três contextos de restauração, pois verifica-se todo um trabalho emocional relativo à construção de estados de emotividade no seio da interação com os clientes e um trabalho estético vinculado à preservação da boa imagem do trabalhador (Warhurst e Nickson, 2007) traduzida, por exemplo, no uso da farda, como veremos mais adiante. As duas primeiras dimensões (técnicas e organizacionais) também se destacam, em particular nas lojas de restauração fast-food e mista, onde os trabalhadores são chamados a ocupar rotativamente vários postos de trabalho (balcão e cozinha no primeiro tipo de lojas e cozinha, balcão e sala de refeições no segundo), que exigem conhecimentos técnicos sobre os produtos a confecionar e as máquinas existentes nas lojas.

Relativamente às lojas de vestuário, o espaço físico é de importância decisiva, pois em torno dele constrói-se um imaginário de consumo (Falk e ­Campbell, 1997) e o tipo desejável de relações entre trabalhadores e clientes. Estas lojas transformam-se em lugares onde ocorrem diferentes interações comerciais que não desembocam necessariamente na venda de um qualquer artigo, já que dependem dos padrões de comportamentos que motivam a entrada do cliente. É possível apontar três tipos de clientes, que aliás foram sendo sugeridos pelos próprios trabalhadores no decurso das entrevistas realizadas. Os clientes fiéis, que entram várias vezes na loja em virtude de contactos anteriores e compram; os clientes de passagem, que visitam a loja e acabam por comprar algo, e os clientes de passeio, que se deslocam à loja sem o intuito de comprar. O cliente fiel é aquele que de modo repetido opta por uma determinada marca em detrimento de outra. Porém, a fidelidade não significa necessariamente exclusividade, pois os clientes podem ser fiéis a mais do que uma marca (Barrey, 2004; Cochoy, 2002). A passagem pela loja, quando repetida, pode significar um momento preparatório para uma futura compra ou apenas uma estratégia para comparar preços de determinados produtos que interessam à clientela. Os clientes de passeio tendem a deambular pela loja sem a pretensão de comprar. Assim sendo, os trabalhadores sabem que os clientes se deslocam às lojas orientados por diferentes motivações, e manifestam comportamentos mais direcionados ou exploratórios facilmente captáveis desde o momento de entrada na loja.

Observemos a informação reunida no quadro seguinte sobre a interação comercial nas lojas de vestuário.

 

Quadro 2

Interação comercial nas lojas de vestuário

 

Na loja de self-service, o momento de aproximação do cliente não é orientado pelo trabalhador, e a duração da interação é variável consoante o tipo de clientela e as suas motivações. Esta tende a circular pelos diferentes espaços da loja que lhe proporcionam o contacto com artigos variados. Quando ocorre a interação entre cliente e trabalhador, este pode orientá-lo através da venda sugestiva (Mills, 1986), suscitando-lhe o desejo de compra mediante a criação de um universo comercial propenso à venda (Pettinger, 2006). Para suportar o atendimento existem desde logo os espaços da loja, onde a localização dos produtos e a sua disposição é pensada meticulosamente pelas marcas. Finalmente, no decurso da interação comercial, o trabalhador aciona um conjunto de saberes fazer sociais de natureza relacional que lhe permitem fazer parte integrante desse momento interacional, mediante o exercício de trabalho emocional e estético. Refira-se, adicionalmente, que a dimensão organizacional dos saberes fazer sociais também se revela presente, pois os trabalhadores transportam para o interior da interação comercial um conhecimento sobre a estrutura organizacional das próprias lojas ao mostrarem, a pedido dos clientes, a localização dos artigos nos espaços das mesmas.

No que concerne à loja de atendimento personalizado, o momento da aproximação do cliente é muito orientado pelo trabalhador, sendo a duração da interação variável. Esta é menos rígida do que no tipo de loja anterior, pois é possível gerir a disponibilidade entre trabalhador e cliente com o intuito de estimular neste a descoberta da oferta, sobretudo no contexto espacial do balcão, embora seja necessário ajustar a interação comercial ao fluxo de clientes. Ocorre também a venda sugestiva, e o trabalhador dispõe, em regra, de mais tempo para uma apresentação detalhada dos artigos existentes na loja. Relativamente aos suportes informacionais ao atendimento, é possível apontar os espaços da loja, com a localização dos produtos e sua disposição, e os catálogos das coleções. Pode salientar-se a importância das sugestões dos trabalhadores aos clientes através da mobilização de saberes fazer sociais de natureza relacional fortemente ancorados no trabalho emocional e estético, como salientado para o tipo anterior de lojas. O recurso à natureza organizacional dos saberes fazer sociais não é tão vincado nas lojas de atendimento personalizado, fazendo sentir-se mais a sua natureza técnica pelo grau de conhecimento que os trabalhadores demonstram sobre o artigo que apresentam ao cliente.

Trata-se, assim, de modalidades de interação comercial no contexto das lojas de restauração e vestuário que evidenciam modalidades singulares de organizar o trabalho no interior de contextos organizacionais associados à existência de mercados fortemente competitivos.

