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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.214 Lisboa mar. 2015

 

ARTIGO

Itinerário das profissões sociais em Portugal, 1910-19621

The social professions in Portugal, 1910-1962

 

Francisco Branco

*CEDH, FCH, Universidade Católica Portuguesa, Palma de Cima — 1649-023 Lisboa, Portugal. E-mail: fnbranco@fch.lisboa.ucp.pt

 

RESUMO

Ensaia-se neste artigo a reconstituição do itinerário das profissões sociais na vigência da I e II Repúblicas, privilegiando o período que se desenrola entre a sua fundação (1910), a constituição do Estado Novo (1933-1945) e a sucessão de Salazar (1968), explorando sobretudo as visitadoras como uma das figuras centrais e paradigmáticas das profissões sociais em geral e das profissões do trabalho social em particular durante este período. Esta reconstituição historiográfica, baseada em fontes secundárias, explora em particular os movimentos e figuras influentes na institucionalização destas profissões emergentes, as dinâmicas de rutura e continuidade entre os períodos charneira, as influências internacionais, bem como a dimensão de género.

PALAVRAS-CHAVE: visitadoras sanitárias; visitadoras escolares; assistentes sociais; profissões sociais; Portugal.

 

ABSTRACT

This article focuses on the reconstitution of the social professions’ itinerary in Portugal during the I and II Republic, during the period that unfolds between its foundation (1910), the constitution of Estado Novo (1933-1945) and the succession of Salazar (1968), exploring, in particular, the visitadoras (visitors) as one of the central and paradigmatic characters of the constitution of social professions.  The paper carries out an historiographical reconstitution based on secondary sources, exploring, especially, the influential figures and movements in the establishment of these emerging professions, the dynamics of rupture and continuity between its pivotal periods, international influences, as well as its gender dimension.

KEYWORDS: health visitors; school visitors; social workers;  social professions; Portugal.

 

Quando se escrever com recuo suficiente a história do nosso tempo, muitas actualidades terapêuticas de sensação, muitas teorias sedutoras e pretensas invenções terão caído num justo esquecimento. Mas eu estou intimamente convencido de que uma das características mais notáveis da nossa época será dada a aparição, entre nós, destas duas figuras novas: a enfermeira visitadora e a assistente social [Rist, citado por João Porto, 1940].2

 

O MOVIMENTO HIGIENISTA E DE MEDICINA SOCIAL E A EMERGÊNCIA DA FIGURA PROFISSIONAL DA VISITADORA

 

No contexto da I República, as primeiras iniciativas no sentido da institucionalização das visitadoras numa base profissional foram desencadeadas pelos movimentos higienista e de medicina social.

Se a figura da visitadora não constitui, é preciso referi-lo, uma novidade em Portugal, uma vez que já no decurso do século XIX se registava, por via das iniciativas privadas e religiosas, o recurso a visitadoras benévolas3, ela assume um distinto significado, uma vez que as iniciativas para a sua institucionalização se inscrevem no movimento em prol da responsabilidade pública pela assistência aos pobres e na relevância assumida pelas questões da higiene e saúde pública.

À semelhança do que já ocorrera noutras cidades industriais europeias, os principais centros urbanos portugueses, e particularmente as cidades do Porto e de Lisboa, confrontam-se com gravíssimos problemas de saúde pública, com incidências muito elevadas de tuberculose, sífilis e mortalidade infantil. É por esta razão que Matias sublinha:

 

[…] para os médicos portugueses é cada vez mais clara a relação entre o funcionamento racional dos hospitais e o desenvolvimento de medidas de protecção e de assistência à população, especialmente a mais pobre, começando a sentir a necessidade de profissionais que se ocupem especificamente desta tarefa [exigindo] a expansão da Medicina Social e dos seus métodos, […] a reorganização científica da higiene e da assistência social e a formação de um novo tipo de profissional [Matias, 1999, pp. 109-113].

 

É neste contexto que se assiste às primeiras tentativas de institucionalização de novos profissionais na área médico-social, com destaque para a proposta de Miguel Bombarda, em 1910, no sentido da formação de profissionais de enfermagem, bem como a iniciativa de Costa Sacadura no sentido da consagração da figura profissional das enfermeiras escolares (1911), e ainda a defesa em prol da enfermagem escolar e da enfermagem social pelo médico João Camoesa, quer no Boletim da Inspeção-Geral da Sanidade Escolar (1923), quer através de artigo anteriormente publicado na Revista Seara Nova, em 1921 (Martins, 1999, cap. II).

Estas propostas, à semelhança da protagonizada pelo médico Guilherme Pacheco em 1922, quando sustentou igualmente a criação do curso de enfermeiras escolares na Escola de Enfermagem dos Hospitais Civis de Lisboa, não lograram no entanto ser concretizadas.

Assim, apesar do protagonismo e destacada posição pública destas figuras e do papel de enorme relevância assumido neste contexto pela Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa4 enquanto ator central do movimento de medicina social, através da realização de múltiplas conferências, debates e propostas de crucial importância para o panorama da saúde pública em Portugal (Matias, 1999), as iniciativas dos movimentos higienista e de medicina social não lograram, no essencial, a concretização das suas causas, mesmo se, nomeadamente na área da saúde escolar, elas se apresentassem coerentes com o ideário republicano da centralidade da educação (Martins, 1999, p. 64) e constituíssem mesmo um dos pontos fortes de convergência entre o movimento republicano e os movimentos dos trabalhadores (Samara, 2010, p. 158).

Importa ter em conta que, a par da frequentemente referenciada forte instabilidade política que marcou a I República, e do próprio programa do republicanismo se apresentar, como assinala Samara (2010, p. 158), mais como um programa político e cultural que social e económico, as dificuldades económicas e financeiras associadas à Guerra tiveram um grande impacto quer no atraso, quer na não concretização de algumas das promessas e reformas republicanas5, de que são exemplo o adiamento das medidas reclamadas pelo movimento higienista e de medicina social. A sua concretização progressiva só terá lugar após o fim da I República, na sequência do golpe militar de 28 de Maio de 1926. Neste quadro, este movimento apoia-se no voluntariado feminino e voluntariado familiar como compensação da ausência do Estado na criação e suporte dos recursos humanos especializados requeridos pelas missões de promoção e defesa da saúde pública. Observa-se aqui uma forte semelhança com o ocorrido com outras profissões e ocupações requeridas pelo processo de desenvolvimento social e económico em Portugal e noutros países, onde estas dinâmicas tiverem lugar mais precocemente.6

 

A FIGURA PROFISSIONAL DA VISITADORA SOB O ESTADO NOVO

 

Em 1929, terá lugar, sob a direção de Ricardo Jorge, a reorganização dos serviços de saúde pública, com a criação de uma rede de dispensários de higiene social, e postos de proteção à infância tendo como missões prioritárias a luta contra a mortalidade infantil e a prevenção das “doenças venéreas” e da tuberculose.7 É neste quadro que se inicia o trabalho das visitadoras sanitárias, estando a sua formação a cargo da Direção-Geral de Saúde. Os primeiros cursos de formação, de caráter experimental, e a duração de 6 meses, tiveram lugar em 1929 e 1930 (Martins, 1999, p. 70; Ferreira, 1990, p. 335), tendo a sua oficialização ocorrido em 1931, com a publicação do Regulamento do Curso (DL 20 376, de 12 de outubro de 1931), o qual consagra como áreas de formação a puericultura, a higiene pré-natal, a higiene alimentar, a higiene geral e a profilaxia das doenças transmissíveis (art.º 9.º). Assinale-se, naquilo que se constitui como um traço orientador do perfil profissional emergente neste domínio, a condição de género imposta na admissão, quando se prescreve “a inscrição aos indivíduos portugueses do sexo feminino, de dezoito a trinta e cinco anos” (art.º 3.º).

