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Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia

versión impresa ISSN 0430-5027

Finisterra  no.122 Lisboa abr. 2023  Epub 30-Jun-2023

https://doi.org/10.18055/finis29957 

Recensão

“Espaço, lugar e território - Figuras do pensamento português contemporâneo”, por André Carmo (coord.)

"Space, place and territory - figures of contemporary Portuguese thought", by André Carmo (Coord.)

Maria da Conceição Rego1 
http://orcid.org/0000-0002-1257-412X

1 Departamento de Economia / Centro de Formação Avançada em Gestão e Economia (CEFAGE - U.É.), Escola de Ciências Sociais, Universidade de Évora, Largo dos Colegiais, 2, 7000-803, Évora, Portugal. E-mail: mcpr@uevora.pt


I. Resumo

Neste texto faz-se a apresentação do livro Espaço, lugar e território - figuras do pensamento português contemporâneo. Trata-se de um volume editado no final do ano 2022, organizado pelo geógrafo André Carmo, com chancela das Edições Afrontamento, que ilustra o percurso de um conjunto diverso de pensadores portugueses, de distintas áreas das ciências sociais e das humanidades. Este volume apresenta os percursos académicos e profissionais, bem como as principais referências bibliográficas, de diversos professores e investigadores que marcaram o pensamento português, e continuam a marcar, desde a segunda metade do século XX e o início do século XXI. Trata-se de uma obra que pode ser de interesse para todos os que estudam a evolução das paisagens, naturais ou transformadas pela ação dos cidadãos, bem como os efeitos, no espaço, no território e nos lugares, das políticas implementadas. É um livro a que o leitor pode voltar sempre que o estudo, ou o trabalho, pressuponha conhecimento, em modo interdisciplinar, das grandes questões sociais, económicas e ambientais que marcaram a evolução da sociedade portuguesa a partir dos anos 70 do século passado.

II. Uma leitura sobre o espaço, lugar e território

Espaço, Lugar e Território - Figuras do Pensamento Português Contemporâneo é um título que nos remete para a importância da construção da memória a partir do legado académico de muitos grandes pensadores portugueses cuja vida ficou e permanece intimamente ligada aos estudos territoriais, a partir de diversas disciplinas científicas e de olhares também distintos, provenientes da economia, geografia, sociologia, arquitetura e arquitetura paisagista, do urbanismo, antropologia, entre outros.

Trata-se uma edição organizada por André Carmo, geógrafo formado na Universidade de Lisboa e Professor na Universidade de Évora, com 41 capítulos que retratam a vida e obra de outros tantos académicos portugueses. Com mais de 400 páginas, de A a V, passa pelas abordagens dos conceitos de espaço, lugar e território, que nos têm sido proporcionadas pelos docentes e investigadores “retratados” no livro, que se ligam na interdisciplinaridade que a obra promove.

Os conceitos - Espaço, lugar e território - que o livro nos propõe a partir dos olhares dos autores protagonistas são basilares e transversais ao pensamento de todos quantos estudam, investigam e trabalham sobre o que ocorre nos lugares onde vivemos, a que pertencemos. Estes conceitos são definidos na obra como pertencendo aos “mais desafiantes do pensamento social contemporâneo: seja na sua aceção material ou no domínio das representações e do simbólico” (Carmo, 2022, p. 19). Espaço, lugar e território são o centro e o destino das políticas que se formulam para a vida em sociedade e que deverão ter como propósito a melhoria da qualidade de vida. Por isso, esta obra constitui um grande repositório de perspetivas interdisciplinares e um vasto conjunto de referências de obras que integram os estudos, no domínio das ciências sociais e das humanidades - campo de trabalho onde a obra se posiciona.