 

INTERAÇÃO COMERCIAL, TRABALHO EMOCIONAL E ESTÉTICO

Para compreender a interação comercial importa ter presente algumas características que são valorizadas nos trabalhadores. Destacam-se as baseadas no “ter” e no “saber-ser”. As categorias que apontam para o “ter” correspondem a: “ter boa imagem física”, “ter capacidade de diálogo com cliente” e “ter boa apresentação”. Quanto ao saber-ser, são mais valorizadas as traduzidas pelas expressões “ser responsável”, “ser simpático” e “ser rápido”. Estas características, que se encontram em sintonia com o facto de não se exigir formação escolar e profissional específica e se preferir recrutar mão-de-obra estudante jovem pela sua flexibilidade (Bettis, 1996) e disponibilidade para trabalhar, apontam para um modelo de gestão baseado nas qualidades pessoais em detrimento das qualificações escolares e profissionais. A própria rede de relacionamentos sociais que os jovens estudantes trabalhadores constroem no centro comercial, ao traduzir-se numa bolsa de autorrecrutamento juvenil, é ilustrativa a este respeito.Convém salientar que tais características valorizadas na população entrevistada tendem a distanciar-se do conjunto formal de saberes associados aos perfis profissionais propostos pelo Instituto para a Inovação na Formação (aavv, 2001).

Um aspeto particularmente revelador assinalado pelos entrevistados é o da necessidade de “saber controlar emoções”, “saber sorrir”, que remete para a questão do trabalho emocional. Aponta-se a necessidade de ter um “sorriso perpétuo e sincero” (Macdonald e Sirianni, 1996, p. 9) no decurso das interações com os clientes.Importa sublinhar que nestes contextos de trabalho não se pode operar uma distinção clara entre o produto que está a ser vendido, o processo de trabalho, e o trabalhador propriamente dito (Gadrey, 2002). Os empregadores acabam por reclamar autoridade sobre os mais variados aspetos subjetivos dos trabalhadores, tentando regular a sua aparência física, o ­trabalho estético (Warhurst e Nickson, 2007), e a forma de se comportarem, o trabalho emocional (Wharton, 1993). O que está a ser vendido é, em última análise, um conjunto de emoções também. O processo de trabalho é estandardizado, tanto no que respeita à forma de fazer, como à de estar, através, por exemplo, do recurso à farda que controla a aparência dos trabalhadores, e à forma de comunicar, recorrendo-se a conjunto de prescrições a cumprir na abordagem ao cliente (Leidner, 1993, 1996). Para esta estandardização ou padronização contribui o tal conjunto de prescrições elaborado pela loja, que os ­trabalhadores devem seguir no relacionamento com os clientes, entre si e com as chefias, e, nalguns casos também em situações envolvendo convívios fora do espaço de trabalho, e que moldam comportamentos e atitudes. Veja-se, por exemplo, a prática de desporto semanal incentivada pela loja de restauração Hot Point, que mobiliza semanalmente os trabalhadores para jogos de futebol, ou a realização de uma gala anual promovida pela loja de vestuário Vip Shop, que reúne todos os trabalhadores a laborarem na marca.

O referido esforço de padronização ou estandardização alarga-se aos ­próprios clientes, com vista a organizar as suas experiências de consumidores.5 As estratégias conducentes a organizá-las passam, por exemplo, pela ­configuração física dos espaços (Simmel, 2001), e revelam-se particularmente evidentes em lojas de vestuário self-service e de restauração fast-food. Se no caso da restauração fast-food o cliente, por regra, não pergunta qual é o menu para aquele dia, também na loja de vestuário self-service não questiona o tipo de artigos expostos num determinado momento.

A procura da estandardização, em particular do trabalho emocional, tem sido analisada em várias investigações e encarada no quadro de uma instrumentalização empreendida pelas entidades empregadoras. Porém, carece de uma abordagem que contemple igualmente o que os trabalhadores extraem dela no espaço social de trabalho. Na linha de Leidner (1993) e de Bolton (2006), a referida padronização pode ser útil para os trabalhadores, não os transformando necessariamente em sujeitos alienados. É necessário indagar sobre os significados que essa padronização despoleta, em particular sobre os proveitos que se retiram da mesma. Efetivamente, as rotinas podem capacitá-los para um controlo mais eficaz das interações e permitir que se protejam das faltas de respeito de que se ressentem na relação com clientes e colegas. Se a gestão disponibiliza estratégias padronizadas que os protegem na interação com o cliente, ou possibilitam um acréscimo de poder, não há nada que leve os trabalhadores a rejeitá-las. Bolton (2006) considera que as emoções6 ou as expressões de emotividade podem ser opressivas para os trabalhadores, mas há margens de manobra que lhes permitem ter algum controlo sobre as mesmas, ainda que pontual, no espaço social de trabalho. Há sempre espaços não controlados onde se exibem comportamentos espontâneos de descontração, por exemplo, quando os jovens trabalhadores da loja de restauração Kuanto Baste atiram pacotes de açúcar uns aos outros no balcão em momentos de menor fluxo de clientela. Pode pensar-se que a padronização não implica que a gestão da loja consiga impor sempre, unilateralmente, as suas rotinas. No caso do trabalho realizado pelos trabalhadores nas lojas de restauração e vestuário, a questão do controlo emocional não se coloca em termos de antagonismo linear de interesses entre as áreas de gestão e operação, pois há várias partes e interesses envolvidos.