Alguns anos mais tarde, em 1931, é criado o curso de enfermeiras visitadoras de higiene junto das Faculdades de Medicina, cuja atividade se havia já iniciado em 1929, no âmbito da Assistência Nacional dos Tuberculosos (ANT).

O Decreto n.º 19 460 que procede à criação de cursos de habilitação para as referidas enfermeiras visitadoras de higiene, permite verificar a fundamentação que o legislador procura na prática dos países anglo-saxónicos e de outros países europeus no que se refere aos serviços de higiene social.

 

As “health visitors” são hoje agentes indispensáveis nos serviços sanitários dos países anglo-saxónicos e em todas as instituições particulares que se dedicam à higiene social. A sua preparação está muito cuidada nesses países e o exemplo que dão vai sendo seguido em toda a parte.

Já desde há anos outros países europeus, como a França, Itália e Espanha, estabeleceram de forma legal e desenvolvida o ensino de visitadoras. Em Portugal, foi iniciado esse ensino pela Direcção-Geral de Saúde, tendo-se verificado dele os mais perfeitos resultados para o serviço sanitário, em cujo trabalho profilático e anti-epidémico as visitadoras sanitárias têm sido aplicadas com o melhor proveito para a defesa da saúde pública e a melhor aceitação da parte da população.

Conviria pois que em Portugal esse ensino fosse generalizado, satisfazendo-se desta maneira também o voto emitido pela secção de higiene do Congresso Nacional de Medicina que reuniu em Lisboa em 1928 [Decreto n.º 19 460].

 

Do mesmo modo, fica clara a inspiração deste curso no modelo anglo-saxónico das health visitors, com funções muito mais latas do que a enfermagem, e com recurso às técnicas de visita domiciliária e inquérito, acentuando, de acordo com Martins (1999, p. 73), “os aspectos de vigilância e controlo de comportamentos e de racionalização de recurso aos serviços”.

O cuidado posto na admissão das visitadoras, enfatizando o seu comportamento e idoneidade moral por relação com a competência técnica, revelam a importância que o Estado Novo irá conferir de forma crescente às dimensões ideológicas e de moralização da ação destas profissionais junto das famílias pobres.

Assim, o diploma que institui a organização nacional Lar Português estabelece na sua Base VII que

 

[…] serão oficialmente reconhecidas como colaboradoras da defesa da família as enfermeiras visitadoras propostas pelas instituições particulares que tomarem a seu cargo algum dos objectivos especiais de protecção à maternidade, e ainda as propostas pelas comissões de propaganda ou as suas delegações distritais ou concelhias. Na admissão das visitadoras deverá atender-se à sua competência técnica e, com maior rigor, ao seu comportamento e idoneidade moral [Decreto n.º 25 936, de 12 de outubro de 1935, sublinhado nosso].

 

Num movimento convergente, e após a criação, em 1933, da Direção-Geral da Saúde Escolar, será instituído o curso de visitadoras escolares, atividade que vinha sendo já exercida por visitadoras sanitárias, por outras profissionais sem formação específica, e por mulheres voluntárias.

Apesar do cunho científico-técnico que os seguidores da Escola de Ciência Social de Le Play advogaram para esta profissão médico-social8, esta será marcada por uma forte orientação ideológica que pode ser comprovada pela tutela da Obra das Mães pela Educação Nacional9sobre esta formação:

 

À visitadora compete a colheita de elementos exteriores que o médico carece para a integração social do indivíduo no meio externo, permitindo assim o estudo completo do aluno, do ponto de vista psíquico como físico (acção individual). Em segundo lugar, a ela compete a modificação, tanto quanto possível para melhor, dalgumas deficiências do meio. Em terceiro lugar, o aproveitamento das oportunidades que surgem no decurso das visitas, para orientação e correcção dos maus hábitos e más práticas de puericultura e de higiene geral física e moral (acção social) [Cortês Pinto, 1978, cit. in Martins, 1999, p. 155].

 

As iniciativas que vieram a ter lugar no quadro da institucionalização do Estado Novo apresentam deste modo dimensões de continuidade e de rutura com a I República: o programa formal retoma reformas então preconizadas (racionalidade técnico-científica da formação dos profissionais), mas imprime-lhe uma orientação mais vincadamente ideológica, ao conferir à ação destas novas profissões e ocupações uma missão moralizadora das famílias e classes pobres.10

Tal orientação pode igualmente ser aferida pela análise da Portaria n.º 9 360, de 30 de outubro de 1939, que regula o curso e o seu funcionamento. Nela são fixadas as condições de admissão ao curso de visitadoras escolares, evidenciando-se os atributos de ordem moral e de género postos na admissão das candidatas, com a exigência do estado civil de solteiro ou viúvo11, bem como a titularidade de curso da Obra das Mães pela Educação Nacional:

 

Serão requisitos de admissão à matrícula a maioridade, irrepreensível conduta moral, modéstia, compostura exterior, suficiente robustez física e aprovação em um exame constituído por provas de aritmética, de redacção e de aptidão para o trabalho social e para a orientação moral, e constituirão motivo de preferência a viuvez com encargos de família, o estado de solteira com encargos de família ou desamparo, melhores habilitações literárias afins, posse de um curso de informação ou aperfeiçoamento instituído pela Obra das Mães pela Educação Nacional [Portaria n.º 9 360, n.º 3].

 

Igualmente relevante para a análise da figura da visitadora se constitui o plano de estudos do curso, o qual se encontrava estruturado em torno de seis áreas nucleares: noções de moral especial, noções gerais de educação, higiene, enfermagem e elementos de higiene sanitária, formação técnica e formação técnica prática (cf. figura 1).

 

 

Para uma análise mais fina do perfil profissional visado, atente-se particularmente na componente de formação técnica e formação técnica prática.Na primeira dimensão, de caráter mais geral, o programa do curso privilegia o estudo das obras de caridade e obras sociais, a exploração das noções de miséria, indigência e pobreza, da psicologia dos pedintes, o serviço social e os casos individuais, as famílias numerosas, tendências cristãs e morais que devem guiar os trabalhadores sociais, as visitas e noções de assistência pública e privada. No que respeita à formação técnica prática, são de destacar a atenção dedicada aos inquéritos, às entrevistas, informações particulares e oficiais e monografias, estatísticas (cf. Portaria n.º 9 360, de 30 de outubro de 1939].

