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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.203 Lisboa abr. 2012

 

O poder visível: D. Carlos, a imprensa e a opinião pública no final da monarquia constitucional

 

The visible power: D. Carlos, the press and the public opinion in the end of the Portuguese constitutional monarchy.

 

José Miguel Sardica*

*Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa. E-mail: jsardica@fch.lisboa.ucp.pt

 

Resumo

O presente artigo parte de uma análise das principais dinâmicas de afirmação da masspolitik e de industrialização e democra­tização da imprensa portuguesa, no final do século XIX e no início do século XX, para situar e compreender a relação que o rei D. Carlos teve com o mundo dos jornais e da opinião pública, desde os tempos da educação como Príncipe Real até à aposta final em João Franco e ao desfecho trágico do regicídio. É assim possível observar como a história da queda da monar­quia constitucional também resultou, entre diversos outros fatores, das dificuldades que o Paço e os políticos do sistema tiveram em conviver com as exigências jornalísticas próprias da “idade de ouro” da imprensa portuguesa.

Palavras-chave: D. Carlos; monarquia constitucional; jornalismo; imprensa; opinião pública.

 

Abstract

The present article analyses the main currents that mark the evolution of the Portuguese press at the end of the nineteenth century and the beginning of the twentieth – masspolitik, industrialization and democratization. It aims to understand the relationship between the King (D. Carlos I) and the newspapers and the public opinion from the time of his political beginnings as Prince Royal to his final political bet on João Franco and the tragic debacle of the regicide. In this way, we hope to make sense of how the end of the constitutional monarchy was the outcome, among other factors, of the problems posed to the Court and the regime’s main political figures by the demands made by the newspapers stemming from what we may now call the “golden age” of the Portuguese press.

Keywords: D. Carlos; constitutional monarchy; journalism; press; public opinion.

 

INTRODUÇÃO: A EMERGÊNCIA DA MASSPOLITIK EM PORTUGAL

 

Num livro publicado em 1906, Sampaio Bruno utilizou uma pequena história para ilustrar o que considerava ser a falta de cultura e consciência cívica dos portugueses, referindo ser frequente deparar com pessoas que desconheciam “o nome e a existência” dos monarcas nacionais. Segundo ele, “uma vez, em Braga, estavam dobrando os sinos para as exéquias de D. Pedro V. Um lavrador acercou-se de um amigo meu e perguntou-lhe por quem dobravam os sinos – Por D. Pedro V. O homem arregalou os olhos e depois sorriu: – Ah! Sim; entendo; algum sujeito lá de Lisboa” (Bruno, 1906, p. 110).

A ter sido verdade, este episódio data de 1861, dois anos antes do nascimento do futuro rei D. Carlos. É menos provável – embora no Portugal rural mais recôndito não fosse impossível – que semelhante ignorância fosse regra geral décadas mais tarde, aquando da morte de D. Carlos. Quanto mais não seja porque o penúltimo monarca português, sobrinho de D. Pedro V, reinou num tempo de espaço público e opinião pública renovados e alargados, em que o voyeurismo da imprensa e a divulgação da fotografia emprestaram ao poder uma visibilidade nova, iniciando assim, também em Portugal, a tendência para a mediatização das figuras do Estado e da política.

Ser rei na época em que D. Carlos o foi (1889-1908), com as responsabilidades que a cultura política do liberalismo e a letra da Carta Constitucional exigiam aos monarcas, e perante os múltiplos desafios que o país vivia, estava longe de ser uma tarefa simples. Os finais do século XIX e inícios do século XX, ou seja, o período que vai do ultimato ao regicídio (e depois à implantação da República), foram uma época de acrescida instabilidade e agitação, reveladora do impasse e crise de velhas estruturas políticas, institucionais, económicas e sociais, vivida num ambiente cultural e mental de pessimismo e de ­decadentismo. Tudo isto contribuiu para a erosão da velha legitimidade monárquica e para o crescente confronto desta com a nova força ideológica do republicanismo. Por todo o país, mas particularmente no universo sociopolítico de Lisboa, generalizou-se um clima de contestação e de busca de renovação que colocava em xeque não apenas a ordem pública imediata, mas também as velhas convenções constitucionais e certezas culturais que até aí tinham servido de base ao sistema monárquico liberal.

Basílio Teles foi um dos observadores que melhor exprimiu a situação portuguesa na viragem do século, detetando que o ambiente tinha começado a mudar antes de D. Carlos ter subido ao trono. O que ele saudava como “a aparição do factor democrático na política portuguesa”, rompendo enfim com a “subserviente apatia da nação” (Teles, 1905, pp. 15 e 20) e predispondo-a a descobrir e tornar audíveis as suas reivindicações coletivas, mergulhava raízes na renovação da intelligentsia portuguesa, iniciada na Questão Coimbrã e na militância da Geração de 70, e nas chamadas “campanhas democráticas” contra D. Luís, no final da década de 1870 e início da década de 1880 (Teles, 1905, p. 16 e Silveira e Fernandes, 2006, pp. 206-214).1 A isso se juntara, em 1880, a comemoração camoniana, momento decisivo para a maturação da intelectualidade portuguesa e para a dinâmica de doutrinação das massas urbanas, que o republicanismo ou a esquerda radical monárquica nunca mais deixaram de incitar e enquadrar. Em poucos anos, portanto, notava Basílio Teles, “todo o microcosmos do constitucionalismo, artificial, ignaro, verboso, ridículo, ficava desde logo exposto à análise desapiedada” de filósofos, escritores, jornalistas, agitadores, de todos quantos, no espaço público, formavam, informavam e mobilizavam a consciência e a ação das massas (Teles, 1905, p. 47).

Os últimos anos do reinado de D. Luís foram assim férteis em meetings, clubes, conferências, comícios, panfletos de ocasião e editoriais de imprensa mais ou menos incendiários, que muito contribuíram para difundir na opinião pública uma atitude iconoclasta, feita de “desdém”, “vaga hostilidade” e “indisciplina” nas camadas sociais mais expostas à renovação cultural e social (Teles, 1905, pp. 61-62). A partir de então, “as massas” agitaram-se e organizaram-se “com entusiasmo e êxito”, revelando a existência e enraizamento social de “uma poderosa corrente democrática, que dos rebeldes de Coimbra se arrastara até à mocidade das escolas e às massas populares” (Teles, 1905, p. 72). Foi como se, no espaço de alguns anos, o país tivesse consciencializado os limites do progresso económico e do modelo político fontista e exigisse agora, nos quadros de um ativismo cívico mais alargado, aprofundar e completar o primeiro liberalismo (o da geração romântica), num sentido de democratização e de massificação que extravasava já os tradicionais modelos de enquadramento e participação cívica à disposição dos portugueses.

Esta consciência era naturalmente causa e consequência das profundas mutações socioeconómicas e políticas ocorridas em Portugal nas últimas décadas do século XIX. É verdade que o país não deixou de ser pobre, rural e analfabeto – mas o facto é que ele mudou então muito, num salto modernizador apenas comparável àquele outro registado mais tarde, nas décadas de 1960 e 1970 (Ramos, 2001, p. 35). O desenvolvimento fontista, apesar de todos os seus limites, escolarizara mais gente, rompera isolamentos ancestrais e engendrara cidades maiores, onde novos estratos de classe média e nascentes bairros operários animaram a sociedade civil e fizeram emergir uma masspolitik mais radical e ruidosa (Pinto e Almeida, 2000, pp. 8-10 e Bonifácio, 2010, pp. 81-82 e 113-114). Esta masspolitik seria avidamente explorada pelos opinion makers da “vida nova” monárquica e pelas estruturas políticas do republicanismo e do anarco-sindicalismo, como já antes o fora pelas vozes radicais do Partido Progressista. Lisboa mais do que duplicou o seu número de habitantes entre 1878 e 1911, passando de 187 mil para cerca de 435 mil; no Porto, o acréscimo populacional excedeu, nestes anos, os 70%, passando de 105 mil habitantes para cerca de 194 mil (Ramos, 2006, pp. 71 e 229).

