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Análise Social

versión impresa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.208 Lisboa jul. 2013

 

As universidades portuguesas na senda da investigação empreendedora: onde estão as diferenças?

Portuguese universities and entrepreneurial research: Where are the differences?

 

Rui Santiago*, Teresa Carvalho* e Andreia Ferreira*

*Universidade de Aveiro. Emails: rui.santiago@ua.pt, teresa.carvalho@ua.pt e andreiabferreira@ua.pt

 

RESUMO

Nos últimos anos têm sido discutidas as mudanças nos quadros epistemológicos, éticos e sociais que envolvem a ciência na atualidade. Particularmente influentes nas transformações ocorridas foram as lógicas incorporadas nas narrativas da “sociedade do conhecimento” e do managerialismo/Nova Gestão Pública (NGP). As noções de “ciência pós-académica”, o “Modo 2 de produção do conhecimento” e o acrónimo PLACE têm vindo a ser utilizados para caracterizar estas mudanças. Este artigo pretende analisar se o modo como a investigação é apresentada pelas universidades públicas portuguesas nos seus websites expressa a influência destas novas noções de ciência. Conclui que existe uma certa ambiguidade nos discursos, o que configura fenómenos de hibridismo.

Palavras-chave: universidades públicas; Portugal; investigação científica; ciência.

 

ABSTRACT

In recent years some discussions have emerged around the changes in the epistemological, ethical, and social issues involving science today. Particularly influential in these changes were the “knowledge society” and managerialism/New Public Management (NPM) narratives. The notions of “post-academic science”, “Mode 2 of knowledge production”, and the acronym PLACE have been used to characterize changes in science. This paper asks if the way research is presented in the Portuguese public universities website expresses the influence of these new notions of science. It reveals that there is a certain ambiguity in the discourses, which configures the phenomenon of hybridity.

Keywords: public universities; Portugal; scientific research; science.

 

INTRODUÇÃO

 

Os temas que têm alimentado o debate contemporâneo sobre o estado da ciência são múltiplos e controversos. A lista é longa, mas alguns destes temas são recorrentes, em especial os que mais diretamente se interessam pelas mudanças atuais dos quadros epistemológicos, éticos e sociais que envolvem a ciência. Uma boa parte da literatura no campo tem interrogado consistentemente estas mudanças, organizando as suas propostas de teorização em torno de um conjunto de questões críticas para a produção de ciência (Olssen e Peters, 2005; Marginson, 2007; Cohen, McAuley e Duberley, 2001; Pels, 2003; Santiago e Carvalho, 2004; Martins, 2004, 2011; Garcia e Martins, 2008; Bourdieu, 2008; Becher e Trowler, 2001; Ziman, 1994, 2000; Gibbons et al., 1994; Calboun, 2006; Slaughter e Rhoades, 2004; Bok, 2003). Estas questões incluem, entre outras, a distinção entre a base disciplinar e a base inter e transdisciplinar da ciência; a relação entre a ciência básica/fundamental, a ciência “auto-interessada” e a ciência aplicada, estratégica e tecnociência; as fronteiras entre ciência e mercado; e o controlo e a regulação da ciência e do seu espaço e tempo (longo, médio ou curto prazo).

A possibilidade de delinear um conjunto de reflexões em torno destas questões não pode ignorar as profundas transformações ocorridas no ambiente institucional, e que têm hegemonizado as conceções e as finalidades da ciência desde o início da década de 80 do século passado. De facto, o aumento das críticas dirigidas à ciência “tradicional” foi coincidente com o “movimento” de colonização das políticas públicas pela nova racionalidade política e de mercado neoliberal, servidas, no terreno, pelo managerialismo/Nova Gestão Pública (NGP). Em muitos países ocidentais, o Estado tornou--se um ator central na criação das novas condições sociais, institucionais e epistemológicas sob as quais o conhecimento é compreendido e produzido. Seguindo o pensamento de Bourdieu (1989; 2006), podemos dizer que, num certo sentido, o campo científico também é objeto da imposição de categorias simbólicas de pensamento sobre o que deve ser a produção de ciência e as suas finalidades. Estas categorias são dominadas pela lógica económico- utilitarista, conectada com as narrativas sobre a “sociedade do conhecimento”, crescentemente significada como “economia do conhecimento” (­Olssen e Peters, 2005). Dos diferentes lugares de produção do conhecimento, em particular das universidades, é esperada uma “revolução” cultural e empresarial/empreendedora que coloque uma boa parte da ciência no “envelope” da racionalidade económico-gestionária. O recurso às noções de “ciência académica” e “pós-académica” de Ziman (1994, 2000), ao significado dos acrónimos CUDOC (Comunalismo, Universalismo, Desinteresse, Originalidade, Ceticismo) (­Merton, 1973; ­Merton e Barber, 2004) e PLACE (Proprietário, Local, Autoritário, Comissionado, Especializado) (Ziman, 1994) e aos “tipo-ideais” Modo 1 e Modo 2 de produção do conhecimento (Gibbons et al., 1994) contribui para caracterizar tal “revolução”. Sobretudo, permite compreender melhor o impacto epistemológico, social e cultural resultante da imposição de valores empresariais/empreendedores e de mecanismos de coordenação pelo mercado nos sistemas de ciência e tecnologia. Em última instância, o que parece estar em causa nesta imposição é a crença na possibilidade de reconfigurar o capitalismo tradicional através da reconversão da economia industrial em economia do conhecimento (Feldman, 2001).

O domínio das narrativas sobre a racionalidade económica e utilitária na produção do conhecimento constitui uma tentativa profunda para reconfigurar o paradigma tradicional de ciência. O controlo e a regulação da investigação deixa de ser uma prerrogativa dos académicos, exige resultados a curto prazo e impõe uma hierarquia na investigação, assente na ideia de resolução de problemas orientada para a relevância económica. As barreiras disciplinares são quebradas, emergindo, numa posição dominante, uma “transdisciplinaridade” utilitária, submetida à retórica da inovação, e alinhada com os interesses do mercado e da economia. Em suma, uma boa parte da investigação tornou-se menos independente, os critérios exógenos vão, crescentemente, substituindo os critérios endógenos na definição do que deve ser investigado (Bourdieu, 2008) e os seus “produtos” passaram a ser categorizados como um bem privado, com um preço no mercado. Subsiste, contudo, uma importante questão que ainda não foi inteiramente explorada nos numerosos estudos no campo. Até que ponto a agenda do Estado, da indústria e dos serviços, desenhada para transformar o modo de produção de ciência, foi endossada pelas universidades e pelos académicos e transformada num “projeto” institucional próprio?

Na realidade, no estado atual do conhecimento, parece-nos não ser possível ajuizar ainda, com alguma segurança, em que grau a agenda e pressões governamentais e da indústria sobre as novas formas e modos de “fazer ciência”, penetraram nos discursos e nas práticas das instituições e dos académicos. Da mesma forma, não é ainda possível apreender o sentido estratégico desse mesmo discurso, sabendo-se que os ganhos de numerosas universidades com a comercialização do conhecimento têm ficado muito aquém das expectativas criadas (Bok, 2003; Calboun, 2006; Vestergaard, 2007).