O perfil e programa de formação destas profissões resulta assim numa combinação da orientação da medicina social, da Escola de Ciência Social de Le Play e da ideologia  conservadora do Estado Novo. A visita domiciliária e o inquérito, com fins de diagnóstico médico-social e suporte ao exercício médico, e a educação moral das famílias são aspetos que fazem da visitadora uma figura paradigmática da profissionalidade emergente no âmbito médico-social, como sustenta também Jorge Ramos d’Ó num trabalho sobre a educação em Portugal neste período:

 

Uma nova e importante medida foi a abertura nos quadros da Direcção-Geral do lugar de visitadora ou enfermeira escolar. As pretensões expressas desde os anos vinte no sentido da sua criação foram finalmente atendidas pelos decretos 25:676 e 27:442, respectivamente de 25 de Junho de 1936 e 31 de Dezembro de 1936, que colocaram 28 daquelas novas funcionárias nos vários liceus do Continente. Auxiliares dos médicos, as visitadoras apareceram inicialmente muito presas ao papel de policiar, a partir do interior, a vida familiar, dando enfim resposta a décadas de desconfiança acerca da acção educativa e higiénica desenvolvida pelos progenitores dos alunos [Ó, 2010, p. 25].

 

EMERGÊNCIA E INSTITUCIONALIZAÇÃO DAS PROFISSÕES MÉDICO-SOCIAIS E DO TRABALHO SOCIAL EM PORTUGAL NA I E II REPÚBLICAS

 

A reconstituição do itinerário histórico das profissões sociais na I e II República (cf. Quadro 1)12, permite-nos identificar as principais metamorfoses da figura paradigmática da visitadora, bem como traçar, em termos genéricos, a evolução do seu perfil.

No primeiro plano, observa-se que não obstante as designações e configurações diferenciadas (visitadoras sanitárias, enfermeiras visitadoras de higiene, visitadoras escolares e ainda educadoras familiares13), no contexto do Estado Novo estas profissões emergentes se apresentam unificadas por uma tripla filiação: a orientação de base científica dos movimentos higienista e de medicina social que esteve fortemente presente na sua génese e primeiros ensaios de institucionalização; a ideologia conservadora do Estado Novo, cujo “programa”, particularmente no domínio da família e da criança, as enquadrava, e a instrumentalidade da escola sociológica de Le Play.

Em termos de perfil profissional emergem como traços mais salientes os atributos de género (feminino) e, parafraseando algumas disposições regulamentares, a “apetência para o trabalho social” e a orientação moral. As habilitações literárias foram relativamente secundarizadas e, numa primeira fase, situavam-se ao nível do 2.º grau da instrução primária e/ou eram atestadas por exame de aptidão. A formação profissional era, em regra, de curta duração14 e apresentava uma vincada orientação doutrinária e técnico-prática.

A reconstituição do itinerário das profissões médico-sociais e do trabalho social, neste período, permite igualmente observar que uma primeira fileira de formações profissionais, que se estrutura em torno da figura da visitadora, apresentava um caráter fragmentário, quer por reflexo das diversas influências internacionais em que se inspirou a sua criação15, quer pela diversidade das áreas setoriais em que se inscreveram. Igualmente, no que respeita aos contingentes profissionais16, esta fileira caracterizava-se por um número relativamente reduzido de efetivos. Assim, verifica-se que algumas dessas ocupações têm uma existência relativamente efémera (e.;g. visitadores escolares) ou dão lugar a grupos profissionais de cunho mais generalista e com requisitos de acesso mais exigentes e maior qualificação. Progressivamente, a figura característica da “visitadora” dá lugar à da “auxiliar social”/“monitora”17 sem que se observe, no entanto, de forma relevante, uma mudança nos propósitos da sua atuação.

A par da emergência destas profissões médico-sociais, registam-se igualmente iniciativas por parte dos movimentos higienista, de medicina social, e de outros movimentos sociais de génese científica, como os movimentos psiquiátrico e de psicologia experimental, no sentido da institucionalização de outras profissões do trabalho social e particularmente da formação de assistentes sociais. Assim, de acordo com Martins (1999, cap. V), as primeiras tentativas para a criação de uma Escola de Serviço Social em Portugal tiveram lugar em 1928 no Instituto de Orientação Profissional, tendo em vista a formação de profissionais para os serviços de justiça de menores. Poucos anos mais tarde, em 1934, no mesmo Instituto, assistiu-se à formação de observadores de psicologia juvenil e de observadores sociais, segundo um programa que colhe a sua influência na orientação anglo-saxónica de serviço social.18 Ocorrendo no contexto da Ditadura Nacional (1926-1933), estas primeiras iniciativas têm, como se assinalou, a sua génese nas preocupações e iniciativas dos movimentos higienistas, de medicina social e de proteção da infância que, de forma manifesta, antecedem o fim da I República em Portugal e são marcadas por propósitos de formação científica e técnica.19

É, no entanto, com o I Congresso da União Nacional, em 1934, que são apresentadas, pela condessa de Rilvas e por Bissaya Barreto, propostas no sentido da criação do Instituto de Serviço Social (Lisboa, 193520) e da Escola Normal Social (Coimbra, 193721). Mais tarde, em 1956, seria criado pela Associação de Cultura e Serviço Social o Instituto de Serviço Social do Porto. Assim, no caso português, a institucionalização do Serviço Social como formação académica e profissão tem por contexto sociopolítico o Estado Novo, um regime de natureza autoritária e corporativista, avesso ao intervencionismo público na esfera social e, por isso, contrário ao modelo de Estado Social em progressiva constituição nos países democráticos e mais desenvolvidos do mundo ocidental.22

Reclamada pelos movimentos higienistas e de medicina social como um requisito para o enfrentamento dos graves problemas de saúde pública, a formação desta nova categoria de profissões sociais viria, à semelhança do que já ocorrera com a figura da visitadora, a ser enquadrada na sua primeira fase de institucionalização, pelo discurso e orientação ideológica do Estado Novo, ancorada no corporativismo e apoiada pela Igreja e elites católicas23, atores e autores centrais neste processo. Esta aliança revelou-se fundamental ao enquadramento da iniciativa tornada possível no quadro da União Nacional, confiando a criação das escolas a organizações privadas (compatibilização com o princípio da supletividade da ação do Estado), e a sua direção a figuras e/ou entidades católicas (compatibilização entre a segurança doutrinária e a autonomia da Igreja).

A formação em Serviço Social é regulada pelo Estado em 1939: são reconhecidos os Institutos de Serviço Social de Lisboa e Coimbra, estabelecida a orientação da formação segundo um plano de estudos de três anos, e certificado o diploma e o título profissional de Assistente Social, exclusivo dos diplomados em Serviço Social.

Nesta primeira fase, a formação compreendia as dimensões médico-sanitária, jurídica, filosófica e do serviço social (cf. Decreto-Lei n.º 30 135, de 14 de dezembro de 1939). Uma outra componente essencial da formação era constituída pelos estágios, ao longo dos três anos, como oportunidade de aprendizagem do desempenho profissional, modelada no terreno, através do contacto e experiência em serviços de cirurgia, medicina, pediatria, puericultura em creche, maternidade e consultas pré-natais, dispensários de profilaxia em higiene social, fábricas, centros sociais e organizações especializadas em ensino familiar e doméstico.