Para sabermos melhor o que é este livro, lemos a introdução que nos mostra logo ao que vamos: quais são as principais características da obra, o seu contexto e o contexto dos “protagonistas”, como foi o processo de construção do volume, os critérios utilizados na seleção dos autores, a estrutura proposta para a apresentação dos autores, entre outros. O livro define-se a partir de três características fundamentais: a diversidade dos autores, a interdisciplinaridade e o seu carácter não hagiográfico. Destaca-se a estratégia seguida para a identificação dos “protagonistas” e dos autores dos capítulos, a qual foi definida por nove “coordenadores das áreas científicas / disciplinares”, o que seguramente ampliou e robusteceu as escolhas dos participantes. Na escolha dos protagonistas, prevaleceu a produção de trabalho académico de reconhecida qualidade, a contemporaneidade do pensamento bem como a diversidade de género e de instituições de origem.

Ainda assim, este livro reflete também as desigualdades da academia portuguesa e a “macrocefalia” de Lisboa. De entre o conjunto de mais de quarenta autores retratados, apenas onze são mulheres. Como origem institucional dos protagonistas desta obra destacam-se as instituições de ensino superior de Lisboa, que são maioritárias, sendo muito menos expressiva a presença da Universidade do Porto e menos ainda de instituições localizadas fora das áreas metropolitanas, como o Minho, Coimbra, Aveiro, Évora, Algarve ou mesmo fora do país.

No conjunto das áreas científicas predominam os autores com origem na geografia e na sociologia. As ciências sociais continuam na obra através de pensadores com formação académica em história, filosofia, antropologia e economia. A estes domínios, junta-se a arquitetura, a arquitetura paisagista, o urbanismo e o ordenamento do território. Todas estas perspetivas mostram olhares diversos para aquilo que pode ser identificado como o tema transversal a toda a obra: as desigualdades. De uma certa forma, os diversos autores protagonistas deste livro abordam os efeitos das desigualdades, seja dentro da cidade, entre as distintas áreas urbanas, na diversidade das áreas rurais e urbanas, na forma como a política pública pode contribuir para a compreensão das diferenças de desenvolvimento e como pode melhorar a qualidade de acesso aos atributos com capacidade para qualificar os territórios, seja através da cultura, da economia, do ambiente ou da sociedade.

Cada um dos capítulos apresenta (quase) sempre uma estrutura comum. Depois de uma breve história de vida de cada um dos autores apresentam-se os contextos teórico e institucional que os conformam, bem como a identificação dos principais contributos para a evolução do pensamento na área científica a que pertence. A finalizar, os capítulos propõem uma breve lista com as principais referências bibliográficas de cada autor, bem como de outras referências relevantes para compreender a obra do investigador apresentado.

Este livro traz-nos percursos inspiradores, de quem, na maioria das vezes, viveu, e vive, profissionalmente, e talvez apaixonadamente, entre a academia - docentes e/ou investigadores - e a intervenção pública em diversos papéis: assessor, decisor em diversos níveis de poder - técnico ou político -, consultor, por exemplo, cruzando o conhecimento teórico com o exercício da aplicação na prática da resolução dos dilemas do quotidiano das empresas e das instituições. Ou seja, estes retratos mostram quem ensina o que faz e que faz como ensina. Estes percursos permitiram, digamos assim, a “fertilização cruzada” da necessidade de decidir e agir, na tomada de decisão pública, com a investigação e a reflexão inerentes à criação de conhecimento puro. Esta simbiose está subjacente à evolução da universidade portuguesa, no caminho que tem feito nos últimos ٥٠ anos.

Este volume também nos mostra como o ensino superior em Portugal se constituiu como “elevador social”. Os percursos de vida dos autores destacados salientam que, nas últimas cinco décadas, chegados à academia, ainda que de origens sociais diferentes, de famílias humildes, do interior do país ou das ilhas, ou da elite económica e cultural das principais cidades portuguesas, a Universidade permitiu que todos se destacassem e chegassem a um mesmo lugar cimeiro na academia.

