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Revista de Ciências Agrárias

versão impressa ISSN 0871-018X

Rev. de Ciências Agrárias v.33 n.2 Lisboa dez. 2010

 

Efeito da fertilização fosfatada na culturada batata (solanum tuberosum l.) no planalto do huambo (Angola)

 

Imaculada da Conceição Henriques1, Ilídio Moreira2 & Ana Monteiro3

1Cooperativa de Multiplicadores de Semente de Batata da Ekunha, Rua Principal Ekunda, Huambo, Angola. E-mail: imaculadahenriques@portugalmail.pt

2Instituto Superior de Agronomia, Tapada da Ajuda 1349-017 Lisboa, Portugal. E-mail: ilidiomor@sapo.pt

3Instituto Superior de Agronomia, Tapada da Ajuda 1349-017 Lisboa, Portugal. E-mail: anamonteiro@isa.utl.pt

 

RESUMO

Relatam-se ensaios realizados, no ano agrícola 2004/5, em blocos completos casualizados, para estudo do efeito na produção de doses de fertilização fosfatada da cultivar de batata-semente importada ‘Romano’ e da cultivar regional ‘Tchigembo’, plantadas em duas datas (Outubro e Fevereiro) da época das chuvas e numa terceira data (Junho), na época seca, praticada em regadio. Os ensaios foram repetidos em três locais da Província do Huambo – Bailundo, Chianga e Calenga – distanciados de cerca de 50 km. Avaliaram-se os efeitos, na produção total e comercial de tubérculos (diâmetro > 25 mm), de diferentes doses de fósforo, na forma de superfosfato simples (24% de P2O5), tendo-se aplicado uniformemente ureia (300 kg ha-1 de N), fraccionada em três aplicações. As doses de fósforo ensaiadas foram 0, 50, 100, 200, 400 e 800 kg ha-1 de P2O5, comparadas com uma testemunha sem qualquer aplicação de fertilizante, azotado ou fosfatado. As modalidades de fertilização azotada receberam, uniformemente 300 de azoto. A dose que maior benefício económico originou, sem desperdício de químicos para o meio ambiente, foi a de 200 kg ha-1 de P2O5.

Palavras-chave: fertilização fosfatada, produção, benefícios/custos.

 

Effects of phosphorus fertilization on potato (solanum tuberosum l.) crop production, in huambo country (Angola)

ABSTRACT

Several trials were carried out to compare total and commercial potato yield of the imported cultivar ‘Romano’ and the regional cultivar ‘Tchigembo’, planted in two dates on rain season (October and February) and in a third date (June), in dry season, with irrigation. The trials were repeated in three locations of the Huambo country – Bailundo, Chianga and Calenga. The effects on total and commercial (tubers diameter > 25 mm) potato yields of different amounts of phosphorus, applied with single superphosphate (24% of P2O5) were evaluated. Treatments were: control (any type of soil fertilization) null, 50, 100, 200, 400, and 800 kg ha-1 of P2O5. Phosphorus treatments received also 300 kg ha-1 of nitrogen (urea) applied uniformly, in three times. The greatest economic benefice for both potato varieties was 200 kg ha-1 of P2O5.

Key-words: phosphorus fertilization, production, benefits/costs.

 

INTRODUÇÃO

As baixas produtividades da produção de batata (Solanum tuberosum L.) em Angola e, em particular, na Província do Huambo têm sido referidas em diversos trabalhos, tanto do período colonial (Sardinha & Carriço 1975), como recentes (FAO 2006; Neto et al. 2006), e discutida em Henriques (2008) e Henriques et al. (2009), mostrando o interesse dos estudos e, principalmente, da divulgação de boas práticas agrícolas, nos quais se devem privilegiar os da adequada adubação.