Era mais gente em espaços muito politizados, e gente que ia já acedendo à leitura e à consciencialização cívica, com os progressos da alfabetização, e à participação política, com o alargamento do direito de voto. Quanto ao primeiro aspeto, vale a pena lembrar que a população alfabetizada subiu de 21% em 1878 para 31% em 1910 (Candeias, 2007, pp. 96 e 120). O ganho – 10% da população, uns 540 mil portugueses num total demográfico de cerca de 5,4 milhões em 1900 – foi obtido sobretudo entre os homens e nas cidades, fazendo do espaço urbano, e acima de tudo de Lisboa e Porto, uma ­autêntica “ilha” de leitura num “oceano” de ruralidade e analfabetismo. Em 1900, na viragem do século, a taxa de analfabetismo em Lisboa era de 46,1%, e no Porto de 56,7%, quando no total do país ascendia a 74% (Marques, 1991, p. 519). Quanto ao segundo aspeto, deve realçar-se que enquanto em meados da década de 1860 apenas 10% dos portugueses tinham direito de voto, depois da reforma eleitoral de 1878 este foi alargado a 18,8% dos portugueses, rondando os 70% da população masculina adulta, numa clara aproximação ao sufrágio universal masculino (Almeida, 1998, p. 733).2

 

IMPRENSA E OPINIÃO PÚBLICA NOS FINAIS DO SÉCULO XIX

 

Neste país que então despertava para a contestação social, arregimentável para o radicalismo político e recetivo aos slogans de renovação cultural que se alinhavam como antídotos contra o decadentismo pátrio, novos núcleos organizadores da opinião foram alargando o seu poder e influência. Ao lado do Paço, do parlamento, dos partidos de notáveis (com os seus pequenos centros eleitorais), os grandes canais de comunicação de massas passaram a ser os meetings, os comícios, as conferências, as comemorações e, muito especialmente, os jornais ao estilo fin-de-siècle – baratos, generalistas, redigidos em linguagem simples, misturando o slogan político-ideológico com a diversidade dos temas sociais e de quotidiano mais atuais.

Perante um espaço público e uma opinião pública geográfica e sociologicamente alargados, a função exercida pela imprensa e a própria forma como os jornalistas, e em geral os escritores e publicistas, exerciam o seu ofício conheceram alterações profundas. Os jornais tornaram-se uma espécie de meta-instrumento para a reorganização sociocultural da nação, e os jornalistas agentes construtores e porta-vozes da nova consciência coletiva. Superando os simples literatos românticos ou noticiaristas de folhetim, os jornalistas assumiram-se então como intelectuais ativos na vanguarda da mutação da vida pública, que se atingiria não pelo culto das letras para as elites, mas através de uma militância ética forte, conquistando e doutrinando diariamente os espíritos no caminho da consciencialização e da revolução (Ramos, 2004, p. 114). Consequentemente, através da intenção e do modus operandi desta “geração nova”, o final do século XIX foi o período em que a opinião pública ascendeu à maioridade em Portugal, reforçando a sua moderna função de referencial básico da luta política e da agenda quotidiana, e de barómetro da democracia ambicionada por muitos. Como resumem António Costa Pinto e Pedro Tavares de Almeida, referindo-se ao Portugal finissecular, “in such a pluralistic context, a free press naturally flourished and played a decisive role in building a civic consciousness within the literate urban strata” (Pinto e Almeida, 2000, p. 6).

A aceitar-se a interligação entre “democracia moderna” e “magistério da imprensa” (Vargues, 2003, p. 157), não há dúvida de que o tempo que mediou entre o início da “fase industrial” do jornalismo – com a fundação do Diário de Notícias em 1865 (Tengarrinha, 1989, pp. 211-215) – e a vitória republicana, em 1910, constituiu a época mais marcante da modernização dos jornais em Portugal, quer em termos quantitativos (mais títulos), quer em termos qualitativos (novos e melhores jornais), assinalando o apogeu, até aos dias de hoje (antes de a República e de o Estado Novo terem restringido a capacidade de expressão da opinião pública), da influência da imprensa na vida social e nos centros de poder político. Alguns números podem ser referidos para contextualização. Em 1880, calcula-se que existissem em todo o país uns 200 jornais (Tengarrinha, 1989, p. 231 e Ramos, 2001, p. 52); nos meados da década de 1890 seriam já quase 400 e no início do século XX 592, de acordo com uma apurada estatística da autoria de Brito Aranha (Aranha, 1900, pp. 45-47). Isto significaria, por volta de 1900, um surpreendente ratio de 1 jornal por cada 9160 habitantes3, bem superior à Inglaterra ou à França, onde a relação seria de 1/23000 (Aranha, 1900, pp. 47-48). Lisboa e Porto assumiam, face ao país, uma distinta macrocefalia comunicacional: as duas cidades, com um pouco mais 500 mil habitantes somados em 1900, detinham cerca de 42% de toda a imprensa nacional e a esmagadora maioria dos jornais diários fazedores de opinião (Ramos, 2001, p. 53).4 No caso particular de Lisboa, a venda de jornais diários subira de uns 50 mil exemplares/dia no final da década de 1860 (­Tengarrinha, 1989, p. 227) para uns 300 mil/dia nos últimos anos da monarquia (Vieira, 1999, p. 184 e Ramos, 2001, p. 55). Como recordaria, já no século XX, um dos jovens jornalistas do tempo de D. Luís e de D. Carlos ao referir-se à sua juventude, “a imprensa barata foi acolhida com entusiasmo; o público habituou-se na leitura do que se passava na sua terra e no estrangeiro […] Em Lisboa, onde até ali apenas se publicavam cinco ou seis folhas diárias, passou a haver vinte ou trinta em todos os formatos e com grandes ou pequenas tiragens” (Bastos, 1947, pp. 73-74).

Era tudo isto que alimentava uma valorização otimista dos jornalistas como intérpretes e porta-vozes privilegiados da agenda sociopolítica (Sardica, 2009, pp. 20-24). Quase todos os que escreviam nos jornais ou refletiam sobre o alcance dessa escrita compunham um discurso que retratava o jornalismo como “um poderoso factor de civismo e de educação nacional”, na “defesa e apostolado das ideias mais justas” (Cayolla, 1929, pp. 158-159). Por isso, a imprensa era “a força mais potente e dominadora das sociedades modernas” (Cayolla, 1929, p. 165), a “palavra organizada em instituição” e “tornada eco da multidão anónima” (Bessa, 1904, p. 29), e o jornalista, individualmente considerado, um “fabricante da opinião pública” (Bramão, 1936, p. 44), uma “sentinela vigilante”, tão indispensável à vida individual de cada um como o seu médico ou o seu advogado (Bessa, 1904, pp. 28 e 35). Ambos, imprensa e jornalistas, tinham uma “altíssima missão social e histórica” na “marcha ascensional e progressiva da civilização”, desempenhando assim “um verdadeiro sacerdócio”, “um verdadeiro apostolado”, “uma suprema magistratura”, porque só eles alcançavam “a multidão anónima” e faziam dela “um público” (­Armelim, 1909, pp. 3-4 e 8, Soares, 1883, p. 18 e Bessa, 1904, pp. 31-32).

A nova imprensa e os novos jornalistas constituíam assim uma intelligentsia com identidade própria e militância ativa, “o equivalente laico do missionário de outrora” na busca da construção da “esfera pública” como “espaço de debate e de aculturação” (Ramos, 2004, pp. 108, 113-114).5 E é por isso que a própria consciência profissional da classe jornalística ganhou considerável reforço em Portugal nos finais de Oitocentos, quando o amadorismo organizativo foi substituído pelas primeiras formas de associativismo profissional, permitindo desta forma, ao mesmo tempo que se complexificavam as redações dos periódicos, potenciar a cotação da carreira jornalística e enraizar as primeiras preocupações quanto à formação e qualidade da classe. Este aspeto é crucial para compreender a progressiva autonomização e redefinição por que passou o jornalismo nestes anos. Da multiplicidade de académicos, literatos e políticos que escreviam para os jornais – os “modernos publicistas”, como lhes chamava Sampaio Bruno – começou a emergir uma classe específica, de profissionais da imprensa a “tempo inteiro”, cuja identidade organizativa foi reforçada exatamente nos finais do século XIX. A organização profissional dos jornalistas portugueses começou em 1880, quando se criou a primeira Associação de Jornalistas e Escritores Portugueses, no âmbito das comemorações camonianas (Vargues, 2003, p. 169). Fracionada por conflitos internos, ela não sobreviveu para lá de 1892 – dando azo a que ainda em 1894 Alberto de ­Oliveira lamentasse serem os jornalistas portugueses pouco mais do que simples “amanuenses de jornais” (França, 1997, p. 228). Talvez para contrariar este aspeto e reforçar a profissão, fundou-se em Lisboa, em 1896, uma Associação dos Jornalistas (repare-se que já sem a menção aos “escritores”), que reunia diretores e editores de jornais. No Porto, em 1897, surgiu uma Associação de Imprensa que juntava repórteres, noticiaristas e alguns tipógrafos, antes de estes últimos se terem, por sua vez, autonomizado, em 1904, na Associação de Classe dos Trabalhadores da Imprensa (v. Vargues, 2003, Santos, 2005 e, de forma mais extensa, Valente, 1998).6

