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Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia

versão impressa ISSN 0430-5027

Finisterra  no.117 Lisboa ago. 2021  Epub 01-Ago-2021

https://doi.org/10.18055/finis19241 

Artigo

O olival como oportunidade para o turismo no parque natural do tejo internacional

The olive grove as an opportunity for tourism in the international tagus nature reserve

L’oliveraie comme une opportunité de tourisme dans le parc naturel du tage international

El olivar como oportunidad para el turismo en el parque natural de tajo internacional

Dora Isabel Rodrigues Ferreira1 
http://orcid.org/0000-0001-8628-9359

José Manuel Sánchez Martín1 
http://orcid.org/0000-0002-4711-3542

1 Faculdade de Empresa, Finanças e Turismo, Universidade de Extremadura, Avda. Universidade, s/n, 10003, Cáceres, España. E-mail: drodrigucc@alumnos.unex.es; jmsanche@unex.es


Resumo

Apesar do olival estar contemplado na lista do Património Cultural Imaterial da Humanidade, com interesse de preservação e desenvolvimento, existem territórios onde as paisagens olivícolas apresentam marcas do tempo e de abandono, especialmente nos territórios mais remotos. Porém, a “triologia” que agrega natureza, património e cultura parece conferir ao olival um cenário inesperado para ancorar novos usos do território, designadamente com a valorização de dinâmicas turísticas que apostem nos seus produtos, gastronomia, elementos da paisagem e o seu usufruto. E é nesta simbiose que pode ser ancorado o agroturismo, o ecoturismo ou o olivoturismo, modalidades que valorizam a agricultura e a natureza, que incluem também a valorização económica e social das comunidades rurais. O presente estudo avalia o olival como potencial turístico no Parque Natural do Tejo Internacional (PNTI), onde se mantêm preservados os terraços de olival, com o sustento dos tradicionais muros de pedra seca. Foram inventariados os produtos, recursos e atividades turísticas e analisados os indicadores, nomeadamente: valores científicos, educativos e turísticos do olival. Os resultados permitem concluir que o olival no PNTI pode ser aproveitado enquanto recurso turístico para atrair visitantes para este destino de fronteira, particularmente assente numa estratégia de turismo sustentável.

Palavras-chave: Parque Natural do Tejo Internacional; olivoturismo; paisagens culturais; potencial turístico; turismo sustentável

Abstract

Although the olive grove is contemplated in the list of Intangible Cultural Heritage of UNESCO with the intent to preserve and develop it, there are territories where the olive landscapes show some signs of ageing and abandonment, especially in remote areas. However, the “trilogy” that brings together nature, heritage and culture seem to provide olive groves with an unexpected framework to encourage the new land uses, namely through the valorisation of touristic dynamics that rely on the enjoyment of gastronomy and landscape elements. And it is in this symbiosis that olive oil tourism can be anchored in agritourism, ecotourism or olive oil tourism, modalities that value agriculture and nature, which include the environmental, economic, and social development of rural communities as well. The present study evaluates the olive grove as a tourist potential in the International Tagus Natural Park (PNTI), where stone wall terraces are maintained and preserved to sustain the traditional olive trees. Data on touristic products, resources and activities were listed, and some indicators were evaluated, specifically: scientific, educative and tourist values of the olive grove. The results concluded that the olive grove at PNTI can be used as a tourist resource to attract tourists to this cross-border destination, especially based on a sustainable tourism strategy.

Keywords: International Tagus Nature Reserve; olive oil tourism; cultural landscapes; touristic potential; sustainable tourism

Résumé

Bien que l’oliveraie soit inscrite sur la liste du Patrimoine Culturel Immatériel de l’Humanitéde l’UNESCO, avec un intérêt de préservation et de développement, il existe des territoires où les paysages d’oliviers sont marqués par le temps et part l’abandon, surtout dans les zones rurales isolées. Cependant, la “triologie” qui joint nature, patrimoine et culture semble donner à l’oliveraie un cadre inattendu pour ancrer des nouveaux usages du territoire, notamment avec la valorisation de dynamiques touristiques qui misent sur les produits, la gastronomie, les éléments du paysage et leur jouissance. Et c’est dans cette symbiose que l’agritourisme, l’écotourisme ou l’oléotourisme peuvent être ancrés, en tant que modalités qui valorisent l’agriculture et la nature, et qui incluent également le développement environnemental, économique et social des communautés rurales. Cette étude évalue les oliveraies comme potentiel touristique dans le Parc Naturel du Tage International (PNTI), où les terrasses d’oliviers avec le soutien de murs en pierre sont préservées. Pour cela, des produits, des ressources et des activités touristiques ont été inventoriés et des indicateurs ont été analysés: valeurs scientifiques, éducatives et touristiques de l’oliveraie. Les résultats montrent que l’oliveraie du PNTI peut être utilisée comme ressource touristique pour attirer les visiteurs vers une destination frontalière, en particulier sur la base d’une stratégie de tourisme durable.

Mot clés: Parc Naturel du Tage International; oléotourisme; paysages culturels; potentiel touristique; tourisme durable

Resumen

A pesar de que el olivar forma parte de la lista del Patrimonio Cultural Inmaterial de la UNESCO, con el fin de preservarlo y desarrollarlo, existen territorios donde los paisajes olivícolas dan muestras de envejecimiento y de abandono, especialmente en áreas remotas. Sin embargo, la “trilogía” que agrega naturaleza, patrimonio y cultura parece conferir al olivar un escenario inesperado para desarrollar nuevos usos del territorio, como la revalorización de los productos, la gastronomía, los elementos del paisaje e implicando a la población local. Esa simbiosis puede sustentar el agroturismo, el ecoturismo y el oleoturismo, modalidad que ponen en valor la agricultura y la naturaleza, que incluye también la revalorización ambiental, económica y social de las poblaciones locales. El estudio evalúa el olivar como potencial turístico en el Parque Natural de Tajo Internacional (PNTI), donde se conservan terrazas de olivos, con el apoyo de muros tradicionales de piedra seca. Fueron inventariados los productos, recursos y actividades turísticas, y analizados algunos indicadores, específicamente: valores científicos, educativos y turísticos relacionados con el olivar. Los resultados permiten concluir que el olivar del PNTI se puede utilizar como recurso turístico para atraer visitantes hacia este destino de frontera, particularmente se basa en una estrategia de turismo sostenible.

