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Revista Portuguesa de Saúde Pública

versão impressa ISSN 0870-9025

Rev. Port. Sau. Pub. vol.29 no.2 Lisboa jul. 2011

 

Utilização do SF–6D na medição das preferências dos portugueses: sistema de valores e normas da população dos 18 aos 64 anos

 

Lara Ferreiraa, Pedro Ferreirab

aEscola Superior de Gestão, Hotelaria e Turismo, Universidade do Algarve; Centro de Estudos e Investigação em Saúde da Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal. Lnferrei@ualg.pt

bFaculdade de Economia, Universidade de Coimbra; Centro de Estudos e Investigação em Saúde da Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal

 

Resumo

Introdução: Existe um interesse crescente no estudo da variação entre países das valorações dos estados de saúde e alguma evidência recente sugere que os resultados de um país não têm necessariamente que ser transferidos para outros países. Nos últimos tempos tem–se assistido ao desenvolvimento de sistemas de valores dos instrumentos de medição de preferências mais utilizados, como o EQ–5D, o HUI e o SF–6D. Recentemente foi publicado um artigo com o sistema português de valores do SF–6D. No entanto, esse sistema de valores apresentava incoerências ao nível dos pesos de alguns níveis das seis dimensões do SF–6D. A correcção das incoerências permitiria melhorá–lo. O objectivo deste artigo é apresentar o sistema português de valores do SF–6D agora livre de incoerências e determinar as respectivas normas da população portuguesa dos 18 aos 64 anos. Metodologia: Foram identificados os níveis das dimensões que tinham incoerências. Esses níveis foram agregados e estimaram–se modelos parcimoniosos pelas equações de estimação generalizadas. As normas portuguesas para os indivíduos com idades compreendidas entre os 18 e os 64 anos para o SF–6D foram obtidas a partir da aplicação dos resultados do melhor modelo parcimonioso aos dados de uma amostra aleatória da população portuguesa dos 18 aos 64 anos (n = 2.459) a quem tinha sido aplicado o SF–36v2. Resultados: A agregação de alguns níveis do SF–6D onde se verificavam incoerências permitiu obter um sistema português de valores para o SF–6D. No entanto, ainda se verificam problemas ao nível da subestimação nalguns estados de saúde graves. A utilidade média dos estados de saúde da população activa portuguesa situou–se em 0,81 (associada a um desvio padrão de 0,12). Calcularam–se as normas portuguesas do SF–6D relativas à população dos 18 aos 64 anos por género, grupo etário, estado civil e nível habilitacional, tendo–se observado valores mais baixos de utilidade nas mulheres, nos indivíduos mais velhos, nos indivíduos com um nível mais baixo de instrução, nos viúvos e nos indivíduos residentes em zonas rurais. Conclusão: Esta investigação demonstra que é possível obter sistemas de pesos para a medição da qualidade de vida relacionada com a saúde. Este modelo melhora significativamente os resultados apresentados anteriormente, embora ainda subsistam limitações ao nível da subestimação nalguns estados de saúde graves. As normas portuguesas são úteis para contextualizar os valores obtidos pelo SF–6D e permitir uma interpretação dos resultados de investigação obtidos.

Palavras Chave: Instrumentos de medição da qualidade de vida relacionada com a saúde baseados em preferências. Normas portuguesas. Qualidade de vida relacionada com a saúde. SF–6D. Utilidades dos estados de saúde.