 

INTERAÇÃO COMERCIAL E DISPOSITIVOS DE FUNCIONAMENTO DAS LOJAS

No âmbito da análise da interação comercial foi decisivo perceber o tipo de objetivos e regras que os trabalhadores são chamados a cumprir no seu quotidiano de trabalho. Em termos de objetivos, o peso das “vendas” é significativo, pois reúne cerca de três quartos dos objetivos apontados pelos entrevistados. A perspetiva da trabalhadora Cristina é reveladora a este respeito:

 

Quanto a objetivos, no essencial é “vender, vender, vender”, valoriza-se os números e a faturação da loja ao final do mês. [Cristina, encarregada na loja de vestuário Space, centro comercial 8]

 

O objetivo de vender surge intimamente associado à necessidade de “bater o orçamento de loja”, ou seja, faturar mais num determinado dia ou mês em comparação com o mesmo período do ano anterior. Veja-se o discurso dos seguintes entrevistados sobre os objetivos existentes nas lojas de restauração:

 

Temos objetivos diários a atingir. Temos afi… temos ah… afixado na… na, no quadro ah… o dinheiro que eles… que eles pensam poder, que poderemos fazer ah… nesse dia igual ao do mesmo dia do ano anterior, é bater o orçamento da loja, é bom para nós”. [Filipe, colaborador na loja de restauração Kuante Baste, centro comercial 1]

Objetivos é assim, depende, todos os meses dão-nos um objetivo e todos os dias temos um objetivo e cada turno tem um objetivo. Por exemplo, hoje o meu objetivo foi muito baixo, 310 euros só, para a hora de almoço. Normalmente por dia é 700 euros, 800 euros. Muitas vezes cumprimos e passamos, outras vezes, nem metade fazemos. Tudo depende do shopping.

[Quando questionada sobre a facilidade ou dificuldade em atingir o objetivo, a entrevistada responde]

Depende do mês. O mês passado foi um mês para esquecer, fevereiro foi um mês para esquecer. Este mês já melhorou um bocadinho, mas mesmo assim não atingimos o objetivo. O nosso objetivo era 15 000 euros, nós ficámos nos 13 000. Por isso, já não há prémio. Mas depende mesmo. Há objetivos que também são muito altos, que são muito difíceis. Este mês o objetivo foi baixo. Mas não deu, mesmo assim não deu. [Madalena, gestora de turno na loja de restauração Vitória, centro comercial 6]

Uma pessoa atingindo os objetivos a nível de orçamento de vendas, a nível de desvio dos produtos, uma pessoa cumprindo esses objetivos uma pessoa recebe prémio, é como se estivéssemos nós a gerir a loja. [Alberto, gerente de turno na loja de restauração Bonanza, centro comercial 5]

Os objetivos das lojas correspondem a metas que os trabalhadores devem atingir no seu quotidiano laboral. O discurso dos entrevistados relativamente às vendas permite assinalar a existência de uma prática gestionária que procura articular o benefício individual e os resultados financeiros da loja, e que pode gerar impulsos contraditórios. Como referem Aubert e Gaulejac (1991), os indivíduos debatem-se entre a tendência para trabalhar menos de modo a protegerem-se das exigências da loja e a inclinação para laborarem mais, com vista a aumentar as suas contrapartidas financeiras e melhorarem os resultados coletivos.

Há quem assinale não ter objetivos a cumprir. Parece tratar-se de casos em que, por exemplo, os trabalhadores são solicitados a serem “rápidos, muito rápidos” para conseguirem atender o maior número de clientes no menor tempo possível e consequentemente faturarem mais, sem no entanto qualificarem essa situação como objetivo formal a cumprir. Tal foi visível no caso da entrevistada Catarina, de 21 anos, trabalhadora-estudante do ensino secundário, a laborar na loja de restauração Carpaccio.

 

[…] Não, não acho que não há assim nada em concreto como objetivo. Acho que… o gerente, o gerente olha muito para… para a vontade de querer trabalhar para a velocidade, temos que ser rápidos e nunca está satisfeito com o ritmo de trabalho que temos, ele agora está a avaliar isso, nem está a avaliar o físico da pessoa nem nada, nem mesmo… se tiver experiência fica e se for bom a trabalhar fica, se não for vai embora. [Catarina, empregada de mesa na loja de restauração Carpaccio, centro comercial 2]

 

Esta entrevistada trabalha numa loja de restauração clássica onde a presença do gerente é muito forte e não existe uma hierarquia profissional diversificada como nas lojas de restauração mista ou de fast-food. Os objetivos, ainda que existentes, acabam por não ser transmitidos à trabalhadora e são centralizados na figura do gerente. O único objetivo partilhado acaba por corresponder à necessidade de incrementar ritmos de trabalho mais acelerados.

Sob o ponto de vista das regras a cumprir, a população entrevistada destaca a questão do uso obrigatório de farda na restauração e no vestuário, embora em menor peso neste último. São vários os acessórios que compõem as fardas. Nas lojas de restauração os adereços revelam-se em maior número e consideravelmente distantes da indumentária que os trabalhadores envergam no quotidiano. Aliás, no grupo focalizado conduzido na loja de restauração, a troca de perspetivas sobre a obrigatoriedade da utilização da farda, foi extremamente reveladora. Atente-se no seguinte excerto:

 

Rodrigo – Somos novos e ainda por cima com esta farda ridícula, ninguém nos dá ­credibilidade. Raramente uma pessoa com 18 anos é vendedora de um stand da Mercedes ou bmw… Tem que ter 40… ao menos 37 anos ou 40 anos vá lá para a Mercedes ou para a bmw vender.

Rute – Não vês ninguém num restaurante onde é só pessoas de 37 ou 40 anos a atender, não vês ninguém chegar ao balcão e dizer: “Então, não atendem aqui?” Está tudo a conversar. Ninguém fala assim […] Só a pala, trazer aquela pala […] Para já, só o facto de os chefes terem a camisa azul e nós termos a camisa verde diferenciam-nos logo. Pronto. Mas também a nossa farda não é uma farda que transmita respeito, distinção… Não sei… É mesmo aquela coisa jovem de trabalho rápido e… O cliente não nos trata com todo o respeito. A assobiar e…

Patrícia – Às vezes os clientes começam a assobiar para chamar por nós.