Palabras-clave: Parque Natural de Tajo International; olive-turismo; paisajes culturales; potencial turístico; turismo sustentable

I. Introdução

A atividade agrícola contribui para a preservação de vasto património, considerado como herança dos modos de vida e do “saber-fazer”, preservado pelos agricultores e pelas comunidades rurais; porém vive na atualidade o desafio de salvaguarda da história e das tradições que a envolvem. Ao mesmo tempo, enfrentam-se os desafios do abandono da agricultura e das áreas rurais, fenómenos que se generalizam em grandes manchas do território europeu (Zagaria et al., 2018). Porém, o seu desaparecimento significa uma perda para o futuro (Sun et al., 2011) e, por isso, a conservação das paisagens produtivas como testemunhas de habitats ambientais e culturais são um desafio que pode abrir novas perspetivas ao uso do território, especialmente se se considerar que a génese da agricultura sustentável se encontra nos sistemas agrícolas tradicionais (Daugstad et al., 2006). Nesta dimensão, encontram-se vocações diversas, designadamente, uma paisagem para a recreação, para a educação e para a conservação e produção de bens públicos, desde o património rural aos valores sociais, à natureza, fortalecendo desse modo as funções da economia agrícola que considera a produção de alimentos e os serviços de agroturismo (Corti et al., 2010).

Efetivamente, as paisagens agrárias tradicionais fornecem valores culturais e serviços ecológicos à humanidade e dão origem a uma grande diversidade de paisagens multifuncionais (Sun et al., 2011), caracterizadas, não apenas pelo cenário natural, mas também pelas suas gentes, as que lá vivem e as que lá trabalham, as infraestruturas que lhes dão suporte e todo o património cultural e histórico envolvente (Carneiro et al., 2015). O valor patrimonial das paisagens agrícolas resulta “dos aspetos físicos ou naturais e incidências da evolução histórica” (Medeiros, 1991, p. 109), mas também das relações que se estabelecem entre os sistemas ecológicos e a estrutura sociocultural (Belli, 1998, in Cavaco, 2005), podendo traduzir-se em paisagens culturais (Barrett & Mitchell, 2016; Maldonado et al., 2019). Na literatura é possível detetar a abordagem das paisagens culturais como reservatório de memória, identidade e entidade viva da sociedade (Luengo, 2011) e, por isso, é tão importante preservar a autenticidade e a integridade do património agrícola, tal como preconiza a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (The United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization [UNESCO]), proclamando a defesa do património cultural e natural (UNESCO, 1972) e a defesa do património imaterial (UNESCO, 2003), que em determinados contextos, convém referir, se trata de contextos agrícolas onde o seu significado estético, cultural e ambiental supera o valor económico da produção (Cavaco, 2005). A este respeito, Assandri et al. (2018) demonstram que a agricultura em modelos de produção extensivos, de baixa escala, não é mais do que um reservatório de sinergias entre a biodiversidade e os serviços culturais e que existe, por isso, uma correlação positiva com as atividades de recreação e lazer, através das quais é possível um retorno económico (Daniel et al., 2011). Apesar da literatura dar conta de que existem ainda escassos estudos sobre a valorização do património agrícola e da própria atividade na perspetiva do desenvolvimento do turismo, sabe-se que o mercado nostálgico, aquele que procura as “raízes” e a “autenticidade” tem vindo a contribuir para a solidificação de um mercado que valoriza as práticas tradicionais e os produtos de qualidade, muitas vezes associada à valorização da sustentabilidade (Streifeneder, 2016), e que pode ter formas de consumo através das experiências de agroturismo (Flanigan et al., 2014), ou mais frequentemente abordado na literatura, a valorização das vinhas tradicionais com o enoturismo (Buckley et al., 2008; Hall et al., 2000, in Sun et al., 2011). São ainda detetados estudos que apontam caminhos para a valorização de paisagens olivícolas como património cultural, abordando o seu potencial turístico, quer do ponto de vista da utilização do olival, do azeite, quer de outros produtos transformados (Bezerra & Correia, 2018; Duarte Alonso, 2010; Luengo, 2011; Vásquez de la Torre et al., 2015, 2017) ou do património industrial, como é o exemplo dos lagares tradicionais, valorizados igualmente como recurso turístico (Yüceer et al., 2018; Vehbi et al., 2019). A este respeito, assumindo que a paisagem do olival é um recurso primordial para o desenvolvimento do turismo, a UNESCO lançou em 2013 o projeto “Rotas da Azeitona: itinerário da cultura e do desenvolvimento sustentável, diálogo e paz entre os povos do Mediterrâneo”, partindo do pressuposto de que a oliveira molda uma grande variedade de paisagens e culturas vivas. Em 2019, foi anunciado, também pela UNESCO, o dia Mundial da Oliveira, assinalado a 26 de novembro, reforçando o seu papel na paisagem para o desenvolvimento económico e social sustentável.

As práticas de “Olivoturismo”, frequentemente designadas na literatura por Olive oil tourism (Vásquez de la Torre et al., 2017) ou Oleotourism (Millán et al., 2018; Tregua et al., 2018), são apresentadas como uma alternativa da oferta que favorece o uso racional dos recursos naturais e humanos, baseados na ecologia e sustentabilidade económica e social (Campón-Cerro et al., 2014) e apresentado como atividade que tem a ver com o azeite e os recursos associados ao olival, desde as características topográficas, a água, a paisagem, a cultura ou o clima (Morales et al., 2015). Os últimos autores apresentam o olivoturismo como atividade que gera benefícios para o desenvolvimento rural, ao incrementar novas formas de exploração e ao agregar novas sinergias entre diferentes setores económicos, fomentando, por isso, novos empregos e mais empregos qualificados. O mercado turístico tem assistido a tendências do lado da procura que valoriza as experiências que promovem a interação com a cultura, a gastronomia e o terroir dos destinos, na busca de novas sensações e aprendizagens (Getz et al., 2014), à medida que o turista tem um envolvimento mais participativo e emotivo com as comunidades locais (cf. Richards & Wilson, 2006, in Bezerra & Correia, 2018). É neste contexto que os destinos com características rurais e com forte vocação agrícola, ao permitirem o contacto com a natureza, com as comunidades, com as tradições e com a gastronomia local, merecem destaque na hora de promover a oferta de experiências únicas. No caso do potencial do olival como recurso turístico, é possível destacar algumas atividades que envolvem a participação ativa do turista. De acordo com vários autores enumeram-se alguns exemplos (Bezerra & Correia, 2018; Duarte Alonso, 2010; Morales et al., 2015; Vásquez de la Torre et al., 2017):

  • Experiências sensoriais como a degustação de azeite ou pratos típicos onde o azeite é o elemento gastronómico de destaque;

  • Experiências culinárias com a aprendizagem de pratos ou produtos especiais (ex.: bica de azeite típica da região da Beira Baixa);

  • Experiências de preparação de sabonetes e outros cosméticos à base de azeite;

  • Experiências de saúde e bem-estar com recurso ao azeite ou produtos derivados;

  • Experiências ativas que envolvam a participação em tarefas como a apanha da azeitona;

  • Visitas a centros de interpretação e museus do azeite e do olival;

  • Visitas a lagares ativos ou lagares tradicionais;

  • Visitas a olivais milenares;

  • Percursos pedestres ou rotas temáticas no olival ou ao património associado aos lagares;

  • Compra de azeite, azeitona e produtos transformados;

  • Festivais temáticos dedicados ao azeite e à azeitona;

  • Usufruir do silêncio, da paisagem, da biodiversidade, da cultura e do património associado ao olival e envolvente natural/rural.