Em Portugal, desde os finais dos anos 90, as narrativas e o controlo e regulação da produção de ciência têm seguido um trajeto semelhante ao que descrevemos atrás. A relevância económica da ciência e da tecnologia foi clara­mente colocada no centro das prioridades políticas, em detrimento da relevância social e cultural. No entanto, em termos gerais, também pouco se sabe sobre o impacto dessas prioridades nas instituições e nos académicos/investigadores. De uma forma mais específica, ainda é relativamente desconhecida a forma como estas prioridades têm sido significadas pelas instituições como um novo “projeto” próprio, científico e académico, e assumidas como uma oportunidade para produzir, no exterior, uma nova imagem institucional e social.

Este artigo pretende analisar o modo como a investigação é apresentada pelas universidades públicas portuguesas nos seus websites. A análise das narrativas que visam divulgar essas atividades são assumidas, no contexto deste estudo, como “textos orientados por valores”, direcionados para comunicar a audiências, internas e externas, um valor específico ou uma dada imagem institucional, sustentada em determinadas conceções da ciência e da investigação (Walton, 2005; Mautner, 2005). Neste âmbito, com recurso à análise de conteúdo temático-categorial, foram analisados os websites das 15 universidades públicas portuguesas, em particular os seus enunciados de missões e objetivos, e as estratégias e estruturas de investigação divulgadas nas suas diferentes páginas.

 

AS NOVAS CONDIÇÕES NA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO

 

Mais recente que o ensino, a investigação emergiu na universidade embutida na “filosofia” humboldtiana. Esta filosofia centrava-se em princípios como a integração do ensino e da investigação, atribuindo à universidade a obrigação de promover a criação de conhecimento, e de assegurar a sua preservação e transmissão, em nome de uma procura constante e desinteressada da verdade. O conhecimento tornou-se, assim, na matriz da reconstrução da universidade enquanto instituição da modernidade. Embora as humanidades tenham, decisivamente, contribuído para esta reconstrução, a institucionalização académica das ciências naturais e físicas impulsionou-a fortemente, transformando a universidade numa estrutura sistemática de investigação (Barnett, 2003).

A adaptação social e cultural da “filosofia” humboldtiana ao Estado-providência permitiu, em certa medida, que a investigação fosse relativamente protegida das pressões políticas, sociais e de mercado. Em termos históricos, as exceções a esta proteção são sobejamente conhecidas, assim como a instrumentalização da investigação e da ciência por diferentes aparelhos industriais, coloniais e político-militares (Martins, 2004, 2011; Garcia e Martins, 2008). Apesar destas exceções, a investigação básica e aplicada manteve-se, até ao início dos anos 70, essencialmente como uma atividade de natureza pública, na qual se inscrevia o pressuposto, largamente partilhado, de que a ciência era um bem público que produzia substanciais benefícios sociais e externalidades positivas. A transferência de conhecimento da universidade para a indústria não era um fenómeno estranho, mas a lógica política e académica do interesse e benefício público da ciência ia prevalecendo em confronto com o interesse e benefício privado (Lazerson, 1998).

Neste contexto, a investigação académica era conduzida, principalmente, com base em processos endógenos (Bourdieu, 2008), ligados a iniciativas científicas individualizadas (Olssen e Peters, 2005) e ancoradas na articulação entre a motivação intrínseca e extrínseca dos investigadores. A motivação extrínseca era (e, em parte, continua a ser) impulsionada por recompensas simbólicas, materializadas na conquista de prestígio social, de poder e da liderança científica num dado campo disciplinar ou sub-disciplinar. A organização interna da ciência sustentava-se numa base disciplinar e na distinção entre ciência básica (descoberta de conhecimento básico) e aplicada (aplicação para finalidades específicas).

A articulação da “filosofia” humboldtiana com o “tipo-ideal” mertoniano de produção e disseminação da ciência – CUDOC – emergia como um quadro representacional dominante na orientação das condutas dos investigadores e das instituições. O acrónimo CUDOC sintetiza um conjunto de normas ideológicas e tácitas (Bourdieu, 2008) que procuram legitimar a ideia de criação de conhecimento livre (for its own sake) e os princípios da curiosidade e dos valores neutros da ciência (Pels, 2003), enquanto algo separado dos interesses económicos específicos da sociedade. Num certo sentido, o acrónimo CUDOC serviu de inspiração a Gibbons et al. (1994) na construção do “tipo-ideal” Modo 1, com o qual procuram caracterizar a ciência “tradicional”, e ainda a Ziman (1994, 2000) quando propõe a noção de “ciência académica” para significar o “espaço-tempo institucional” no qual a ciência é endogenamente localizada (nas universidades), conduzida por académicos/investigadores autónomos, e submetida, exclusivamente, ao controlo dos pares.

Este quadro de referência, simultaneamente ideológico, institucional e epistemológico, tem sido objeto de um forte escrutínio crítico ao longo das últimas três décadas. As origens próximas deste escrutínio podem ser analisadas tomando duas direções, articuladas entre si. Em primeiro lugar, mais do que em períodos anteriores, emergiram fortes pressões governamentais e empresariais para a reconfiguração do capitalismo industrial tradicional, com base na crença de que a solução para esta reconfiguração reside na indústria/economia do conhecimento (Feldman, 2001) e no papel que esta pode assumir na aquisição de vantagens competitivas nacionais na arena da globalização. O interesse do Estado é aqui identificado com os interesses empresariais. Em segundo lugar, as mudanças nas narrativas e nas práticas, que têm alimentado esta reconfiguração, têm sido conduzidas, de forma dominante, por assunções neoliberais, centradas no produtivismo e no utilitarismo, em estreita conexão com os princípios do mercado, os quais, progressivamente, têm imigrado para o ensino superior e para o sistema de ciência e tecnologia pela mão do managerialismo/NGP.

Voltando à nossa primeira direção de análise, parece-nos importante salientar que a tela em que estão inscritos os processos de reconversão do capitalismo é tecida pela ideia de que a sustentação dessa reconversão reside na nova economia ou na “economia do conhecimento”. O papel do conhecimento na reprodução do capitalismo é obsessivamente sobrevalorizado pelo palco da globalização competitiva. Esta sobrevalorização tem conduzido o Estado a (re)conceptualizar e a instrumentalizar as suas políticas do ensino superior e de ciência e tecnologia com o objetivo de transformar o conhecimento numa nova forma de “acumulação de capital”, orientada para a competitividade da economia (Calboun, 2006). Nesta perspetiva, o conceito de capital intelectual constitui um dispositivo-chave na legitimação das práticas legais de proteção do conhecimento, materializando-se na identificação da propriedade individual com a noção de propriedade intelectual. Este fenómeno permite perceber, por um lado, por que é que a universidade é politicamente representada como um ator coletivo-chave na reconfiguração do capitalismo, mesmo que já não detenha o monopólio da produção de conhecimento, e, por outro lado, por que é que o ensino superior e a ciência e a tecnologia foram eleitos como uma prioridade política. Esta prioridade tem insistido, recorrentemente, na necessidade de alinhar o ensino superior com a economia e o mercado de trabalho, assim como no estabelecimento de interações estreitas e/ou ­parcerias com a ­indústria. O pressuposto que sustenta este alinhamento reflete, ­claramente, a crença sobre a possibilidade de reconstruir uma economia mais sólida, baseada na transferência de conhecimento e na sua transformação em tecnologia e inovação.