A problemática da assimilação do fósforo nos solos tropicais é bem conhecida e já amplamente equacionada nas condições angolanas por Dias (1973a, 1973b), tendo-se salientado, em estudos em vasos divulgados em Dias et al. (2006) e cuja metodologia foi detalhadamente justificada por Moreira & Dias (1963), as elevadas carências dos solos do Huambo em fósforo. Como recentemente foi lembrado por Rodrigues (2005), sendo os solos da região do Huambo predominantemente ferralíticos, por natureza pobres em nutrientes, principalmente azoto, fósforo, enxofre, cálcio, magnésio, zinco e boro, só com o recurso a fertilizações químicas é que se tornam razoavelmente produtivos. No entanto, para que sejam economicamente viáveis, é necessário que os nutrientes sejam fornecidos de forma racional e sustentável. Como referido pelos autores citados, tratando-se duma região com elevadas precipitações, o azoto deverá ser fornecido, preferencialmente, sob forma de adubos amoniacais e de modo fraccionado, de forma a contrariar as importantes perdas por lixiviação; e o fósforo, sendo um nutriente que é rapidamente imobilizado, na presença de óxidos de ferro e alumínio e assim tornando-se indisponível para as plantas, deverá ser aplicado de forma localizada e de preferência na forma de adubo granulado. O enxofre, outro nutriente cuja carência assume, também, expressão significativa nesta região, necessita de uma correcção tanto mais precisa quanto mais intensa for a utilização do solo.

Refira-se que, em regiões não tropicais, a batateira beneficia com a aplicação de fósforo mesmo em solos com elevados teores deste nutriente, em especial nos de textura ligeira, de acordo com informação de manual elaborado pelo Laboratório Químico Agrícola Rebelo da Silva (2006). Lembra-se ainda que, segundo esta fonte, a batata tem uma alta sensibilidade à carência do nutriente secundário magnésio e do micronutriente manganês.

De acordo com Rodrigues (2005), o uso do adubo superfosfato simples é uma boa opção, porque, para além de fósforo e de cálcio, fornece quantidades apreciáveis de enxofre. Efectivamente, como salientou Santos (1996), este macronutriente secundário, “apesar de absorvido pela batateira em quantidades reduzidas, é indispensável e exerce importante função na sanidade da planta e em certos aspectos da qualidade dos tubérculos”. Porém, não sendo aquele tipo de adubo conhecido pelos pequenos agricultores da região, que geralmente, quando fertilizam o solo, aplicam o adubo composto 12-24-12, para que aquele adubo seja utilizado correctamente, são necessários estudos demonstrativos de aplicação e de rentabilidade económica.

Anote-se que, expressamente para a cultura da batateira em Angola, Pestana (1962) estudou diversos ensaios de fertilização no Centro de Estudos da Cela (actual Waco-Kungo), tendo encontrado benefícios com a adubação fosfatada em solos ferralíticos, até 300 kg ha-1 de P, aconselhando novos ensaios com níveis superiores de adubação. Todavia as recomendações divulgadas, pela revista da Associação dos Agricultores de Angola, eram bastante mais baixas, talvez por prudência ou falta de experimentação, como constam nos artigos de divulgação de Andrade (1961a, b, c, d) e, também, no trabalho de Dias (1973a).

Asanzi et al. (2006) apresentaram resultados de estudos recentes de fertilização da batateira em numerosos locais do Planalto Central tendo indicado, para as cultivares ‘Romano’ e ‘Diamant’, as expectativas da produção, respectivamente, de 4 e 7 t ha-1, na época das chuvas, com uma fertilização de 100 kg ha-1 de N e 200 kg ha-1 de P, e na época seca, em regadio, a produção de 12 e 16 t ha-1 com 320, 240 e 120 kg ha-1 de N, P e K.

O objectivo do trabalho que agora se descreve foi, pois, contribuir para a avaliação das doses de adubo economicamente viáveis para as condições agrícolas e socioeconómicas da região do Huambo, na cultura da batata, para a qual a Província tem boas condições edafo-climáticas (Diniz 1991).