A formação e a missão que se pretendia conferir às assistentes sociais, se apresentava dimensões diferenciadas das anteriores ocupações médico-sociais, por via de uma formação mais longa e consistente nas áreas médico-sanitárias, jurídicas e do serviço social, assumia, em continuidade com a orientação antecedente, um caráter fortemente doutrinário, corporativo e conservador, em que as funções simbólico-ideológicas e de controlo social tinham particular relevo. Na letra da Lei:

 

[…] cumpre salientar, pelas possibilidades que encerram de inexplorados horizontes, a criação de escolas de formação social onde se habilitem raparigas, até da melhor condição, para exercerem junto de fábricas, organizações profissionais, instituições de assistência e de educação colectiva e de obras similares uma acção persistente e metódica de múltiplos objectivos – higiénicos, morais e intelectuais –, em contacto directo com famílias de todas as condições.

[…] a missão de extraordinário alcance e a influência decisiva que às obreiras do Serviço Social incumbem nos diversos meios em que hão-de trabalhar, designadamente entre as famílias humildes e de restrita cultura, as mais facilmente influenciáveis, impõem ao Governo não se alhear da formação que àquelas se dê, para que jamais possa desviar-se do sentido humano, corporativo e cristão.

Por isso, se aprovam o plano geral de estudos e programas, tudo para a formação de dirigentes idóneas, responsáveis no meio a que se destinam, ao mesmo tempo activas cooperadoras da Revolução Nacional [Decreto-Lei n.º 30 135, de 14 de dezembro de 1939].

 

Com a institucionalização da profissão de assistente social (assistentes de serviço social, segundo a designação da época), inaugura-se, do ponto de vista do itinerário das profissões sociais em Portugal, uma segunda fileira de formações profissionais caracterizada por um ciclo de formação longo, critérios habilitacionais de acesso elevados, atributos que surgem associados a um perfil profissional diferenciado, de enquadramento, distinto das profissões até então constituídas.

Ao mesmo tempo, inicia-se um processo de reorganização deste campo profissional, observável na extinção do curso de visitadoras escolares, entendido como curso de especialização a ser oferecido pelos Institutos de Serviço Social, prevendo-se apenas o seu funcionamento no ano letivo 1939-1940.

Este processo terá na década de 50 um novo e importante marco. Procede-se, num primeiro movimento, à criação da formação de auxiliares sociais, em 1947 e 1952 (auxiliares de serviço social na designação inicial) e a concomitante extinção da profissão de visitadora sanitária em 1952. Concretiza-se, num segundo impulso, em 1956, a revisão da regulamentação pública da formação em serviço social, que passa a ter, oficialmente24, uma duração de 4 anos, e a regularização e reformulação da formação de educação familiar (Portaria n.º 15 973), a qual, como já se referiu, vinha sendo realizada nos Institutos de Serviço Social desde 1935.25

Nestas circunstâncias, ensaia-se a institucionalização de uma nova arquitetura das profissões do campo médico-social e do trabalho social com a consagração de

 

dois tipos de trabalhadoras sociais: umas – as monitoras familiares e as assistentes familiares – mais particularmente votadas aos problemas educativos, pedagógicos, recreativos e da vida familiar; outras – as assistentes sociais – dedicando-se mais especificamente aos problemas da saúde, de trabalho, de auxílio social, de pesquisa e planeamento sociais […][Decreto-lei n.º 40 678, sublinhado nosso].

 

Esta formulação é particularmente significativa e relevante, pois deixa claro, já a essa data, aquilo que muitas abordagens persistem em ignorar ou confundir quando se reportam às profissões sociais em Portugal, a saber: a de que o termo trabalho social se reporta a um conjunto de profissões e não a uma profissão.

Esta sistema bi-profissional, que combinaria profissões de perfil mais elevado e “cursos de índole mais modesta”26, não se revelou no entanto consistente, pois, apesar desta e de outras orientações e medidas, mormente da Obra das Mães pela Educação Nacional em prol da educação familiar rural (Pimentel, 2011), o “ramo” da educação familiar não viria a consolidar-se tendo-se extinguido nos Institutos de Serviço Social a partir do início dos anos 60, apesar da sua consonância com o projeto ideológico e político do Estado Novo na esfera da família e da mulher.27

Assinale-se, no entanto, que um novo ensaio viria a ser realizado no contexto das colónias portuguesas, em 1962, com a autorização da criação de Institutos de Educação e Serviço Social, os quais se destinavam à formação de assistentes sociais, e profissionais na área da infância, mas também de educadores sociais e monitores de família.28 No entanto, a profissão de assistente social apresenta-se, progressivamente, como a profissão do trabalho social mais consolidada em Portugal, tendo o curso de serviço social, em 1961, sido reconhecido como curso superior, com os mesmos requisitos de admissão do ensino superior em geral.

No que respeita à orientação da formação, e relativamente ao curso de Serviço Social, a passagem da formação de 3 para 4 anos, é fundamentada com base na

 

[…] necessidade de introduzir certas alterações ao preceituado […], alterações destinadas principalmente a conseguir correspondência mais perfeita às exigências da evolução social portuguesa, que, semelhantemente à de outros países, reclama se dê cada vez maior incremento às actividades de grupo, educativas e culturais, aos movimentos e organizações das comunidades e aos estudos de carácter sociológico em que essas actividades e movimentos forçosamente têm de basear-se [Decreto-Lei n.º 40 678, sublinhado nosso].

 

No entanto, pelo menos no plano formal da organização dos planos de estudos e das matérias nucleares, não se registaram alterações significativas, como se pode comprovar pelos planos fixados pela Portaria n.º 15 972, de 18 de setembro de 1956, para os cursos de serviço social e cursos geral e normal de educação familiar.29

 

PROFISSÕES MÉDICO-SOCIAIS E DO TRABALHO SOCIAL EM PORTUGAL NA I E II REPÚBLICAS NUMA PERSPETIVA DE GÉNERO

 

As figuras típicas desta profissionalidade emergente conjugam-se no feminino, construindo uma estereotipia das profissões médico-sociais e do trabalho social como profissões de mulheres, dimensão presente quer na admissão às formações especializadas, quer nas qualidades apontadas para o desempenho profissional, como pode ser facilmente comprovado ao compulsar as regulamentações legais e os documentos de teor mais doutrinário.30 A orientação imprimida pelo legislador e doutrinadores é claramente cunhada pelo “maternalismo”.

No caso português, esta orientação é extensiva a outros campos profissionais, como o da enfermagem (Escobar, 2004, pp. 31-79) e o dos professores (Nóvoa, 2005, p. 93; Araújo, 2000; Pimentel, 2011, pp. 128-134; Rosas e Brito, 1996, pp. 286-288), apresenta-se como um vetor essencial do processo de construção de uma “identidade feminizada” das profissões sociais, em sentido lato, a qual, ainda que numa linha de continuidade com os valores presentes tanto no período da Monarquia Constitucional, como na I República, vai ser fortemente reforçada sob o Regime do Estado Novo. A este propósito, é igualmente significativa a orientação adotada no âmbito da saúde escolar, na qual se consagrou a divisão de género entre “médicos escolares e visitadoras sanitárias” (Decreto-Lei n.º 37 869/1950).31

É de assinalar que, nomeadamente no que respeita ao serviço social, só no ano letivo 1961-1962 se regista a admissão de alunos do sexo masculino no Instituto de Lisboa, indo, deste modo, ao encontro da recomendação do parecer da Câmara Corporativa, de 1956, sobre a matéria.32 Refira-se, no entanto, que o fundamento desta posição dos procuradores radica numa reatualização da questão de género, uma vez que se suporta no ponto de vista de que “para alguns trabalhos sociais – como por exemplo a assistência nas prisões, junto dos menores delinquentes, de doentes mentais e de vadios, em campos de refugiados e para muitas das tarefas da educação de base e organização de comunidades – a experiência tem mostrado a vantagem de agentes masculinos” (ponto 6, p. 779), assente pois numa conceção de divisão social do trabalho baseada no género. Esta visão entronca na tradição de alguns países europeus, onde se registou a existência de escolas de serviço social para mulheres e escolas de serviço social para homens, com perfis profissionais distintos.