Rute – “Ó Rute, chega-me isto. Ó Rute não tires a Cola com gelo”. Eu não conheço esta pessoa de lado nenhum. Eu estou a servi-lo. Tem que ser um atendimento de respeito.

Gabriela – Foi o que eu disse há bocado. Cada vez mais somos desrespeitados por sermos jovens, por estarmos num restaurante de fast-food. [Grupo focalizado, loja de restauração Match Point, centro comercial 1]

 

A obrigatoriedade do uso de farda permite construir uma imagem corporativa da marca, intimamente associada à existência de uma hierarquia profissional (Warhurst, Nickson, 2007; Pettinger, 2006). Como refere a participante Rute, o facto de os “chefes terem uma camisa azul” e de os outros trabalhadores usarem uma “camisa verde”, constitui um sinal evidente de diferenciação. Simultaneamente, segundo esta mesma trabalhadora, a farda não transmite “respeito” nem “distinção”, pelo contrário, revela-se fortemente estigmatizante e pouco digna. Simboliza “aquela coisa jovem de trabalho rápido”, ainda segundo Rute, que faz com que os clientes não os tratem dignamente e acionem estratégias de abordagem profundamente desrespeitosas, como seja a do “assobiar” ou a do tratamento por “tu”. Segundo a participante Gabriela, são “desrespeitados por serem jovens” e também por estarem num “restaurante de fast-food”.

Estas formas de tratamento são reveladoras do exercício de poderes assimétricos (Sennett, 2003; Wolf, 1990) no seio da interação comercial entre trabalhadores e clientes. Esta coloca em jogo posições diferenciadas fundadas em capitais económicos, culturais, sociais e simbólicos necessariamente desiguais. Tal desigualdade sugere a questão da dimensão relacional da dignidade. Ter dignidade e sentir a sua dignidade reconhecida implica ser tratado como uma pessoa em si mesma, e não meramente como um meio para um fim de outra pessoa (Sayer, 2007). Se o trabalhador se sente tratado de modo pouco digno, tende a reagir de forma a evidenciar a sua indignação, de forma silenciosa ou audível, como no caso do trabalhador Bruno, que logo a seguir ao cliente o ter tratado por “moço” o questionou “moço?”. A dimensão da dignidade, ou melhor, da sua ameaça ou perda associa-se à forma como muitos clientes encaram estes jovens trabalhadores e à clara ausência de autonomia (Hodson, 2001) de que dispõem no espaço social de trabalho.

Se é a própria marca que financia a farda, cabe no entanto à população trabalhadora cuidar da boa aparência da mesma. No caso das lojas de vestuário, os trabalhadores vestem peças da marca onde trabalham, que exibem um valor simbólico distintivo face às peças de roupa da restauração. Para além da manutenção da farda, devem seguir outro tipo de regras, em particular, ter cuidado com cabelos e unhas, utilizar bijouterie e maquilhagem, estas duas últimas aplicadas às lojas de vestuário e proibidas na restauração por questões de higiene e segurança laboral. Estas regras reportam-se ao cuidado com a aparência, cujo incumprimento acaba por merecer comentários. A este propósito, uma entrevistada narrou um episódio decorrido na loja em que trabalhava, no qual a diretora comercial em passagem pela mesma se dirigiu a uma trabalhadora que tinha engordado, chamando-a à atenção para a necessidade de controlar o aumento de peso.

A questão do uso de farda foi também objeto de discussão no grupo focalizado conduzido na loja de vestuário. Para muitos, a farda é positiva e transmite uma boa imagem da marca em causa. As seguintes opiniões expressas durante uma reunião de um grupo focalizado são elucidativas:

 

Francisca: Para mim a farda é importante, transmite uma imagem da marca para quem estamos a trabalhar. Vê-se alguma organização e cuidado com a imagem.

Conceição: Concordo, é uma imagem positiva para os clientes.

Ricardina: Também me parece, aliás, além da farda, acho que devíamos usar uma placa de identificação com o nosso nome oh… assim o cliente sabia qual o nosso nome, mas a farda é muito importante dá um certo profissionalismo, nós só usamos uma t-shirts e calças de ganga, mas ainda assim acho que é importante. [Grupo focalizado, loja de vestuário Space, centro comercial 8]

 

É possível assinalar do conjunto dos discursos recolhidos, que os entendimentos acerca do uso de farda assumem configurações diversas no contexto das lojas de vestuário e restauração.

No âmbito da análise das regras propostas aos trabalhadores, cabe referir ainda que mediante o exercício de observação direta registou-se o facto de estes usarem uma placa de identificação com o seu nome, obrigatória na restauração e nem sempre utilizada no vestuário, como aliás referiu uma das participantes no grupo focalizado da loja de vestuário Space. Constatou-se, igualmente, a obrigatoriedade de os trabalhadores responsáveis pela abertura de loja exibirem um cartão de identificação junto do segurança à entrada do centro comercial, sob pena de não poderem cumprir tal tarefa. Desse cartão constava a fotografia, a identificação e a assinatura do trabalhador, a designação do centro comercial, do seu proprietário e da loja, e a validade do mesmo.