 

MATERIAL E MÉTODOS

Caracterização dos locais de estudo

Tal como os ensaios de cultivares e aplicação de produtos fitofarmacêuticos (Henriques et al. 2009), os ensaios decorreram em três regiões da Província do Huambo, Bailundo, Chianga e Calenga, distanciados de cerca de 50 km. A localização dos ensaios e as características edafo-climáticas dos locais escolhidos foram anotadas neste trabalho agora citado, sendo que aos solos, respectivamente no Bailundo, na Chianga e na Calenga, correspondem as texturas areno-limosa, argilosa e argilo-limosa e o pH variou, nos 3 locais, entre 5,2 e 5,5. A riqueza dos solos em fósforo, antes dos ensaios, era, respectivamente, de 3,43 e 21 mg L-1.

Em cada local foram conduzidos, na campanha agrícola 2004/5, ensaios em três épocas, a primeira no período entre Outubro a Janeiro, a segunda de Fevereiro a Maio e a terceira, época de regadio, entre Junho e Setembro.

Técnicas culturais

Considerou-se que se deveriam testar duas cultivares, uma seleccionada importada e outra regional. Os ensaios acima referidos, em que se avaliaram diversas cultivares importadas e regionais com e sem aplicação de produtos fitofarmacêuticos (Henriques et al. 2009), levaram à escolha, entre as importadas, pelos bons resultados e em especial pela sua boa aceitação, da ‘Romano’ e, entre regionais, por motivos idênticos, da ‘Tchingembo’.

A área total de cada ensaio de 1 075,2 m2 (44,8 m de largura x 24 m de comprimento) foi dividida em 56 parcelas com 16 m2 (3,2 m x 5 m) cada. Os dados foram colectados na área central de cada parcela (área útil) com 8 m2, utilizando-se um compasso de plantação de 20 cm na linha e 80 cm na entrelinha.

Na primeira e segunda data de plantação, época chuvosa e quente, a cultura foi tratada com o fungicida mancozebe + metalaxil-M (Ridomil©, da empresa Syngenta), nas doses recomendadas pela empresa. Na 1ª plantação foram efectuadas três aplicações de fungicidas, nos dias 22 de Novembro, 6 e 21 de Janeiro nos três locais, e na 2ª plantação apenas se efectuou uma, em 10 de Março na Calenga e na Chianga e a 12 de Março no Bailundo. Na terceira época de plantação, época seca, em que a cultura foi regada por alagamento, não houve problemas devido a doenças mas as pragas tiveram que ser controladas com o insecticida lambda-cihalotrina (Karate+©, Syngenta). Efectuaram-se três aplicações na Calenga (12 e 30 de Julho e 15 de Agosto), uma na Chianga (25 de Julho) e duas no Bailundo (26 de Julho e 15 de Agosto). O tratamento com os produtos fitofarmacêuticos foi feito com um pulverizador manual de dorso com bicos cónicos. O insecticida foi aplicado na dose de 150 L ha-1 de calda, com a concentração de 0,5% (v/v) de produto na calda, e o fungicida na dose de 500 L ha-1 de calda, com a concentração de produto de 0,5% (p/v).

Na plantação da época seca efectuou-se uma vintena de regas.

O combate às infestantes foi efectuado manualmente.

Modalidades de fertilização

Os fertilizantes utilizados foram o superfosfato simples (com 24% de P2O5), como adubação de fundo, e ureia, fraccionada em três aplicações, uma de fundo e duas de cobertura (15 e 30 dias após emergência). A dose de azoto utilizada, excepto na testemunha, foi sempre 300 kg ha-1, em três aplicações fraccionadas.

Foram ensaiadas oito modalidades de fertilização: Testemunha sem aplicação de qualquer fertilizante, quer azotado quer fosfatado, e P0, P50, P100, P200, P400 e P800 kg ha-1 de fósforo, expresso em P2O5, sempre com a aplicação de azoto referida anteriormente.