A dimensão de género está igualmente presente quando se leva em linha de conta o forte envolvimento das mulheres nos movimentos sociais de melhoramento da assistência às populações pobres e desfavorecidas e nos movimento de reforma social, tanto em Portugal como, em geral, noutras latitudes. Assim, estes movimentos, que exerceram um papel importante na emergência e institucionalização das profissões médico-sociais e do trabalho social, constituíram-se como espaços de emancipação da mulher, ainda que o caso português apresente algumas especificidades, decorrentes do regime político ditatorial do Estado Novo e da sua relação com as mulheres (Martins, 1995 e 2003; Pimentel, 2011; Hering e Waaldijk, 2003; Muncy, 1991). Pode-se pôr a hipótese de que, no caso português, se cruzavam duas dinâmicas: a presença de orientações que podemos qualificar de feministas e reformadoras, inclusive com referências a Jane Addams como inspiração, e a instrumentalização das mulheres pelo Estado Novo, conferindo-lhe papéis de liderança na sua política da família e da mulher.

 

CONCLUSÃO E PERSPETIVAS DE INVESTIGAÇÃO

 

O presente artigo procurou, a par da reconstituição histórica do itinerário das profissões médico-sociais e do trabalho social em Portugal na I e II República, privilegiando o período 1910-1945, elucidar as dinâmicas sociais e políticas que se articulam no processo de emergência e de desenvolvimento das profissões sociais em Portugal. Em termos sintéticos, apresentam-se agora algumas hipóteses interpretativas mais sugestivas e heurísticas que emergiram da análise das fontes e estudos considerados.

Os movimentos sociais e profissionais, higienista e de medicina social, são os grandes impulsionadores da emergência de novas profissões médico-sociais em Portugal nos primeiros 50 anos da República Portuguesa.33

A forte consciência da dimensão social dos grave problemas de saúde pública e a defesa de uma nova assistência pública e da criação de novas profissões neste domínio, não foram no entanto bastantes para conduzir às reformas sociais e à criação das profissões requeridas.

As dificuldades económicas e financeiras associadas à Guerra e a instabilidade política no decurso da I República, a par do programa do republicanismo, estão na base do adiamento das medidas reclamadas pelo movimento higienista e de medicina social.

Neste quadro, este movimento apoia-se no voluntariado como compensação da ausência dos recursos humanos especializados requeridos pelas missões de promoção e defesa da saúde pública, e será no contexto sociopolítico saído do golpe militar de 1926 que serão tomadas as primeiras medidas de institucionalização de novas ocupações profissionais médico-sociais.

A influência europeia e norte-americana no domínio da saúde pública, movimento hospitalar e serviço social, então em institucionalização, impulsionou o movimento de medicina social numa orientação pautada por critérios científicos e de racionalidade.

As iniciativas que vieram a ter lugar no quadro da institucionalização do Estado Novo apresentam dimensões de continuidade e de rutura com a I República: o programa formal retoma reformas preconizadas (racionalidade técnico-científica da formação dos profissionais), mas imprime-lhe uma orientação mais vincadamente ideológica, ao conferir à ação das novas profissões e ocupações uma missão moralizadora das famílias e classes pobres.

O perfil e programa de formação destas profissões resulta, assim, numa combinação da orientação da medicina social, da Escola de Ciência Social de Le Play, e da ideologia conservadora do Estado Novo na construção da figura da visitadora como elemento paradigmático da profissionalidade emergente no âmbito médico-social.

O itinerário das profissões médico-sociais e do trabalho social estrutura-se em torno de duas fileiras. Uma primeira centra-se  na visitadora, a qual se apresenta com um caráter fragmentário, um número relativamente reduzido de efetivos e uma existência relativamente efémera. Uma segunda, assente na institucionalização da profissão de assistente social, caracterizada por um ciclo de formação longo e um perfil profissional diferenciado, de enquadramento, a qual, progressivamente, se constitui como a profissão do trabalho social mais consolidada em Portugal.

Esta nova profissionalidade conjuga-se no feminino, constituindo-se um arquétipo das profissões médico-sociais e do trabalho social como tipicamente femininas. Esta dimensão está presente desde logo na admissão às formações especializadas, mas também nas qualidades apontadas para o desempenho profissional.

Concluindo, o trabalho de cariz exploratório realizado abriu diversas perspetivas de investigação a que importa dar continuidade, no sentido do aprofundamento do conhecimento sobre a emergência e desenvolvimento destas profissões e da sua interpretação sociohistórica devidamente contextualizada. Assim, de acordo com a perspetiva que orienta este trabalho, as ocupações e profissões sociais emergem em resposta a problemas e necessidades sociais, e o seu itinerário histórico corporiza projetos societários, histórica e socialmente contextualizados (Groulx, 1999; Mayer, 2002; Morales e Sheafor, 2002). Neste entendimento, os períodos de crise e de mutação social, cultural e política mais profunda influenciam de forma direta e significativa os itinerários, orientações e práticas das profissões sociais, pelo que o estudo mais desenvolvido do contexto sociohistórico da I República e do Estado Novo se afigura indispensável para uma interpretação mais densa e rigorosa do itinerário e dos projetos que tais profissões sociais corporizam. Inclui-se, igualmente, neste âmbito, embora com relativa autonomia, um aprofundamento do estudo sobre o movimento da medicina social e de outros movimentos sociais e científicos relevantes, procurando aprofundar o conhecimento da sua génese, pensamento das suas figuras proeminentes, e sua articulação com o regime e movimentos católicos no contexto do Estado Novo. Neste âmbito, procurar-se-á apurar em especial o papel da Igreja na dinamização de visitadoras sociais e de outras ocupações médico-sociais, designadamente através de algumas das suas mais representativas organizações, como a Ação Católica Portuguesa.

Do mesmo modo, o “leplaysianismo português”, que, na linha da argumentação de Ágoas (2013), jogou um importante papel na emergência e institucionalização da sociologia e das ciências sociais em Portugal e assumiu uma particular influência na formação e orientação das profissões médico-sociais e das profissões do trabalho social no nosso país, deverá ser considerado nas análises que se vierem a realizar sobre estas profissões.