Estes objetivos e regras de funcionamento das lojas de restauração e vestuário associam-se à questão do ritmo laboral que se pretende que os trabalhadores mantenham nestes contextos organizacionais. Importa referir que o ritmo de trabalho é sempre acelerado e assegurado pela lógica do “sempre mais, melhor e mais rápido” difundida no interior destes universos laborais. Esta lógica remete para o sentimento de equipa fortemente ancorado na ideologia gestionária do novo espírito capitalista (Boltanski e Chiapello, 1999). Trata-se de uma ideologia que promove, entre outros aspetos, a ideia de que todos devem estar sempre a dar o máximo, encontrando-se emocionalmente envolvidos na prossecução dos mesmos objetivos. Há assim um trabalho emocional que sustenta este ritmo acelerado. A presença diária das chefias no espaço da loja a laborar com os restantes trabalhadores, realizando as mesmas tarefas de operação, como já se assinalou, e o fluxo mais ou menos constante de clientes, mais acentuado nalguns períodos, faz com que a mão-de-obra trabalhe a ritmo predominantemente acelerado e muito acelerado. Adicionalmente, o próprio sistema de comissões individuais de que os trabalhadores podem beneficiar condu-los a procurarem estar sempre no auge do desempenho (Darmon, 1993), originando por vezes um espírito de competição feroz responsável por disseminar um clima de tensão diária no quotidiano laboral. O testemunho seguinte é ilustrativo a este respeito.

 

Muito acelerado. Tem que ser. Em lojas que faturam muito tem que ser. Ou nós fazemos o ritmo ou depois acabamos por sair […] Se não correspondermos ou a própria pessoa sai da marca, ou a marca pronto convida a sair. Há certas pessoas que não conseguem trabalhar na marca mesmo, não é para qualquer pessoa, há um ritmo de competição muito forte, é muito exigente. [Leonor, responsável da loja de vestuário Mon Ami, centro comercial 7]

 

O ritmo é acelerado, o sistema de vendas cruzadas é assim… eu estou na caixa, estou a registar… a pessoa começa a olhar e atrás de mim tem bijouterie, tem carteiras, tem óculos… perguntam-me e eu vendo, claro… começo a fazer as minha vendas, faço propostas, sugestões e depois a cliente dá umas voltas na loja e a minha colega pensa que a cliente é dela… eu não preciso de andar ali a stressar… tem dias, o ambiente é altamente concorrencial… às vezes chego e consigo atingir o objetivo, as outras colegas ficam a dizer “chegaste agora e já estás em primeiro nas vendas!”, eu acho que é o stress e de querer vender. [­Carolina, empregada de balcão na loja de vestuário Orange, centro comercial 4]

 

Há algumas pessoas que não se enquadram nestes ritmos acelerados, segundo a entrevistada Leonor, e acabam por abandonar o trabalho na loja, sobretudo em marcas de vestuário que atingem níveis de faturação diária muito elevados. O ritmo acelerado associado ao excesso de trabalho faz com que alguns trabalhadores não aguentem e sejam “convidados a sair” ou “saiam”. A pressão psicológica diária é assim uma realidade incontornável para muitos trabalhadores (Légeron, 2003).

Ainda a respeito do ritmo laboral, é importante salientar que períodos de menor volume de trabalho podem ser tão cansativos e stressantes como os de sentido contrário. O acréscimo de stress provocado pela constante vigilância das chefias, a quem compete assegurar que todos estão sempre a “fazer qualquer coisa”, constitui uma realidade captada no decurso da realização do trabalho empírico da pesquisa que sustenta este artigo. Esta conclusão converge com a de Ehrenreich (2001), quando refere, no âmbito da sua experiência como empregada de mesa, que os gerentes podiam sentar-se se quisessem em horas de menor movimento, no entanto, tinham de assegurar-se de que mais ninguém o fazia: “Começamos a fazer render a pequena tarefa, porque, se o gerente de serviço nos surpreender num momento de ócio, dar-nos-á algo muito mais desagradável para fazer. […] Quando, numa tarde especialmente morta, o gerente me encontra a dar uma vista de olhos a um exemplar do jornal usa Today que um cliente deixou ficar, manda-me aspirar o restaurante todo com um aspirador meio avariado, que tem um tubo de somente meio metro, pelo que a única forma de desempenhar a tarefa sem arranjar problemas ortopédicos é andar de joelhos de um sítio para o outro” (p. 31). Os trabalhadores têm, assim, de mostrar que estão permanentemente ocupados.

Deste modo, há um conjunto de dispositivos de funcionamento das lojas que condicionam a natureza da interação comercial e que impõem ritmos específicos de trabalho, cuja realização pode ser afetada de sentido positivo pela existência de prémios, recompensas, reconhecimento da capacidade de quem é posto à prova tanto como trabalhador, como na qualidade de ser humano.

 

INTERAÇÃO COMERCIAL E PERTURBAÇÕES DO QUOTIDIANO LABORAL

O último aspeto analisado neste artigo prende-se com as perturbações do quotidiano de trabalho da população entrevistada.Este tema tem merecido uma atenção particular no âmbito das abordagens sobre o assédio moral no trabalho (Einarsen et al., 2010), que equacionam os efeitos de tais perturbações não apenas no espaço de trabalho, como nas restantes esferas da vida dos trabalhadores.