Observações e análise estatística

O delineamento experimental consistiu num sistema de quatro blocos completamente casualizados, por época de cultura e por dose de fósforo (as oito modalidades referidas anteriormente).

Os parâmetros avaliados foram o número total de tubérculos, número de tubérculos comerciais, número de tubérculos podres ou bichados, peso total dos tubérculos, peso comercial de tubérculos e peso dos tubérculos podres.

Após a contagem e pesagem do número total de tubérculos, realizou-se a classificação dos tubérculos de acordo com o diâmetro transversal, dividindo-se em duas classes: comercial – tubérculos com diâmetro superior a 25 mm –; descarte – tubérculos inferiores a 25 mm. Nesta última classe foram igualmente incluídos os tubérculos que apresentavam sintomas de Fusarium sp., Pectobacterium spp. (anteriormente designadas por Erwinia spp.) e Ralstonia solanacearum (Smith) Yabuuchi et al.

Para análise económica utilizou-se o rendimento comercial, estipulando-se o preço por kg de 0,65 USD para a cultivar ‘Romano’ e 0,44 USD para a ‘Tchingembo’. O adubo estava cotado no mercado a 800 USD/tonelada.

Os dados relativos ao rendimento total e comercial foram submetidos à análise de variância usando o programa Statistix 8 (Analytical Software, Tallahassee, FL). Uma análise de variância preliminar com os dados combinados revelou interacção entre tratamentos-locais e tratamentos-época de cultura chuvas vs regadio. Nas duas épocas de chuvas não se verificaram diferenças significativas, quer entre locais quer entre modalidades, pelo que se considerou o valor médio das produções obtidas nas análises seguintes. Assim, a comparação entre os valores médios das produções total e comercial foi determinada apenas entre as diferentes modalidades de adubação, por local e por época de cultura, das chuvas e de regadio, através do teste da mínima diferença significativa (MDS) para um nível de significância de P=0,05.

A análise económica do uso de adubo foi feita por recurso ao programa “Economic dominance analysis methods” (Harrington, 1988).

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Produção total e comercial

Nos quadros 1 a 3 apresentam-se o rendimento total e o comercial das duas cultivares de batateira, na época de regadio e na das chuvas, em função de diferentes doses de superfosfato simples.

 

Quadro 1 – Rendimento total e comercial (kg ha-1) de batateira (Solanum tuberosum L.), cultivares ‘Romano’ e ‘Tchingembo’, no Bailundo (Planalto Central – Angola), na época de regadio (época de sequeiro) e das chuvas, em função de diferentes doses de superfosfato simples.

 

Quadro 2 – Rendimento total e comercial (kg ha-1) de batateira (Solanum tuberosum L.), cultivares ‘Romano’ e ‘Tchingembo’, na Chianga (Planalto Central – Angola), na época de regadio (época de sequeiro) e das chuvas, em função de diferentes doses de superfosfato simples.

 

Quadro 3 – Rendimento total e comercial (kg ha-1) de batateira (Solanum tuberosum L.), cultivares ‘Romano’ e ‘Tchingembo’, na Calenga (Planalto Central – Angola), na época de regadio (época de sequeiro) e das chuvas, em função de diferentes doses de superfosfato simples.

 

Os elevados valores da produção das modalidades com adubação fosfatada, relativamente aos das parcelas sem esta fertilização e apenas com a fertilização azotada, comum à daquelas modalidades, são notórios, com significado estatístico em todas as épocas e locais, sendo as diferenças muito mais acentuadas para as testemunhas, sem qualquer fertilização, fosfatada e azotada. Naturalmente, a produção da modalidade testemunha, sem qualquer adubação, foram em geral muito baixas, mostrando a imprescindibilidade da fertilização para a conveniente produção de batata. 

