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Silva Lusitana

versão impressa ISSN 0870-6352

Silva Lus. vol.21 no.Especial Lisboa jun. 2013

 

A Fileira Florestal no Contexto da Economia Nacional: A Produtividade e a Especialização Regional

The Forestry Sector in the Context of the National Economy: Productivity and Regional Specialization

 

*Elsa Sarmento e **Vanda Dores

* Economista. The World Bank, USA; Departamento de Economia, Gestão e Engenharia Industrial, Universidade de Aveiro; Campus Universitário de Santiago, 3810-193 AVEIRO E-mail: elsa.sarmento@gmail.com

** Técnica Superior. Direção de Serviços de Gestão de Informação e Estatística, Gabinete de Estratégia e Estudos, Ministério da Economia e do Emprego; Av. da República 79, 1º, 1050-246 LISBOA

 

RESUMO

Este trabalho contextualiza a importância económica da Fileira Florestal em Portugal, a nível dos principais agregados macroeconómicos e da especialização regional, oferecendo uma definição própria das indústrias de base florestal, à qual se intitulou “Fileira Florestal”, introduzindo uma metodologia que assenta na nomenclatura estatística oficial das Contas Nacionais. É visível a tendência de desaceleração do peso do setor florestal na economia portuguesa nos últimos anos, em particular a partir de 2008, ao nível da produção, VAB e emprego. É igualmente de relevar igualmente as discrepâncias existentes, nomeadamente entre a Indústria da Papel, Cartão e seus artigos e as restantes indústrias e o seu comportamento, por vezes dissonante, relativamente ao conjunto da Fileira Florestal. A produção da Indústria do Papel, Cartão e seus artigos, assume pela primeira vez, em 2009, a maior representatividade na fileira. Portugal é, em 2010, o terceiro maior produtor de pasta de papel da UE-27. Na UE-27, Portugal é o país em que o rácio do VAB face à área de floresta produtiva é mais elevado em 2009. Em 2009, Portugal é ainda o quinto país, de entre 15, com maior VAB da Fileira Florestal e sexto na Formação Bruta de Capital. De acordo com o Eurostat para 29 países, Portugal apresentou a maior taxa de investimento na Indústria do Papel e Produtos Derivados do Papel e a sétima maior na Indústria da Madeira. Composta essencialmente por pequenas empresas, com sistemas produtivos muito especializados, o total da fileira apresentou uma produtividade 11,6% inferior à média da Indústria Transformadora em 2009. Existem no entanto discrepâncias substanciais; a Indústria da Pasta, do Papel e do Cartão regista habitualmente valores de produtividade cerca de 2,5 vezes superior à da Indústria Transformadora e três vezes superior à da fileira.

Palavras-chave: Floresta, Especialização regional, Produtividade, Portugal

 

ABSTRACT

This paper contextualizes the economic importance of Portuguese Forests, using main macroeconomic aggregates and regional specialization indicators. It offers a definition of Forest-based industries, which is entitled, the “Forestry sector”, based on the National Accounts statistics. In particular since 2008, the weight of the Forestry sector in the Portuguese economy has been declining, being particularly observable in production, employment and GVA aggregates. Most noteworthy are the discrepancies between the Pulp, Paper and Paperboard industries, whose performance is often dissonant with the remaining forestry industries. In 2009, the production of the Pulp, Paper and Paperboard industries became the highest of all Forestry sub-sectors. Later in 2010, Portugal becomes its third largest producer in the EU-27. Portugal is also the country where the GVA ratio to the area of productive Forest is higher in 2009, within the EU-27. In 2009, Portugal ranks as the fifth country (EU-15) with the highest Forestry GVA and sixth in terms of Gross Capital Formation. According to the Eurostat data for 29 countries, Portugal had the highest investment rate in Pulp, Paper and Paperboard and the seventh largest in the Wood Industry. Composed mainly of small businesses, with very specialized production systems, the total Forestry productivity performance was 11.6% below that of the Manufacturing Industry average in 2009. However, the Pulp, Paper and Paperboard customarily records a productivity level over 2.5 times higher than the manufacturing industry and three times higher the overall Forestry sector.