O resultado destes passos é que o jornalista, como categoria social particular, começou então a distinguir-se das esferas, mais largas e difusas, da literatura e da política (embora os campos tenham sempre revelado porosidade de fronteiras), levando a que a oferta jornalística consolidasse a sua setorialização. Assim, os grandes periódicos, sobretudo os diários lisboetas, podiam ser classificados em dois tipos: jornais ideológicos e panfletários, que serviam de megafone a projetos políticos de maior ou menor transformação social, defendidos por partidos ou fações, e jornais noticiosos, de grande informação dita útil e suprapartidária, por norma ligados a lobbies comerciais ou industriais. No primeiro caso estavam as folhas dos grandes articulistas, cujo talento prendia leitores e garantia vendas e influência: O Século, de Magalhães Lima e Silva Graça, o Novidades, de Emídio Navarro, o Diário Popular, de Mariano de ­Carvalho, o Tempo, de José Dias Ferreira, O Mundo, de França Borges, ou A Lucta, de Brito Camacho, entre outros. No segundo caso estavam as grandes empresas jornalísticas, como o Diário de Notícias, o Jornal de Notícias, o Primeiro de Janeiro ou o Jornal do Comércio, entre outros, bem como o florescente nicho de mercado constituído pelas revistas ilustradas, entre as quais avultavam o Occidente e a Ilustração Portuguesa.

O conceito moderno, militante, agitador e pedagógico da imprensa como agenda-setter de todo o debate político-social e cultural que urgia fazer supunha um jornalismo de estilo e visual gráfico renovados. Foi nas últimas décadas do século XIX e nos primeiros anos do século XX que a velha escrita jornalística que vinha da geração de Garrett ou de Herculano deu lugar a uma escrita mais concisa e informativa – feita de “afirmativas cortantes, nítidas, categóricas, impositivas” (Bruno, 1906, p. 392). Várias transformações tecnológicas e um incremento do jornalismo internacional de agência permitiram aos jornais terem mais páginas, diferentes secções e uma apresentação renovada: títulos, subtítulos, leads, ilustrações e já, também, fotojornalismo, tudo isto servindo editoriais políticos, crónicas parlamentares, relatos estrangeiros, reportagens de quotidiano, entrevistas com figuras de atualidade, apontamentos de cultura e high-life e exploração de casos e escândalos (Vargues, 2003, p. 159 e ­Santos, 2005, p. 83). O mundo do jornalismo nos finais do século XIX e inícios do século XX – tempo do reinado de D. Carlos – tornou-se assim quase uma indústria informativa e cultural, um verdadeiro “quinto poder” (como um dia definiu José Dias Ferreira), mais vasto e influente do que os outros: além dos jornalistas profissionais, eram-no também, por escreverem nos jornais, os intelectuais aclamados como grandes escritores; vinham dos jornais, ou neles se distinguiam, praticamente todos os nomes da vida política7, sobretudo os da “vida nova”, que militavam na esquerda monárquica ou que engrossavam as fileiras republicanas; e era a grande imprensa de massas, e já não os títulos literários, que fabricava e conduzia a opinião pública urbana.8

Todas estas transformações acompanhavam, ainda que em escala menor, o que eram as tendências das grandes democracias ocidentais do tempo, europeias e norte-americana. No panorama internacional, as décadas finais do século XIX e os princípios do século XX (até à I Guerra Mundial) são por norma referidas como a “Idade de Ouro” da imprensa escrita. Recebendo novos investimentos e dirigindo-se a novos públicos, forjados pela urbanização, pela terciarização e pela massificação próprias da segunda revolução industrial, o jornalismo profissionalizou-se, lá fora, ao mesmo tempo que se mercantilizava, produzindo periódicos multitemáticos, de grande informação, linguagem apelativa e abordagem sensacionalista (Chapman, 2005, pp. 71-75 e Sassoon, 2006, pp. 713-717). A yellow press norte-americana, de Joseph Pulitzer e William Randolph Hearst, ou o new journalism britânico de Alfred Harmsworth, foram os melhores exemplos da industrialização informativa e da dramatização noticiosa em estratégia alargada de captação de públicos (o catch-all paper), que cristalizaram o conteúdo e a forma típicas dos jornais fim de século como “synthesis of advertising, culture, information, politics and manipulation” (Chapman, 2005, p. 72).9

Também no Portugal monárquico de D. Carlos, a fase industrial da imprensa, ou a idade de ouro do jornalismo escrito, fez desse único mass media então existente um poderoso meio de lobbying e de agitação política, que ­acelerava o debate de ideias e a movimentação social num país atravessado por tensões, problemas e desafios novos. Desde a Geração de 70 até à República que a condução do Estado e da nação se tornou cada vez mais difícil e incerta. A rotina e os mecanismos sobre os quais repousava o constitucionalismo da Carta começaram a revelar-se desajustados para responder às reivindicações de democratização e massificação da política propostas por vários quadrantes. Governar deixou de poder ser administrar apenas a velha alternância rotativa e passou a ser ter de enfrentar contestação aberta, ruído nas ruas e militância nos jornais, oposição dentro do sistema e cada vez mais fora dele. Sobretudo na imprensa mais vincadamente político-partidária (da esquerda monárquica e cada vez mais no campo republicano), predominava a escrita inflamada e tribunícia, o estilo revolucionário e justicialista, o tom insultuoso e sensacio­nalista, que aproximavam o jornalismo português do populismo e da retórica de contrapoder dos grandes diários nova-iorquinos, londrinos ou parisienses.10 Em várias redações, “a política eram escândalos; as relações internacionais, guerras e ameaças; a vida nacional, desastres e crimes sangrentos; a economia, desfalques e fraudes; a vida social, casamentos e batizados” (Ramos, 2001, p. 54). Com esta predisposição e conteúdos, servidos por novas linguagens e grafismos, num quadro organizativo mais profissional e industrializado, produzia-se um jornalismo porventura intelectualmente menos elaborado mas socialmente mais abrangente, a um tempo panfletário e noticioso, mas sempre mobilizador, que se tornou a mais eficaz arma contra as convenções e rotinas vigentes.

Numa tal conjuntura, e ainda para mais quando, pela letra da Carta Constitucional, o monarca era o árbitro cimeiro e indispensável de todo o aparelho político-partidário, D. Carlos (como depois o filho, D. Manuel II, entre 1908 e 1910), foi uma das figuras mais expostas, mais escrutinadas e mais atacadas do seu tempo.11 Não é, aliás, possível compreender o seu reinado, a sua linha de ação política e o seu desfecho (o regicídio), sem ter presente que, no estado de opinião pública então vigente em Portugal, D. Carlos nunca pôde limitar-se à conduta seguida pelo pai, D. Luís, na primeira metade da década de 1860 e ao longo da década de 1870: reinar, mas não governar (como prescrevia a teoria constitucional cartista), ou seja, não se envolver e pairar resguardado sobre instituições, pessoas e problemas, como um distante “mestre-de-cerimónias” do regime.12 E é isto que permite situar e compreender muito do que a imprensa disse sobre o rei e a própria natureza da relação que o monarca manteve com ela, e com o espaço público, desde os tempos da educação como príncipe real até à aposta final em João Franco. Entre muitos outros fatores, a história da queda da monarquia também resultou das dificuldades que o Paço e os políticos do sistema tiveram em conviverem com as exigências jornalísticas próprias da era da democracia e das massas.