 

The Portuguese SF–6D for measuring preferences: a set of values and norms for individuals aged 18 to 64

Abstract

Introduction: There has been an increasing interest in the study of the health state valuations across countries. Evidence suggests that health state valuations may differ from country to country. In recent years there has been increasing interest in surveys conducted to obtain value sets for the most used preference–based instruments, such as the EQ–5D, the HUI and the SF–6D. A Portuguese value set for the SF–6D was recently published. However this system weight had some inconsistencies in what concerned the weights of the six dimensions of the SF–6D. The correction of these inconsistencies would improve the value set. This study seeks to present the Portuguese system weight for the SF–6D without inconsistencies. It also aims at providing Portuguese norms for individuals aged 18–64 for the SF–6D. Methods: Inconsistencies were found in some levels of the dimensions of the SF–6D. These levels were aggregated and parsimonious models were estimated through generalized estimating equations. The data used to obtain the Portuguese norms for individuals aged 18–64 came from a random sample of the Portuguese population aged 18–64 (n=2,459). The SF–36v2 was applied to this sample and results from the best parsimonious model were used to obtain the Portuguese norms for individuals aged 18–64. Results: Aggregating levels of each dimension whenever inconsistencies occurred enabled to obtain a Portuguese system weight for the SF–6D. However there are still some problems of under prediction in some states assigned to poor health. The mean utility value obtained for the Portuguese working age population was 0.81 (associated with a standard deviation of 0.12). Portuguese norms for the SF–6D for individuals aged 18–64 were computed by gender, age, marital status and educational level. Lower levels of utilities were observed in women, the elderly, individuals with low educational level, widowed and individuals living in rural areas. Conclusion: This research demonstrates that it is possible to estimate preference weights for measuring health related quality of life. This model improves significantly the results previously presented. There is still evidence of under prediction in some states. The Portuguese norms play an important role in the interpretation of research results.

Keywords: Health–related quality of life preference–based instruments Portuguese norms. Health–related quality of life. SF–6D. Health state utilities.

 

Introdução

Existe um interesse crescente no estudo da variação entre países das valorações dos estados de saúde e alguma evidência recente sugere que os resultados de um país não têm necessariamente que ser transferíveis para outros países. Nos últimos tempos tem-se assistido ao desenvolvimento de sistemas de valores dos instrumentos de medição da qualidade de vida relacionada com a saúde baseado em preferências mais utilizados, como o EQ-5D, o HUI e o SF-6D.

O SF-6D é um instrumento de medição da qualidade de vida relacionada com a saúde baseado em preferências. Foi desenvolvido por Brazier, Roberts e Deverill1 e recentemente têm sido muitos os estudos publicados utilizando aquele instrumento (e.g.2-16). Nos últimos quatro anos foram desenvolvidos estudos para determinar o sistema de valores para o Japão17 e Hong-Kong18. Em 2006 foi publicada a versão portuguesa do SF-6D19 e em 2009, o sistema português de valores do SF-6D20. No entanto, esse sistema apresentava algumas limitações. As principais limitações eram a existência de incoerências nos pesos de alguns níveis das dimensões do SF-6D. A correcção dessas incoerências permitiria obter um sistema de valores para o SF-6D para Portugal melhor que o anterior.

A contextualização de estudos realizados em Portugal de qualidade de vida relacionada com a saúde, de avaliação económica (nomeadamente de análises custo-utilidade) e/ou de estudos de outra natureza em que seja utilizado o SF-6D, é importante e necessária para muitos investigadores. Neste sentido, existe uma clara necessidade da existência de normas para a população portuguesa para o SF-6D.

O objectivo deste artigo é apresentar o sistema português de valores do SF-6D sem incoerências e determinar as normas da população portuguesa dos 18 aos 64 anos.

 

Metodologia

Sistema português de valores do SF-6D

O desenho do estudo encontra-se descrito pormenorizadamente noutros artigos20,21, apresentando-se aqui apenas um resumo. A valoração dos estados de saúde foi realizada utilizando a técnica do Jogo Padrão, aplicado por entrevista pessoal. Cada indivíduo respondeu às versões portuguesas do SF-36v222,23, do EQ-5D e do SF-6D19 e a questões de natureza sócio-demográfica. Em seguida, cada indivíduo ordenou seis estados de saúde definidos pelo SF-6D, acrescidos de mais três estados: melhor (111111) e o pior (645655) definidos pelo sistema descritivo do SF-6D e a morte imediata. Posteriormente, foram colocadas aos respondentes seis questões de Jogo Padrão, em que tinham que valorizar os seis estados de saúde definidos pelo SF-6D num jogo contra o melhor (111111) e o pior estado de saúde (645655 ou morte imediata), consoante a ordenação efectuada pelos respondentes.