Voltando ainda à introdução do livro, André Carmo escreve: “Num tempo de hegemonia da universidade neoliberal, Espaço, lugar e território mostra que é possível fazer diferente” (Carmo, 2022, p. 22). Na atualidade, os investigadores e os docentes universitários podem organizar e colaborar na escrita de um livro, de um capítulo de um livro, bem como ocupar esse tempo a escrever mais um artigo para submeter a uma revista bem classificada nos rankings. Estas opções, em regra não são valorizadas de igual modo nos processos de avaliação. De facto, nos nossos dias, os contributos para os livros são “filhos menores” quando comparados com os artigos propostos a revistas científicas, no que à avaliação da produção científica diz respeito. Hoje, organizar e escrever um livro, um capítulo de um livro, é um ato de generosidade, de dádiva. Por isto também se deve um agradecimento a todos os envolvidos neste volume por estarem um pouco contra a corrente e, ainda assim, produzirem conhecimento relevante e inovador. São cerca de cinco dezenas de docentes e investigadores que estiveram envolvidos na produção desta obra a quem devemos estar gratos.

Este não é um livro para ser lido de um fôlego.... é um livro a que se volta, quase como um regresso a casa quando for necessário para continuar o trabalho, a investigação, a descoberta. E por falar em voltar à raiz, dada a intemporalidade e relevância, pela lição que nos traz, cito, a concluir, o inspirador economista Professor António Simões Lopes:

Aprendi eu, na minha iniciação à Economia, que não há fenómenos económicos, mas tão só aspetos económicos no fenómeno social, e que toda a pretensão de objetividade que leve a destacar os aspetos económicos da vida humana do seu contexto político e social distorce os problemas que tem de discutir em vez de os tornar mais claros (...). Aprendi ainda, do mesmo modo que há a Economia da Produção, a Economia da Circulação, a Economia do Consumo mas também a Economia da Repartição, sendo nesta que os aspetos económicos surgem mais profunda e intrinsecamente associados a outros aspetos do fenómeno social (...). Foi perdendo atenções a Economia da Repartição, verdadeiro estabilizador social, a lembrar quanto é importante a partilha equilibrada do produto da atividade económica (...). Era pela mão da Economia da Repartição, em suma, que nos habituávamos a fazer as primeiras abordagens da Desenvolvimento. (Lopes, 2006, pp. 41-42, em Silva Costa, 2022, pp. 70-71).

Ficha técnica:

Título: Espaço, lugar e território. Figuras do pensamento português contemporâneo.

Coordenação científica e editorial: André Carmo

Revisão Científica: Ana Cordeiro Santos, Eduardo Ascensão, João Pedro Silva Nunes, Maria Alice

Samara, Paula Simões, Pedro Pinto, Ricardo Costa Agarez, Susana Mourato Alves-Jesus.

Edição: Edições Afrontamento, Lda.

ISBN: 978-972-36-1963-8

Coleção: Biblioteca de Ciências Sociais / Plural / 22

Depósito Legal: 506382/22

Agradecimentos

A autora agradece o apoio da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do projeto UIDB 04007/2020.

Referências bibliográficas

Carmo, A. (Ed.). (2022). Espaço, Lugar e Território - Figuras do Pensamento Português Contemporâneo [Space, Place and Territory - Figures of Contemporary Portuguese Thought]. Edições Afrontamento. [ Links ]

Carmo, A. (2022). Introdução [introduction]. In A. Carmo (Org.), Espaço, Lugar e Território - Figuras do Pensamento Português Contemporâneo [Space, Place and Territory - Figures of Contemporary Portuguese Thought] (pp. 19-22). Edições Afrontamento. [ Links ]

Silva Costa, J. (2022). António Simões Lopes. In A. Carmo (Org.), Espaço, Lugar e Território - Figuras do Pensamento Português Contemporâneo [Space, Place and Territory - Figures of Contemporary Portuguese Thought] (pp. 69-76). Edições Afrontamento. [ Links ]

Recebido: 28 de Fevereiro de 2023; Aceito: 11 de Abril de 2023

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