De um modo geral, encontraram-se aumentos crescentes de produção total e comercial, estatisticamente significativas, com as doses de fósforo, 50, 100 e 200 kg ha-1  de P2O5. Exceptuam-se, a cultivar ‘Tchingembo’ no Bailundo e na Calenga e ambas as cultivares na época de regadio na Chianga, casos em que não se vislumbram diferenças significativas entre as doses 100 e 200 kg ha-1 de P2O5.

As doses superiores, 400 e 800 kg ha-1 de P2O5, não melhoraram, ou até diminuíram, as produções totais relativamente à de 200. O mesmo ocorreu com a produção comercial, com excepção da cultivar ‘Tchingembo’ na Chianga, no regadio (Quadro 2).

Em média, o rendimento da cultura em resposta ao superfosfato simples aplicado apresentou um máximo para a dose de P200 na maior parte dos locais em estudo e para as duas épocas de produção,  como também se pode verificar nas figuras 1 e 2. O rendimento máximo foi cerca de 23 t ha-1 para cultivar ‘Romano’ e cerca de 11 t ha-1 para ‘Tchingembo’. O resultado faz todo o sentido, na medida em que a cultivar importada pode ser duas vezes mais produtiva que a cultivar local, conforme demonstrado pelo ensaio de cultivares apresentado em Henriques et al. (2009). Anota-se que as produções unitárias da cultivar importada são da mesma ordem de grandeza das alcançadas nos ensaios de fertilização relatados por Pestana (1962).

 

Figura 1 – Rendimento total (esquerda) e comercial (direita) de batata (Solanum tuberosum L.) cvs. ‘Romano’ e ‘Tchingembo’, no Bailundo, Chianga e Calenga (Planalto Central – Angola), em função de diferentes doses de superfosfato simples, aplicadas durante a época das chuvas da campanha agrícola 2004/5.

Test. = Testemunha sem qualquer fertilização, azotada ou fosfatada.

 

Figura 2 – Rendimento total (esquerda) e comercial (direita) de batata (Solanum tuberosum L.) cvs. ‘Romano’ e ‘Tchingembo’, no Bailundo, Chianga e Calenga (Planalto Central – Angola), em função de diferentes doses de superfosfato simples, aplicadas durante a época de regadio da campanha agrícola 2004/5.

Test. = Testemunha sem qualquer fertilização, azotada ou fosfatada.

 

As Figuras 1 e 2 ilustram as produções totais e comerciais das duas cultivares em função da dose de fertilizante fosfatado, na época das chuvas (médias de dois ensaios) e de regadio, respectivamente. A sua análise confirma, evidentemente, as afirmações feitas anteriormente. Na época das chuvas (Fig. 1), para a ‘‘Romano’, os resultados mostram que o decréscimo a partir de 200 kg ha-1 de P2O5 é mais acentuado, e muito notório tanto na Chianga como na Calenga, em relação à do da ‘Tchingembo’; efectivamente, nalguns gráficos, o rendimento desta cultivar apresenta um ligeiro patamar. Todavia, para a cultivar regional, na Chianga, desenha-se uma produção total sempre crescente com o aumento da adubação fosfatada até 400 kg ha-1 de P2O5 e mais irregular com 800 kg ha-1 de P2O5. A distribuição dos valores de produção das duas cultivares ao longo das curvas de adubação assemelham-se, acentuando-se, porém, a diferença entre as duas cultivares para os rendimentos comerciais, principalmente na época chuvosa (Fig. 1). Este facto deve-se provavelmente, por um lado, a degeneração da semente local (pouca capacidade para engrossar) e, por outro, à maior proliferação de micoses e bacterioses nesta cultivar.

Na época de regadio (Fig. 2), o decréscimo a partir de 200 kg ha-1 de P2O5 já não foi tão acentuado no Bailundo e na Chianga, verificando-se na Calenga que a diminuição da produção só ocorreu a partir do 400 kg ha-1 de P2O5.