Utilizou-se uma amostra estratificada óptima que se pretendeu ser representativa da população portuguesa, reflectindo a sua variabilidade em termos de idade e género20,21. A dimensão da amostra foi determinada com um nível de confiança de 95% e uma precisão relativa de 4,6%. Os indivíduos foram seleccionados aleatoriamente de uma base de amostragem da população portuguesa com mais de 15 anos de idade, que incluía nome, morada, género, idade e residência. As entrevistas foram realizadas nas residências dos indivíduos, entre Abril e Outubro de 2006.

Os respondentes avaliaram um total de 55  estados de saúde, tendo cada estado de saúde sido avaliado em média dez vezes (mínimo 9, máximo 11), representando um total de 630 valorações20,21.

O modelo geral definido foi o seguinte20,21:

 

 

onde i = 1,2,..., n representa os estados de saúde, j = 1,2,..., m representa os respondentes, yij é o valor ajustado do estado de saúde i valorizado pelo respondente j, x'ij = (x1ij, x2ij,...,xnij) é um vector de v variáveis dummy explicativas referenciadas à mesma unidade, nas quais xnij = xdlij para cada nível λ da dimensão δ do SF-6D. Para qualquer estado de saúde as variáveis dummy explicativas são definidas como λ se, para esse estado de saúde, a dimensão d está no nível l, e igual a 0, em caso contrário, sendo o nível 1 a base para cada dimensão. O termo r'ij = (r1ij, r2ij,...,ruij) é um vector de u variáveis interaccionadas entre os níveis dos diferentes atributos, também referenciadas à mesma unidade, β' = (β1, β2,...,βv) e θ' = (θ1, θ2,...,θu) são vectores de parâmetros. O termo uj é a variação específica do respondente que se assume variar aleatoriamente entre os respondentes e eij é um termo de erro da i-ésima avaliação do estado de saúde pelo indivíduo j, assumindo-se que varia aleatoriamente entre as observações com N [0,σ2e]. Para além disto, Cov(uj,eij) = 0, o que significa que a alocação dos estados de saúde pelos respondentes é aleatória. Foi ainda incluída no modelo uma variável dummy em representação de todas as situações em que qualquer dimensão se encontra no pior nível (PIOR), definida como tomando o valor 1 se qualquer dimensão estiver no nível mais grave e 0 caso contrário.

Foram estimados diversos modelos cujos resultados são apresentados com algum detalhe em Ferreira et al.20,21. Resumidamente pode-se referir que foram estimados modelos lineares, modelos lineares mistos e modelos de efeitos aleatórios com a constante forçada à unidade pelas equações de estimação generalizadas (EEG), uma extensão do modelo linear generalizado para dados correlacionados. Foi utilizada uma bateria de medidas de bondade do ajustamento, que levou à escolha do modelo de efeitos aleatórios estimado com a constante forçada à unidade pelas EEG com efeitos principais. No entanto, este modelo apresentava algumas incoerências, na medida em que se esperava que os coeficientes estimados aumentassem em grandeza absoluta, uma vez que as variáveis dummy representam problemas progressivamente piores em cada dimensão, quando comparadas com a base de cada dimensão20,21. Por esta razão, considerou-se que ocorria uma incoerência quando um coeficiente estimado diminuísse em valor absoluto, quando se passasse para um nível mais grave de uma dada dimensão. Para resolver este problema, seguiu-se uma abordagem já utilizada na literatura24: agregaram-se os níveis das dimensões em que ocorriam incoerências, de forma a obter escalas consistentes. Os modelos foram então estimados novamente, tendo-se obtido modelos parcimoniosos sem incoerências21.