Podem ser ainda consideradas as atividades relacionadas com o Agroturismo, associado ao olival ou aos lagares de azeite, e a contemplação de diferentes contextos paisagísticos, designadamente a valorização de olivais em encostas ou socalcos suportados pelos muros de pedra. De referir que, de acordo com a literatura, as características da paisagem que contribuem para os valores estéticos e recreativos (por exemplo, olival com os muros de pedra) estão a ser ameaçadas pelas alterações nas práticas agrícolas que privilegiam modelos de exploração intensivos, mas também pelo abandono da atividade agrícola (Zanten et al., 2016). Porém, outras opiniões referem a mais valia das áreas naturais protegidas, na medida em que prevêem mecanismos de proteção da biodiversidade das paisagens agrícolas tradicionais e a conservação do património cultural agrícola (Maldonado et al., 2019), traduzindo-se, assim, em oportunidades para a valorização dos olivais tradicionais.

Perante este contexto, é objetivo da presente investigação conhecer os limites geográficos e as principais características das manchas de olival que se estendem na área do Parque Natural do Tejo Internacional (PNTI), dando destaque às áreas onde os muros de pedra são a marca e a identidade do olival tradicional. Pretende-se, ainda, conhecer o seu potencial turístico através da análise dos produtos e recursos existentes que envolvem o olival, a azeitona e o azeite que no caso é, aliás, produto de Denominação de Origem Protegida (DOP) e apresentar um modelo que apoie à estruturação de uma oferta de olivoturismo para o contexto do PNTI.

1. Área de estudo

O Parque Natural do Tejo Internacional (PNTI), que é também território Reserva da Biosfera, estende-se por três municípios nacionais (Castelo Branco, Idanha-a-Nova e Vila Velha de Ródão) que pertencem à comunidade intermunicipal da Beira Baixa, e ao longo de 11 municípios da província de Cáceres, Comunidade Autónoma da Extremadura (Espanha), englobando as comunidades intermunicipais, designadas por “Mancomunidades” de Sierra de San Pedro, Tajo-Salor-Almonte e Rivera de Fresnedosa. No total, o PNTI ocupa uma área de aproximadamente 500km2 e caracteriza-se por uma baixa densidade demográfica (fig. 1). É um território de fronteira e que dista de cerca de 1h00 a 1h30 de Castelo Branco e Cáceres e 3h00 a 3h30 de Lisboa e Madrid, ocupando assim uma posição central em relação a grandes centros urbanos.

Fig. 1 Localização da área de estudo. Figura a cores disponível online. 

Em geral, o PNTI caracteriza-se pela diversidade e riqueza de fauna e flora, com as comunidades típicas dos ecossistemas mediterrâneos e com características geomorfológicas distintivas, desde as áreas aplanadas, ora cortadas pela incisão da rede hidrográfica do Tejo, com destaque nos rios Ponsul e Erges e ribeira de Aravil (afluentes nacionais) e os rios Salor, Sever e Erjas e a ribeira de Carbajo, em território Espanhol, ora onde irrompem os relevos residuais graníticos, com destaque para Monsanto. São ainda identificados os relevos sedimentares e os distintivos alinhamentos tectónicos, como as escarpas e cristas quartzíticas, destacando-se a título de exemplo a crista quartzítica de Penha Garcia que se estende até aos canhões fluviais do rio Erges e se liga a Espanha ou, ainda, o caso das Portas de Ródão que abrem caminho ao Tejo com as suas margens marcadas pela forte presença do olival, aos terraços do rio Tejo constituídos pelo material quartzítico do leque aluvial (por exemplo, Monte do Pinhal em Vila Velha de Ródão).

Na extensa paisagem do PNTI destacam-se as comunidades dominantes de montado de azinheira (Quercus rotundifólia) e de sobreiro (Quercus suber), detetando-se ainda manchas dispersas de olival tradicional (Olea europea). Este caracteriza-se pela baixa densidade, em regime de sequeiro e com estruturas de ocupação dispersa. Porém, junto às povoações são frequentes os olivais de pequena dimensão, em geral com a estrutura em linha. Na área de estudo domina o olival de encosta nas principais linhas de água (Tejo, Erges e Ponsul), suportado por muretes de pedra e que se encontra maioritariamente abandonado ou semi-abandonado, e, em geral, é pastoreado. Por se tratar de um sistema tradicional e com plantas em fase de decrepitude, caracteriza-se pela baixa produtividade. Apesar deste estudo não contemplar um levantamento rigoroso do tipo de cultivares existentes, sabe-se que a oliveira Galega é a cultivar endógena da Beira Baixa e, por isso, a mais representativa deste território. Importante referir que em Portugal, o azeite produzido neste território é um produto registado com DOP (Denominação de Origem Protegida). Em território espanhol destaca-se a presença da variedade endógena Manzanilla Cacereña, que em Portugal pode tomar diferentes designações, como Azeiteira, Azeitoneira ou Negrinha, que também é produto registado com DOP.

II. Metodologia

Para delimitar a área geográfica ocupada pelo olival recorreu-se ao uso do software ArcGIS (versão 10.6.1) utilizando como base de dados geográficos a Carta de Ocupação do Solo (COS) de 2015 para o território nacional e igualmente a última versão disponível do Sistema de Información sobre Ocupación del Suelo de España (SIOSE), neste caso, com dados de 2014.

Dentro do contexto territorial do PNTI, após a delimitação das áreas de olival, procedeu-se à sua sua caracterização e ao enquadramento paisagístico de forma a captar a diversidade de contextos produtivos existentes através de saídas de campo para observação e registo fotográfico. Foram ainda identificados e caracterizados os produtos e recursos “Oleoturísticos” olivoturísticos existentes à escala do município. As principais fontes de informação foram materiais de divulgação e sítios de internet sujeitos a análise de conteúdo, foram consultadas empresas do setor e foi recolhida informação junto dos principais stakeholders através de questionário online, o que permitiu encontrar respostas aos seguintes tópicos: inventário da tipologia de produtos e serviços, inovações, redes de cooperação, projetos ou iniciativas desenvolvidas ou em curso que visam o apoio ao setor olivícola e de apoio mais específico para a área de estudo, identificação e caracterização das ações desenvolvidas e planeadas para a estruturação/promoção de olivoturismo e contributos para os valores científicos e de educação observáveis a nível local/regional. No total participaram 13 stakeholders, dos quais representantes de autarquias, da comunidade intermunicipal, gestores do PNTI, agricultores e associações.

