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Revista de Ciências Agrárias

versão impressa ISSN 0871-018Xversão On-line ISSN 2183-041X

Rev. de Ciências Agrárias vol.45 no.4 Lisboa dez. 2022  Epub 01-Dez-2022

https://doi.org/10.19084/rca.28405 

Artigo

Processamento de dados de temperatura do solo para simulações computacionais de um agro-ecossistema

Processing of soil temperature data for computational simulations of an agroecosystem

M.C. Paz1 

S.A.P. Santos1  2 

R. Barreira3  4 

1 CIQuiBio, Escola Superior de Tecnologia do Barreiro, Instituto Politécnico de Setúbal, Rua Américo da Silva Marinho, 2839-001 Lavradio, Portugal

2 LEAF, Instituto Superior de Agronomia, Tapada da Ajuda, 1349-017 Lisboa, Portugal

3 INCITE, Escola Superior de Tecnologia do Barreiro, Instituto Politécnico de Setúbal, Rua Américo da Silva Marinho, 2839-001 Lavradio, Portugal

4 CMAFcIO, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Campo Grande, 1749-016 Lisbon, Portugal


Resumo

Os serviços de ecossistema, como a limitação natural de pragas, incluem-se nas estratégias de gestão de agro-ecossistemas e o seu uso pode ser otimizado com base no conhecimento provindo da modelação computacional das pragas, dos seus predadores, e da paisagem. Neste artigo focamo-nos no processamento de dados de temperatura do solo, necessários para o funcionamento dos modelos de praga-predador Bactrocera oleae (mosca da azeitona) e Haplodrassus rufipes (aranha do solo) no olival. A metodologia de processamento permitiu-nos (1) completar as lacunas existentes na série de dados de temperatura do solo, recolhidos com periodicidade horária, (2) convertê-la numa série com periodicidade diária, e ainda (3) criar uma variável adicional, a temperatura média diária do solo durante o crepúsculo vespertino. Este último passo possibilita que não haja uma perda de informação no que diz respeito àquele período específico do dia, reduzindo-se o erro associado à desaquação da resolução temporal da variável climática média diária para exprimir um fenómeno que ocorre apenas durante um determinado número de horas do dia.

Palavras-chave: temperatura do solo; processamento de séries climáticas; conversão de resoluções temporais; linguagem R; modelação computacional de agro-ecossistemas

Abstract

Ecosystem services, such as natural pest control, are included in agro-ecosystem management strategies and their use can be optimized based on knowledge from computational modelling of pests, predators, and landscape. In this article we focus on the processing of soil temperature data, necessary for the operation of the predator-pest models Bactrocera oleae (olive fly) and Haplodrassus rufipes (soil spider) in the olive grove. The processing methodology allowed us to (1) complete the gaps in the series of soil temperature data, collected on an hourly basis, (2) convert it into a series with daily periodicity, and (3) create an additional variable, the average daily temperature of the soil during the twilight. This last step prevents the loss of information regarding that specific period of the day, reducing the error associated with the deaquation of the temporal resolution of the average daily climatic variable to express a phenomenon that occurs only during a certain number of hours of the day.

Keywords: soil temperature; climate series processing; conversion of temporal resolutions; R language; computational modelling of agroecosystems

INTRODUÇÃO

A limitação natural de pragas é um serviço de ecossistema que consiste no aumento das populações de inimigos naturais das pragas através do estabelecimento de componentes paisagísticas que lhes forneçam alimento alternativo e refúgio (Villa et al., 2020, 2021), e que pode ser integrado nas estratégias de gestão dos agro-ecossistemas. O uso deste serviço pode ser otimizado conhecendo o seu funcionamento, o que pode ser feito através da modelação computacional das pragas, dos seus predadores, e da paisagem (Corral & Calegari, 2011; Topping et al., 2019; Ziołkowska et al., 2021). Neste contexto, o projeto OLIVESIM está a construir um sistema de modelos para simular os comportamentos de espécies de pragas da oliveira e de seus inimigos, na região de Trás-os-Montes (Portugal), através do sistema ALMaSS (Animal, Landscape and Man Simulation System), que recebe séries de dados de ações de gestão agrícola e de variáveis climáticas, com periodicidade diária (Topping et al., 2003). De facto, para alguns dos artrópodes modelados, a temperatura do solo é usada como dado de entrada na modelação computacional, uma vez que a temperatura desempenha um papel fundamental nas várias fases da sua vida e também porque interagem espacialmente ao nível do solo.