Normas portuguesas do SF-6D dos indivíduos entre 18 e 64 anos

Para a obtenção das normas portuguesas dos 18 aos 64 anos foi utilizada uma amostra aleatória de 2.459  indivíduos pertencentes à população residente em Portugal continental, com idades entre 18 e 64 anos de idade, cujo desenho amostral se encontra descrito com mais detalhe em Ferreira e Santana25.

Embora a amostra tenha sido aleatoriamente seleccionada, diferia ligeiramente da população portuguesa entre os 18 e os 64 anos. Para resolver este problema, foi necessário utilizar métodos de estimação pós-estratificados para ponderar (ajustar) os resultados iniciais por idade e género, de acordo com os valores da população portuguesa11. Neste estudo, os dez pós-estratos resultantes do cruzamento das duas variáveis eram conhecidos ao nível populacional. O problema de estimação foi assim reduzido ao caso em que se utiliza apenas uma variável de pós-estratificação sendo os métodos de pós-estratificação directamente aplicáveis. Foram utilizados estimadores pós-estratificados, baseados na abordagem design-based, que considera que as características da população são fixas e que a componente probabilística é introduzida quando se adopta um determinado plano de amostragem26. Os estimadores utilizados são apresentados seguidamente.

Sendo yhi a utilidade SF-6D do i-ésimo indivíduo pertencente ao pós-estrato h, o estimador pós-estratificado para a média é dado pela equação seguinte11:

 

 

onde N é a dimensão da população, n é a dimensão da amostra, Nh é o número de indivíduos da população que pertencem ao pós-estrato h e nh é o número de indivíduos da amostra que pertencem ao mesmo pós-estrato. A partir desta equação é possível concluir que o estimador pós-estratificado é uma média ponderada, em que as utilidades de cada indivíduo pertencente à amostra são pesadas. Isto é, os resultados amostrais são ajustados pelos pesos de acordo com as classes definidas na população da variável auxiliar qualitativa.

A média da utilidade SF-6D para um subgrupo da população (e.g. mulheres) deveria ser estimada utilizando um estimador pós-estratificado para domínios. Sendo um domínio uma subpopulação de dimensão desconhecida, para a qual se pretendem estimar parâmetros, se for possível identificar domínios de estudo antes de a amostra ser recolhida, então o plano de sondagem a adoptar deverá ter em consideração esses domínios planeados, considerando-os como estratos27.

Como na definição do plano de sondagem não se tomou em consideração a definição desses domínios (e.g. mulheres, homens, casados, solteiros, etc.) como estratos, eles são designados como domínios não planeados.

Da mesma forma, sendo ydhi a utilidade SF-6D observada do i-ésimo indivíduo pertencente ao pós-estrato h no domínio d, o estimador pós-estratificado para a média dos domínios é dado pela equação27:

 

 

onde Nd é a dimensão da população no domínio d, nd é a dimensão da amostra no domínio d, Ndh é o número de indivíduos da população que pertencem ao pós-estrato h no domínio d e ndh é o número de indivíduos da amostra que pertencem ao mesmo pós-estrato no domínio d. Nos casos em que o domínio coincide com o pós-estrato, Ndh = Nh e ndh = nh, as equações (2) e (3) são análogas.

Na tabela 1 são indicados os ponderadores finais utilizados para cada estrato, as dimensões amostrais e populacionais28 por género e classe etária.

 

Tabela 1 - Dimensão populacional, dimensão amostral, pesos na população e na amostra e ponderadores por estrato

 

Os indivíduos responderam à versão portuguesa do SF-36v2 e a questões de caracterização. O questionário foi aplicado por entrevista pessoal em 200225. O sistema de valores parcimonioso do SF-6D foi aplicado a esses dados para determinar as preferências dos indivíduos e obter as normas da população portuguesa dos 18 aos 64 anos.

Para apresentação das normas portuguesas dos 18 aos 64 anos foi realizada uma análise descritiva, tendo-se calculado frequências e medidas de estatística descritiva para os valores do SF-6D. A sua organização em tabelas seguiu a estrutura dos valores apresentados para o EQ-5D no Reino Unido29 e noutros países30. Foram também realizados testes paramétricos e testes não paramétricos na análise da existência de diferenças entre os grupos sociodemográficos. A análise de dados e a modelação econométrica foram realizadas nos programas Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 17.0 e Stata, versão 9.1.