Algum pensamento académico tem legitimado esta nova estratégia política de colocar a ciência no “envelope” da racionalidade económica. O modelo triple hélix, proposto por Etzkowitz (2003a; 2003b) é exemplar quanto a esta legitimação. Para Etzkowitz (2003a) a institucionalização de uma terceira missão para a universidade – a missão económica – e, simultaneamente, a criação de valor através do capital intelectual – “o capital intelectual está a tornar-se tão importante como o capital financeiro como base do futuro crescimento económico” (p. 295) - seriam as condições básicas requeridas para o estabelecimento de uma nova aliança entre a universidade/ciência, a indústria e o Estado. Esta aliança pressupõe, no entanto, reconversões mútuas: a transformação da universidade num semi-ator empresarial (quase-empresa), da indústria em semi--ator académico (quase-universidade) e o Estado em supervisor, ou terceiro parceiro, guardião dos interesses económicos nacionais e da consistência do sistema.

Contudo, como Kleinman e Valas (2001) argumentam, existe uma “convergência assimétrica” nesta aliança. A indústria é sempre dominante neste sistema de interações, e isso apesar de as universidades terem privatizado alguns dos seus meios de produção de conhecimento, transformando-os em unidades que se comportam como empresas ou quase-empresas. Apesar de em Portugal o peso da indústria não ser tão significativo na economia, quando comparado com outros países desenvolvidos, não deixa de ser um facto que as universidades e os académicos estão submetidos a fortes pressões políticas e gestionárias. Estas decorrem, em grande medida, de restrições financeiras substanciais, que têm conduzido, noutros países, a um aumento do controlo do conhecimento por gestores e pelas lógicas da gestão (Hellstöm e Jacob, 2005). Deste modo, as condições que definem as relações entre a universidade e a indústria são desiguais. Ao nível simbólico, os conceitos de capital intelectual e de propriedade intelectual têm sido tão popularizados, e com tal insistência apresentados como um argumento racional, orientado para aumentar a utilidade económica do conhecimento, que a sua intrusão no ensino superior e na ciência tem vindo a ser absorvida como uma verdade incontestável e naturalizada, dificilmente refutável (Hellstöm e Jacob, 2005).

Tomando agora a nossa segunda direção de análise, parece-nos pertinente sublinhar o papel determinante que o neoliberalismo, e as perspetivas tecnocráticas do managerialismo/NGP, que se constituíram como a sua instrumentação, têm assumido na reestruturação do ensino superior e do sistema de ciência e tecnologia. Na realidade, os novos ambientes institucionais, gerados a partir desta reestruturação, procuram impor a ideia de que as universidades devem ser, sobretudo, um “mecanismo coletivo eficiente”, de modo a aproveitar, de forma otimizada, as oportunidades que surgem no “mercado” do ensino e da ciência. As universidades são instadas a adquirir capacidades para se alinharem com a sociedade, ou melhor dizendo, com a economia (Gibbons et al., 1994; Helstöm e Jacob, 2005), no sentido de mobilizar melhor os seus recursos no processo de acumulação de capital (Feldman, 2001). As universidades são, assim, representadas segundo uma perspetiva vincadamente utilitarista, quase como sistemas de “inputs-ouput” redutíveis a uma mera função económica (Olssen e Peters, 2005). Nesta lógica, é esperado que tomem a cultura empresarial/empreendedora como um “projeto próprio”, transformando-se em agentes económicos e parceiros do Estado e da indústria (Cohen, McAuley e Duberley, 2001).

A institucionalização de um “projeto” desta natureza coloca grandes desafios aos processos de produção de conhecimento. Entre estes, o maior é, sem dúvida, o da emergência da dependência epistemológica, ligada à simplificação e à redução, a mecanismos utilitários da complexidade cognitiva, cultural e social envolvida no próprio conceito e processos de construção da ciência (Pels, 2003). De facto, o domínio do utilitarismo na ciência ignora, em grande medida, o conhecimento cultural, moral e social “desinteressado”, esvaziando-o dos seus conteúdos humanos (Muller e Subotzky, 2001). A “transdisciplinaridade económica”, a desvalorização dos temas disciplinares isolados, a sobreposição da “resolução de problemas” à pesquisa crítica, livre e “auto-interessada” e a substituição do longo e médio prazo pelo curto prazo na obtenção de resultados, surgem como fatores que podem contribuir decisivamente para esse esvaziamento.

Ziman (1994, 2000) caracteriza este novo contexto de produção de ciência com a noção de “ciência pós-académica”, o qual, em certa medida, cobre um conjunto semelhante de fenómenos que Gibbons et al., (1994) se propõe analisar com o “tipo-ideal” Modo 2 de produção de conhecimento. Entre estes fenómenos é possível destacar a crescente contextualização da ciência e a transdisciplinaridade; a diversidade organizacional na produção de ciência; o domínio da racionalidade económica sobre os processos e resultados de investigação, e o controlo da investigação pela racionalidade de gestão e da economia, o que confere aos investigadores uma determinada responsabilidade perante uma certa “ordem de mercado” e os seus clientes/empresas (Olssen e Peters, 2005). O acrónimo de Ziman (1994, 1996, 2000) – PLACE – expressa bem o crescente domínio desta “ordem de mercado” sobre a ciência contemporânea. As dinâmicas exógenas e a heteronomia na construção social da ciência, dependentes da satisfação dos “clientes/investidores”, vão conquistando uma posição hegemónica em relação às dinâmicas endógenas e à autonomia dos investigadores (Bourdieu, 2008).

Contudo, parece emergir um paradoxo nessa hegemonia. Calbour (2006), por exemplo, referindo-se às universidades americanas, sublinha que se algumas têm aumentado, recentemente, os seus rendimentos com a comercialização da ciência, poucas beneficiaram efetivamente com as parcerias com o setor empresarial, no que respeita a licenças ou outras atividades. Vestergaard (2007), na mesma linha de argumentação, constata que poucas universidades conseguiram captar fundos significativos a partir da comercialização da investigação. O autor assume, contudo, que os papéis empresariais e académicos podem ser integrados na mesma estrutura académica, embora de forma separada.

Apesar deste balanço, muitas universidades parecem ter substancialmente interiorizado este “projeto” externo (em última instância, em termos retóricos). Nesta perspetiva, tentam impor aos académicos uma determinada agenda na investigação – concentração em temas limitados e potencialmente comercializáveis –, e têm criado centros de investigação inter e transdisciplinares claramente orientados para beneficiar de potenciais lucros comerciais com a transferência direta de conhecimento e tecnologia para a economia (Calboun, 2006). É possível, igualmente, que esta interiorização obedeça a outra lógica: a conquista de prestígio social, no quadro das narrativas dominantes sobre a “sociedade/economia do conhecimento”, e, subsequentemente, a abertura de novas oportunidades para aceder a outras fontes externas de financiamento (Santiago e Carvalho, 2004). Deste modo, o envolvimento das universidades com a investigação estratégica, comercial e a tecnociência, pode, também, representar uma oportunidade para estas (re)construírem o seu capital simbólico, o qual permitiria a conquista de vantagens posicionais no jogo competitivo interinstitucional.