Para que a modelação computacional possa funcionar, as séries de dados climáticos devem ter uma estrutura temporal regular. No entanto, muitas vezes não estão completas, o que exige a aplicação de metodologias fiáveis para o preenchimento das lacunas existentes. Por outro lado, uma série de dados climáticos é formada por dados recolhidos com uma dada periodicidade, que pode ser diferente da necessária para o sistema computacional, o que implica uma conversão de periodicidade. No caso da conversão de séries de dados com periodicidade horária em séries de dados com periodicidade diária, que neste caso são as usadas pelo sistema ALMaSS, há uma redução da resolução temporal e, portanto, uma perda de informação no que diz respeito a períodos específicos do dia. Isto pode ser um problema quando se tenta simular, por exemplo, um comportamento animal que ocorre durante um período específico do dia. Uma forma de segregar esse período específico é criar variáveis diárias que são calculadas usando apenas os dados horários compreendidos nesse período do dia.

Neste trabalho, debruçamo-nos sobre o processamento da série de temperatura do solo necessária para o funcionamento dos modelos de praga-predador Bactrocera oleae (mosca da azeitona) (Paz et al., 2021) e Haplodrassus rufipes (aranha do solo) (Barreira et al., 2021), ambos artrópodes dependentes da temperatura do solo em certas fases ou durante toda a sua vida. De facto, a aranha habita os primeiros centímetros do solo, e a mosca pupa na mesma zona durante os meses mais frios do ano, tornando-se um potencial alimento para a aranha. Completámos as lacunas existentes na série de dados recolhida, e convertemos a sua periodicidade de horária para diária, criando também uma variável adicional, a temperatura média diária do solo durante o crepúsculo vespertino, que é o momento em que a aranha normalmente se move para caçar (Benhadi-Marín, J., comunicação pessoal).

MATERIAL E MÉTODOS

A temperatura do solo foi medida com periodicidade horária, de 2010 a 2020, a uma profundidade de 0,05 m, na estação meteorológica de Mirandela. Esta estação faz parte da rede de estações meteorológicas automáticas do Instituto do Mar e da Atmosfera (IPMA). O Quadro 1 resume as características da série de dados recolhida, que foi depois processada utilizando a linguagem R (R Core team, 2020), seguindo a sequência apresentada na Figura 1.

Quadro 1 Características da série de dados de temperatura do solo medidos com periodicidade horária na estação meteorológica de Mirandela. Entende-se por lacuna um grupo de valores em falta seguidos 

Comprimento da série 96360
Número de valores em falta 9172
Percentagem de valores em falta 10%
Número de lacunas 88
Comprimento de lacuna mais frequente 1
Maior comprimento de lacuna 4285

Figura 1 Sequência de processamento dos dados de temperatura do solo. A série de dados de temperatura do solo, medidos com periodicidade horária no período 2010-2020, apresenta, como esperado, um padrão de sazonalidade, pelo que se qualifica para o uso da função na_seadec, contida no pacote imputeTS, na tarefa de imputação de valores nas lacunas com comprimento inferior a 500 valores consecutivos em falta. O pacote imputeTS foi especificamente desenvolvido para a imputação de valores em falta em séries temporais univariadas (Moritz & Bartz-Beielstein, 2017). 