Keywords: Forests, Regional specialization, Productivity, Portugal

 

1 - Introdução

As indústrias que compõem a fileira da floresta têm uma importância inquestionável no contexto da economia nacional, pela criação de valor acrescentado nacional, pelo seu contributo para o comércio externo, pela geração de emprego, através do elevado número de agentes envolvidos na produção, transformação e comercialização dos seus produtos e pela sua relevância na fixação das populações nas regiões mais desfavorecidas. Também é reconhecido que a floresta desempenha outras funções, para além das económicas, designadamente sociais e culturais, ecológicas e de sustentabilidade. Esta fornece fluxos de bens públicos importantes, conhecidos na literatura económica como ‘‘amenidades” (na maioria dos casos, bens públicos que não possuem preço de mercado atribuído) ou ‘‘nontimber goods’’ (AGRO, 2010; PEARCE et al., 1999). A floresta como recurso natural endógeno e renovável, e a extensão da sua ocupação territorial pelo país, torna-o num dos mais importantes a nível da criação e distribuição regional de riqueza em Portugal.

Este trabalho procura documentar a importância da fileira para a economia nacional, na criação de valor e geração de emprego, mas também a nível das suas componentes sectoriais, territoriais e ambientais, complementando o trabalho de outros atores (ASSOCIAÇÃO PARA A COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA DA FILEIRA FLORESTAL, 2010; LOURO et al., 2009; ASSOCIAÇÃO EMPRESARIAL DE PORTUGAL, 2008; MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, DO DESENVOLVIMENTO RURAL E DAS PESCAS, 2007; DIRECÇÃO-GERAL DOS RECURSOS FLORESTAIS, 2006).

Este estudo encontra-se dividido em 5 secções. Na secção seguinte introduzem­se os aspectos metodológicos que assistem à definição de Fileira Florestal do ponto de vista estatístico. Na parte 3, contextualiza-se a importância da Fileira Florestal para a economia portuguesa, a nível dos principais agregados macroeconómicos. A secção 4 aborda a especialização regional através dos dados dos Quadros de Pessoal. Finalmente, a secção 5 apresenta as principais conclusões.

 

2 - Aspectos metodológicos

Não é frequente encontrar uma delimitação precisa e consensualizada acerca do que é efetivamente o “setor florestal”. Este estudo apresenta uma definição própria de um conjunto de indústrias de base florestal, que intitulámos de “Fileira Florestal” e que assenta na nomenclatura estatística oficial para efeitos de caracterização do seu contexto macroeconómico e sectorial. No âmbito das Contas Nacionais, a delimitação adotada neste trabalho inclui as unidades produtivas de matérias-primas e de produtos transformados que estão intimamente ligados à floresta, abordagem também adotada em estudos anteriores (ASSOCIAÇÃO PARA A COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA DA FILEIRA FLORESTAL, 2010; ASSOCIAÇÃO EMPRESARIAL DE PORTUGAL, 2008; MARQUES, 2010). Deste modo, na abordagem à Fileira Florestal que propomos incluem-se as principais indústrias transformadoras relacionadas com a produção de produtos da madeira e da cortiça, do papel e do cartão e mobiliário, ou seja, a análise incide sobre as principais “indústrias florestais”.

A identificação das atividades económicas teve por base o nível de detalhe das nomenclaturas de ramos de atividade das CNAP, disponibilizado para o ano base de referência 2006 (NRCN06). Com base no nível de desagregação a 2 dígitos foram identificadas as diferentes “indústrias florestais”: Indústria da Madeira, Cortiça e suas Obras, exceto Mobiliário, Obras de Espartaria e Cestaria (ramo 16 da NRCN06); Fabricação da Pasta, do Papel, de Cartão e seus Artigos (ramo 17 da NRCN06); Fabricação de Mobiliário e de Colchões (ramo 31 da NRCN06). Foram ainda consideradas outras fontes de informação, os dados do Eurostat e dos Quadros de Pessoal do Ministério do Emprego.

 