Independentemente do comprometimento das universidades com objetivos comerciais, simbólicos ou sociais, esta dinâmica parece atrair muitas universidades para a esfera da cultura empresarial (Clark, 1998, 2003, 2004; Barnett, 2003), do capitalismo académico (Slaughter e Leslie, 1997) ou do capitalismo do conhecimento e da aprendizagem (Slaughter e Rhoades, 2004). Esta atração conduz as próprias universidades e os académicos/investigadores, para um envolvimento ativo no “jogo de mercado” ao nível das estruturas, dos processos e dos resultados da produção de ciência. Até que ponto este envolvimento pode tomar corpo na retórica e nas práticas institucionais constitui uma questão controversa, que vai continuar inscrita na agenda política e institucional futura. Não obstante, esta retórica está impregnada de valores sobre o que deve ser a produção do conhecimento, os quais, em última análise, podem exercer uma influência estruturante sobre os comportamentos individuais e coletivos dos atores académicos. Nesta direção, seguindo o raciocínio de Barnett (2003), torna-se importante refletir se as universidades começaram a viver “fora” de si-mesmas e até que ponto a sua construção está dependente das imagens dos seus grupos de “clientes/investidores”.

Este tópico constitui a preocupação central deste artigo. Nele, procuramos analisar o papel das variáveis exógenas e endógenas na divulgação pública das atividades científicas promovida pelas universidades portuguesas. Em termos genéricos, a literatura documenta bem a forma como a reconversão do capitalismo tradicional se tem apoiado na managerialização e mercantilização do ensino superior, assim como as fortes pressões que daí resultam para as universidades se tornarem performativas no âmbito da produção de ciência e de tecnologia útil para a economia. Neste sentido, a análise das estratégias desenvolvidas pelas universidades portuguesas para comunicarem as suas atividades científicas a audiências externas (e internas) constitui um tema em aberto na investigação sociológica em Portugal. Surge aqui uma possibilidade de captar novos elementos que possam alicerçar uma reflexão empírica e conceptualmente mais apoiada sobre o impacto dos princípios de mercado e do managerialismo na produção de ciência e tecnologia nas universidades portuguesas. O esbatimento das fronteiras entre a produção do conhecimento e as necessidades empresariais no âmbito da inovação tecnológica tornou-se na “pedra de toque” dos discursos governamentais e, em parte, institucionais (Santiago e Carvalho, 2004; Santiago, Magalhães e Carvalho, 2005). O novo regime jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES – Lei 62/2007), aprovado em 2007, consagrou institucionalmente este esbatimento, ao insistir expressamente, no seu artigo 2.º al. 4, no princípio de que as instituições têm o direito e o dever de participar em atividades de ligação à sociedade “[…] designadamente de difusão e transferência de conhecimento, assim como de valorização económica de conhecimento”.

 

OS CAMINHOS SEGUIDOS NA RECOLHA DE INFORMAÇÃO

 

A componente empírica deste artigo baseou-se na análise de conteúdo de informação extraída dos websites das universidades portuguesas, algumas especialmente dedicadas à divulgação das atividades de investigação. A esta informação atribuímos um duplo estatuto ‒ por um lado, trata-se de um conjunto de narrativas institucionais às quais atribuímos o estatuto de “textos orientados por valores” (Walton, 2005) para comunicar, a audiências internas e externas, uma determinada imagem social da instituição; e, por outro lado, surge como um repositório de dados autênticos que podem ser utilizados para objetivos de investigação (Mautner, 2005). É possível aceitar, então, que a informação, apresentada nos websites pelas universidades, visa a aquisição (e a reconstrução) de capital simbólico, social, cultural e económico (­Bourdieu, 1989, 2006) com o objetivo de conquistar uma posição mais vantajosa no campo organizacional do Ensino Superior e de diversificar a captação de recursos no exterior. Neste contexto, procuramos analisar, especificamente, a forma como as universidades expressam o seu posicionamento sobre as atividades de investigação, e as conceções de ciência que as suportam, na comunicação que estabelecem com as suas audiências internas e externas através dos seus websites.

A amostra definida para o estudo, que decorreu entre junho e julho de 2008, corresponde ao universo total (15) das universidades públicas portuguesas.1 Numa primeira fase do estudo, foi selecionada como principal corpo da análise de conteúdo apenas a informação relacionada com os enunciados de missão e objetivos das universidades. A expectativa é a de que estes enunciados, nos quais incluímos, igualmente, os discursos e tomadas de posição dos reitores na apresentação da instituição, possam permitir apreender o quadro geral de crenças, imagens e representações sobre a investigação e ciência que cada universidade quer transmitir para audiências internas e externas.

Num segundo momento, a análise de conteúdo foi estendida à informação mais específica, em particular a informação divulgada sobre a forma como as universidades desenvolvem as suas estratégias de investigação e sobre as estruturas organizacionais que criam para as concretizar. É neste nível de análise que, na quase totalidade das universidades portuguesas, emergiu com mais visibilidade um conjunto de mudanças mais profundas, direcionadas para conceções e práticas na investigação e na ciência mais próximas da esfera da racionalidade económica e de mercado.

 

IDEOLOGIA, ESTRATÉGIAS E ORGANIZAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO: O QUE OS WEBSITES DAS UNIVERSIDADES COMUNICAM

 

MISSÃO E OBJETIVOS NA INVESTIGAÇÃO

 

Os conteúdos dos enunciados de missão e dos grandes objetivos da investigação extraídos dos websites das universidades públicas são, transversalmente, homogéneos. Esta transversalidade desdobra-se em três cenários básicos, relacionados com as conceções institucionais de investigação e de ciência disseminadas nas universidades. Um primeiro cenário, que designamos por “tradicional/endógeno”, engloba um conjunto de dimensões próximas do sistema de crenças e normas mertoniano (Merton, 1973; Merton e Barber, 2004), da noção de “ciência académica” de Ziman (1994) e do “Modo 1 de produção de conhecimento” de Gibbons et al. (1994). Este cenário corresponde a processos “tradicionais” e endógenos de construção de conhecimento científico, no interior dos quais a diferenciação entre investigação fundamental/básica e aplicada parece continuar a constituir o organizador principal do quadro “ideológico” geral de investigação idealmente assumido pelas instituições. Este quadro é completado com a reafirmação do princípio humboldtiano de ligação entre a investigação e o ensino (Santiago e Carvalho, 2004). Não existem, nos enunciados, referências concretas a áreas disciplinares, embora alguns façam referência à promoção de intercâmbios entre a cultura/arte e a ciência e tecnologia enquanto enfoque preferencial e principal da produção e difusão do conhecimento (ver Tabela 1).