 

A INICIAÇÃO: O PRÍNCIPE D. CARLOS NO ESPAÇO PÚBLICO PORTUGUÊS

 

Entre as décadas de 1860 e de 1880, quando o renascimento do radicalismo político, a renovação cultural da intelligentsia e a redobrada influência dos jornais começaram a obrigar o poder a mediatizar-se perante a opinião pública, o ambiente em que nasceu e cresceu D. Carlos era ainda relativamente discreto. A Casa Real portuguesa tinha por tradição educar os seus príncipes no recato de palácios e precetores privados, longe do ensino público a que outras dinastias europeias já recorriam (Ramos, 2006, p. 19).13 Para mais, em Portugal, a Corte não era, nem nunca fora, faustosa e rica, não dispunha de um alargado círculo de amigos aristocráticos (como a rainha Vitória, em Inglaterra), e não tinha a panache militarista do Kaiser germânico, estando desprovida de meios financeiros ou simbólicos que a impusessem à atenção e a predispusessem à simpatia do público (Ramos, 2006, pp. 111-120). Desde os anos 70, e parti­cularmente nos últimos tempos do reinado de D. Luís, a discrição da família real era causa, e também consequência, do seu mau relacionamento com a nova imprensa. Apesar de monárquico, o testemunho de Rocha Martins não deixa de ser verdadeiro: havia, na generalidade dos jornais, “um propósito firme de ataque ao Paço”, uma “arremetida geral de baixa prosa”, da esquerda à direita, dos extremos radicais aos extremos miguelistas (Martins, 1926, pp. 47-48). O príncipe D. Carlos e o irmão, D. Afonso, eram “as louras crianças” (Cayolla, 1929, p. 9) de uma Corte que não gozava de especial reverência na opinião pública. É verdade que D. Luís tentou várias vezes inverter ou moderar este sentimento, fugindo à clausura do palácio de Queluz e procurando ser popular, mostrando-se em visitas a instituições ou passeando na capital com a rainha e os filhos (Ramalho, 2001, p. 16, e Silveira e Fernandes, 2006, pp. 66-67). Mas os resultados eram limitados.

Foi nestes anos e neste meio que D. Carlos formou a sua personalidade, de cujos traços fundamentais já era possível encontrar indícios antes de ­chegar ao trono. Nos termos de Fialho de Almeida, “a cordialidade risonhamente fidalga no trato íntimo” contrastava com o “aspecto bisonho, aborrecido e duro” por ele assumido em público (Almeida, 1924, p. 91). Apesar de se esforçar por ­aparecer, D. Carlos nunca esteve à vontade entre grandes multidões. João Franco, que o conheceu bem, elaborou-lhe um expressivo retrato: “aos primeiros contactos com estranhos, e até em actos oficiais, D. Carlos deixava por vezes uma impressão de fria reserva […] em que uns julgavam ver secura ou soberba, indo os que lhe eram hostis até o malsinar de falto de comunicabilidade intelectual e de capacidade afectiva”. Por isso, “ficou sempre, na sua estrutura íntima, um desconhecido para o seu país” (Franco, 2006 [1924], pp. 49-50), contrastando com a simpatia, a irreverência ou o à-vontade que eram características de Eduardo VII de Inglaterra ou de Afonso XIII de Espanha (Ramos, 2006, p. 167).

Isto não significa, de modo algum, que fosse um eremita, incapaz de manter qualquer vida social. A relativa distância a que mantinha os políticos sobre quem mandava e a nação que tinha de governar não o impediram de, desde a sua juventude, ler os debates da imprensa, formar juízos e ­opiniões, intervir, mostrar-se atento e interessado, cultivando até seletas amizades no mundo da intelectualidade e do jornalismo (Ramos, 2006, pp. 44-46). Na década de 1880 já adquirira “estatuto público” (Ramos, 2006, p. 46): escrevia a ­Oliveira ­Martins, era conhecido de Ramalho Ortigão (que depois o consideraria ­sempre um “confrade suplente” dos “vencidos da vida” [Ortigão, 1908]) e ­caricaturizado por Rafael Bordalo Pinheiro. São, aliás, deste último as primeiras representações visuais do futuro rei na imprensa humorística, com a qual D. Carlos alimentaria sempre uma dupla relação de consideração artística e de reserva política. Na pena de Bordalo, no António Maria, no Álbum das Glórias ou no Pontos nos ii, D. Carlos aparecia imberbe, como o “Príncipe José Simão”, em 1879, burguês janota e dandy, em 1882, ou romanticamente apaixonado, em busca de uma noiva, em 1886 (Martins, 1926, pp. 78-79, 108 e 116). Pelo meio, aos 20 anos, em 1883, a imprensa escrita também começou a falar dele por causa de um suposto envolvimento com a filha de um jardineiro do Paço (Martins, 1926, pp. 98-99), um pequeno escândalo amoroso que alimentou os sussurros dos mais moralistas e que prenunciou a série de histórias de amantes e adultérios em que andaria permanentemente envolvido como rei.

No outono de 1887, já casado com D. Amélia, e meses depois de ter sido pai do príncipe D. Luís Filipe, D. Carlos realizou uma digressão ao Porto e ao Norte, na companhia da rainha, para “julgar de perto o que os povos pensavam” (Martins, 1926, p. 143). De futuro, todas as viagens em Portugal teriam sempre este objetivo mais ou menos explícito – o de tomar o pulso à opinião pública, uma entidade abstrata que um dos conselheiros do pai, Nogueira ­Soares, já definira como nada menos do que “a omnipotente rainha do mundo” (Soares, 1883, p. 218), e que o próprio D. Luís, apesar da avançada idade e deterioração física, reconhecia já como elemento central da governação.14 Quando ascendeu ao trono, com 26 anos, D. Carlos podia não ser popular, mas era já bem conhecido do público e, mais importante, alvo preferencial das mais díspares especulações intelectuais e jornalísticas sobre que estilo e que monarquia seriam os dele.

 

A MATURIDADE: D. CARLOS E A OPINIÃO PÚBLICA PORTUGUESA

 

Oliveira Martins era o que mais se distinguia na expressão pública das muitas expectativas que se depositavam no novo monarca, logo a partir de outubro de 1889, no momento em que morreu D. Luís. Era preciso, dizia, que o jovem Bragança coroado não fosse “um rei manequim”, mas que se adequasse “às necessidades dos nossos dias”, o que significava obedecer “às manifestações da opinião, ou de uma certa opinião, pelo menos” (a dos teóricos da “vida nova”) (Martins, 1957 [1889], p. 219). Os tempos eram outros no que dizia ­respeito à relação entre o chefe supremo e a nação: “no amor do povo”, explicava ­Oliveira Martins, “é que se enraíza o poder dos príncipes e na consciência geral dos seus benefícios está a melhor base da duração das monarquias” (Martins, 1957 [1889], p. 217). Era preciso, em suma, dar visibilidade ao poder, e que D. Carlos governasse, e não apenas reinasse, não para “violentar a opinião” mas para “moralizar essa força” (Martins, 1957 [1892], p. 295).

Sucede que a sorte ou a força das circunstâncias não seriam especialmente benignas para o jovem rei. Em janeiro de 1890, o escândalo político do ­ultimato manchou o prestígio da monarquia e afetou irreversivelmente o curso do reinado – ao mesmo tempo que constituiu um momento-chave no reforço do jornalismo mais desbragado dirigido contra o rei e os seus ministros. Na imprensa, nos comícios, nos banquetes, nas conferências, nos abaixo-assinados, nas arruadas de estudantes e muito povo que se seguiram à capitulação diplomática perante a Inglaterra, o nome e a figura de D. Carlos eram o alvo preferencial de toda a histeria patriótica (Martins, 1926, p. 192).15 Guerra ­Junqueiro e António José de Almeida tornaram-se instantâneos opinion makers, glosados nos jornais e citados em voz alta, o primeiro pelo célebre poema (que Bordalo Pinheiro logo ilustrou), “O caçador Simão”, o segundo pelo violento artigo antimonárquico “Bragança, o último” (tema que ­Bordalo já glosara), publicado n’O Ultimatum, um pequeno jornal estudantil de ­Coimbra (Martins, 1926, pp. 204-205).

A gestão da opinião pública e das suas inclinações entrou assim na agenda do rei bem cedo e como um problema central da governação. Enquanto nas ruas, em 1890-1891, os portugueses insultavam a velha aliada e o monarca “lacaio” que diante dela se “ajoelhara”, D. Carlos e o príncipe de Gales (o futuro Eduardo VII) debatiam esse mesmo problema. O herdeiro do trono britânico pedia a D. Carlos que entendesse “que nós também temos de lidar com uma opinião pública que, apesar de melhor instruída, é igualmente ­exigente”. Em resposta, o monarca português confidenciava que o que o preocupava mais não era tanto a opinião pública das “ruas”, mas a da “gente de ordem, da gente séria” (Ramos, 2006, pp. 60 e 64-65) que, nos jornais, capitaneava a vox populi.