Num outro plano, importa proceder a uma exploração de um acervo mais amplo de fontes primárias sobre as profissões médico-sociais e do trabalho social, sobetudo aquelas que permitam analisar as práticas e dinâmicas sociais a partir dos relatos, testemunhos, e pontos de vista das próprias profissionais e de outros atores relevantes, pois só desta forma será possível ultrapassar os limites de uma análise como aquela que aqui se privilegiou, baseada no essencial em textos jurídicos-legais e/ou doutrinários. Atente-se, a título exemplificativo, na referência que Pimentel nos apresenta, com base na análise dos arquivos da organização nacional Defesa da Família (1936-1939)34, a propósito da ação das visitadoras sociais35:

 

[…] as visitadoras sociais da DF esclareceram sempre que a sua acção não era uma obra de beneficência, mas um serviço social com o objectivo de debelar as causas da miséria. Entre estas, as visitadoras davam relevo ao desemprego, que transformava os que atingia em “incuráveis física e moralmente”, atirando-os para o círculo vicioso da casa de penhores, da sopa dos pobres e da mendicidade.

Diga-se porém que o contacto de muitas dessas “servidoras sociais” com a realidade da miséria extrema quase as conduziu por vezes a formular críticas abertas ao regime, como se pode ver nos relatórios dos inquéritos que elas realizavam, que dão um impressivo e dramático relato das condições de vida de miséria das famílias visitadas [Pimentel, 2011, p. 101].

 

Num plano de investigação mais específico, será importante alcançar um maior conhecimento sobre as dinâmicas de articulação entre as profissões (movimentos de fusão e recomposição - cf. figura 2), sobre a periodização de algumas profissões e seus contingentes e sobre o processo de institucionalização destas profissões no contexto colonial.

 

 

Num âmbito mais alargado, será pertinente o alargamento do estudo a outras profissões como a enfermagem, a educação de infância e professores, bem como o aprofundamento da perspetiva de género no estudo das profissões sociais.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

LEGISLAÇÃO E PUBLICAÇÕES OFICIAIS RELATIVAS À REGULAMENTAÇÃO DAS PROFISSÕES SOCIAIS

 

A.          VISITADORAS SANITÁRIAS

                Decreto n.º 20 376, de 12 de outubro de 1931.

B.            ENFERMEIRAS VISITADORAS SANITÁRIAS

                Decreto n.º 19 460, de 13 de março de 1931.

C.           VISITADORAS ESCOLARES

                Portaria n.º 9 360, de 30 de outubro de 1939.

                Decreto-lei n.º 25 676, de 25 de julho de 1935, procede à criação de lugares de visitadoras escolares.

                Decreto-lei n.º 37 869, de 29 de junho de 1950, procede à criação de lugares de visitadoras escolares.

D.           ASSISTENTES SOCIAIS E ASSISTENTES FAMILIARES

                Decreto-lei n.º 30 135, de 14 de dezembro de 1939, procede à regulamentação do curso de assistente de serviço social.

                Decreto-lei n.º 36 914, de 14 de junho de 1948, fixa nova duração para o plano de estudos do curso de assistente de serviço social.

                Decreto-Lei n.º 40 678, de 10 de julho de 1956, fixa a duração da formação de assistentes sociais e cria os cursos de assistente familiar e monitora familiar.

                Portaria n.º 15 972, de 18 de setembro de 1956, aprova o plano de estudos dos cursos de serviço social, assistente e monitoras familiares.

                Portaria n.º 15 973, de 18 de setembro de 1956, equipara o curso de educação familiar professado no Instituto de Serviço Social de Lisboa de 1935 a 1950 e na Escola Normal Superior de Coimbra de 1948 a 1955 ao curso normal de educação familiar criado pelo Decreto-Lei n.º 40 678.

                Decreto n.º 44 159, de 18 de janeiro de 1962, cria os Institutos de Educação e Serviço Social nas províncias ultramarinas, autorizando o funcionamento do curso de Assistentes Sociais, entre outras formações.

                Portaria n.º 19 091, de 26 de março de 1962, aprova os plano de estudo do curso de Serviço Social a ministrar nos Institutos de Educação e Serviço Social nas províncias ultramarinas.

                Decreto n.º 44 774, de 6 de dezembro de 1962, revê as condições de admissão aos cursos ministrados nos Institutos de Educação e Serviço Social.

E.            AUXILIARES SOCIAIS

                Decreto-lei n.º 36 219, de 10 de abril de 1947, cria, no âmbito das escolas de enfermagem, a formação de auxiliares de serviço social.

                Decreto-lei n.º 38 884, de 28 de agosto de 1952, funde os cursos de visitadora sanitária e de auxiliar de serviço social no novo curso de auxiliares sociais.

                Portaria n.º 14 391, de 19 de maio de 1953, cria a Escola de Auxiliares Sociais de S. Pedro de Alcântara.

                Portaria n.º 14 452, de 9 de julho de 1953, aprova o Regulamento da Escola de Auxiliares Sociais de S. Pedro de Alcântara.

F.           EDUCADORAS SOCIAIS

                Decreto n.º 44 159, de 18 de janeiro de 1962, cria os Institutos de Educação e Serviço Social nas províncias ultramarinas, autorizando o funcionamento do curso de Educadoras Sociais.

                Portaria n.º 19 091, de 26 de março de 1962, aprova os plano de estudo do curso de Serviço Social, do curso de Educadores Sociais, na suas diferentes especializações a ministrar nos Institutos de Educação e Serviço Social nas províncias ultramarinas.

 

OUTRA LEGISLAÇÃO E PUBLICAÇÕES OFICIAIS

 

Parecer n.º 37/VI da Câmara Corporativa, de 31 de março de 1956, relativo às alterações ao Decreto-lei n.º 30 135 (organização e funcionamento dos Institutos de Serviço Social), atas da Câmara Corporativa, n.º 83/1956.

Parecer da Câmara Corporativa acerca da proposta de lei sobre o Estatuto da Assistência Social. Diário das Sessões n.º 48, de 25 de fevereiro de 1944.

 

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Recebido a 29-01-2014. Aceite para publicação a 16-09-2014.

 

NOTAS

1 Apresentam-se neste artigo alguns resultados de um projeto de investigação em curso sobre Serviço Social e Profissões Sociais em Portugal: Dinâmicas e Tendências.

2 V. parecer da Câmara Corporativa sobre o Estatuto da Assistência Social, de 25 de março de 1943, p. 105, de que foi relator Marcelo Caetano.

3 No trabalho Génese, Emergência e Institucionalização do Serviço Social Português, de Alcina Martins (1999, cap. II), em que nos apoiamos, a autora recenseia várias iniciativas que envolviam a figura das visitadoras benévolas, mormente a instalação em Portugal da Congregação das Servas dos Pobres (1819), a criação das primeiras conferências de São Vicente de Paulo (1859) e uma versão portuguesa da Associação das Damas da Caridade (1862).

4 Deve ser sublinhado o papel de Costa Sacadura, membro da Sociedade de Ciências Médicas e um dos seus mais destacados presidentes.

5 Apresenta-se igualmente como fator de grande relevância para a compreensão da ineficácia do republicanismo no campo das reformas sociais, as próprias características estruturais, à época, da sociedade portuguesa. Num interessante trabalho sobre as reformas do republicanismo neste domínio, José Luís Cardoso e Maria Manuela Rocha, analisam, de forma aprofundada, o contexto e experiência da implementação do sistema de seguros sociais obrigatórios, mostrando que a não concretização daquele programa se ficou a dever menos à falta de empenho e apoio político, mas antes a dificuldades decorrentes do contexto económico e do desajustamento das suas bases programáticas e operativas às características estruturais da sociedade portuguesa (Cardoso e Rocha, 2009).