3 - Relevância da fileira florestal no contexto da economia nacional

De acordo com os dados das Contas Nacionais, o Valor Acrescentado Bruto (VAB) das indústrias que compõem a Fileira Florestal representou 1,3% do VAB nacional e 1,18% (1,7% se incluída a Silvicultura) do Produto Interno Bruto (PIB) em 2009 (Tabela 1). Apesar do quadro de estabilização nas duas décadas anteriores a 2005 (DIRECÇÃO-GERAL DOS RECURSOS FLORESTAIS, 2006), a população empregada na Fileira Florestal tem vindo a diminuir em anos mais recentes, bem como o seu peso na população ativa total e da Indústria Transformadora. Em 2009 foi responsável por cerca de 1,9% do emprego nacional, correspondendo a um efetivo de cerca de 95 mil empregos diretos. No entanto, o efeito indireto que esta atividade representa na economia de diversos agregados familiares é substancialmente maior, estimando-se poder atingir quatro vezes mais este número, em termos de proprietários florestais existentes, sobretudo em regiões mais desfavorecidas do interior do país em que estas fontes alternativas de rendimento assumem particular importância na aquisição de receitas adicionais. Por outro lado, a elevada fragmentação e pulverização espacial da distribuição da propriedade privada na atividade florestal (MINISTÉRIO DO AMBIENTE, ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E DESENVOLVIMENTO REGIONAL, 2005), tem causado um decréscimo progressivo da população residente em território rural, conduzindo ao consequente abandono da gestão ativa por parte de proprietários rurais, sendo também este o fundamento de diversas propostas de reforma sectorial e estrutural (Decreto 13/XI de 5 de abril de 2010).

 

 

No contexto da Indústria Transformadora, as indústrias da Fileira Florestal foram responsáveis, nesse mesmo ano, por 10,6% do VAB e 12,4% do emprego total. Constata-se também que o VAB regista uma quebra considerável de 9,3% em 2009 e que por outro lado, o peso do VAB da Fileira Florestal no PIB tem também vindo a perder expressão (1,45% em 2006 e 1,18% em 2009).

A visão mais longa, proporcionada pelos dados do Eurostat, demonstra que, contrariando a tendência observada entre 1997 e 2000, o VAB tem vindo a apresentar um comportamento descendente na criação de valor acrescentado após o início do século XXI (Figura 1).

 

 

Os dados do Eurostat revelam igualmente que a nível internacional, na produção de pasta de papel, Portugal foi o terceiro maior produtor em 2010, com 8,8% do total da UE-27 (quarto maior produtor em 2008, com 6,3%). As projeções das Nações Unidas e da FAO (2005), estimam que em Portugal a produção de pasta de papel cresça de forma significativa até ao ano 2020, ultrapassando o consumo, devido ao alargamento de áreas de plantação florestal.

Da análise do contributo relativo das diferentes indústrias que compõem a Fileira Florestal, destaca-se a supremacia da “Indústria da Madeira, da Cortiça e suas Obras (…)”, como aquela que mais peso tem na estrutura dos principais agregados macroeconómicos e, consequentemente na Indústria Transformadora, representando em 2009, 37,2% do VAB (40,7% em 2008), 46,4% do emprego direto (47,6% em 2008) e 41% das remunerações da Fileira Florestal (42,7% em 2008), (Figura 2). A Fabricação de Pasta de Papel tem quase metade (47,6%) do peso da Fileira no Excedente Bruto de Exploração (EBE).

 

 

Em 2009, entre os 15 países para os quais existem dados, Portugal é o quinto país da UE-27 com maior VAB da Fileira Florestal (621 milhões de Euros) e sexto na Formação Bruta de Capital (88 milhões de Euros). Efectivamente, de acordo com os dados do Eurostat para a taxa de investimento em indústrias da Fileira Florestal de 29 países para 2009, Portugal apresentou a maior taxa de investimento na Indústria do Papel e Produtos Derivados do Papel (126,8%) e a sétima maior na Indústria da Madeira (28,1%).

De destacar ainda o facto de Portugal ser o país da UE-27 em que o rácio do VAB face à área de floresta produtiva é mais elevado, 341 Euros por hectare em 2009 (Tabela 1). Isto evidencia a capacidade que a Fileira Florestal tem tido na realização do potencial económico da floresta portuguesa.

De acordo com a OCDE, o crescimento da produtividade no setor agrícola tem sido particularmente lento em Portugal, e o país tem ficado claramente atrás dos seus parceiros Europeus (OCDE, 2010).

Com o intuito de aferir a produtividade da Fileira Florestal portuguesa, utilizaram-se os dados das Contas Nacionais do INE e as do Eurostat, para as comparações internacionais. Os dados apresentados na Tabela 2, dizem respeito ao cálculo da variação real da produtividade do trabalho para 2009, medida em milhares de Euros por Equivalente a Tempo Completo (ETC). ETC define-se como o total de horas trabalhadas dividido pela média anual de horas trabalhadas em empregos a tempo completo no território económico.