Depois de completada a série de dados horários, calculou-se a temperatura média diária do solo (Ts), efetuando a média das 24 medições horárias de cada dia. Para o cálculo da temperatura média diária do solo durante o crepúsculo (Tsc) foi definido o período de crepúsculo como o período entre o pôr-do-sol e o fim do crepúsculo astronómico, isto é, quando o Sol está 18° abaixo do horizonte. Tsc foi então calculada efetuando a média ponderada dos dados de temperatura do solo medidos com periodicidade horária durante o período do crepúsculo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Figura 2 mostra a série de dados de temperatura do solo, medidos com periodicidade horária, recolhida na estação meteorológica de Mirandela, e os dados imputados em lacunas inferiores a 500 valores consecutivos em falta. Podemos verificar que os valores imputados se enquadram perfeitamente na série.

Figura 2 Série de dados de temperatura do solo, medidos com periodicidade horária (círculos azuis-claros), recolhida na estação meteorológica de Mirandela, e dados imputados em lacunas inferiores a 500 valores consecutivos em falta (circunferências vermelhas), usando a função na_seadec contida no pacote imputeTS. 

A Figura 3 mostra as séries de Ts e Tsc, calculadas para o período 2010-2020, permitindo verificar que Tsc é em geral superior a Ts. A Fig. 3 mostra também, a título de exemplo, o período de 22 de janeiro a 4 de fevereiro de 2011, ano durante o qual se realizou uma campanha de amostragem de artrópodes e solos, e os limites do intervalo de valores de temperatura dentro do qual o movimento da aranha ocorre. Podemos ver que em alguns dias, por exemplo no dia 24 de janeiro de 2011, Tsc está acima do limite inferior (tmin) e Ts está abaixo do mesmo, o que significa que se usássemos Ts em vez de Tsc para simular o movimento da aranha, estaríamos a impedi-la de mover-se, quando deveria estar a fazê-lo. Isto poderá também acontecer em redor do limite superior, mas de forma inversa - a aranha estar em movimento, quando já deveria estar em repouso. Ou seja, o uso de Ts, que exprime a temperatura média das 24h do dia, em vez de Tsc, que exprime especificamente a temperatura durante o período do dia em que a aranha se move, resultaria numa simulação incorreta do seu movimento. Desta forma, podemos ver como a utilização de dados climáticos temporais de alta resolução oferece a oportunidade de modular aspetos que, de outro modo, não seriam percetíveis (Afrifa-Yamoah et al., 2020).

Figura 3 Séries de temperatura média diária do solo (Ts - °C) e temperatura média diária do solo durante o crepúsculo (Tsc - °C), para o período 2010-2020, calculadas a partir da série de dados de temperatura do solo medidos com periodicidade horária, recolhida na estação meteorológica de Mirandela. As linhas vermelhas representam as temperaturas mínima (tmin) e máxima (tmax) entre as quais é desencadeado o movimento da aranha. 

CONCLUSÕES

A metodologia aplicada permitiu-nos (1) completar as lacunas existentes na série de dados de temperatura do solo, recolhidos com periodicidade horária, (2) convertê-la numa série com periodicidade diária, e ainda (3) criar uma variável adicional, a temperatura média diária do solo durante o crepúsculo vespertino. Este último passo possibilita que não haja uma perda de informação no que diz respeito àquele período específico do dia, reduzindo-se o erro associado à desaquação da resolução temporal da variável climática média diária para exprimir um fenómeno que ocorre apenas durante um determinado número de horas do dia.

As séries criadas permitirão uma simulação mais correta das pragas e seus predadores, contribuindo para melhores definições de estratégias de gestão dos agro-ecossistemas.

Agradecimentos

Este trabalho é financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) através do projeto PTDC/ASP-PLA/30003/2017 - OLIVESIM - Gestão dos serviços de ecossistema no olival utilizando modelos espaciais avançados. R.B. financiada pela FCT através do projeto UIDB/04561/2020.

As autoras agradecem ao IPMA a cedência dos dados de temperatura do solo.

Referências bibliográficas

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