SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.45 número4Caracterização das dinâmicas físico-químicas e da fertilidade de solos de mangal da Guiné-Bissau em diferentes condições agroecológicas subjacentes ao cultivo do arrozCompostagem de resíduos provenientes da cultura de kiwi índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista de Ciências Agrárias

versão impressa ISSN 0871-018Xversão On-line ISSN 2183-041X

Rev. de Ciências Agrárias vol.45 no.4 Lisboa dez. 2022  Epub 01-Dez-2022

https://doi.org/10.19084/rca.28425 

Artigo

Comparação entre fertilização mineral e orgânica na cultura do milho forrageiro: impacto na produção, carbono total e nutrientes NPK do solo

Comparison between mineral and organic fertilization on forage corn culture: impact on yield, total carbon and nutrients NPK of soil

Carlos Pacheco1 

André Oliveira2 

Manuel Correia3 

1 Lage Antiga, Lda, Rua do Olivalinho 3,A,2925-441 Azeitão - Portugal

2 INOVA: Inst. Inov. Tecnol. dos Açores, Estrada de São Gonçalo, S/N, 9504-540 Ponta Delgada, Açores, Portugal

3 Instituto Superior de Agronomia, Tapada da Ajuda, 1349-017 Lisboa, Portugal


Resumo

Compara-se a fertilização mineral versus substrato orgânico (SO), no rendimento do milho forrageiro e nos teores em carbono total (Ct) e NPK do solo. A morfologia do perfil cultural resultante da mobilização do solo com charrua x fresagem, na distribuição dos resíduos orgânicos (RO) e do substrato orgânico (SO), carateriza-se por o horizonte Ap2 apresentar unidades morfológicas de elevada acumulação de RO à mistura com terra (TERO), no tratamento A (TA), e acumulação de SO mais terra (TESO) no tratamento B (TB). A relação entre unidades constituídas por terra (TE) e TERO é de 70:30 no TA e de 50:50 entre TE e TESO no TB. O conforto nutricional da cultura foi muito elevado e constante no TA, mas superior e crescente no TB. O rendimento em matéria verde foi fraco no 1º ano, devido ao acentuado défice hídrico, e alto no 2º ano. As diferenças entre TB e TA foram de 4,7t/ha e de 9.8t/ha. No período de 462 dias, registou-se no TA um decréscimo em Ct de -1,6g/kg e no TB um acréscimo de +4,7g/kg, demonstrativas da elevada resiliência do SO-MUSAMI, o qual potencia a produção.

Palavras-chave: fertilização; mineral; orgânica; milho; forrageiro

Abstract

Mineral fertilization versus organic substrate (SO) is compared on forage corn yield, total carbon (Ct) and NPK contents. The morphology of the cultural profile resulting from tillage with moldboard x rotovator, in the distribution of organic residues (RO) and organic substrate (SO), is characterized by soil horizon Ap2 presenting morphological units of high accumulation of RO mixed with soil (TERO) in treatment A (TA), and accumulation of SO plus soil (TESO) in treatment B (TB). The relation between soil units (TE) and TERO units is 70:30 in the TA and 50:50 between TE and TESO in the TB. The nutritional comfort of the forage culture, confirmed by the analyses of the soil samples, was very high and constant in TA, but higher and increasing in TB. Green biomass yield of forage corn was weak in the 1st year, explained by the severe water deficit, and high in the 2nd year. The differences between TB and TA in yield were 4.7t/ha and 9.8t/ha. In the period of 462 days, there was a decrease in Ct of -1.6g/kg in TA and an increase of +4.7g/kg in TB, demonstrating the high resilience of SO-MUSAMI, which enhances production and soil sustainability.

Keywords: fertilisation; mineral; organic; corn; forage

INTRODUÇÃO

A área da cultura do milho forrageiro, em São Miguel-Região Autónoma dos Açores (RAA), era em 2019 de 7.733 hectares. A fertilização tradicional consiste na aplicação de adubos NPK e de chorumes das explorações leiteiras e a preparação do solo na lavoura com charrua à profundidade de 30/35cm, seguida de destorroamento e uniformização do terreno com fresagem e sementeira com semeador de precisão. No segundo ano, a lavoura foi substituída pela subsolagem (Oliveira, 2020).