Uma expressiva maioria da população trabalhadora nas lojas de restauração e vestuário dos centros comerciais declara sentir perturbações de natureza física e psicológica. A fatia mais elevada de perturbações físicas reporta-se ao cansaço físico, em particular dores de pernas e costas, que decorrem das posições de pé prolongadas em que se encontram a laborar no dia-a-dia de trabalho. Atente-se no seguinte discurso da entrevistada:

 

Um das coisas piores deste trabalho é estarmos sempre de pé, dá um conjunto de dores nas pernas e nas costas ao final do dia… é que não nos podemos sentar, aliás, a loja não tem nenhum sítio para nós nos sentarmos, só dá para descansarmos as pernas na pausa, quando estamos a almoçar ou a jantar. A loja é toda muito bonita, mas não pensam nunca em nós, nos trabalhadores. [Rosa, caixeira-ajudante na loja de vestuário Safira, centro comercial 1]

 

A entrevistada Rosa salienta a inexistência de um local específico para se sentar na loja, sendo possível fazê-lo apenas durante os momentos de pausa no trabalho. Uma outra questão importante é a da configuração física das lojas não levar em consideração a presença dos trabalhadores nesses mesmos espaços. Prevalecem acima de tudo preocupações estéticas (Falk e Campbell, 1997; Vilar, 2006) e não se contemplam as necessidades humanas das pessoas que aí trabalham. Estes problemas físicos podem não significar uma perturbação patológica evidente (Nava, 2002), porém os seus efeitos atuam lentamente.

Segue-se o cansaço psicológico. Aqui destaca-se o facto de as chefias, por exemplo, terem de estar sempre disponíveis, quer nos dias de trabalho fora do seu horário, quer mesmo nos dias em que se encontram a gozar a sua folga. O ter o telemóvel sempre ligado constitui uma realidade para muitas destas chefias. É de registar precisamente que nos momentos anteriores à realização do grupo focalizado com trabalhadoras de lojas de vestuário, a encarregada da loja atendeu várias vezes o telemóvel para responder a questões colocadas por trabalhadoras que se encontravam a laborar. A mão-de-obra, e particularmente a que desempenha cargos de chefia, tem de manifestar uma disponibilidade constante, o que perturba as suas vidas pessoal, familiar e social.

Importa destacar também os períodos de insónias, o mau humor, as ­enxaquecas e o sentimento depressivo. As insónias relacionam-se com o tipo de horários a que os trabalhadores estão submetidos, em particular a sua grande variabilidade, que implica a obrigatoriedade de realizar turnos de manhã, à tarde e à noite, que interferem com os ritmos circadianos (Young, 1988)7

O testemunho de António é revelador:

 

As minhas principais perturbações do trabalho são as insónias. Eu trabalho por turnos, aliás, como a maioria dos meus colegas, por isso imagine… pode calhar numa semana fazer o horário da manhã e a outra o da noite, ou mesmo variar na mesma semana… por exemplo, acontece numa semana trabalhar até às 1h00, depois na semana seguinte ter que ir trabalhar às 9h00, na noite anterior a esse dia em que tenho de trabalhar de manhã, deito-me lá para as 23h00, mas não consigo adormecer, porque na semana anterior a essa hora estava eu a trabalhar… fico acordado até de madrugada e apetece-me dormir justamente à hora que tenho de acordar para ir trabalhar. Nos dias de folga, a situação também não é fácil, pois como tenho os horários de sono desregulados, passo o dia todo a dormir, e sinto-me um pouco para o inútil, pois acabei por não fazer nada, exceto dormir. [António, gestor na loja de restauração Real, centro comercial 4]

 

As insónias parecem estar relacionadas, neste caso concreto, com a variabilidade dos turnos de uma semana para a outra, ou numa mesma semana. Pode considerar-se que este problema interfere negativamente na saúde dos trabalhadores.

O mau humor decorre da interação comercial com a clientela, em particular do ter de estar sempre a “representar junto do cliente”. As enxaquecas tendem a ocorrer, segundo a população entrevistada, devido ao ritmo de trabalho acelerado existente nas lojas de restauração e vestuário, embora mais sentido nas primeiras pela natureza concreta da atividade de trabalho. A depressão foi sentida pela trabalhadora Verónica, que desempenha o cargo de chefia na loja de restauração Club. Essa situação foi justamente motivada, nas palavras da entrevistada, por um “ritmo de trabalho fora do normal”, que a levou a emagrecer muito e a sentir-se absolutamente exausta.

Finalmente, é de sublinhar que ao adicionar o cansaço psicológico a todas as outras perturbações de natureza psicológica, o resultado é um conjunto relativamente mais pronunciado de perturbações desta índole, em comparação com as de natureza física. Como quer que seja, as perturbações físicas e psicológicas acabam por atuar de forma interativa num movimento dinâmico que pode ter combinações várias ao longo do tempo (Légeron, 2003). Elas ­traduzem a ideia de usura que não se limita ao período de trabalho, mas estende-se a outros momentos da vida dos trabalhadores.