Para avaliar o potencial turístico das paisagens de olival realizou-se uma análise SWOT como método de diagnóstico. Para a avaliação do potencial turístico do território seguiu-se a metodologia aplicada por Zgłobicki et al. (2018). Esta metodologia foi seguida por outros autores, nomeadamente por Belmonte Serrato et al. (2019), aplicada em contexto de avaliação do potencial turístico do património geológico. Pretende-se com o presente estudo testar a referida metodologia, com o objetivo de avaliar o potencial turístico das áreas de produção agrícola. A metodologia recorre à avaliação de diferentes parâmetros (valor científico e educativo, valor turístico e acessibilidades), aos quais foi atribuída uma valoração na escala de 0, 0,5 e 1, classificando-se as áreas em potencial baixo (≤3,5 pontos), potencial médio (4-6,5 pontos) ou potencial elevado (≥7 pontos).

III. Resultados

1. Representatividade da área de olival no PNTI

O PNTI ocupa uma área correspondente a 515,7km2, abrangendo 14 municípios, dos quais três são nacionais (Idanha-a-Nova, Castelo Branco e Vila Velha de Ródão) e os restantes são território de Espanha. No total, a área de olival ocupa 785,7ha, que corresponde a apenas 1,5% da área total do PNTI (fig. 2). O olival tem maior expressão em Portugal, com cerca de 700ha (quadro I). Convém referir que a área do PNTI integra a Beira Interior, região que ocupa a terceira posição com maior área de olival do país (48 777ha; Instituto Nacional de Estatística, 2018). Em Espanha, na área do PNTI, é possível delimitar uma área total de aproximadamente 90ha, na área do PNTI. À escala dos municípios, Idanha-a-Nova é o território com maior área de olival, com cerca de 56%, seguido de Castelo Branco com aproximadamente 26%. Em Espanha, são os municípios de Herrera de Alcántara (3,7%) e Santiago de Alcántara (3,0%) onde o olival tem maior representatividade.

Fig. 2 Área de olival no PNTI. Figura a cores disponível online. 

Quadro I Área ocupada por olival por município (ha e %). 

2. Características e particularidades dos produtos/recursos olivoturísticos

2.2.1. A Paisagem e os produtos agroalimentares

O olival ocupa apenas 1,5% do território do PNTI, mas é possível detetar manchas de olival disperso e com caraterísticas peculiares, sobretudo ao longo das encostas das principais linhas de água, designadamente nos rios Erges, Tejo e Ponsul (fig. 3A). As suas características são distintivas, especialmente por se tratar de um olival com uma história que remonta a vários séculos e onde ainda se encontram preservados muros de pedra seca (fig. 3B). Estes têm como função a sustentação do terreno, das plantas e também como divisão das parcelas, configurando veredas com características interessantes, que na atualidade assumem novos usos, nomeadamente para os percursos pedestres (fig. 3C). O olival do PNTI é maioritariamente em regime extensivo (fig. 3D) e a produção de azeite é complementada com a produção de carne de borrego ou aproveitamento de leite para a produção de queijo, que no caso português são rotulados com o selo “Queijos da Beira Baixa DOP: Amarelo, Castelo Branco ou Picante”, e em território espanhol tem a marca “Alimentos de Extremadura” e integram a “Rota del Queso de Extremadura”.

Fonte: A, B e C) fotografias próprias; D) fotografia cedida pela Herdade da Tapada da Tojeira

Fig. 3 Diversidade da paisagem de olival no PNTI. Figuras a cores disponíveis online. 

Os olivais inseridos no PNTI são maioritariamente explorados por proprietários privados, encontram-se em regime de sequeiro e ainda prevalecem os olivais pastoreados por ovinos, principalmente os mais próximos dos aglomerados urbanos. Na área de estudo, foram identificados dois produtores com marca registada de produção e comercialização de vários produtos escoados para o mercado, particularmente azeite biológico Virgem Extra da variedade Galega (DOP), a azeitona em conserva, pasta de azeitona, a tradicional bica de azeite e cosméticos naturais à base de azeite.

2.2.2. Olivoturismo no PNTI

De forma a perceber o potencial do olivoturismo como produto no contexto territorial do PNTI, foram inventariados os recursos turísticos e experiências existentes para cada município inserido no PNTI, desenvolvidos nos últimos cinco anos (quadro II). Destaca-se o património gastronómico existente associado ao azeite que permite a realização de atividades de degustação e festivais temáticos, o património construído que contempla desde os museus temáticos às próprias unidades de produção e ainda as rotas pedestres ou cicláveis que têm no olival o cenário para outras atividades de turismo de natureza ao turismo criativo com as experiências relacionadas com a valorização do olival.

Quadro II Caracterização do olivoturismo no território do PNTI. 

Fontes: Websites das entidades, inquérito e entrevistas (Associação Alto Tejo, Ayuntamiento de Valencia de Alcántara, Azeite Egitânia, Câmara Municipal de Castelo Branco, Câmara Municipal de Idanha-a-Nova, Câmara Municipal de Vila Velha de Ródão, Casa del Molinero, Comunidade Intermunicipal da Beira Baixa, Geoparque Naturtejo, Herdade da Tapada da Tojeira, Instituto Nacional de Conservação da Natureza, Taejo Internacional, Instituto Nacional de Conservação da Natureza)

3. Valores científicos e educativos do olival no PNTI

O interesse científico associado ao olival é de extrema importância, na medida em que identificam questões importantes no setor do azeite nas diferentes etapas da cadeia de valor, promove a criação e transferência de conhecimento orientado à sustentabilidade e promove a busca de soluções para problemas complexos, desde a produção, a transformação até ao consumo, por exemplo ao investir no conhecimento na área da saúde.

Associado à produção, o interesse científico vai desde a avaliação do potencial produtivo dos olivais tradicionais, gestão do solo, da água, fertilização, poda ou apanha (Fernandez Escobar et al., 2013), à preservação de variedades tradicionais (Veloso et al., 2018) ou mesmo ao tirar partido do uso das novas tecnologias, como são o exemplo dos sistemas de informação geográfica como ferramenta de apoio à gestão de práticas culturais no olival, por exemplo, ou ainda a influência da poda em diferentes modos de condução das plantas (Jiménez-Brenes et al., 2017).

Do lado da transformação, o interesse científico é amplo, cobrindo áreas desde a proteção do ambiente (Pienkowski & Beaufoy, 2002) através da gestão de resíduos e aproveitamento de subprodutos (Ochando-Pulido et al., 2016), à melhoria do produto (Khdair et al., 2015) ou a criação de novos produtos, como são os exemplos de chocolate com azeite biológico ou o azeite virgem extra com sabor a chocolate. É possível ainda acrescentar o interesse científico na área da saúde, uma vez que o azeite é considerado um super-alimento devendo ser utilizado na dieta alimentar (Tur et al., 2003).