As alterações no perfil cultural do solo foram analisadas, bem como o padrão de distribuição das unidades morfológicas (UM), (ver Figura 1), ricas em restolhos orgânicos (RO) e no substrato orgânico (SO). Ao longo de dois ciclos culturais, monitorizou-se o rendimento em matéria verde (MV) da cultura do milho e os teores em carbono total (Ct), nutrientes NPK e pH do solo, nos tratamentos A (TA) e B (TB), tendo o TA recebido fertilização mineral complementada com chorume e o TB substrato orgânico (SO).

MATERIAIS E MÉTODOS

No Quadro 1, apresenta-se a variedade do milho forrageiro e os quantitativos de fertilizantes minerais e orgânicos aplicados. O SO é um produto de origem vegetal compostado.

O terreno de morfologia convexa, com declive longitudinal de 10 a 15%, foi dividido em dois blocos, cada um com quatro sub-parcelas, com 50m no sentido S-N e 15m no W-E.

A morfologia do perfil cultural foi caraterizada e identificadas as unidades morfológicas com significado nas alterações provocadas pelas alfaias agrícolas. Foram descritas as unidades: TE- material terroso sem vestígios de restolhos orgânicos; TERO - material terroso com concentração de RO; TESO - material terroso com concentração elevada de SO.

Pelo método da abertura do perfil, foram colhidas amostras de solo, com incidência nos 10cm centrais de Ap1 (0-15/17cm) e Ap2 (15/17-30/35cm), ao longo de dois ciclos culturais e analisadas as variáveis químicas do solo (Quadro 1). Para quantificação da biomassa forrageira verde, foram aleatoriamente selecionados 8 pontos por tratamento.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A qualidade do SO, analítica e biológica estudada por Cruz (2013), e em experimentação de campo por (Pacheco & Teixeira, 2016) é indiscutível, bem como a elevada afinidade e estimulação dos sistemas radiculares na presença de volumes de terra com muito elevada concentração. As incertezas residiam na resiliência e taxas de decomposição do SO no solo, e na satisfação das exigências em azoto, nos picos de maior procura da cultura do milho forrageiro.

A análise morfológica do perfil cultural (Figura 1), revelou-nos que a distribuição do SO em Ap1 era fraca, mas regular e uniforme e no Ap2 o SO concentrava-se em unidades morfológicas distribuídas de modo sistemático em bandas inclinadas e bolsas maiores, na proporção de cerca 50:50 entre as unidades TESO e TE, no TB. No TA a proporção entre as TE e as TERO é cerca de 70:30. O contraste entre as unidades identificadas, nos teores das variáveis químicas do solo é muito forte. As diferenças, na profundidade 7-35cm, em Ct, entre a TERO e a TE do TA, é de 10g/kg e entre a TESO e a TE do TB de 54g/kg. O acréscimo em Ct influência positiva e significativamente os teores em NPK e o pH.

As datas de colheita e os teores totais em Ct e Nt e teores em P e K assimiláveis, são apresentados nos Quadros 2 e 3. Os valores do pH do solo não são apresentados.

Da análise dos teores em Ct ressalta que Ap2 apresenta teores significativamente mais elevados do que Ap1. A diferença entre TA e TB é de 4,75g/kg em Ap1, de 16,63g/kg no Ap2 e de 10,69g/kg na espessura média de 20cm. Os teores médios em Ct, no intervalo de 98 dias, apresentam um ligeiro abaixamento em ambos os horizontes do TA e Ap1 do TB, enquanto o Ap2 do TB apresenta um acréscimo muito significativo. A diferença média entre TB e TA é de 16,14g/kg, o TA em média decresceu -1,58g/kg e o TB em média cresceu 3,38g/kg. Os valores de Ct registados 358 dias após a colheita anterior, cresceram no Ap1 e decresceram no Ap2 do TA, e o TB cresceu tanto em Ap1 como em Ap2, com um acréscimo médio de 4,15g/kg. No intervalo de 462 dias, verifica-se que o TA apresenta flutuações entre Ap1 e Ap2, mas em média a tendência é decrescente (-1,51g/kg), enquanto no TB a tendência é crescente em Ap1 e Ap2, com um acréscimo médio de 4,03g/kg. No TA as perdas de MO, por decomposição, são ligeiramente superiores aos ganhos, enquanto no TB os ganhos em MO são muito superiores às perdas, perpetuando a influência positiva do SO por muitos ciclos culturais, contrariando as expetativas iniciais.