Da análise global das argumentações expostas pela população entrevistada, fica claro que as perturbações do quotidiano laboral remetem acima de tudo para as condições de exercício do trabalho: níveis de pressão elevados suscitados por períodos longos de interação com os clientes, que obrigam os trabalhadores a um esforço permanente para manter o comportamento adequado. Também sobressai a irregularidade dos horários de trabalho, que constitui uma das principais fontes de insatisfação laboral. São atividades profissionais que certamente, à semelhança de outras, mas aqui salvaguardando a especificidade de terem lugar em contexto de centro comercial, desencadeiam um conjunto de problemas decorrentes da sua própria natureza e das condições do seu exercício: problemas físicos e psicológicos, que devem ser perspetivados de forma inter-articulada, como sugerem precisamente os últimos relatórios dos inquéritos às condições de trabalho na União Europeia (Eurofound, 2011).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho em lojas de restauração e vestuário nos centros comerciais permite pensar a dimensão interativa dos empregos nos serviços. Analisar a atividade de trabalho a partir dos contextos organizacionais é fundamental para perceber de que forma estes a influenciam (Haveman e Khaire, 2006). Neste artigo procurou-se refletir, precisamente, sobre a interação comercial entre trabalhadores e clientes a partir dos tipos de lojas construídos. O momento de aproximação do cliente, o enquadramento temporal e espacial da interação, os recursos mobilizáveis no decurso da interação pelo trabalhador, os suportes informacionais ao atendimento e as competências mobilizadas pelo trabalhador constituíram os parâmetros de análise da interação comercial. A tipologia de lojas de restauração (fast-food, clássicas e mistas) e de vestuário (self-service e atendimento personalizado), sustentada nos parâmetros do momento de aproximação do cliente e da organização do trabalho, forneceu a base para pesquisar a diversidade de contextos organizacionais.

No caso da restauração fast-food, referiu-se que o momento de aproximação do cliente é muito orientado pelo trabalhador e pelas prescrições da marca sustentadas por um modelo de produção e comercial que implica a transferência de trabalho para o cliente. Na restauração clássica, este entra e na maioria dos casos apenas posteriormente é atendido pelo trabalhador. A restauração mista compatibiliza as duas situações dos tipos anteriores. Relativamente à duração da interação, na restauração fast-food regista-se a sua curta duração comparativamente à restauração clássica, destacando-se na primeira o espaço do balcão, e na segunda a sala de refeições, enquanto na restauração mista se conjugam as realidades das duas anteriores. No respeitante aos recursos mobilizáveis pelo trabalhador, identificou-se o fenómeno da venda sugestiva nas lojas de restauração fast-food e clássicas, embora nestas últimas o trabalhador disponha de mais tempo para realizar a referida venda. Na restauração mista conjugam-se as situações anteriores. Os suportes informacionais do atendimento na restauração fast-food correspondem ao painel informativo existente e na restauração clássica ao menu entregue ao cliente. Por fim, referiu-se que o trabalhador mobiliza nos três contextos de restauração um corpo de saberes fazer sociais aproximados, embora na restauração fast-food e mista, para além da componente relacional, se destaquem as componentes técnica e organizacional em virtude da divisão do trabalho aí existente.

No âmbito das lojas de vestuário de self-service, o momento de aproximação do cliente não é orientado pelo trabalhador, e a duração da interação é variável em função do cliente, tendo lugar nos vários espaços da loja. Já na loja de atendimento personalizado, é muito orientado pelo trabalhador, sendo variável também a duração da interação, embora esta, ao contrário da primeira, se concentre no espaço do balcão. Identificou-se para ambos os tipos de loja a venda sugestiva, embora no segundo o trabalhador disponha de mais tempo para dar a conhecer os artigos da loja. Em termos de suportes informacionais ao atendimento, a loja e sua montra constituem desde logo elementos fundamentais. O trabalhador utiliza um conjunto de saberes fazer sociais próximo em ambos os tipos de loja, embora nas lojas de atendimento personalizado avulte a sua natureza técnica, dada a especificidade da interação comercial que aí tem lugar. Mediante esta análise sobressaíram lógicas diferenciadas de organização e racionalização dos processos conducentes preferencialmente à venda comercial.

Para a compreensão da interação comercial foi decisivo apreender as características exigidas à mão-de-obra que ocupa os postos de trabalho nas lojas de restauração e vestuário, os dispositivos de funcionamento destas lojas e as perturbações que os trabalhadores declaram sentir no seu quotidiano laboral. Os empregadores acabam por reclamar autoridade sobre os mais variados aspetos subjetivos dos trabalhadores, tentando regular a sua aparência física e a forma de se comportarem. Deu-se conta da existência de trabalho emocional (Hochschild, 2003 [1983]; Bolton, 2006) vinculado à construção de expressões de emotividade e, simultaneamente, de trabalho estético (Warhurst e ­Nickson, 2007), consubstanciado na preservação de corpos jovens e bem cuidados. Ambos os trabalhos apontam para práticas de gestão orientadas para o cumprimento de metas comerciais e financeiras das lojas.

No seio da análise dos dispositivos de funcionamento das lojas sobressaiu a importância vincada do objetivo das vendas, e o facto de os trabalhadores se confrontarem por um lado com a tendência (Aubert e Gaulejac, 1991) para laborarem menos com vista a protegerem-se das exigências da loja, e por outro com a vontade de se empenharem mais nos resultados coletivos de modo a obterem contrapartidas financeiras. Entre as regras de funcionamento das lojas, argumentou-se que a utilização obrigatória da farda contribui para a construção de uma imagem corporativa das marcas comerciais e para a consolidação da hierarquia profissional traduzida, por exemplo, na existência de fardas diferenciadas.

Ainda no contexto analítico da interação comercial, procurou-se examinar o tipo de perturbações sentidas pela população entrevistada no seu quotidiano de trabalho. Salientaram-se as de natureza física e psicológica, intimamente associadas aos contextos de trabalhos vividos. Foram destacadas as dores de pernas e de costas, as insónias, o mau humor, as enxaquecas e o sentimento depressivo. Tais perturbações relacionam-se, de modo geral, com a variabilidade dos horários de trabalho, com a configuração física das lojas que contempla acima de tudo preocupações estéticas descurando as necessidades dos trabalhadores, e com a nem sempre fácil interação com os clientes. Trata-se de atividades laborais que suscitam um conjunto de problemas particularmente gravosos para os trabalhadores, resultantes das suas características e condições do seu exercício.