Quando o escândalo do ultimato finalmente abrandou, depois da assinatura do Tratado de 1891, o governo decidiu fazer a família real peregrinar pela Beira e pelo Norte, a propósito da inauguração de alguns melhoramentos ­ferroviários. Era um teste à popularidade do maltratado rei, e não correu mal. Na Lisboa mais politizada podiam não gostar dele, mas na província o prestígio das majestades ainda era sólido. Milhares aclamaram o rei e D. ­Amélia. N’O Século, Feio Terenas reconheceu que pela primeira vez no reinado D. Carlos presenciara “manifestações despidas de cortesias oficiais, pois essas que teve foram verdadeiras manifestações populares”. Fialho de Almeida, ao tempo um iconoclasta de esquerda, optou por maltratá-lo, dizendo que “El-Rei” se mostrara sempre, no contacto com o povo, “oprimido por uma necessidade urinária inconfessável, carrancudo e alheio” (sic) (Martins, 1926, p. 258).

É muito possível que D. Carlos não estivesse propriamente folgazão e de bem com o público. O país estava agitado e perigoso e o seu capital de experiên­cia no trono era ainda escasso para se mover à vontade entre as muitas vozes da política e da opinião. No primeiro biénio de reinado, entre o ­ultimato, as crises de governo, a revolta do 31 de janeiro (1891) no Porto e a bancarrota financeira, o rei não fez discursos nem deu entrevistas (Ramos, 1996, p. 115). A sua educação recomendava-lhe obediência à tradição constitucional de um rei moderado e moderador, árbitro à distância e último garante do equilíbrio das instituições; entendia em suma que o seu principal dever era “substituir governos, não o de substituir-se-lhes” (Ramos, 1996, p. 125). O problema é que era para isso que os múltiplos desafios do ­Portugal de fim-de-século o empurravam, havendo, assim, muita gente a pedir-lhe que fosse “cesarista” e interventivo. O dilema envenenou todo o seu reinado: como resume Rui Ramos, num ambiente de crescente agitação, “D. Carlos viveu sempre entalado entre a acusação de passividade e a calúnia do despotismo” (Ramos, 1996, p. 133).

Instruído pelo embate do ultimato, o rei gastou os anos seguintes a ensaiar caminhos e a desenvolver expedientes que lhe permitissem sintonizar a monarquia com a opinião. Começou a passear muito em Lisboa, desprevenido e sem escolta (hábito que manteria até ao dia 1 de fevereiro de 190816), para se misturar com a multidão, para fazer passar a ideia de que era, como o povo, um cidadão liberal colocado primus inter pares. Quem não apreciava a estratégia de mediatização denegria-a, dizendo que tudo não passava da vaidade de “fazer-se ao aplauso” (Ramos, 2006, pp. 90-91). Paralelamente, e no recato do gabinete, ia conversando com a intelligentsia, procurando cooptá-la para a reforma ou revolução a partir de cima com que nunca desistiu de mudar o país, as instituições e os hábitos. É neste âmbito que se insere a famosa conferência que manteve com Augusto Fuschini, numa tarde de novembro de 1892. Conversaram muito e concordaram que era preciso fazer muito: mas, no fim, D. Carlos acabou por arrefecer o ânimo do seu interlocutor, fazendo-lhe notar que faltavam “os homens” para essa grande obra de motivar e mobilizar o povo para a regeneração nacional (Martins, 1926, pp. 274-276).

Passado o biénio de 1890-1892, os homens a quem D. Carlos teve de recorrer para governar foram um misto de continuidade e de renovação. Em fevereiro de 1893, assinalando o regresso à mecânica rotativa que se manteria até 1906, a Presidência do Conselho foi entregue a Hintze Ribeiro, cujo “número dois” era o irrequieto e truculento João Franco, uma das caras da “vida nova”. A solução reconferiu estabilidade à monarquia, mas acirrou os ânimos da esquerda progressista e republicana (por vezes juntas e indistintas). O longo consulado da dupla Hintze-Franco (1893-1897) irritou o suficiente para que a imprensa oposicionista visasse diretamente o rei, por detrás dos seus áulicos. Nos jornais de esquerda, onde se distinguiam nomes do calibre de Emídio Navarro (no Novidades), Mariano de Carvalho (no ­Diário Popular), António Enes (no Dia), ou João Lacerda (no Correio da Noite), ressuscitou-se o velho aviso de cariz radical, que tanto molestara o Duque de Loulé nos seus tempos: “volte a coroa para junto do povo liberal, que ­continuará a ter em nós os estrénuos, leais e dedicados defensores que sempre fomos. Senão… não”.17

Às caricaturas de Rafael Bordalo Pinheiro somaram-se, a partir da segunda metade da década de 1890, outros artistas tão ou mais mordazes em relação à realeza. O primeiro foi Celso Hermínio. O seu jornal O Micróbio, além de vergastar a ambição de João Franco e a ingenuidade de Hintze Ribeiro, desenhava o rei em permanentes apuros políticos. D. Carlos admirava-lhe o talento artístico, chegando a comentar algumas das caricaturas com Ramalho Ortigão (Costa, 1943, p. 54), e Hermínio retribuía-lhe a consideração enviando para o Paço alguns dos seus jornais. Um dia, em 1895, quando Franco quis querelar O Micróbio e levar o seu autor para o Limoeiro, o rei retorquiu-lhe: “Deixa-o fazer os bonecos! O rapaz vive disso!…” (Costa, 1943, pp. 234-235). O segundo, Tomás Leal da Câmara, era menos um “rapaz” e já mais um agitador assumido. Colaborador de Celso Hermínio (n’O Berro), Leal da Câmara começou por publicar A Marselheza, em finais de 1897 (“o jornal de maior circulação em todo o Governo-Civil”, como se autointitulava), e prosseguiu depois, em 1898, com o mais famoso A Corja (França, 1997, pp. 222-225). Retratando invariavelmente D. Carlos de barriga proeminente, jaqueta, cinta, charuto e chapéu desabado, à toureiro ou caçador marialva, Leal da Câmara criou “uma régia expressão inexacta, mas que ficava nos olhos da populaça. Era um demolidor da realeza e de cada vez que a polícia o punia por suas audácias, achava sempre maneira de as repetir, sofismando-as” (Martins, 1926, p. 365). Depois de ter zurzido durante meses o rei, partiu perseguido para Madrid e fixou-se de seguida em Paris. Nos primeiros anos do século XX, enquanto em ­Portugal Bordalo Pinheiro se consagrava definitivamente com o seu último jornal, A Paródia, Leal da Câmara, em Paris, conseguia renome à custa do Assiette au Beurre, em cujos desenhos arredondava ainda mais o contorno físico de D. Carlos, culminando na célebre estampa, cuja legenda ecoava Guerra ­Junqueiro, em que declarava o monarca “à point pour l’abbatoir” (“pronto para o matadouro”).

À medida que o último rotativismo, de Hintze-José Luciano, ia falindo, a figura de D. Carlos ia sendo cada vez mais exposta à consideração e à usura públicas. Falando em 1903, Raul Brandão exprimia o ar do tempo: “Alto ou baixo, ao ouvido ou em plena rua, só se fala no rei” (Ramos, 2006, p. 239).18 Ao cabo de quase década e meia de reinado, o tom com que a imprensa se referia a D. Carlos ia enegrecendo – até no sentido de tornar bem possível a profecia desenhada por Leal da Câmara. Nesse mesmo ano de 1903, quando Alexandre da Sérvia foi assassinado, o Novidades, de Emídio Navarro, estendeu-se em comparações entre a política dos dois países, dando azo a que às esquinas de Lisboa os mais exaltados se perguntassem quando se iria fazer cá o mesmo. Navarro não ia tão longe, mas constatava que Alexandre da Sérvia morrera depois de um resultado eleitoral que aparentemente o tranquilizara. A conclusão a tirar seguia-se: chegara o tempo em que os monarcas deveriam estar mais atentos “à lição dos chapéus na cabeça do que ao resultado das eleições” – porque uma cabeça que não se descobria à passagem de el-rei era mais reveladora do sentimento público do que um voto depositado numa urna (Martins, 1926, p. 443).