Será importante referir que, do ponto de vista científico, existem vários estudos que analisam o potencial turístico do olival, reforçando a sua importância para a preservação da paisagem (Vásquez de la Torre et al., 2015), na promoção da multifuncionalidade das áreas rurais (Duarte Alonso, 2010), favorece práticas de produção e transformação sustentáveis (Arikan, 2017) e ainda o contributo para a criação de uma oferta da tipologia de turismo alternativo que valoriza e respeita os valores sociais e ambientais (Morales et al., 2015). Do ponto de vista educativo é necessário mencionar o papel que os olivais podem ter em disciplinas científicas relacionadas com a ecologia da paisagem e biodiversidade, e ainda salientar o papel que o azeite pode ter em assuntos relacionados com a educação para uma alimentação saudável. Associado à produção e transformação tradicional, existe um vasto conhecimento, inevitável, de resgate junto das gerações mais velhas, do conhecimento relacionado com as variedades tradicionais, métodos de proteção de plantas ou de transformação e conservação da azeitona. Só através da criação de oportunidades de transferência desse conhecimento para gerações mais novas será possível perpetuar métodos e práticas que contribuam para uma gestão assente nos valores da sustentabilidade. Para apoiar tais ações, pode ser viável a criação de materiais educativos em formatos físico e digital, bem como a realização de atividades que promovam a interação de conhecimento entre gerações.

O interesse educativo passa igualmente pela sensibilização do consumidor, nomeadamente, alertando para a valorização da produção de proximidade, do valor dos produtos para os quais é necessário recorrer ao saber-fazer, muitas vezes moroso e exigente. Entre as possíveis ações de carácter educativo, destaca-se a título de exemplo a formação de consumidores através da realização de provas de azeite e visitas ao olival e lagar, que são aliás exemplos de atividades observáveis no território. É ainda de mencionar o interesse educativo para a valorização da paisagem agrícola, como reserva de ecossistemas que representa e pelo carácter lúdico que pode ter com atividades como o pedestrianismo ou observação de flora e fauna. Neste domínio, detetam-se iniciativas de valorização da sustentabilidade e desenvolvimento dos territórios rurais através da promoção do consumo dos produtos tradicionais, de valorização dos produtos locais na restauração, e recuperação de receitas que valorizam a dieta mediterrânica e os valores da cozinha tradicional, como são exemplos a “Carta Gastronómica do Tejo Internacional” ou o guia de “Gastronomia Raiana em Quatro Estações” que enaltecem o valor dos produtos tradicionais.

4. Potencialidades e debilidades do olival no PNTI para promover o “olivoturismo”

Para avaliar as potencialidades da paisagem agrícola, em particular do olival, como âncora para estruturar a oferta de um produto turístico para o PNTI, foi elaborada uma análise SWOT identificando-se as forças, fraquezas, ameaças e oportunidades, tendo como base o reconhecimento das áreas de estudo selecionadas (quadro III).

Quadro III Análise SWOT para as paisagens de olival do PNTI, segundo as suas potencialidades como recursos turísticos, ativos ou potenciais (*). 

(*) √ - Favorável; ± - Merece atenção; X - Oportunidade de melhoria.

As debilidades identificadas estão sobretudo relacionadas com a ausência de uma estratégia de marketing territorial que valorize os produtos do PNTI e que, por sua vez, se reflete na ausência de materiais de comunicação orientados para a promoção do destino e educação do consumidor, neste caso um destino de fronteira, ao qual acresce o desafio de criar e fortalecer sinergias entre atores económicos e sociais de Portugal e Espanha. De salientar ainda a ausência de um modelo de proteção e valorização da paisagem mediterrânea, que tem vindo a ser substituída pela introdução de espécies florestais de produção, como o eucalipto, sobretudo em território do PNTI nacional. Esta é a espécie que ocupa a segunda posição entre as principais espécies florestais, contribuindo para a perda de biodiversidade e identidade deste território. De referir também a alteração aos padrões de produção/transformação que comprometem a continuidade e manutenção de métodos tradicionais decorrente da imposição de normas de qualidade alimentar que implicam a substituição de sistemas de transformação do azeite mais industrializados.

Das ameaças identificadas destaca-se a ausência de conhecimento e/ou interesse no aproveitamento do olival como atração turística, que leva à perda de oportunidade de valorização do azeite e dos agentes turísticos locais. O envelhecimento da população e a perda de população nas áreas rurais mais periféricas constitui também uma ameaça, na medida em que concorre para o abandono do olival, do património construído e ainda da transferência de conhecimento tradicional. Outro aspeto a salientar, relacionado com uma das debilidades identificadas, deve-se à progressiva expansão da cultura do eucalipto na área do PNTI, como já referido, e que conduz a vários riscos, desde a descaracterização da paisagem ao aumento do risco de incêndio.

Destacam-se como forças e oportunidades a existência de uma oferta de eventos culturais e educativos de valorização do azeite e produtos transformados, bem como a proximidade à rede das Aldeias Históricas de Portugal e outros produtos turísticos como o termalismo, o turismo náutico no rio Tejo e as rotas arqueológicas no Alto Tejo e do queijo da Extremadura. Estes últimos contam com programas de visitação e, por isso, oferecem a possibilidade de fruição de serviços e atividades turísticas complementares ao segmento do olivoturismo. Salienta-se ainda o contributo dos olivais para a preservação do ambiente e, por isso, como oportunidade de valorização da oferta junto de segmentos de procura que busca o turismo assente nos princípios da sustentabilidade. O olival poderá ser valorizado pelo seu contributo na preservação de ecossistemas, porém ainda carece de investimento na identificação dos valores naturais existentes. Por fim, importa referir a proximidade do território do PNTI a outros territórios produtores de azeite DOP, como o exemplo das regiões da Beira Alta, Norte Alentejo em Portugal e Gata-Hurdes em Espanha que pode ser interessante para reforçar parcerias e estruturar o produto para nichos de mercado.

5. Avaliação do potencial turístico do olival

Segundo a metodologia de avaliação do potencial turístico do olival aplicada no presente estudo, baseada em Zgłobicki et al. (2018) e Belmonte Serrato et al. (2019), a função da acessibilidade do destino, numa perspetiva de proximidade a mercados potenciais, bem como a acessibilidade, as infraestruturas turísticas e outras atrações turísticas, devem ser consideradas no processo de planeamento e promoção do turismo. Tanto a análise SWOT como a avaliação dos diferentes parâmetros analisados no quadro IV permitem concluir que existem valores do ponto de vista turístico e ainda valores científicos e educativos que reforçam a importância do olival como recurso turístico, desde logo pelo seu contributo para o desenvolvimento territorial na medida em que promove emprego, atrai investimento e pessoas, especialmente se se considerar toda a extensão de olival para além das fronteiras do PNTI.