 

 

Podemos dizer que o significado da matriz que suporta este primeiro cenário articula a cultura humboldtiana, baseada no modelo do conhecimento, com a ideologia e as normas tácitas mertonianas (Merton, 1973; Merton e Barber, 2004), resultando desta articulação uma certa continuidade na afirmação da herança do capital simbólico embutido na ideia tradicional de universidade. Por outro lado, inclui-se também neste cenário um conjunto de enunciados de missão que expressam significados ligados ao caráter público da ciência. O conhecimento é representado como um bem público, que tem por função promover o progresso da cultura nacional, geral e científica, assim como o desenvolvimento da sociedade portuguesa. Torna-se importante sublinhar que este primeiro cenário constitui o quadro de referência dominante na maioria das narrativas sobre a missão da investigação nas universidades portuguesas.

Um segundo cenário – “economia-mercado/exógeno” – situa-se numa maior proximidade em relação aos significados expressos pelo acrónimo PLACE, pela noção de “ciência pós-académica/pós-industrial” de Ziman (1994, 2000) e pelo “Modo 2 de produção de conhecimento” (Gibbons et al., 1994). De facto, alguns dos enunciados de missão incidem sobre os processos e critérios exógenos que influenciam a produção de ciência e tecnologia, assim como sobre as formas estruturais que suportam a sua organização, em particular as conectadas com o envolvimento e estabelecimento de parcerias das universidades com o tecido empresarial. A investigação estratégica, comercial, empresarial e personalizada no “cliente/empresa”, surge como uma referência importante para as universidades no contexto da nova economia do conhecimento, baseada na inovação tecnológica (ver Tabela 1). A presença da racionalidade e do utilitarismo económico nestas narrativas é mais densa e mais claramente orientada para a reconfiguração dos quadros de referência “tradicionais” da investigação e da ciência.

O terceiro cenário – “híbrido endógeno-exógeno” – evidencia nos enunciados de missão e objetivos uma tentativa de articulação dos processos endógenos e exógenos, ao nível epistemológico e institucional, na divulgação das atividades de investigação nos websites. O lado endógeno deste cenário enfatiza as dinâmicas internas na produção de conhecimento. As universidades apresentam-se como os atores principais na criação e promoção do progresso científico e tecnológico, na inovação, na construção da modernidade e na promoção do desenvolvimento económico quer ao nível internacional, quer nacional e/ou regional. Por sua vez, o lado exógeno, traduz a incorporação parcial pelas universidades das imposições coercivas (por exemplo, a legislação e alguns indicadores de avaliação da ciência) e indutivas (por exemplo, as políticas seletivas de financiamento da investigação) de um “projeto” externo – estatal e empresarial – de transformação da produção de ciência na direção da metáfora “sociedade/economia do conhecimento”. Para além disso, ainda na lógica deste cenário, as narrativas tendem a esbater as fronteiras entre a investigação fundamental/básica e a investigação aplicada.

 

ESTRATÉGIAS E ORGANIZAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO

 

Para além das narrativas sobre a missão e objetivos das universidades, procurámos igualmente nos websites das universidades informação mais específica e pormenorizada sobre a divulgação das estratégias de desenvolvimento das atividades de investigação e das formas organizacionais criadas para as apoiar. A análise de conteúdo que desenvolvemos centrou-se em torno das seguintes categorias, que nos permitiram explorar conceptualmente a informação selecionada: a base disciplinar/interdisciplinar da produção de conhecimento; as estruturas de coordenação organizacional da investigação; a especialização interna do conhecimento; os contextos da produção de conhecimento; e os académicos/investigadores e a prestação de contas.

Numa perspetiva comparativa, foi possível detetar grandes discrepâncias entre os dois tipos de informação. A análise de conteúdo das narrativas sobre as estratégias e as estruturas de investigação, ao invés dos resultados obtidos com a análise da missão e objetivos gerais das universidades, mostra a sua evidente aproximação ao segundo e terceiros cenários atrás descritos – “economia-mercado/exógeno” e “híbrida-endónega/exógeno”. O quadro de referência dominante surge, agora, contextualizado num conjunto de representações sobre a ciência mais próximas da noção de ciência estratégica e comercial, eventualmente orientada para a economia e/ou para o tecido empresarial. Contudo, as referências à ciência “tradicional” continuam a assumir uma certa centralidade em várias universidades.

Vejamos agora os resultados da análise de conteúdo, obtidos com cada uma das categorias atrás enunciadas, e os esforços de interpretação e conceptualização que esses resultados nos permitiram.

 

Base disciplinar/interdisciplinar da produção do conhecimento

 

Como foi possível inferir da análise de conteúdo das narrativas das universidades sobre as suas estratégias de desenvolvimento da investigação, as fronteiras disciplinares da ciência surgem representadas de uma forma ambígua. O discurso sobre a interdisciplinaridade é dominante, mas trata-se de um discurso que parece enquadrar-se mais em razões de ordem “pragmática” do que em razões de ordem epistemológica. Um dos objetivos estratégicos enunciado nas páginas web de uma das universidades ilustra este tipo de discurso:

 

Promover a interdisciplinaridade de modo a identificar os temas principais de investigação externa (socioeconómico) e também o financiamento de regras externas de estruturas e projetos científicos [UM].

 

Não é possível determinar, com segurança, se este significado da noção de “interdisciplinaridade” é suportado, inteiramente, numa lógica de “interdisciplinaridade de mercado”. Aliás, as universidades são muito prudentes na divulgação das suas narrativas neste campo. Mas o que nos parece mais evidente é o alinhamento da noção de interdisciplinaridade com critérios exógenos de produção de ciência – resolução de problemas económicos sociais e regras financeiras externas – do que com o princípio do conhecimento baseado na indagação livre ou, pelo menos, na ciência “auto-interessada”. Mesmo quando este princípio parece estar mais presente nas narrativas das universidades – “[…] avanços no conhecimento com base na interação disciplinar promovida pela universidade (UL; UNL)” – a referência a temas isolados de investigação, gerados no interior dos campos disciplinares, são por elas quase ignorados. Para além das dinâmicas internas, inerentes aos processos de desenvolvimento do conhecimento científico, a identificação da inter e transdisciplinaridade com a modernidade, articulada com as pressões políticas (coercivas e indutivas) e empresariais para a esfera do utilitarismo, pode, eventualmente, ajudar a explicar essa ausência.

Num outro registo, em algumas universidades, as narrativas sobre a interdisciplinaridade – “[…] promover a interdisciplinaridade de forma a aumentar a produtividade e criatividade científica e a mobilizar infraestruturas e projetos” (UA) – parecem emergir igualmente como um instrumento de legitimação de modalidades de controlo e regulação institucionais e de gestão da investigação (Hellstrom e Jacob, 2005), alinhado com a “cultura da performance”.

 

Estruturas de coordenação organizacional da investigação

Olssen e Peters (2005) argumentam que a produção de conhecimento tem surgido como uma preocupação política central dos governos e das universidades. Estas, enquanto atores-chave neste processo, são, como vimos, externamente submetidas a fortes pressões para construir conexões estreitas com a indústria e os serviços. A investigação é, assim, representada como um dispositivo essencial na ativação do desenvolvimento económico e no aumento da competitividade nacional na arena da globalização económica (Santiago e Carvalho, 2004).