6 A título exemplificativo, atente-se no que ocorreu com a institucionalização do Serviço Social como profissão, a qual foi antecedida por importantes movimentos voluntários, designadamente nos EUA e Reino Unido, nos quais os movimentos das Charity Organization Societies (COS) e o movimento dos Settlements Houses emergem como resposta às questões social e urbana na sociedade americana e inglesa. A primeira Charity Organization Society foi fundada em Inglaterra, em 1869, por Octavia Hill, tendo-se posteriormente difundido de forma rápida nos Estados Unidos entre 1877 e 1920. O movimento Settlement Houses teve início com o estabelecimento do Toynbee Hall em Londres, em 1884. Os primeiros settlements americanos foram fundados em Boston, Nova Iorque e Chicago, sendo o mais conhecido e influente a Hull House de Chicago, fundado por Jane Addams e Ellen Gates, em 1889 (Mink e O’Connor, 2004, pp. 143 e 656).

7 A importância dos dispensários de higiene social na luta contra as doenças venéreas é atestada por múltiplas publicações e relatórios de médicos higienistas (e.g.: Tovar de Lemos, Para Erradicar a Sífilis Criemos Dispensários, de 1935, e Regras da Profilaxia para Evitar as Doenças Venéreas, de 1936, do dispensário de higiene social de Lisboa).

8 Esta dimensão pode ser comprovada pelo papel cometido a Serras e Silva, na reestruturação dos serviços de saúde escolar e na edição da revista A Saúde Escolar, de que foi diretor (Martins, 1999,  cap. III).

9 A Portaria n.º 9 360 confia a formação das visitadoras escolares à OMEN, a quem autoriza a instituir em Coimbra, Lisboa e Porto o curso de visitadoras escolares.

10 Alguns autores sustentam a tese de que o movimento de medicina social se alia ao objetivo de “evangelização da sociedade” e das classes trabalhadoras, em concordância com a filosofia social da Igreja (Carvalho e Mouro, 1987, p. 68). Na hipótese que emerge da pesquisa que vimos realizando, as preocupações higienistas e de medicina social em Portugal são, em primeira instância, ditadas por uma racionalidade modernizadora técnico-científica, pelo que a hipótese interpretativa avançada na obra em referência, pouco sustentada em evidência empírica, deverá ser tida em consideração em investigação futura.

11 A declarada admissão preferencial de mulheres solteiras ou viúvas, e por consequência a exclusão de mulheres casadas, pode ser entendida à luz não só de uma conceção maternalista das profissões sociais, associada à diferente natureza da mulher, mas igualmente à ideologia do Estado Novo relativamente à família e à função social da mulher, à qual uma vez casada competia o papel mais belo, mais alto e útil, de defesa e regeneração da família (v. sobre este assunto, entre outros, Pimentel, 2011, parte I).

12 O Quadro 1, que ilustra o itinerário histórico das profissões médico-sociais e do trabalho social na I e II Repúblicas em Portugal, foi elaborado com base na legislação que regulamenta a sua formação e enquadramento profissional. Esta dimensão formal, sendo naturalmente relevante para o objetivo deste trabalho, não esgota outras requeridas por uma análise sociohistórica mais aprofundada, não dando suficientemente conta das dinâmicas e práticas sociais que lhe subjazem.

13 Conforme se assinalou, esta formação foi realizada no Instituto de Serviço Social, em Lisboa, entre 1935 e 1950) e na Escola Normal Social, em Coimbra, no período de 1940 a 1955, sendo apenas reconhecida em 1956, pela equiparação a Monitora Familiar pelo Decreto-Lei n.º 40 678, de 10 de julho de 1956. Como se pode ler na exposição de motivos do referido diploma, “igualmente se considera necessário fixar a orgânica dos cursos de educação familiar, até hoje ainda não aprovados oficialmente, mas cuidadosamente experimentados desde 1936, o que permite adoptá-los com segurança, como sendo os mais adequados às necessidades e possibilidades da atual situação portuguesa[…]”. V. também Martins (1999, p. 263).

14 Excetuava-se a formação das Enfermeiras Visitadoras Sanitárias, com a duração de um ano, seguido de seis meses de estágio, a que não será estranho o seu enquadramento pelas Faculdades de Medicina. Não foi possível colher elementos precisos que permitam caracterizar a formação das Educadoras Familiares, cuja particularidade em termos de processo de institucionalização foi já assinalada (cf. nota 10).

15 A trajetória das profissões médico-sociais e do trabalho social em Portugal sofreu diversas influências, sendo no entanto as mais marcantes de extração francófona. A comparação da trajetória registada em França com a que ocorreu em Portugal permite, sem prejuízo das suas especificidades, identificar muitos aspetos semelhantes. A este respeito veja-se, designadamente, Bouquet e Garcette (2005).

16 A título de exemplo, o Decreto-lei n.º 37 869, de 29 de junho de 1950, que apresenta o quadro de médicos e visitadoras escolares, permite verificar a existência de 42 visitadoras escolares, contingente que corresponde a um período de 7 anos (1933 a 1940), no qual esta formação foi assegurada.

17 As visitadoras sanitárias, reconhecidas publicamente em 1931, foram em 1952 substituídas pelas auxiliares sociais, cuja formação tinha entretanto sido iniciada em 1947, com fundamento no facto de se estar face a um perfil similar, mas mais qualificado (DL 38 884, de 28 de agosto de 1952, art.º 12.º).

18 O Instituto de Orientação Profissional (IOP) foi criado em 1925 no âmbito da Provedoria Central de Assistência, por influência de Faria de Vasconcelos, professor da Faculdade de Letras e da Escola Normal Superior de Lisboa. Faria de Vasconcelos, regressado a Portugal após o seu doutoramento em Ciências Sociais em Bruxelas, pretendia impulsionar a psicologia experimental infantil. Estando vocacionado para a seleção e orientação profissional das crianças e jovens acolhidos nas instituições de assistência, o IOP foi integrado, em 1926, no Instituto de Seguros Sociais e de Previdência-Geral vendo as suas competências alargadas aos serviços tutelares de menores. Foi neste âmbito, progressivamente alargado, que o IOP desenvolveu várias iniciativas de formação do seu pessoal, tendo em vista, entre outros propósitos, a sua preparação em serviço social de casos individuais (Martins, 1999, cap. IV). É neste contexto que o então diretor-geral dos Serviços Jurisdicionais de Menores afirmava que “a preparação do pessoal, à falta de uma Escola de Serviço Social, tem-se realizado por todos os meios ao alcance, conferências, lições, palestras, etc.” (Martins, 1999, p. 192).

19 Merece igualmente menção a defesa da criação de Escolas de Serviços Social no III Congressos das Misericórdias, em 1932, no qual Pereira Ferraz, segundo a perspetiva sustentada pelo médico e higienista social René Sand, na I Conferência Internacional de Serviço Social em Paris, propôs a “criação de escolas de higienistas, de enfermeiras (…) e de escolas de Serviço Social” (III Congresso das Misericórdias, 1935, p. 123, citado por Santos, 2011, p. 673).