A reflexão sobre a interação comercial baseada na construção de uma tipologia de lojas de restauração e vestuário permitiu sublinhar a importância analítica de partir da diversidade dos contextos organizacionais para compreender a atividade de trabalho. No seu conjunto fornece indicadores de relevo para conhecer a natureza dos contextos sociais de trabalho analisados, e as lógicas de procura e oferta de mão-de-obra nestes segmentos do mercado de trabalho.

 

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*Recebido a 18-10-2010. Aceite para publicação a 25-11-2011.

 

Notas

1Esta pesquisa insere-se no projeto de investigação: “Trabalhadores dos Centros Comerciais na Área Metropolitana do Porto” (POCI/SOC/8215/2004), financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e pelo Programa Operacional Ciência e Inovação 2010 (POCI 2010) comparticipado pelo fundo comunitário europeu FEDER, e no projeto de doutoramento: Trabalhadores (as) e Contextos de Trabalho em Centros Comerciais Portuenses: O Caso das Lojas de Vestuário e Restauração (DFRH/BD/16340/2004), financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

2Todos os nomes das lojas e dos trabalhadores utilizados ao longo do artigo são fictícios.

3A primeira parte do capítulo 4 do livro O Trabalho nos Centros Comerciais (Cruz, 2010), dá conta de uma análise comparativa sobre as atividades económicas “comércio a retalho” e “alojamento e restauração”, ambas inseridas no setor terciário, e a globalidade dos três setores de atividade económica, que permite evidenciar as singularidades que atravessam as primeiras ao nível, por exemplo, das variáveis sexo, idade, habilitações escolares, qualificações profissionais, situação na profissão, antiguidade na empresa, tipo de contrato de trabalho e regime de duração do trabalho.

Refira-se que para além destas duas atividades económicas do setor terciário, este é constituído por outras de natureza distinta (atividades de consultoria, científicas e similares; atividades de informação e comunicação, atividades administrativas e dos serviços de apoio, entre outras) que apontam, precisamente, para a sua composição heterogénea em termos de emprego.

4Construiu-se uma tipologia sustentada nas seguintes dimensões: o momento de aproximação do cliente e a organização do trabalho que se opera nas referidas lojas. Para a restauração apontou-se uma classificação tripartida: restauração fast-food, clássica e mista. Na primeira, o cliente é envolvido numa dinâmica de self-service que o leva ao balcão de atendimento para solicitar os produtos pretendidos e pagá-los, para de seguida se deslocar para uma mesa da praça da restauração existente nos centros comerciais. A segunda oferece ao cliente uma sala de refeições onde este pode sentar-se, aguardar pela pessoa indicada para formular os pedidos e degustar a sua refeição nesse local, e no final pagar a respetiva despesa. A terceira compatibiliza as características das duas anteriores.

No vestuário identificaram-se dois tipos: lojas de self-service e lojas de atendimento personalizado. Nas primeiras, o cliente entra e circula livremente e dirige-se ao balcão central para efetuar o pagamento; nas segundas, o cliente quando entra é orientado pelo trabalhador que atende e regista os artigos na caixa.

5Há todo um universo de consumo sustentado pelo design do espaço comercial meticulosamente projetado. Neste contexto dissemina-se um conjunto de dispositivos mediante os quais as marcas tentam atrair, e se possível fidelizar, clientes (Barrey, 2004). Pode falar-se em dispositivos de atração que visam uma estratégia ofensiva que consiste no recrutamento dos clientes e no esforço de mantê-los por um determinado período de tempo afastados das marcas concorrentes. Porém, estes dispositivos por si só não fixam os clientes, podem atraí-los pontualmente, mas comportam limites. Já os dispositivos de fidelização ativam uma estratégia defensiva que visa reter os clientes já conquistados no interior do local de venda. Ora, ambos os dispositivos trabalham sobre as disposições dos clientes, moldando as existentes e construindo novas. Ou seja, as marcas e entidades que as gerem sabem que os clientes gostam de se divertir e experimentar situações e produtos novos, e nessa medida brindam-nos com novidades, colocando à disposição, por exemplo, cartões cliente que lhes permitem ter descontos ou até mesmo proporcionar facilidades de pagamento, habilitarem-se a ganhar viagens, etc.

6Esta autora considera que as emoções no local de trabalho devem ser equacionadas não apenas como sinónimo de sofrimento, mas como expressão de satisfação e desfrute. Defende que o trabalho de Hochschild (2003, [1983]) vincula as ideias de trabalho e emoção sob um prisma excessivamente pessimista, porquanto explora as consequências negativas do controlo das emoções dos trabalhadores encetado pelas entidades empregadoras.

7O ritmo circadiano, considerado o período de cerca de um dia (24 horas) sobre o qual se baseia todo o ciclo biológico do corpo humano e de qualquer outro ser vivo, influenciado pela luz solar, regula todos os ritmos materiais como vários dos ritmos psicológicos do corpo humano, com interferência sobre a digestão ou o estado de vigília, o crescimento e a renovação das células, as oscilações da temperatura. Segundo Diane Boivin – docente de psiquatria e diretora do Centro para o Estudo e Tratamento dos Ritmos Circadianos, do Instituto Universitário de Saúde Mental, Montreal, Canadá – os trabalhadores que laboram por turnos correm riscos acrescidos de saúde, em particular no que respeita ao sono (Boivin e James, 2005; Boivin et al., 2007).

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