Quadro IV Critérios e pontuações de avaliação do potencial do olival para o turismo. 

(1) Valor baixo: <3,5 pontos; Valor médio: 4-6,5 pontos; Valor alto: >7 pontos. (2) Produção científica relacionada com o Olivoturismo e conhecimento agronómico relacionado com a cultura da oliveira, transformação da azeitona e desenvolvimento rural. (3) Avaliado pela análise aos materiais de comunicação e divulgação do PNTI.

Fonte: adaptado a partir de Zgłobicki et al. (2018); Belmonte Serrato et al. (2019)

No global, o PNTI recebeu uma pontuação de seis valores (num máximo de 10), destacando-se o elevado potencial dos valores turísticos, porém com algumas lacunas ao nível dos valores educativos e científicos, especialmente verificado pela necessidade de investimento em ações de comunicação do destino, mas principalmente do produto turístico “olivoturismo”. Para a sua valorização este deverá ser comunicado de forma integrada e articulada no setor (hotelaria, restauração e atividades), bem como referenciado a um destino único sem fronteira entre Portugal e Espanha e devidamente articulado com outros segmentos (cultural, rural e de natureza). Importa referir que neste domínio existe ainda um vasto campo de oportunidades e necessidades de investigação e educação que responda às necessidades específicas dos agricultores e população local.

No que diz respeito à acessibilidade territorial é importante assinalar a opção “chegada a este destino” que assenta na existência de barcos recreativos, proporcionando assim uma experiência diferente para conhecer o território. A proximidade à Rede de Aldeias Históricas e às Termas de Monfortinho é um importante atrativo que pode complementar a oferta de programas de olivoturismo.

No global, pode concluir-se que o olival no território do PNTI tem potencial para o turismo, especialmente os segmentos do turismo cultural, turismo rural, turismo de natureza assente nos princípios do ecoturismo e ainda o turismo de saúde e bem-estar.

6. Contributos para o desenvolvimento do olivoturismo no PNTI

O presente estudo, focado na avaliação do potencial do olival como base para o olivoturismo, vem trazer à discussão diferentes perspetivas, desde logo assinalar que o olival é apenas uma das componentes da paisagem, tal como refere o Convénio da Europeu da Paisagem (2000; inTrujillo, 2018), ao delimitar o seu papel como sendo “de interesse geral nos domínios culturais, ecológico, ambiental e social, e que constitui um recurso favorável à atividade económica e que a sua proteção, gestão e ordenamento podem contribuir para a criação de emprego (…) e ainda “qualidade de vida das populações”.

Do ponto de vista do interesse cultural da paisagem, a área de estudo é caracterizada pela existência de olivais em regime extensivo, de encosta, caracterizados pela baixa produção e multifuncionalidade e são indicadores da presença humana no território que remonta a vários séculos. Tratam-se, na maioria dos casos, de olivais delimitados com muros de pedra, que entre os seus vários significados podem ser identificados como limite de propriedade, para sustentar as oliveiras em socalcos, e também podem assumir outros significados, como refere Assandri et al. (2018) ao reforçar que os atributos culturais da paisagem, onde inclui os muros, são fundamentais para a preservação da biodiversidade. No que concerne ao prisma ecológico e ambiental, destaca-se o papel fundamental das áreas protegidas que, ao delimitar áreas de interesse especial, contribui para a proteção de espécies. É importante salientar que na área de estudo se detetaram modelos de exploração assentes na proteção ambiental (Agricultura Biológica) e que a este respeito Berque (1990; inTregua et al., 2018), refere que a utilização de recursos naturais nos modelos de negócio pode favorecer um melhor uso dos mesmos, ao mesmo tempo que incentiva outros agentes locais à sua valorização e proteção, que neste contexto é verificado pelas dinâmicas de valorização do azeite e de outros produtos do olival com classificação DOP. Este selo não só distingue os produtos de qualidade, como é uma base para oportunidades de desenvolvimento turístico, como referem Vázquez de la Torre & Pérez (2014).

Consequentemente, o olivoturismo pode ser enquadrado como uma ferramenta de sustentabilidade, desde logo do ponto de vista ambiental, uma vez que fomenta a valorização e proteção dos recursos naturais; da sustentabilidade económica, ao contribuir com a produção de produtos de qualidade e de valor acrescentado; e também do ponto de vista social, ao contribuir para a atração de investimento e criação de novos empregos transversais à atividade olivícola (alojamento, restauração, por exemplo), bem como a fixação de população e a recuperação de saber-fazer tradicional. Esta ideia encontra-se alinhada com a literatura que destaca o efeito positivo entre agricultura e o turismo (Armesto-López & Gómez-Martín, 2006) e também com o conceito de olivoturismo apresentado por Morales et al. (2015). De acordo com os mesmos autores, é importante salientar a necessária difusão de conhecimento entre os vários intervenientes do olivoturismo, o que pressupõe um envolvimento e um compromisso pela preservação dos valores naturais e locais subjacentes ao olival tradicional e a defesa dos métodos de produção assentes numa base artesanal e tradicional. A este respeito e, de acordo com o diagnóstico realizado, convém reforçar que a promoção do olivoturismo na área de estudo carece de uma base sólida assente no conhecimento e educação, pois, se por um lado é crucial ativar mecanismos de proteção e valorização do conhecimento tradicional (produção e transformação de azeite), por outro, é importante dar respostas aos desafios das alterações climáticas às quais devem corresponder soluções de novo conhecimento gerado entre agricultores, academia e poder público de forma a contribuir para a salvaguarda destes olivais.

Do ponto de vista da criação de emprego, importa salientar que na área de estudo prevalecem agricultores com empresas de pequena e muito pequena dimensão e olivais para consumo próprio, portanto sem exploração comercial. Porém, a realidade do agricultor-empreendedor identificado no território espelha dinâmicas de diversificação, internacionalização e inovação, resultado do respeito pela herança de um olival com história, reservatório de memórias e da vida natural, pilares que estão na base do seu modelo de negócio. A diversificação é visível através da sua capacidade para aproveitar o olival para outras atividades económicas complementares, designadamente a criação de ovinos e a produção de leite para fornecimento local. A aposta em várias tipologias de produtos (azeite, azeitona, pasta de azeitona, cosméticos) combinado, por vezes, com o aproveitamento do olival para a atividade turística, bem como a visita a lagares ou degustações, revela um perfil de agricultor com uma visão holística da gestão do olival.