20 Este Instituto foi criado como estabelecimento de ensino particular, feminino, por iniciativa do Patriarcado, tendo por suporte jurídico a Associação de Serviço Social, instituição com fins de cultura e formação social.

21 Esta Escola foi criada por iniciativa das Irmãs Franciscanas Missionárias de Maria, com o apoio de Bissaya Barreto, presidente da Junta da Província da Beira Litoral. Em 1949, o seu alvará foi concedido a esta Junta.

22 Para uma análise mais detalhada da emergência e institucionalização do serviço social e da formação em serviço social em Portugal veja-se Branco e Fernandes (2005) e Branco (2010).

23 Como Braga da Cruz (1999, pp. 233-243) assinala, dadas as novas perspetivas de “reconhecimento público, prestígio e capacidade de influência, tanto ao nível da sociedade, como ao nível do Estado” abertas pelo instauração do Estado Novo, “não é de estranhar a atitude colaborante que patenteia a Igreja com a instauração do novo regime que, nos terrenos político, social, educativo e colonial, abre perspetivas particularmente apreciáveis à Igreja e à sua acção” (p. 234). Também a análise de Matos Ferreira (1999, pp. 257-269) aponta no mesmo sentido, quando assinala que as primeiras gerações de católicos, e designadamente a segunda geração, nasce e forma-se “num quadro eclesial e político marcado pelo princípio da união; encarou o Estado Novo como favorável à cristianização da sociedade”, tendo o seu protagonismo girado em torno da Acção Católica (Ferreira, 1999, p. 258). O afastamento e ruturas entre os católicos e o Estado Novo tem o seu início, segundo o autor, com a progressiva tomada de consciência da natureza do projeto corporativo, e acentua-se particularmente a partir dos anos 50 e da realização do Concílio Vaticano II.

24 O plano de estudos de 4 anos tinha já sido adotado pelas escolas de formação desde os anos 40 (Martins, 1995, p. 45).

25 O Parecer n.º 37/VI da Câmara Corporativa, de 31 de março de 1956, fornece informação e explicação relevante sobre um dos fundamentos desta reformulação. Esclarece o parecer que “O número de educadoras familiares diplomadas desde o ano de 1937-1938 até ao ano de 1954-1955 foi apenas de trinta e oito. (A diferença do número entre estas e as assistentes sociais, cento e trinta e seis, de 1936-1937 a 31 de Dezembro de 1955, explica-se, talvez, por o curso de educação familiar não estar oficializado e, possivelmente, pelo prestígio da palavra “social”) (ponto 36, p. 787)”. Outra dimensão explicativa fornece-a o mesmo parecer ao manifestar a concordância da Câmara com a criação dos dois tipos de trabalhadoras sociais: “no meio português, onde a família é ainda a base fundamental da sociedade, mas onde começam a falhar certas virtudes familiares e a organização doméstica é bastante deficiente, os cursos de educação familiar, quer para habilitar profissionais para funções diretivas e formativas, quer para preparar raparigas para mais perfeita compreensão e desempenho da sua missão familiar, só podem ser úteis (ponto 34, p. 787)”.

26 Decreto-lei n.º 40 678.

27 Para uma informação e análise detalhada veja-se Pimentel (2011, pp. 164-389), dedicada à Obra das Mães pela Educação Nacional no contexto do projeto ideológico e político do Estado Novo relativo à mulher. A intencionalidade do regime no que respeita à família está claramente expressa no Parecer n.º 37/VI da Câmara Corporativa, de 31 de março de 1956, relativo às alterações da organização e funcionamento dos Institutos de Serviço Social. Neste documento sublinha-se, de forma particularmente enfática, a relevância da educação familiar e da educação familiar rural, como os novos grandes desafios abertos pelo Decreto-lei n.º 30 135.

28 No âmbito do trabalho exploratório até agora realizado não foi possível recolher suficiente informação sobre a o funcionamento dos cursos de educação social e monitoras de família nos IESS, mormente em Luanda, onde foi criado o Instituo Pio XII, e ainda sobre o seu período de funcionamento e efetivos diplomados. Não sendo, nestas condições, possível analisar o significado e alcance destas formações no itinerário das profissões sociais em Portugal, é importante assinalar, contudo, que no que respeita ao curso de educação social, a sua criação e funcionamento no âmbito dos IESS se pode configurar como um marco relevante para o seu estudo, pois representará a sua institucionalização no nosso país, contrariando assim a tese que situa a sua emergência nos anos 70, como curso técnico-profissional ao nível do ensino secundário, e a criação, nos anos 90, dos cursos de bacharelato em Educação Social (Azevedo, 2011, p. 53). A Portaria n.º 19 091, de 26 de março de 1962, que aprova os planos de estudos dos diferentes cursos, constitui um exemplo da matriz histórica de orientação da educação social que importa considerar, sem prejuízo de uma leitura sociohistórica do seu contexto.

29 A mesma orientação se observa para o Curso de Agentes de Educação Familiar Rural (Pimentel, 2011, quadro XVI).

30 Particularmente ilustrativa é a defesa por Bissaya Barreto, na sua comunicação ao I Congresso da União Nacional, de que caberia à mulher o exercício da medicina social, pela sua experiência nas organizações médico-sociais como enfermeira e visitadora e porque, pelo seu espírito as suas qualidades lhe permitiriam “reunir boas vontades, congregar valores, sistematizar esforços, angariar donativos e organizar instituições que vivem do seu método, da sua tenacidade, do seu desinteresse, do seu coração” (Bissaya Barreto, 1935, citado por Martins (1999, p. 225).

31 Na medicina observou-se, no entanto, uma dinâmica de reversão da feminização da profissão, mormente quando se analisa a questão do ponto de vista dos contingentes de homens e mulheres na profissão médica. Esta dinâmica é comprovada quer pelo número de alunas que concluíram o curso de Medicina nos anos 40 e 60 (Pimentel, 2011, quadro VIII), quer pela inscrição na Ordem dos Médicos em anos mais recentes (Machado, 2003, quadro 2). No entanto, como sublinha Machado (2003, p. 129), essa mutação que se regista de modo consistente, não se traduz no acesso das mulheres às especialidades mais prestigiadas e recompensadas, ou a cargos de chefia e direção, constatando-se a persistência do que a autora designa como especialidades “Cinderela”.

32 Parecer n.º 37/VI da Câmara Corporativa, de 31 de março de 1956, ponto 6.

33 Ainda que com menor relevo, devem referir-se igualmente o movimento psiquiátrico e o movimento de psicologia experimental (Martins, 1999).

34 Com base no Arquivo de Salazar, AOS/CO/IN-9-A, referenciado por Pimentel (1999, p. 494).

35 Esta referência à categoria profissional de visitadoras sociais não é clara, pois na nossa pesquisa não encontrámos qualquer iniciativa ou regulamentação associada a esta designação. Admite-se, assim, que se trata de uma formulação por adaptação da figura da visitadora nas diferentes formas que ela enformou no nosso país. Trata-se de matéria a esclarecer.

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