 

Resultados

Sistema português de valores do SF-6D

A tabela 2 apresenta os resultados dos modelos estimados pelas EEG (M1 e M2) que foram considerados os melhores modelos em termos da bateria de medidas de bondade do ajustamento, número de coeficientes negativos e número de coeficientes significativo21. Como se pode observar pela tabela 2, esses modelos apresentavam cinco incoerências, na medida em que se verificaram cinco situações em que um coeficiente estimado diminuía em valor absoluto, quando se passava para um nível mais grave de uma dada dimensão. Neste sentido, decidiu-se agregar os níveis das dimensões em que ocorriam incoerências24 e estimar novamente os modelos, tendo-se obtido modelos parcimoniosos sem incoerências21, que são também apresentados na tabela 2.

 

Tabela 2 - Modelos EEG e modelos coerentes parcimoniosos (n = 630)

 

O modelo parcimonioso para o M1 (M3) corresponde à especificação preferida para o sistema de valores do SF-6D e é consistente com o sistema de valores do SF-6D do Reino Unido21.

A figura 1 compara os valores dos estados de saúde previstos pelo M3 com os observados. A partir da figura é possível concluir que embora a subprevisão dos estados de saúde menos graves tenha sido reduzida relativamente aos resultados apresentados anteriormente20, existe ainda um problema de subprevisão dos estados de saúde mais graves. No entanto, a figura 1 mostra claramente que, de uma forma geral, o M3 prevê adequadamente os estados de saúde observados.

 

Figura 1 - Valores dos estados de saúde observados e previstos pelo M3. Fonte: adaptado de Ferreira et al.21.

 

Normas portuguesas do SF-6D dos indivíduos entre 18 e 64 anos

Na tabela 3 são resumidas as principais características da amostra utilizada (n = 2.459) e da população portuguesa com idades compreendidas entre os 18 e os 64 anos28,31,32.

 

Tabela 3 - Principais caracterí da amostra e da população portuguesa (18-64 anos)

 

Os 2.459 indivíduos pertencentes à amostra tinham uma idade média de 37  anos (DP  =  11), sendo na sua maioria mulheres (58,1%). Com idades compreendidas entre os 18 e os 64 anos, a amostra era predominantemente constituída por indivíduos entre os 35 e os 54 anos de idade (64,4%). É ainda de referir que 69,5% dos indivíduos eram casados ou viviam em união de facto e 25,5% eram solteiros. Cerca de 47% dos indivíduos tinham um nível baixo de escolaridade (primário ou básico) e 5,5% não sabiam ler, nem escrever. No que respeita à sua situação face ao trabalho, cerca de 30% eram trabalhadores qualificados e cerca de 35% não qualificados; por outro lado, 16,9% eram domésticas. Relativamente ao local de residência, cerca de 63% residiam numa zona rural e cerca de 37% numa zona urbana ou semiurbana.

A tabela 4 apresenta a distribuição das respostas dos indivíduos às dimensões do SF-6D.

 

Tabela 4 - Distribuição das frequências relativas das dimensões do SF-6D (%) (n = 2.459)

 

Estes resultados mostram níveis elevados de problemas nas dimensões Limitação no Desempenho, Dor Física, Saúde Mental e Vitalidade, uma vez que mais de 56,1% dos indivíduos responderam nos níveis 3 a 6. Além disto, 65,5% dos indivíduos identificaram algumas limitações na Função Física e 53,6% na sua Função Social. É ainda de notar que as dimensões Função Física e Limitação no Desempenho apresentam um elevado número de indivíduos nos seus últimos níveis, evidenciando o problema de efeito chão, uma das limitações que caracterizam o SF-6D3,6,8,9,11,12,33.