Análise económica

Na figura 3, apresenta-se, para as duas épocas estudadas e, em conjunto, para os 3 locais, uma análise económica da fertilização das duas cultivares de batata.

 

Figura 3 – Análise de benefícios vs custos, em batata (Solanum tuberosum L.), cvs. ‘Romano’ e ‘Tchingembo’, no Bailundo, Chianga e Calenga (Planalto Central – Angola), em função de diferentes doses de superfosfato simples, aplicadas durante a época das chuvas (esquerda) e regadio (direita) na campanha agrícola 2004/5. Valores médios dos três locais de estudo.

 

Para os valores admitidos de custos do adubo e de venda da batata, durante a primeira época das chuvas, apenas a cultivar ‘Romano’ mostrou benefício económico no uso do adubo superfosfato simples entre as dosagens 100 e 800 kg ha-1 de P2O5, atingindo o máximo para 200 kg ha-1 de P2O5, com um valor acima dos 6 000 USD/ha. A cultivar ‘Tchingembo’ apresentou prejuízo para qualquer dosagem utilizada (Fig. 3, esq.ª). Para a época de regadio a cultivar ‘Romano’ mantém o seu benefício máximo para 200 kg ha-1 de P2O5 e a cultivar ‘Tchingembo’ atinge o benefício máximo para 50 kg ha-1 de P2O5, com um valor próximo dos 1 000 USD (Fig. 3, dir.ª). A diferença nos benefícios entre as duas épocas em estudo é compreensível, uma vez que o rendimento comercial durante a época chuvosa é bastante inferior ao rendimento total. Desta forma o número de tubérculos com características comerciais não é suficiente para que haja benefício económico. Note-se, contudo que, nos anos em que decorreram os ensaios, o agricultor, em geral, não fazia a triagem dos tubérculos por tamanhos, vendendo a produção no mercado local a granel, mitigando-se, pois, a desvalorização na produção por menor rendimento comercial das cultivares locais, o que futuramente poderá não ocorrer com a desejável melhoria da organização do mercado.

 

CONCLUSÕES

A cultura respondeu à aplicação do superfosfato simples com um máximo para 200 kg ha-1 de P2O5. Tendo em conta a percentagem de enxofre existente neste tipo de fertilizante e ao tipo de solo desta região, é defensável o uso de superfosfato simples na produção da batata, embora Dias (1973a) tivesse considerado que, em termos de economia, o superfosfato concentrado granulado de origem externa baterá sempre, ou quase sempre, o superfosfato simples.

A dose que maior benefício económico originou, sem desperdício de químicos para o meio ambiente, foi a de 200 kg ha-1 de P2O5. Considerando que o produto comercial fosfatado (superfosfato simples) utilizado neste estudo tinha 24% de P2O5, implica que o agricultor deve aplicar 833 kg de adubo por hectare.

Atendendo à disponibilidade financeira inicial para compra do adubo, pode concluir-se que, para o pequeno camponês, a dose de 50 kg ha-1 de P2O5, correspondendo a cerca de 200 kg de adubo por hectare, mostrou-se economicamente viável durante a época de regadio, chegando a atingir um benefício próximo dos 2 000 USD/ha para a cv. ‘Romano’ e próximo dos 1 000 USD/ha para a cv. local ‘Tchingembo’. Porém, tendo em conta que a menor eficácia da cultivar local se deve à degeneração dos tubérculos utilizados como semente, recomenda-se o incentivo de programas de carácter social para a recuperação de cultivares locais, através, por exemplo, de métodos de selecção, positiva ou negativa, de tubérculos, recomendados pelo CIP.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Professor Rui Pinto Ricardo os esclarecimentos recebidos e ao Investigador José Soveral Dias a leitura crítica do original e as sugestões que permitiram melhor compreensão do trabalho apresentado.

 

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Recepção/Reception: 2009.01.26

Aceitação/Acception: 2010.04.05

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