Como grande opinion maker da imprensa, Navarro sabia do que falava. As críticas, apesar de tudo políticas (porque o Novidades era um periódico monárquico e não republicano), que dirigia a D. Carlos eram apenas a ponta do icebergue. Fora dos limites do sistema monárquico, vociferava a violenta imprensa republicana, liderada pel’O Mundo, de França Borges, a que se juntaria A Lucta, de Brito Camacho, em 1906. De um modo geral, o jornalismo e memorialismo republicanos viam no rei, alternada ou cumulativamente, um inútil, supérfluo, parasita, corrupto, obeso, mulherengo, devasso e adúltero, um tirano, metediço, irresponsável, provocador, vendido à Inglaterra e só valentão em casa, e conluiado sempre com a camarilha política que roubava impunemente o povo; se isto não chegasse – e sempre que isto não chegava – era ainda retratado como caçador ausente, mau pintor, oceanógrafo diletante e turista gastador que, sob a falsa capa de grande diplomata, se passeava à custa do erário público. Inventavam-se-lhe todos os defeitos e transformavam-se os méritos em vícios. Como Rocha Martins sintetizaria, com algum fundo de verdade, a imprensa era um mar de “acerbismo crítico, terrível para um povo que não sabia ler nem discernir”, diariamente cheia de “ironias, girândolas furibundas, satiricismos, sarcasmos e charges sangrentas” (Martins, 1926, prefácio).

 

APRECIAÇÕES E ROTINAS RÉGIAS: D. CARLOS E OS JORNAIS

 

D. Carlos, o visado deste metódico character assassination, não comentou ­muitas vezes a questão da imprensa, do seu tom e dos seus excessos. Mas é realista imaginar que era sensível ao que se escrevia e dizia sobre ele: preocupava-se com o impacto da sua imagem na opinião pública e muitas vezes ­contra-atacava, para publicitar adequadamente tudo o que o pudesse (e ao regime) favorecer aos olhos dos portugueses mais atentos, ou para lamentar “a linguagem dos nossos jornais”, sobretudo em assuntos de política externa que envolvessem a Grã-Bretanha (Ramos, 2006, pp. 185-186 e 202). Perante a imprensa especificamente republicana, tinha sentimentos díspares: por vezes irritava-se, e propunha até apreensões, como em 1899, quando os jornais se encheram de manchetes alarmistas sobre o surto de peste no Porto; outras vezes passava por cima do insulto pessoal que lhe era dirigido, mas recomendava aos governos providências legais para coartar tão claras manifestações de “indisciplina social”. Em geral declarava – como um dia fez ao seu secretário, o Conde de Arnoso – que “vozes de burro não chegam ao céu. Sem que a minha modéstia me coloque no céu, põe-me pelo menos os furos suficientes acima desses pandilhas para me não molestar com o que eles dizem”; mas também sabia avisar: “se eles começarem a contender muito comigo, talvez lhes doa” (Ramos, 2006, p. 192). A verdade é que nunca lhes “doeu” muito. Se é um facto que os últimos vinte anos da monarquia assistiram a algum recrudescimento de legislação restritiva da liberdade de imprensa – com a Lei Lopo Vaz, de março de 1890, a “lei dos anarquistas”, de Hintze e Franco, de fevereiro de 1896, e as leis franquistas, de abril e junho de 1907 – e a uma maior repressão dos jornalistas por parte do aparelho judicial, também é um facto que a imprensa nunca teve de enfrentar uma censura séria e contínua. A maioria dos jornais jamais deixou de revelar uma frontalidade combativa e uma ousadia retórica que foram sempre marcas distintivas na história do jornalismo português de grande parte do século XIX e do primeiro quartel do século XX (Sardica, 2000, pp. 35-37).

O que é claro, e comprovado por muitos testemunhos, é que a leitura da imprensa ocupava regularmente os hábitos quotidianos do rei – uma prática herdada do pai, D. Luís. Lia O Mundo e não fazia segredo disso (Costa, 1943, p. 22); e, apesar do muito que os separava, mantinha relações com diversos ­diretores de jornais oposicionistas – como Emídio Navarro, de quem publicamente lamentou a morte, em agosto de 1905 (Dias, 1914, p. 135).19 Isso aproximava-o da opinião, permitia-lhe escutá-la quase em discurso direto, familiarizava-o com os temas que ocupavam o centro da agenda política e social, entre a intelligentsia e as ruas. Por regra, os seus serões privados dividiam-se em dois momentos: começava, primeiro, por ler os jornais todos, previamente recolhidos e colocados nos seus aposentos, até mesmo os científicos e literários, e não lhe escapava “nem uma local insignificante”; depois, ­consagrava-se à correspondência pessoal, na qual muitas vezes referia passagens jornalísticas (Leitão, 1908, p. 77). Mesmo no despacho oficial com o governo, acontecia-lhe de amiúde ser ele a chamar a atenção para determinadas notícias. Em algumas ocasiões de redação de leis, ditou ele mesmo os termos, por se achar especialmente habilitado a conceber o tom e o modo como o poder deveria falar ao povo (Ramos, 2006, pp. 188-189).

 

O ÚLTIMO FÔLEGO: D. CARLOS E O FRANQUISMO

 

O franquismo (1906-1908) condensou, em menos de dois anos, muitos dos problemas político-sociais que tinham atravessado o reinado de D. Carlos e dos aspetos que mais marcaram a relação do monarca com a imprensa e a opinião pública. A aposta em João Franco foi a tentativa malograda da “revolução feita de cima” por que há anos a “vida nova” clamava, um último esforço e fôlego da monarquia para romper com os velhos vícios do rotativismo sem ter de desaparecer de cena, engolida pelo inimigo republicano. João Franco era o homem ideal para liderar tal processo: dentro da monarquia, mas fora dos quadros tradicionais do rotativismo, era porventura o único político sintonizado com a necessidade de investir no espaço público, na masspolitik e no grande jornalismo de massas. Desde que formara o seu partido Regenerador-Liberal, fazia comícios, dava entrevistas, andava a “caçar no terreno dos republicanos” (e dos rotativos, que viram nele o primeiro dos revolucionários, antes de o condenarem como o último dos miguelistas). Por isso D. Carlos apostou nele, e apostou até ao fim em defendê-lo perante a fronda de opiniões críticas que o franquismo suscitou.

Foram quase dois anos de redobrada exposição do Paço, do monarca e do seu valido nas páginas dos jornais e na oratória dos comícios. Como D. Carlos confidenciou em carta a Alberto do Mónaco em fevereiro de 1907, a governação, por detrás de Franco, obrigava-o a “estar permanentemente na passerelle, não abandonando nunca o comando por um minuto que seja” (Ramalho, 2001, p. 173). Visível como porventura nunca até ali, o poder régio alcançou então um equilíbrio arriscado: era preciso governar e, portanto, impor; mas era também necessário ouvir a opinião para corrigir a rota quando a ondulação política fosse demasiada. Sirvam de exemplo para estes dois caminhos dois episódios da governação franquista com íntima ligação ao pulsar da opinião pública. Em junho de 1907, o rei tentou moderar a impetuosidade de Franco, expressando-lhe as maiores reservas sobre a resolução, por decreto ditatorial, do escândalo dos adiantamentos à Casa Real. Na interpretação do monarca, os ânimos estavam demasiado exaltados para “lançarmos neste momento a questão”, porque, “com as facilidades de desvairamento da nossa opinião pública, seria este um campo bem fácil de explorar contra o governo” (Franco, 2006 [1924], p. 135). Em novembro desse ano, contudo, quando o espírito público atingiu o paroxismo antifranquista, foi D. Carlos que não hesitou em dar uma entrevista ao jornalista francês Joseph Galtier, do Temps, durante a qual elogiou o “carácter” de Franco e lhe reiterou publicamente apoio e solidariedade. Antecipando a chuva de críticas que aí vinha, gabou-se mesmo ao seu interlocutor: “Conheço o meu país; conheço o meu tabuleiro eleitoral […] compreendo, porque vou a toda a parte, que o meu povo está comigo” (Martins, 1926, pp. 559-560). Foi a entrevista Galtier uma temeridade arriscada e desnecessária? Politicamente, talvez. Mas, do ponto de vista mediático, era um risco e uma manobra calculados: era preciso fazer passar a mensagem de que Franco não estava a prazo, não só para investidor estrangeiro ler, mas, mais importante, para que se soubesse que havia quem mandava, naquela conjuntura difícil. No primeiro caso, portanto, era possível e prudente pactuar com o espírito público; no segundo, era urgente e necessário mostrar pulso forte.