O recurso aos estimadores pós-estratificados permitiu o cálculo da utilidade média dos estados de saúde da população activa portuguesa, tendo-se chegado a um valor médio de 0,81 (DP = 0,12). As normas portuguesas do SF-6D relativas à população dos 18 aos 64 anos por género, grupo etário, estado civil e nível habilitacional foram calculadas utilizando-se os estimadores pós-estratificados para domínios, tendo-se previamente definido os estratos a partir do género e dos grupos etários, tal como já havia sido referido. Os resultados são apresentados nas tabelas 5 e 6.

 

Tabela 5 - Normas do SF-6D relativas à população portuguesa dos 18 aos 64 anos. medidas descritivas do SF-6D por género e grupo etário

 

 

Tabela 6 - Normas do SF-6D relativas à população portuguesa dos 18 aos 64 anos. medidas descritivas do SF-6D por estado civil e habilitações literárias

 

A partir das tabela 5 e dos testes paramétricos realizados foi possível observar os valores mais baixos de utilidade atribuídos pelas mulheres quando comparados com os dos homens (t = -9,114; gl = 2.425; p < 0,001). São também os jovens (18-24 anos) os indivíduos que apresentaram valores médios mais elevados, sendo as diferenças em relação aos mais velhos significativas para todos os grupos etários (H = 144,300; gl = 4; p < 0,001). Contudo, estes valores não são tão elevados como os observados noutras populações, talvez por causa de uma tendência dos portugueses referirem valores mais baixos em termos de avaliação do estado de saúde (veja-se por exemplo34-36).

Analisando a tabela 6 verifica-se que as utilidades médias foram 0,13 mais baixas no nível mais baixo de instrução quando comparado com as do nível de instrução mais alto (H = 270,924; gl = 3; p < 0,001). Na tabela 6 constata-se também que as pessoas solteiras e as casadas/união de facto apresentam valores médios de utilidade mais altos quando comparados com os viúvos e os divorciados/separados (H = 101,163; gl = 3; p < 0,001).

Verificou-se também que os habitantes em áreas rurais apresentaram também valores médios mais baixos de utilidade em relação aos cidadãos que vivem nas áreas urbanas (t  =  3,107; gl  =  1971; p  <  0,005). Em relação à situação profissional, os trabalhadores não qualificados, as domésticas e os aposentados/reformados apresentaram valores de utilidade mais baixos do que os trabalhadores qualificados e do que os estudantes (H = 215,962; gl = 5; p < 0,001).

 

Conclusão

Neste artigo foi apresentado o sistema português de valores do SF-6D sem incoerências, que era uma das limitações encontrada nos resultados publicados recentemente em Ferreira et al.20. Estes resultados proporcionam um sistema de valores adaptado às especificidades e cultura da população portuguesa e, portanto, uma alternativa ao sistema de valores britânico do SF-6D.

Este sistema foi aplicado a uma amostra da população portuguesa dos 18 aos 64 anos (n = 2.459) que havia respondido ao SF-36v2, após se ter aplicado a pós-estratificação de forma a ajustar os resultados iniciais por idade e género, de acordo com os valores da população portuguesa. Desta forma, obtiveram-se as normas portuguesas dos 18 aos 64 anos do SF-6D por idade, género, estado civil e nível de habilitações literárias.

É, ainda, de referir que, seguindo a opinião de alguns autores37 que realçam a necessidade da validação do sistema de valores obtido para um determinado país a partir da população em geral, em amostras de doentes e em subgrupos culturais eventualmente existentes na população em geral, já se iniciou a sua validação em amostras de indivíduos com algumas doenças com elevada prevalência em Portugal, como a artrite reumatóide2, as cataratas10 e a asma13 e está neste momento a ser desenvolvida noutras doenças, como a doença pulmonar obstrutiva crónica. Prevê-se, para um futuro próximo, a sua validação em oncologia e em outras doenças do foro reumatológico.

 

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Agradecimentos

Os autores agradecem a John Brazier por todo o seu apoio.

 

Recebido em 13 de Abril de 2010

Aceite em 3 de Julho de 2011