No domínio da internacionalização foi possível detetar o recurso a diferentes canais de comercialização, com peso importante no mercado de produtos biológicos e a internacionalização para mercados como França e Alemanha. A valorização dos produtos é também alcançada por via da inovação. Neste domínio, detetam-se dinâmicas de valorização do produto (azeite): desde logo, do lado da produção detetam-se soluções dos agricultores que canalizam os seus recursos na proteção e valorização de variedades tradicionais, na conceção, design de produtos ou embalagens e uso de novo conhecimento combinado com o saber-fazer tradicional com o objetivo de melhorar a sua competitividade e desempenho no mercado onde apresentam os seus produtos com os selos “Agricultura Biológica”, “DOP”, “Natural.PT”, “Beira Baixa Terras de Excelência”. O resultado é visível com a apresentação de um produto “único” no mercado que valoriza as práticas de produção que preservam a tradição e a biodiversidade, desde as lojas de produtos gourmet, mercados biológicos, ao fornecimento de restaurantes, contribuindo assim para a valorização económica dos seus produtos. O olivoturismo passa a ser, perante este enquadramento, uma atividade de complemento de rendimentos para o agricultor e de sustentáculo da economia local, alinhando-se com os sistemas de agricultura multifuncional, que pode ser visto como oportunidade para o agricultor obter rendimentos extra durante todo o ano, mas também de potenciar novos negócios complementares, como referem Millán et al. (2011).

Tais dinâmicas parecem contrastar com uma aparente ausência de vitalidade económica e social do território, fortemente caracterizado pelo despovoamento e envelhecimento da população. Com o objetivo de atrair investimento para o território, foram identificados programas de desenvolvimento local que prevêem contributos, quer na retenção, quer na captação de população jovem e com impacto crucial nos modelos de negócios no setor agroalimentar. São exemplos os casos da Incubadora de Base Rural de Idanha-a-Nova e a integração deste município na rede Bio-Regiões, com orientações específicas de promoção de modelos de negócio que valorizem a gestão sustentável dos recursos locais e a produção e consumo alimentar de base biológica e agro-ecológica. Porém, importa salientar que este tipo de dinâmicas deveriam estar profundamente comprometidas com as dinâmicas de valorização do território, nomeadamente pela definição de ações mais concretas que privilegiem iniciativas de valorização da paisagem olivícola que detém, pelo seu carácter histórico, um vasto património construído, património natural, ecológico e imaterial, que se constituem como valores fundamentais que merecem a atenção pública para a sua preservação e valorização, isto em detrimento do apoio a iniciativas de produção em grande escala, ou seja, de modelos de agricultura intensiva. Portanto, a ausência de vínculos das instituições com o território e de iniciativas vinculadas e comprometidas com as premissas do desenvolvimento sustentável pode comprometer qualquer esforço de dinamização do olivoturismo no território em estudo.

Partindo ainda do pressuposto de que uma estratégia orientada para o desenvolvimento do território prioriza o aproveitamento inteligente do capital territorial, o olival como cenário turístico, não pode deixar de ser integrado numa estratégia de valorização do produto (azeite), particularmente o produto com características que lhe conferem selo DOP, e que merece, por isso, proteção e apoio. Considera-se que o azeite, ao ser apontado elemento crucial de identidade do território, é um fator de geração de riqueza e motor de fomento de inovações e iniciativas de desenvolvimento local. Neste âmbito, por exemplo, é fundamental a delimitação de áreas de interesse que valorizem os espaços cénicos em olival, como os miradouros, oliveiras centenárias, mas especialmente a sinalização das áreas com muros de pedra, pois são a espinha dorsal de uma paisagem cultural com elementos que distinguem estes olivais de outros da Península Ibérica, cuja preservação e manutenção das suas características se deve à sua integração em áreas protegidas (Barrett & Mitchell, 2016). Não descurando ainda todo o património gastronómico que merece atenção, nomeadamente o reforço de redes locais para potenciar as ofertas gastronómicas que absorvam a produção local, de forma a garantir efeitos positivos na valorização do destino e o reconhecimento da sua identidade gastronómica.

Face ao exposto, comunicar os valores científicos e educativos existentes ou que venham a ser gerados com o olivoturismo vem atender ao desafio da manutenção dos sistemas de produção tradicionais e biológicos, que poderá ter os seguintes efeitos: a) a influência nos modelos de negócio de novos empreendedores que valorizem as tradições e a biodiversidade; e b) o reforço do papel do turista, que ao ter acesso a mais conhecimento, poderá conduzir a hábitos de consumo mais saudáveis e sustentáveis e estimular a sua curiosidade para os produtos tradicionais e a ruralidade como modo de vida, ficando, consequentemente, mais sensibilizado para um tipo de turismo alternativo. Este pode ser exemplificado por uma oferta que valorize: a utilização do olival como espaço cénico para caminhadas, passeios de bicicleta, roteiros fotográficos, por exemplo, às atividades de carácter educativo e/ou contemplativo (observação de aves, identificação e recolha de plantas ou cogumelos silvestres de interesse gastronómico), ainda à valorização da componente sensorial que o olival potencia (união entre a produção e a degustação de pratos típicos, do azeite, das azeitonas, da doçaria tradicional ou da inesperada combinação do azeite com sabores locais), às experiências, com a participação em atividades como a apanha manual de azeitona, aprender a podar uma oliveira, apadrinhar uma oliveira centenária, aprender mais para ser um expert em provas de azeite (turismo criativo) ou ainda usufruir de massagens relaxantes com a utilização de azeite, reforçando dessa forma as ofertas relacionadas com o produto saúde e bem-estar.

De salientar que as entidades locais (autarquias, instituições de ensino), a par dos agricultores, empresas do setor turístico e da população local, têm um papel essencial na estruturação do destino e na capacitação da imagem do olival como paisagem cultural. Neste contexto, adverte-se que ficar apenas pela disponibilização de instrumentos e ferramentas de comunicação que permitam a aproximação do território ao consumidor (eventos, infraestruturas culturais) ou do consumidor ao território (materiais de comunicação, desde folhetos, painéis e sinalética) pode ser um investimento com um retorno de baixo impacto no desenvolvimento territorial. Apesar de serem iniciativas necessárias, podem ser insuficientes e, por isso, é crucial o desenho de uma estratégia orientada para o contexto do “território sem fronteira” que aproxime todos os intervenientes, de Espanha e Portugal, e que sob uma marca agregadora e de complementaridade com diferentes componentes da oferta (que inclui desde o alojamento, a restauração, às experiências) seja visível a ligação entre o olivoturismo e outros segmentos turísticos, nomeadamente: a) o turismo cultural, com âncora na cultura e arte, e onde a gastronomia é um dos recursos primários; b) o turismo rural, ancorado no património, desde o industrial ao etnográfico, às diferentes dimensões da paisagem, não descurando também a oferta de alojamento que valoriza as práticas agroturísticas; c) ao turismo de natureza, assente na fauna e flora específica de contextos de olivais centenários com variedades tradicionais e sistemas de produção multifuncionais; d) ao turismo de saúde e bem-estar, com a ligação ao termalismo, ao aproveitamento do azeite para os cosméticos, massagens relaxantes e ainda a valorização da alimentação mediterrânica.