Neste contexto, as estruturas de coordenação organizacional dedicadas à gestão da investigação são abundantemente publicitadas nos websites das universidades públicas. A maioria destas novas estruturas organizacionais é apresentada como um instrumento de gestão da investigação e de facilitação das interações entre os centros, unidades, institutos e laboratórios e o exterior, sobretudo as agências governamentais e a indústria e serviços:

 

[…] existem outras unidades de ligação, que promovem a interação das unidades de investigação com parceiros sociais e económicos fora da universidade [UA].

 

[…] as unidades de investigação devem ser consideradas como instituições de intercâmbio, tendo a universidade como parceiro principal e outras organizações que representam interesses externos (indústrias, corpos governamentais, etc) [UP].

 

Algumas destas estruturas são constituídas sob a forma de incubadoras de empresas. Outras são categorizadas como “unidades de intercâmbio”, dedicadas à institucionalização das interações entre o ambiente académico e empresarial ou ao apoio e à proteção da propriedade industrial, em particular o registo de patentes:

 

[…] promover a emergência de empresas baseadas na tecnologia através da criação de uma incubadora [UALG; UA].

[…] unidade de intercâmbio para promover as ligações entre o ambiente académico e empresarial e para proteger a propriedade industrial [UA].

 

[…] unidade de intercâmbio para promover a relação entre unidades externas, inovação, transferência de conhecimento e o empreendedorismo […] e para dar apoio à gestão da propriedade industrial [UC; UBI].

 

A emergência destas novas formas organizacionais traduz um fenómeno de forte envolvimento das universidades (e de muitos académicos) no “jogo do mercado” e na procura de potenciais benefícios financeiros, através da comercialização do conhecimento científico e tecnológico (Calboun, 2006; Bok, 2003). No entanto, esta pode não ser a única razão que conduz as universidades a abraçar o capitalismo académico (Slaugther e Leslie, 1997) e o capitalismo do conhecimento/aprendizagem (Slaugther e Rhoades, 2004) ou, em geral, a cultura empresarial/empreendedora (Barnett, 2003). A acumulação de capital simbólico constitui um dado que merece uma atenção tão cuidada como a acumulação de capital económico. A criação de novas formas organizacionais, ou a reformulação das “tradicionais”, dedicadas a sustentar a transferência de conhecimento e tecnologia para o tecido empresarial e a promover o sucesso da investigação económica e de mercado, parecem instituir-se como novas “bandeiras” usadas na renovação da imagem social das universidades enquanto organizações modernas. Assim, as narrativas sobre a criação e os objetivos consignados a estas estruturas expressam também tentativas para conquistar posições mais favoráveis e/ou dominantes no campo do ensino superior, através das tentativas de reconversão em capital simbólico do impacto nas audiências (internas e externas) da divulgação de informação sobre a (re)configuração organizacional da investigação. Tal como sublinha Calboun (2006), as novas pressões competitivas sobre as universidades aumentaram o significado das suas posições no campo hierárquico das instituições de ensino superior.

Por outro lado, num registo mais “tradicional”, a divulgação de informação sobre as novas estruturas organizacionais – em particular, alguns centros interdisciplinares ou de investigação – surge mais instrumentalmente orientada para o interior das instituições. Ou seja, para o desenvolvimento de estratégias tendentes a situar e/ou a hierarquizar a investigação numa escala organizacional mais larga ou a promover o diálogo e a cooperação científica intrainstitucional:

 

[…] centro interdisciplinar para localizar os centros de excelência – ciências da saúde, ciências sociais e ciências da terra e do espaço [UL].

[…] centro de investigação para promover o diálogo científico e a cooperação entre os centros de investigação [UL; UNL].

 

Mas esta projeção da investigação para uma escala organizacional mais larga pode, igualmente, traduzir tentativas para centralizar e desfragmentar os diferentes loci de produção da investigação, introduzindo algum tipo de unificação nas atividades de investigação e referências comuns nas ações e condutas dos investigadores. A ênfase concedida a este tipo de narrativas por algumas universidades é suscetível de conter um significado que elege a “gestão institucional” da investigação como uma dimensão essencial na (re)construção de uma dada identidade organizacional, eventualmente alinhada pela ideia de “universidade de investigação”.

 

A especialização interna do conhecimento

A separação entre investigação básica e aplicada surge destacada, na maioria dos websites das universidades, nas narrativas sobre as estratégias e estruturas organizacionais de promoção da investigação. A relevância económica sobrepõe-se, claramente, neste destaque, à relevância cognitiva, social e cultural do conhecimento, sendo esta raramente mencionada. Este fenómeno é visível na interseção narrativa das dimensões instrumentais, económicas e empresarialmente orientadas do conhecimento, tal como são expressas na divulgação de diversos objetivos definidos para a promoção de atividades e projetos de investigação. As narrativas mais divulgadas sobre a forma como a produção de conhecimento é significada e organizada assumem duas dimensões hegemónicas: a sobrevalorização da investigação aplicada; a identificação deste tipo de investigação com a ciência comercial e a tecnociência:

 

[…] promover projetos de investigação aplicada e transferência de tecnologia [UALG; UC].

 

[…] desenvolver projetos de I&D nas áreas de impacto científico, tecnológico e sócio-económico como robótica, inteligência artificial, telefones e mecanismos de ensino [UA].

 

[…] desenvolver projetos aplicados ao envolvimento de parceiros empresariais [UAC].

 

[…] o desenvolvimento técnico e científico quer preparar planos de negócios com sucesso, de modo a otimizar as qualidades dos produtos e dos serviços [UTL].

 

Olssen e Peters (2005) sublinham que este fenómeno traduz um modelo de conhecimento em que o princípio da “soberania do consumidor” conduz os projetos de investigação. O que está em causa neste modelo parece ser a assunção de uma determinada noção estratégica de I&D, no âmbito da qual as áreas disciplinares básicas das ciências naturais, físicas e sociais são mais negligenciadas, assim como as artes e humanidades. Por outro lado, o mercado surge representado como um mecanismo eficiente de sustentação das mudanças na ciência e tecnologia (Calboun, 2006).

Apesar deste panorama hegemónico, as referências à investigação “tradicional” continuam a assumir alguma relevância nas narrativas quer das universidades “clássicas”, quer das universidades novas. A diferenciação entre investigação básica e aplicada, a criação de conhecimento “por si mesmo”, e a investigação científica “auto-interessada” (objetivos definidos a partir de iniciativas internas) continuam a subsistir como uma referência importante nas estratégias e organização das atividades científicas, como mostra um dos enunciados a seguir transcritos:

 

[…] criação de conhecimento ou investigação científica como um objetivo próprio ou “por si mesmo” [UMA; UC].

 

Por outro lado, as narrativas construídas por algumas universidades dão lugar à coexistência de atividades de investigação aplicada e inovação tecnológica com a investigação básica/fundamental.

 

[…] Algumas das escolas estão envolvidas na investigação aplicada e no desenvolvimento da inovação tecnológica, assim como algumas na investigação fundamental [UTL].