 

 

Composto maioritariamente por Pequenas e Médias Empresas (PMEs) de dimensão reduzida, a Fileira Florestal, a produtividade do trabalho rondou os 21,4 milhões de Euros por ETC em 2009, inferior em 11,6% à média da Indústria Transformadora. Entre 2008 e 2009, a par da Transformadora (-2%), a produtividade da fileira apresentou um decréscimo de 1,5%, dado que a variação negativa do VAB foi superior à do emprego, em sentido oposto ao aumento de produtividade verificado no conjunto da economia (2,2%). Este decréscimo foi acompanhado de forma mais acentuada pelas Indústrias da Madeira e do Mobiliário (-9,3% e -5,2%, respetivamente). A Indústria da Pasta, do Papel e do Cartão, muito orientada para a exportação, registou uma produtividade 2,5 vezes superior à da Indústria Transformadora e três vezes superior à do conjunto da fileira, sendo o único subsector neste período a registar uma variação real positiva da produtividade do trabalho (5,4%).

A Tabela 3 ilustra a produtividade do trabalho ajustado pelo salário na Indústria Transformadora em dois subsectores da Fileira Florestal em 2009, para um conjunto de 27 países europeus. Esta está expressa em percentagem, sendo calculada através do valor acrescentado, dividido pelos custos de pessoal e ajustado pelo rácio dos trabalhadores remunerados no total de trabalhadores empregados, de forma a tomar em consideração o facto de que todos os trabalhadores contribuem para o valor acrescentado, enquanto apenas os custos de empregados remunerados são tidos em conta nos custos de pessoal.

 

 

No conjunto dos 27 países representados na Tabela 3, Portugal ocupava o 9º lugar no ranking relativo ao número de trabalhadores empregados na Indústria Transformadora em 2009, com 718.507 trabalhadores. O mesmo não sucede relativamente às duas indústrias do complexo florestal, onde existem relativamente menos trabalhadores (35.031), colocando Portugal numa posição menos cimeira: 10º lugar na Indústria da Madeira e 13º lugar na Indústria do Papel.

Na Indústria do Papel, foram registados rácios de produtividade elevados, acima dos 200%, na Polónia, Bélgica, Eslováquia, Roménia, Bulgária e Portugal. Aamplitude de variação da produtividade na Indústria do Papel é substancial (180,6 p.p.), considerando os 260% verificados na Polónia até aos 79% da Noruega. No entanto, no sector da Madeira esta é ainda superior, 213 p.p. de diferença entre a Roménia e a Irlanda.

Portugal encontrava-se em 6º lugar na produtividade na indústria do Papel (214,6%) e em 12º na da Madeira (126,7%). As posições relativas por subsector da Fileira Florestal são todas superiores à assumida no total da Indústria Transformadora (13º). O diferencial da produtividade do trabalho ajustada pelo salário nas indústrias do complexo florestal, face à transformadora, é considerável: 68 p.p. na Indústria do Papel e 20 p.p. na da Madeira.

O emprego da Tabela 4 está representado em unidades de trabalho anuais (UTA), o que significa que esses dados não são expressos apenas por contagens do número de trabalhadores empregados, mas baseiam-se antes no input trabalhado, equivalente ao trabalho de um indivíduo ocupado a tempo inteiro nessa actividade, trabalhando o número médio de horas por ano considerado típico para essa actividade no país de referência. Esta conversão pretende dar uma visão mais realista da situação desta actividade, pois não é raro que um trabalhador com actividade florestal esteja também envolvido noutras actividades paralelas.

 

 

Em 2009, a Alemanha, a França, a República Checa e a Finlândia possuíam o maior número de trabalhadores florestais, expressos em UTAs. No entanto, se este número for ponderado pela área de florestal disponível para o fornecimento de madeira, verifica-se que foi na República Checa e em Portugal, onde se registaram os índices mais elevados de emprego por área florestal disponível (10,7 e 6,5 UTA por milhar de hectare, respetivamente). Concretamente, em Portugal, este valor tem vindo a aumentar desde 2000 (5,8 e 6,0 em 2005).

Quanto à produtividade aparente, expressa em metros cúbicos por UTA, verifica-se que, em 2009, a Finlândia, a França e a Noruega ocupavam as três primeiras posições deste ranking, aparecendo Portugal em 7º lugar (0,8 m3/UTA), onde se verifica uma redução da produtividade desde 2000 (0,9 m3/UTA). Quando expresso em VAB por UTA, são os mesmos três países que lideram a tabela, mas Portugal aparece melhor posicionado, em 5º lugar (52 milhares Euros/UTA), apesar do registo de desaceleração verificado face a 2005 (55,3 milhares Euros/UTA).