Nos finais de 1907, D. Carlos redobrou a sua atenção na leitura dos jornais. Ao conde de Arnoso ia fazendo as suas próprias recensões: uns eram “­mansos”, outros estavam “à capa, a ver em que isto pára”, outros ainda eram “destemperados”, os republicanos “era natural saltarem de todo” (Ramos, 2006, p. 284). A 1 de fevereiro de 1908, o espírito público mais radical armou-se para o regicídio e executou o rei e o príncipe real D. Luís Filipe. Porque foi liberal até ao fim, portanto visível e acessível aos seus súbditos, que ele olhava como cidadãos, D. Carlos nunca imaginou que precisasse de uma escolta armada para o defender daquela opinião que ele se gabara de conhecer e de conseguir moderar e orientar. Nos dias que se seguiram, o que era afinal o divórcio entre o espírito público mais radical e os poderes monárquicos ficou eloquentemente expresso na generalidade da imprensa portuguesa: poucos jornais tarjaram de negro e lamentaram o crime, preferindo, por convicção ou medo, glorificar ou amnistiar a memória dos regicidas. O facto causou mais estranheza no estrangeiro – onde D. Carlos sempre fora aplaudido e positivamente publicitado nos jornais – do que em Portugal. Entre os seus, a mediatização do poder acabara abatida a tiro.

 

CONCLUSÃO: O PODER E O POVO NO TEMPO DE D. CARLOS

 

Alguns meses após a morte de D. Carlos, Fialho de Almeida redigiu um texto no qual, arrependido da sua passada militância radical ou rendido ao valor da personalidade do malogrado monarca, deixou para a posteridade uma extensa análise do que fora a razão do insucesso do seu reinado. O texto constitui um bom diagnóstico da relação, ora difícil, ora impossível, que o rei mantivera com a opinião pública portuguesa. Fialho começava por declarar que consultara 200 ou 300 pessoas “desinteressadas e serenas” para formar o seu juízo sobre D. Carlos (Almeida, 1924, p. 89). O rei falhara? Sim, mas talvez não por sua culpa. Um Vítor Emanuel ou um Kaiser Guilherme (reis populares e fortes) só eram possíveis em países com “uma consciência cívica perfeita” e “uma opinião pública robustecida” (Almeida, 1924, p. 92). Em Portugal isso nunca existira e não se vislumbrava como poderia vir a existir. O povo português nem de perto era “uma multidão intelectualmente disciplinada e consciente”. Ligeiramente acima dele, também não se via verdadeira classe média, que não passava de “um aglutinado social com escassas luzes de civismo” (Almeida, 1924, pp. 93-95).20 Finalmente, faltara a D. Carlos o que Fialho designava por “conselheiros e sugestores habilidosos”21, capazes de apreenderem corretamente as mutações que estavam a acontecer no universo do jornalismo e de popularizarem a conduta régia no espaço público do tempo.

O resultado final de todas estas carências interligadas é que “o Bragança fica[ra] só”, num “isolamento moral” que lhe liquidou o “prestígio” na “opinião pública” (Almeida, 1924, pp. 96-97). Sem meios, e sem amigos, políticos e povo para o secundarem e escutarem, D. Carlos desistira civicamente de aparecer e tentar: daí o “tédio”, que Fialho de Almeida detetara nele, e que era no fundo a confissão de um “desalento”, “vista a impotência de uma vontade só poder galvanizar a parezia (sic) de seis milhões de inconsciências” (Almeida, 1924, pp. 99-100). Para Fialho, a conhecida frase do rei de que Portugal era “uma monarquia sem monárquicos” era então uma formulação, “clamada num colapso de angústia”, para exprimir esse divórcio que sempre subsistira entre o poder, só, e o povo, ao longe. Quanto à experiência franquista, ela significara, ainda e sempre, o desejo de fazer “vida nova” com a opinião, embora visando o impossível, a saber, “transformar no lapso breve de um ministério a alquimia moral de um povo inteiro” (Almeida, 1924, pp.103-104). Nem um governo de vigor como o de João Franco, nem o reinado inteiro de D. Carlos (mais de dezoito anos) chegaram para transformar, cívica e culturalmente, a “alquimia moral” da nação portuguesa.

A chave para o sucesso ou para o fracasso desta obra estava tanto nos meios do poder como na recetividade e na capacidade de o público o escutar e agir em conformidade. Talvez o problema de D. Carlos tenha sido o facto de, para má sorte da monarquia, o jornalismo mais influente (porque mais audível no espaço público), ter estado nas mãos de republicanos ou, pelo menos, de dissidentes do consenso monárquico, cuja agenda se orientava para o ataque ao Paço. É difícil compreender a transição de século em Portugal, a erosão da credibilidade monárquica na opinião pública e a forma como as promessas oposicionistas, sobretudo republicanas, ganharam adeptos nessa mesma opinião pública, se não se perceber o mundo dos jornais e a maneira como a monarquia, incapaz de se reformar e de reformar o país, perdeu a corrida pela manutenção de uma sintonia com o discurso padrão por eles veiculado.

Não havia, na época de D. Carlos, quem não reconhecesse à opinião pública uma importância crucial como instância de mediação dos anseios nacionais, de fabricação de uma cidadania adaptada aos novos desafios e, por isso, de diálogo mais intenso entre as elites da governação e o povo anónimo, cada vez mais chamado à intervenção cívica. No centro e na vanguarda da opinião e do espaço público estava a figura do jornalista, para alguns “mestre de primeiras letras”, para outros “catedrático de democracia em acção, advogado e censor, familiar e magistrado” (Bessa, 1904, p. 36). Mas mesmo que D. Carlos tivesse conseguido chamar para o serviço à monarquia todos os muitos “mestres catedráticos” que a imprensa do seu reinado foi produzindo, restava e restou, incorrigível, a anomia cívica da nação mais profunda. Foi isso mesmo que D. Amélia fez notar, um dia, em março de 1906, quando, perante a constituição do último ministério de Hintze Ribeiro, confidenciou ao demitido José Luciano de Castro: “Ora, José Luciano… Quem são os nossos amigos? Quem são os sustentáculos da Monarquia? Você e o Hintze!” (Martins, 1926, p. 480). Assim personalizado no rei e nos áulicos que o rodeavam, era inevitável que o regime monárquico se visse envolto em crescentes dificuldades, e cada vez mais isolado, no espaço público massificado e truculento que caracterizou a transição do século XIX para o século XX em Portugal.

 

BIBLIOGRAFIA

FONTES

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Recebido a 10-03-2011. Aceite para publicação a 16-02-2012.

 

Notas

1 A “campanha democrática” contra D. Luís fora a ofensiva levada a cabo pelas vozes e jornais progressistas mais radicais, denunciando o favoritismo prodigalizado pelo monarca a Fontes Pereira de Melo e aos regeneradores aquando da transição ministerial de janeiro de 1878 – numa altura em que o Partido Progressista, recém-formado, alimentava expectativas de vir a herdar o poder. Arrastando-se durante meses, foi um momento de jornalismo antimonárquico e incendiário particularmente sentido na opinião pública portuguesa – “uma licenciosa batalha da imprensa, na qual […] se revelaram formidáveis panfletários Mariano de Carvalho, no Diário Popular, e Emídio Navarro, no Progresso […] Ninguém construía. Era uma fúria demolidora, inconsciente […] entrara-se na campanha injuriosa e difamadora” (Martins, 1926, pp. 68 e 70). Depois de 1878-1879, o ataque dos progressistas a D. Luís (muitas vezes secundado pelos republicanos) regressou em força em 1883, com acusações várias de que o rei “governichava” (sic) sempre a favor dos regeneradores e rumores de que se preparavam, até, ações de força contra a vida do monarca (v. Silveira e Fernandes, 2006, pp. 234-236).

2 A abertura seria todavia restringida pela lei eleitoral de 1895, que faria decrescer o ratio entre eleitores e população para 9,4%. Depois, e até ao final do regime, esse indicador recuperou para 10,3% em 1899 e para 12% em 1905, fixando-se em 11,7% aquando das últimas eleições da monarquia, realizadas em 1910 (v. Almeida, 1998, p. 733).

3 O número foi obtido dividindo os 592 títulos recenseados por Brito Aranha pelos 5 423 132 habitantes de Portugal segundo o censo desse mesmo ano de 1900 (v. Vieira, 1999, p. 214).