 

Esta coexistência traduz a emergência de um certo hibridismo nas conceções e práticas institucionais de ciência, situadas entre a “ciência académica” e a “ciência pós-académica” (Ziman, 1994, 2000), esta última assumindo, claramente, um caráter estratégico-comercial. A noção de “bilinguismo” (Trowler, 2010) permite-nos perceber melhor as contradições com as quais as universidades portuguesas se confrontam neste processo de hibridação. Por um lado, emerge a necessidade de preservar a herança simbólica e de manter compromissos institucionais com a ciência básica, que se sustenta num sistema de crenças e normas tácitas, historicamente mais sólidas, e ainda com força institucional para suportar as noções de validade e de confiança na “objetividade” do conhecimento. Este sistema de crenças e normas tácitas continua a persistir como uma fonte determinante de legitimidade e prestígio social da investigação. Por outro lado, a sobrevivência das universidades como agentes ativos na estruturação do campo científico e tecnológico contemporâneo, conduz à assunção de uma linguagem identificada com o utilitarismo do conhecimento, permitindo um alinhamento com os novos critérios institucionais da “modernização” científica e tecnológica.

 

Contextos da produção de conhecimento

Olssen e Peters (2005) argumentam que, sob pressão do mercado e do managerialismo/NGP, o conhecimento se tornou mais dependente do financiamento externo, escrutinado e contestável, separado do ensino e mais controlado pelos governos e agências externas. O alinhamento das dinâmicas de produção de conhecimento pelos princípios da racionalidade económica e de mercado transformou-se numa prioridade política. O Estado assumiu um papel central na reconfiguração deste novo ambiente institucional, sedimentado por expectativas sobre a missão económica da investigação e ensino das universidades (neste último caso, em boa medida, sob a influência das teorias do capital humano) e sobre a abertura dos seus sistemas de conhecimento ao exterior.

Num certo sentido, algumas narrativas sobre a divulgação dos objetivos das novas estruturas organizacionais e de interface, dedicadas ao apoio às atividades de investigação, parecem traduzir uma interiorização, pelo menos parcial, deste “projeto”. Várias enunciações insistem, de facto, na necessidade de seguir o agenciamento empresarial a propósito da transferência de conhecimento e tecnologia para a economia:

 

[…] promover as nossas próprias tecnologias dentro do sector empresarial e atender às suas necessidades […] e ser um parceiro importante de numerosas empresas […] com as quais numerosos projetos de I&D e novos produtos são desenvolvidos [UA].

 

[…] criar um ambiente de cooperação com o sector empresarial [UE; UC].

 

[…] identificar as exigências tecnológicas do sector empresarial e a sua transformação correspondente nos projetos inovadores e competitivos do desenvolvimento tecnológico [UE; UC].

 

[…] promover iniciativas que possam ligar empresas com universidades e C&T [UALG].

 

[…] Planear estrategicamente a investigação com o ambiente socioeconómico circundante em mente [UM].

 

[…] Orientar a investigação para o ensino relevante e para a inovação e o progresso tecnológico [UNL].

 

[…] Para melhorar e flexibilizar a interação ciência/indústria, permitindo um melhor diálogo mútuo e confiar de modo a facilitar a criação de diversas formas de cooperação” [UAC].

 

Seguindo a argumentação de Pels (2003), sobrevalorizar este tipo de contexto de produção de conhecimento pode configurar o risco da criação de uma rede de estreitas interdependências entre as dimensões cognitivas e económicas da ciência. A emergência de uma possível “transdisciplinaridade geral” é subsumida pela hegemonia de uma “transdisciplinaridade economicamente orientada”, em grande parte devido à posição secundária que as ciências básicas naturais, ciências sociais, humanidades e artes ocupam nesse novo contexto.

Contudo, as narrativas também desvendam que os processos de estruturação dos contextos internos de investigação nas universidades não foram exclusivamente configurados por dinâmicas exógenas, no sentido da sua inscrição num “projeto” externamente imposto pela disseminação das noções de ciência empreendedora e comercializável. Uma parte das suas iniciativas na organização dos contextos internos de investigação ainda parece obedecer a uma dinâmica “estrategicamente” endógena, orientada para a acumulação e o reconhecimento externo de prestígio social, institucional e científico (nacional e internacional).

 

[…] A universidade só pode ambicionar a continuar como uma universidade se puder incentivar, respeitar e valorizar a componente de investigação [UMA].

 

[…] produzir conhecimento científico de referência ao nível nacional e internacional [UL].

 

[…] assumir um papel principal na definição de estratégias e políticas nacionais de investigação e, em alguns casos, também ao nível Europeu [UTL].

 

Nesta perspetiva, o que parece estar agora em causa, não será tanto a conquista institucional de uma posição mais favorável no campo do ensino superior, visando a diversificação da captação de fundos no exterior, mas a possibilidade de as universidades se tornarem agentes ativos na influência sobre a formulação das políticas e estratégias nacionais e internacionais de investigação. A ideologia e as normas tácitas mertonianas sobre a hierarquização social da ciência, com base na aquisição e reconhecimento do prestígio social, surgem articuladas aqui com a ideia de “universidade de investigação”, formando um dos quadros de referência da produção dos contextos de criação e difusão do conhecimento científico.

Mas, mais uma vez, é possível constatar que duas narrativas diferentes e aparentemente contraditórias sobre a investigação e conhecimento, podem coexistir, e mesmo articular-se, no interior de uma mesma universidade. É provável que para além do fenómeno do “bilinguismo”, já antes sublinhado, esta diferenciação surja igualmente como o reflexo da diversidade de conceções de ciência e dos objetivos da investigação, tal como são assumidos nos diferentes “territórios” disciplinares, e interdisciplinares, pelas diferentes “tribos” académicas presentes em cada instituição (Becher e Trowler, 2001).

 

Os académicos e a prestação de contas

A autonomia e a liberdade científica dos académicos são temas que surgem, com alguma relevância, nas narrativas sobre a divulgação das atividades de investigação nos websites das universidades. Uma das universidades analisadas assume mesmo uma posição ativa e explícita de defesa deste princípio:

 

[…] A universidade defende a autonomia científica dos centros de investigação assim como a liberdade científica dos seus investigadores [UL].

 

Com efeito, a autonomia pressupõe o autocontrolo dos académicos sobre as iniciativas, o desenvolvimento e a regulação da investigação (conhecimento crítico e livre), mas, também, a condução do controlo epistemológico e institucional sobre os resultados, materializado pela ação dos pares. Contudo, algumas universidades divulgam informação sobre a criação de sistemas de controlo da qualidade científica da investigação, que incluem mecanismos de quantificação, baseados em indicadores de produtividade científica (número de publicações). É sublinhado que a tomada de decisão institucional, a propósito do desenvolvimento das atividades de investigação, pode ser baseada nos resultados obtidos com estes indicadores; uma das universidade analisadas enfatiza ainda que estes serviriam para melhorar as posições das universidades nos “ranking”:

 

[…] Análise da produção científica (bibliométrica) de modo a apoiar as decisões estratégicas das universidades na investigação científica. [para] ter uma posição relevante no “ranking” das universidades Europeias [UNL].