Esta análise demonstra que no seio da Fileira existem grandes discrepâncias em termos de produtividade e que existirá alguma margem de manobra para promover o aumento da produtividade primária relacionada com a floresta, nomeadamente na Indústria do Mobiliário e da Madeira.

 

4 - A especialização regional

O nível de especialização regional nas atividades da Fileira Florestal será aferido através do Quociente de Localização (QL), uma das medidas de especialização mais difundidas na literatura regional (CABRALe SOUSA, 2001; COSTA, 2002; PAIVA, 2006; RIEDL e MAIA, 2007). O Quociente de Localização é no fundo uma medida de localização que permite tecer considerações sobre o grau de especialização de uma região numa determinada atividade existente num território.

O QL compara a participação percentual de uma atividade específica numa região com a participação percentual dessa atividade no total da economia nacional. Ou seja, fornece uma medida da importância relativa de uma atividade económica numa região, tendo em conta a sua respetiva dimensão a nível nacional. Este indicador informa não só se o objeto de medição é ou não especializado, mas também o quanto ele está especializado. Mais especificamente, este traduz “quantas vezes mais” (ou menos) uma região se dedica a uma determinada atividade vis-à­vis o conjunto das regiões que perfazem a macrorregião de referência.

Habitualmente utiliza-se a participação percentual do emprego como medida de importância ou dedicação a certa atividade. Neste caso, a aplicação desta metodologia considera as regiões portuguesas NUT II e NUT III, o emprego enquanto indicador de análise, a Fileira Florestal como o conjunto das atividades e Portugal como espaço padrão.

O Quociente de Localização pode então ser obtido a partir da seguinte expressão:

Onde Xrj é o valor da atividade j na região r, X é o valor do total das atividades consideradas, na região r, Xpj é o valor da atividade j no espaço geográfico padrão p, e Xp é o valor do total das atividades consideradas no espaço geográfico padrão p.

Do valor do rácio obtêm-se as seguintes conclusões, se QLrj = 0: a região r não possui a atividade j. Se QLrj = 1, a região r tem um grau de especialização idêntico ao do espaço padrão p. Se QLrj 1 (ou 1), a região em questão é mais (ou menos) especializada na atividade j do que a região padrão.

Se o valor do QL for maior do que 1, o sector em causa é relativamente mais importante nessa região do que na região padrão, ou seja detém uma expressão da actividade da Fileira Florestal superior à verificada no contexto nacional.

Tomando em consideração a utilização da variável emprego no ano de 2009 e o caso do território português e respectivas regiões NUTS II, observamos que o emprego na Fileira Florestal apresenta uma maior expressão nas regiões Norte, Centro e Alentejo, por ordem de importância, regiões com as três maiores superfícies do solo atribuídas à ocupação florestal (Tabela 5). O emprego na Indústria da Madeira encontra-se predominantemente localizado nas regiões Norte e Centro, bem como a do Mobiliário, embora que relativamente mais afecto ao Norte do país. A região Centro apresenta um nível de concentração de mão-de­obra na Indústria da Pasta, do Papel e do Cartão cerca de duas vezes superior à média do país, sendo a combinação região/indústria com o QL mais elevado (1,9).

 

 

Considerando uma desagregação superior, a nível das regiões NUTS III, observa­se que são as sub-regiões Entre Douro e Vouga (Norte), Pinhal Interior Sul (Centro), Tâmega (Norte) e Pinhal Interior Norte (Centro) as que possuem uma concentração relativamente maior de emprego em actividades florestais (Tabela 6). No que diz respeito à Indústria da Madeira, o Pinhal Interior Sul e Entre Douro e Vouga apresentam quocientes de localização bastante elevados (9,8 e 9,1 respectivamente). O emprego na Indústria do Mobiliário está relativamente mais concentrado, em particular no Tâmega (8,6), e em menor grau no Pinhal Interior Norte (3,1) e Baixo Vouga (2,3). A Indústria da Pasta, do Papel e do Cartão, continua a apresentar valores elevados de concentração de mão-de-obra nas regiões do Centro, com particular destaque para o Médio Tejo (5,7), Beira Interior Sul (4,5) e Baixo Mondego (3,5). No entanto, a região Entre Douro e Vouga, no Norte, apresenta também um quociente de localização elevado (4,1).

 

 

5 - Comentários finais

Em Portugal, a floresta, em resultado da deliberada reflorestação ou da espontânea regeneração de terrenos abandonados, padece há séculos da influência considerável da ação humana, nomeadamente através da agricultura e da pastorícia, com consequências marcantes, não só a nível da sua destruição, mas também da sua transformação, em resultado da sua substituição por culturas ou por espécies arbóreas não autóctones.