De acordo com o modelo proposto (fig. 4), o olivoturismo no PNTI deve então alinhar-se com outras atividades e experiências de forma a alcançar novos públicos, designadamente a visita aos locais da rede das Aldeias Históricas de Portugal, particularmente Monsanto e Idanha-a-Velha onde a paisagem do olival é uma das principais marcas da paisagem rural, as rotas arqueológicas no Alto Tejo ou o turismo náutico, com circuitos que permitem a contemplação das encostas do Tejo, precisamente onde o olival assume características diferenciadoras.

Fig. 4 Modelo para promover o olivoturismo no PNTI. 

Para finalizar, reforçando o principal objetivo deste trabalho de investigação, que apresenta os resultados da aplicação da metodologia de avaliação do potencial do olival para aproveitamento turístico num contexto territorial de fronteira, é importante reforçar algumas considerações. Em primeiro lugar, em termos paisagísticos, o olival assume características peculiares que lhe conferem atributos de paisagem cultural e que deveriam ser protegidos e valorizados e, em particular travar ações de expansão do eucalipto no PNTI. Em segundo lugar, o público potencial do olivoturismo é considerado como nicho, o que implica que potenciar e valorizar o olivoturismo requer um produto base (azeite) de qualidade, o qual depende inteiramente da valorização da tradicionalidade e biodiversidade, características que devem ser refletidas na própria estratégia de estruturação da oferta, mas especialmente consideradas nos mecanismos de defesa do património olivícola face aos desafios impostos pela pressão do mercado (que leva muitas vezes à modernização dos processos de produção e transformação de azeite e, consequentemente, à perda de identidade dos produtos tradicionais). Em terceiro lugar, a sustentabilidade deve ser uma componente valorizada pelo mercado, desde a perspetiva do produto, ao destino. Finalmente, em quarto lugar, os pilares do conhecimento e educação são fundamentais na estruturação do modelo de olivoturismo no PNTI, pelo que será necessário um maior investimento em novo conhecimento que apoie este setor.

IV. Conclusões

Os olivais são uma marca importante das paisagens do Mediterrâneo e o azeite está entre os produtos alimentares mais importantes na base da alimentação humana. A par disto, surge de forma cada vez mais evidente uma procura por destinos turísticos alternativos, que ofereçam silêncio, mas, ao mesmo tempo, que permitam experiências de contacto com a natureza ou se traduzam em aprendizagens sobre saberes tradicionais. É neste contexto que se situa o olivoturismo, assente numa oferta estruturada, que combina o produto-território (olival) e o produto-produto (azeite), em que as áreas fronteiriças e as áreas naturais protegidas emergem como destinos de oportunidade, sendo o PNTI um território com condições privilegiadas.

O presente estudo, com objetivo de conhecer a área de olival no PNTI e avaliar o seu potencial como recurso turístico do destino, permite extrair as principais conclusões, que se seguem. Em primeiro lugar, apesar da área do olival no PNTI ser reduzida (1,5% da área total), na realidade o território envolvente é tradicionalmente um território produtor de azeite, onde se identificam também outros produtos que dependem do olival (borrego ou queijo, por exemplo), produtos de qualidade com importância no contexto territorial de fronteira. É de salientar as características distintivas do olival do PNTI associadas a sistemas de produção tradicionais com ocupação em encostas onde os muros de pedra são essenciais, quer no suporte do terreno, quer das oliveiras. Tratam-se, pois, de elementos distintivos que conferem valores estéticos à paisagem e que devem, por isso, ser protegidos e valorizados como paisagem cultural. Porém, a sustentabilidade deste recurso turístico está comprometida pela manutenção da produção que evita “paisagens produtivas abandonadas” ou o avanço de outras espécies de produção florestal que descaracterizam a paisagem e contribuem para o risco de incêndio. Assim, devem ser garantidos sistemas de apoio e estímulo à produção, bem como valorização de serviços de ecossistema, pois o olival assume funções essenciais na fixação de carbono, regulação da água no solo e da erosão e tem um importante contributo para a conservação da biodiversidade.

Em segundo lugar, se se observar a riqueza e a diversidade cultural inerente ao território fronteiriço, quer do ponto de vista paisagístico, de tradições do mundo rural, da diversidade gastronómica e cultural, os valores educativos e turísticos multiplicam-se, considerando-se, por isso, que o olival pode ser um recurso turístico para atrair visitantes, mas, também, atrair investimento que contribua para a manutenção da paisagem e valorização dos produtos agroalimentares. Para tal, deve ser valorizada uma estratégia que estruture a oferta e a promova de forma integrada, pois só dessa forma será capaz de reforçar o seu posicionamento como um destino sustentável.

Em terceiro lugar, a estratégia para a valorização do destino passa pela promoção do olivoturismo como complemento de um conjunto vasto de segmentos e que passam, por exemplo, pela valorização da gastronomia num contexto onde o azeite deve ser considerado um elemento agregador e diferenciador do território, da cultura, das tradições e, ao mesmo tempo, potenciador de experiências e emoções através da estruturação da oferta de modalidades como o agroturismo e ainda a complementaridade do turismo de natureza com ofertas existentes de turismo cultural, histórico, náutico, de saúde e bem-estar. Refiramos ainda que qualquer estratégia de promoção do olivoturismo deve envolver os agricultores, que para além de produzirem um produto com características diferenciadoras no mercado, têm um papel importante na preservação da paisagem e da manutenção dos ecossistemas e, por isso, a deverá ser integrado numa estratégia de valorização do turismo sustentável.

Por último, a metodologia aplicada possibilitou a compreensão de diferentes variáveis de análise do território, identificando as suas potencialidades e debilidades, onde se destaca o risco associado ao abandono ou reconversão dos olivais tradicionais, em contraste com as dinâmicas da procura turística que tendem a valorizar experiências turísticas em que é transmitido o conhecimento tradicional, o saber-fazer, o acesso a produtos de qualidade e a degustação dos sabores específicos dos territórios.

A principal limitação do estudo, que é ao mesmo tempo uma oportunidade para delinear investigações futuras, passa pela incorporação de novas dimensões de análise do potencial do destino com a validação das preferências da procura baseada em inquéritos, ou ainda a realização de estudos comparativos com outras regiões produtoras de azeite em contexto de produção de baixa intensidade de forma a perceber o impacto do olivoturismo, quer nos modelos de negócio associados à produção/transformação, quer na estruturação do destino.

Contributos dos/as autores/as

Dora Isabel Rodrigues Ferreira: Conceptualização; Metodologia; Software; Análise formal; Investigação; Curadoria dos dados; Escrita - preparação do esboço original; Redação - revisão e edição. José Manuel Sánchez Martín: Validação; Redação - revisão e edição; Supervisão.

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Recebido: 16 de Janeiro de 2020; Aceito: 15 de Fevereiro de 2021

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