 

Em geral, a formalização destes sistemas, ligados a uma lógica de produtividade e de prestações de contas, é crescentemente representada como uma componente central da institucionalização de uma nova cultura da performance na investigação, controlada por gestores, ou académicos-gestores, e por objetivos de gestão (Hellsrom e Jacob, 2005). Este controlo não deixa de se constituir como uma forte limitação à autonomia e liberdade dos académicos/investigadores, resultante em grande medida da influência crescente exercida pela lógica de gestão e do mercado sobre a organização da investigação. O poder dos profissionais académicos/investigadores é transferido para instrumentos de medição externa da produtividade científica, estruturados à imagem da produtividade económica. Esta transferência pode afetar os crité­rios epistemológicos de validade e a confiança no conhecimento produzido, aprisionando a liberdade e a crítica de indagação científica dos académicos/investigadores no desenvolvimento da investigação (Barnett, 2003).

 

CONCLUSÕES

 

Conduzidas pelos pressupostos do managerialismo/NGP, assistiu-se a uma intensificação e densificação das mudanças no ambiente institucional do ensino superior português a partir de finais dos anos 90. As condições que hoje contextualizam o trabalho académico são substancialmente diferentes das existentes há uma década atrás. Estas condições são mais configuradas por tentativas de impor um “projeto” empresarial/empreendedor, estranho às instituições, do que pelas suas dinâmicas internas (Santiago e Carvalho, 2003; Santiago e Carvalho, 2004). Por outro lado, a organização institucional e social da ciência também tem mudado com alguma rapidez. A concentração da produção de ciência nas universidades tem diminuído, dispersando-se agora por diferentes estruturas localizadas na esfera pública ou privada. Esta concentração originou um tipo de fenómeno que Muller e Subotzky (2001), referindo-se a outras realidades nacionais, designam como “transinstitucional”.

Apesar do caráter hegemónico deste novo ambiente institucional, amplamente estruturado pelo capitalismo académico e o capitalismo do conhecimento/aprendizagem (Slaughter e Leslie, 1997; Slaugther e Rhoades, 2004), a análise dos resultados empíricos deste estudo permitiu evidenciar várias conclusões que matizam, no caso português, o alcance dessa hegemonia.

Uma primeira conclusão, de âmbito geral, refere-se à ambiguidade das narrativas institucionais que suportam a divulgação da investigação nos websites das universidades. Por um lado, a investigação ‘tradicional’ permanece um “quadro ideológico” importante para o desenvolvimento das atividades de investigação. A análise de conteúdo dos enunciados de missão e dos grandes objetivos institucionais, dedicados à investigação e à ciência, mostra que as grandes narrativas que lhes dão corpo continuam a articular os princípios humboldtianos do conhecimento e as crenças e normas tácitas mertonianas de produção de ciência (Merton, 1973; Merton e Barber, 2004). Mas, por outro lado, quando a análise se foca na divulgação de informação mais específica, sobre as estratégias e a organização institucional das atividades de investigação, o que parece evidenciar-se é a assunção de uma “gramática” managerialista e mercantilista como matriz de atribuição de significados aos processos, objetivos e finalidades da ciência. Esta “gramática” desenvolve-se na esfera de uma conceção de ciência em linha com o que Ziman (1994) categorizou como “ciência pós-académica/pós-industrial” ou Gibbons et al. (1994) como o “Modo 2 de produção de conhecimento”.

Tentando apreender a lógica destes dois discursos, é possível sustentar a hipótese da existência, ao nível institucional, de fenómenos de hibridismo, ou, pelo menos, de fenómenos de “bilinguismo” (Trowler, 2010) na relação que as universidades estabelecem com as suas audiências internas e externas. As universidades utilizam, simultaneamente, linguagens diferentes, de modo a adaptar-se a interesses diferentes – uma linguagem “moderna”, que enfatiza a investigação empresarial/empreendedora, podendo traduzir uma forma de alinhamento com os “requisitos externos” do mercado, e uma estratégia de conquista de posições simbólicas no campo da relevância económica da “nova” ciência; uma linguagem da “tradição”, provavelmente orientada para a proteção e preservação da herança simbólica e cultural da ciência, mas usada também como instrumento de aquisição e de reconhecimento de prestígio social e institucional.

A segunda possível conclusão deste estudo é, agora, mais específica. Prende-se com a ideia de que as universidades procedem à naturalização, na informação divulgada, das estratégias e ações de transferência de conhecimento e de tecnologia para a indústria e os serviços. A maioria das narrativas, neste campo, enfatiza a importância das variáveis e dos critérios exógenos (económicos) na orientação das atividades de investigação, alinhando-os com a noção utilitária de produtividade económica (Muller e Suboztky, 2001). A produtividade na ciência é, naturalmente, identificada com a produtividade económica, sendo esta identificação apresentada como inevitável. A este propósito, Feldman (2001) sublinha que apesar das críticas dirigidas à universidade empresarial/empreendedora, não é possível ignorar as ligações existentes entre a detenção de recursos do conhecimento e a acumulação de capital. A questão que deve ser colocada, seguindo ainda o raciocínio de Feldman, é a de saber como é que esses recursos podem ser democraticamente governados, subtraídos ao controlo empresarial e redistribuídos de uma forma mais justa pela sociedade.

Uma terceira conclusão, também específica, decorre da comparação qualitativa dos resultados da análise de conteúdo, confrontando as narrativas produzidas pelas universidades “clássicas” com as narrativas das universidades “novas”. Na verdade, não existem diferenças significativas entre estes dois “grupos” de universidades quanto às características das narrativas institucionais sobre a ciência e a investigação publicitadas na web. As diferenças que emergem são mais de ordem intrainstitucional do que interinstitucional, provavelmente traduzindo a diversidade epistemológica e organizacional dos “territórios” e das “tribos” académicas presentes em cada instituição (Becher e Trowler, 2001).

Finalmente, uma última conclusão deste estudo relaciona-se com a hipótese de as universidades usarem as narrativas na web para induzirem uma imagem social de si-próprias como “universidades de investigação”. O sucesso desta estratégia de comunicação pode contribuir para a conquista de uma maior legitimidade das universidades junto das audiências internas e externas (tecido empresarial, estudantes, outras instituições, associações profissionais, e o Estado). Esta conquista serve um duplo propósito: a diversificação das fontes de captação de recursos financeiros; e a conquista de uma posição mais vantajosa no campo do ensino superior, em particular, neste último caso, através da “renovação” institucional do capital simbólico, do capital cultural e do capital social das universidades. Em trabalhos futuros seria relevante analisar o modo como estes discursos se encontram alinhados com os discursos políticos sobre a produção e divulgação do conhecimento.

 

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Recebido a 18-04-2013. Aceite para publicação a 23-07-2013.

 

NOTAS

1 A lista das universidades públicas portuguesas era, à data deste estudo, a que se segue: ISCTE (Instituto Superior de Ciência do Trabalho e da Empresa); UA (Universidade de Aveiro); UAÇ (Universidade dos Açores); UALG (Universidade do Algarve); UBI (Universidade da Beira Interior); UC (Universidade de Coimbra); UE (Universidade de Évora); UL (Universidade de ­Lisboa); UMa (Universidade da Madeira); UMinho (Universidade do Minho); UAB (Universidade Aberta); UNL (Universidade Nova de Lisboa); UP (Universidade do Porto); UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro); UTL (Universidade Técnica de Lisboa).

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