A floresta portuguesa encontra-se portanto profundamente artificializada. As características mais marcantes da evolução da ocupação da área florestal desde o século XIX até aos nossos dias, consistem na progressiva utilização de terrenos incultos, sem grande vocação agrícola, e no alargamento da área de pinheiro­bravo, que é hoje a principal espécie produtora de madeira a nível nacional.

Ao longo de toda a análise fornecida neste estudo, é visível a tendência de desaceleração do peso do setor florestal na economia portuguesa nos últimos anos, em particular a partir de 2008, ao nível da produção, VAB e emprego. É igualmente de relevar igualmente as discrepâncias existentes, nomeadamente entre a Indústria da Papel, Cartão e seus artigos e as restantes indústrias e o seu comportamento, por vezes dissonante, relativamente ao conjunto da Fileira Florestal.

A desaceleração da produção de produtos florestais torna-se evidente a partir de 2008, apesar da tendência ascendente verificada desde 2000. Em 2009, a produção de produtos da Fileira Florestal é visivelmente afetada pelas contingências económicas globais, perdendo importância no conjunto do setor transformador. No entanto, a produção da Indústria do Papel, Cartão e seus artigos, assume pela primeira vez, em 2009, a maior representatividade na Fileira. Portugal é em 2010 o terceiro maior produtor de Pasta de Papel da UE-27, com 8,8% do total da produção.

No entanto, uma análise comparada a nível internacional deixa antever que, apesar do descrito anteriormente, a Fileira apresenta indicadores bastante favoráveis relativamente ao conjunto de países europeus. De entre os parceiros da UE-27, Portugal é o país em que o rácio do VAB face à área de floresta produtiva é mais elevado em 2009, sendo evidente a capacidade que a Fileira Florestal tem tido no aproveitamento do potencial económico da Floresta portuguesa. Em 2009, Portugal é ainda o quinto país (entre 15) com maior VAB da Fileira Florestal e sexto na Formação Bruta de Capital. Efetivamente, nesse ano, de acordo com os dados do Eurostat para 29 países, Portugal apresentou a maior taxa de investimento na Indústria do Papel e Produtos Derivados do Papel e a sétima maior na Indústria da Madeira. Também a população empregada na Fileira Florestal tem vindo a diminuir em anos mais recentes, bem como o seu peso na população ativa total e da Indústria Transformadora, apesar do quadro de estabilização nas duas décadas anteriores a 2005. Em 2009, foi responsável por cerca de 1,9% do emprego nacional, correspondendo a um efetivo de cerca de 95 mil empregos diretos, estimando­se ser o impacto indireto quatro vezes superior. Numa perspetiva comparada, ponderando o número de trabalhadores florestais pela área florestal disponível para o fornecimento de madeira, Portugal é o segundo país de entre 24 pertencentes à UE-27, a registar os índices de emprego mais elevados. O emprego na Fileira Florestal apresenta uma maior expressão nas regiões Norte, Centro e Alentejo, que possuem as três maiores superfícies do solo atribuídas à ocupação florestal.

Em Portugal, é amplamente reconhecido o défice de produtividade da maioria dos setores industriais comparativamente à média europeia. Designadamente o crescimento da produtividade no setor agrícola tem permanecido particularmente retardado. Composto maioritariamente por pequenas e médias empresas de reduzida dimensão (apesar das discrepâncias existentes entre a Indústria da Pasta de Papel, em média de grande dimensão, e a Indústria da Madeira e da Reparação de Mobiliário), a produtividade do trabalho na Fileira Florestal foi inferior em 11,6% à média da Indústria Transformadora. Entre 2008 e 2009, a produtividade da fileira apresentou um decréscimo de 1,5%, em sentido oposto ao aumento de produtividade de 2,2% verificado no conjunto da economia.

É de relevar a existência de discrepâncias substanciais no seio da Fileira Florestal. A Indústria da Pasta, do Papel e do Cartão regista habitualmente valores de produtividade cerca de 2,5 vezes superior à da Indústria Transformadora e três vezes superior à do conjunto da Fileira, indicando que existe algum potencial por explorar no que toca ao aumento da produtividade na Indústria do Mobiliário e da Madeira.

 

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Agradecimentos

As autoras gostariam de agradecer ao Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério da Economia e do Emprego o acesso aos dados referentes aos Quadros de Pessoal.