4 Os números de Brito Aranha são ligeiramente superiores: dos 592 títulos de imprensa de 1900, 279 (47%) eram lisboetas ou portuenses. A capital tinha 188 periódicos e o Porto 91 (­Aranha, 1900, p. 45).

5 O Diário de Notícias, em 1865, anunciava ser sua intenção programática “interessar a todas as classes, ser acessível a todas as bolsas e compreensível a todas as inteligências”, assim chegando a “pobres e ricos de ambos os sexos, e de todas as condições, classes e partidos” (Diário de Notícias, Programa, 29-12-1864). Em 1885, no seu número inaugural, o Novidades declarava querer transformar o seu público leitor numa “grande majestade anónima, que ainda quando se julga vilipendiada e envilecida, domina sobre todas as outras” (Novidades, n.º 1, 07-01-1885). Já A Lucta, em 1906, opinava que só através dos jornais era possível “fazer uma longa sementeira de ideias, agitar questões, aventar princípios, formular hipóteses, criar uma intensa vida de espírito” (A Lucta, n.º 1, 01-01-1906).

6 Foi em grande parte este trabalho que permitiu dar visibilidade à profissão jornalística, como ficou patente na organização, em 1898, de uma Exposição da Imprensa Portuguesa, integrada na realização, em Lisboa, do V Congresso Internacional do Bureau de la Presse, que reuniu 230 delegados de 18 países diferentes (França, 1997, pp. 218-219, e Vargues, 2003, pp. 161-164). Para contextualização internacional da história da profissionalização do jornalismo, registe-se que o I Congresso Internacional fora realizado em Londres, em 1893, que a primeira escola de formação de jornalistas na Europa surgiu em Paris, em 1899, e a primeira escola de jornalismo norte-americana (a Columbia School of Journalism, em Nova Iorque), em 1912, a partir de um legado financeiro deixado por Joseph Pulitzer para esse efeito (Sassoon, 2006, p. 712).

7 A interligação entre os círculos políticos e as redações dos jornais fazia com que todos os líderes partidários da monarquia no tempo de D. Carlos – José Luciano de Castro, Hintze Ribeiro, João Franco, Jacinto Cândido ou José Maria de Alpoim – escrevessem, com maior ou menor regularidade, para um ou outro jornal. Também é sabido que todos os chefes republicanos de 1910 eram diretores, quando não proprietários, de jornais.

8 Nos termos de José Tengarrinha, os grandes jornais da fase industrial da imprensa (pós- -1865, data da fundação do Diário de Notícias), procuravam dirigir-se “a todos”, e não já somente “a um grupo de leitores ideologicamente afins” (Tengarrinha, 1989, pp. 213-215).

9 Para o panorama da grande imprensa norte-americana, inglesa e francesa da “Idade de Ouro”, v. Campbell (2003, pp. 25-50) ou Sánchez Aranda (2004, pp. 108-117).

10 Num certo sentido, portanto, pode dizer-se que o segredo do sucesso da imprensa do Partido Republicano ficou menos a dever-se à doutrinação republicana que veiculava “do que ao facto de terem sido alguns destes jornais radicais a fundarem em Portugal a imprensa sensacionalista, que nesta época se desenvolveu em todos os países europeus” (Ramos, 2001, p. 54). Sirva como exemplo da predisposição justicialista e da abordagem sensacionalista que dominava os grandes diários republicanos o editorial de apresentação d’O Mundo, de França Borges: “Queremos servir a Verdade e a Justiça. Queremos dizer o que sentimos – atacar a opressão, desmascarar a mentira, atacar a imoralidade, defender os oprimidos, verberar os tiranos e os exploradores” (O Mundo, n.º 1, 16-09-1900).

11 Para uma panorâmica geral das imagens sobre o rei, desde a caricatura e da escrita jornalística mais mordaz e insultuosa até às melhores reportagens fotográficas da monarquia, da Corte e da atividade política, diplomática, artística e científica de D. Carlos, v. Ramalho (2001), Nobre (2002) e Dias (2007).

12 O reinado de D. Luís, mais longo do que o do filho, teve quatro conjunturas distintas: na primeira (1861-1868) e na terceira (1871-1879), o monarca pôde ser apenas um “rei colaborante”, num cenário de “acalmia política”. Em contraste, na segunda (1868-1871) e na quarta e última (1879-1889), houve uma muito maior necessidade de interferência régia na governação (v. Silveira e Fernandes, 2006, p. 255). Por princípio, D. Luís era um crítico desta atuação, tendo aliás censurado o irmão, D. Pedro V, pelo seu caráter demasiado interveniente. Mas a década de 1880 já não lhe permitiu resguardar-se, obrigando-o a antecipar um estilo que seria, com algumas nuances conjunturais, o de D. Carlos.

13 João Franco lamentou que assim fosse, pois essa redoma constituía um ambiente “restrito e pouco renovado”, que condenava os príncipes a crescerem e a formarem-se “à parte das classes que nas sociedades modernas […] constituem o nervo e o músculo da nação” (Franco, 2006 [1924], pp. 49-50).

14 Em fevereiro de 1886, ao aceitar a demissão do governo regenerador de Fontes Pereira de Melo, trocando-o pelos progressistas de José Luciano de Castro, D. Luís escrevera a este último, dizendo-lhe: “Era um passo necessário e em que eu creio ter seguido a opinião pública. É o dever dos reis constitucionais e, se muitos o fizessem, não se veria tanta coisa que temos presenciado por muita parte” (cit. por Ramos, 2006, p. 104).

15 Na descrição de Basílio Teles, “num relance, magotes movediços e frementes manchavam o pavimento das ruas e das praças; os cafés da Baixa [de Lisboa], repletos, estavam em ardente ebulição; as vociferações, os protestos, as injúrias, as propostas mais radicais e extravagantes entraram a cair, como granizo, comunicando e agravando a efervescência […] Todo o mundo estava na rua, comentando, discutindo, perorando” (Teles, 1905, pp. 127 e 143).

16 A Hintze Ribeiro, em carta de maio de 1906, D. Carlos dava sobre isto indicações precisas: “Manda-me dizer por telefone a que horas vens. As melhores seriam ou até às 4 ou depois das 6, porque não quero, como compreenderás, deixar de dar o meu passeio por Lisboa” (Martins, 1926, p. 483).

17 Correio da Noite, maio de 1894, cit. por Martins (1926, p. 294). O Correio da Noite foi um dos mais importantes órgãos do Partido Progressista, desde a sua fundação, em 1881. Emídio Navarro foi o seu diretor político até sair, em 1884, para fundar o Novidades, e António Enes foi seu colaborador até 1887, quando fundou o Dia.

18 Dali a dois anos, João Franco corroboraria a centralidade de D. Carlos no debate quotidiano, constatando que “El-Rei é hoje o homem público mais discutido do seu país” (discurso de 16-11-1905, cit. por Frazão, 1905, p. 108).

19 O comentário de D. Carlos foi: “Também a mim me fez a maior pena a morte do Navarro. Foi muitas vezes um adversário em extremo desagradável e sobremaneira injusto, mas [ele] não tinha neste país, por certo, maior admirador do seu enorme talento do que eu. Foi uma vítima, principalmente da qualidade dos seus defeitos”.

20 A impreparação cívica da população portuguesa era um tópico recorrente no discurso da intelligentsia portuguesa. Entre muitos outros que corroboravam Fialho de Almeida, Augusto Fuschini exprimira já a opinião de que “em povo algum do mundo, ouso quasi afirmá-lo, se manifestou mais completa indiferença pelos atos da vida política e administrativa da nação” (Fuschini, 1899, p. 117). Anos mais tarde, João Franco diria que a “viciosa educação cívica” dos portugueses era tanto fruto da “irresponsabilidade de quem governa” – Franco estava nesta altura na oposição… – como da “falta de vida pública dos governados” (discurso de 16-05-1903, cit. por Frazão, 1905, p. 26).

21 “Se o rei tem tido alguém de mirada dúctil que aconselhando lhe fosse o caminho por certos indivíduos ou grupos capazes de interferir na opinião […] se tem procurado aproximar-se de certas camadas […] de tudo quanto pode sentir a comunicabilidade d’um espírito e propagar entusiasmo por um credo; talvez que essa atmosfera de êxito […] viesse a oxigenar-se outra vez, possibilitando a floração do espírito monárquico” (Almeida, 1924, pp. 97-98).

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