Quanto ao Nt, os tratamentos TA e TB apresentam teores no início semelhantes, mas progressivamente o TB aumenta a diferença positiva relativamente a TA. Em síntese, a cultura do milho forrageiro, em ambos os ciclos, dispôs de níveis de Nt altos no TA e muito altos no TB.

Quanto ao P, os tratamentos TA e TB apresentam teores elevados no início, mas muito elevados no Ap2 do TB. Em média, o TB apresenta cerca do dobro do TA. No intervalo de 98 dias, os teores em P continuam elevados no TA e Ap1 do TB, mas em média o TB apresenta cerca do triplo comparativamente a TA. No intervalo de 462 dias, os teores são muito elevados no TA, mas muito superiores no TB. Em média, a diferença entre TB e TA é de 227mg/kg e o acréscimo do TB, comparativamente à colheita anterior, é de 136,5 mg/kg. A cultura do milho dispôs de muito elevado conforto em P em ambos os tratamentos, sendo os teores no 2º ciclo cultural excessivos. Verifica-se ainda que no TB os acréscimos em P, à medida que o tempo progride, é muito significativo.

Quanto ao K, os teores são muito elevados em TA e TB ao longo dos dois ciclos culturais, mas cerca de 3,5 vezes mais no TB. Em média o TA não apresenta variação significativa entre datas, mas no TB os teores crescem 1,3 vezes mais em 98 dias, retrocedendo para o valor inicial ao fim de 462 dias. A cultura do milho forrageiro, em ambos os ciclos culturais, dispôs de muito elevado conforto em K no TA e conforto excessivo no TB. Quanto à variável pH do solo verifica-se que o SO proporcionou um acréscimo progressivo muito significativo tendendo o pH do solo para a neutralidade.

Analisando os dados biométricos da cultura do milho forrageiro (Quadro 4), verifica-se que o rendimento em MV foi muito baixo no 1º ciclo, sendo a diferença média entre TB e TA de 4,7t/ha, e alto no 2º ano, sendo a diferença entre TB e TA de 9,8t/ha, diferenças essas explicadas pela baixa precipitação total (117mm) ocorrida no 1º ano, contra 259,5mm no 2º ciclo.

Quadro 1 Fertilização mineral e orgânica da cultura do milho forrageiro nos dois ciclos culturais 

Ano 2020: LimaGrainFAO400 2021: LimaGrainFAO500
Tratamento A B A B
Fertilização Modalidade NPK/ kgha-1 NPK/ kgha-1 NPK/ kgha-1 NPK/ kgha-1
Mineral Fundo(1) 70:26:0 140:24:58
Cobertura(2) 105:0:0
Localizada (3) 35:27:35 35:27:35
Orgânica 63:7:54(1) 400 t ≈220t seco (2)
Mineral + orgânica 238:33:54 93:16:98 (3) 175:51:93 35:27:35

*1) Chorume exploração leiteira - NPK: 2,1:0,23:1,8 kg/m3;

*2) Substrato orgânico (SO-MUSAMI) - NPK: 11,8:2,1:12,4 kg/t;

*3) Considerando uma taxa de decomposição de 3,59 % em 4 meses.

Figura 1 Perfil cultural dos tratamentos TA e TB, milho forrageiro no início da floração. 

Quadro 2 Teores totais em carbono e azoto 

Horizonte Tratamento N Ct (g/kg) Nt (g/kg)
30 jun/20 7 out/20 1 out/21 30 jun/20 7 out/20 1 out/21
Ap1 (5-15 cm) A 8 27,0 ± 3,6 25,4 ± 3,6 29,3 ± 2,6 2,5 ± 0,4 2,0 ± 0,4 2,5±0,8
B 8 31,8 ± 3,6 30,5 ± 5,0 43,9 ± 9,9 2,3 ± 0,5 2,2 ± 0,3 3,3±1,2
Ap2 (20-30 cm) A 8 32,0 ± 4,9 30,6 ± 5,0 26,9 ± 2,9 2,4 ± 0,2 1,9 ± 0,1 2,1±0,3
B 8 48,6 ± 4,9 57,6 ± 12,7 52,7 ± 7,5 2,5 ± 0,3 2,4 ± 0,4 3,8±1,0
Média (E=20 cm) A 8 29,6 ± 4,7 278,0 ± 4,9 28,1 ± 3,0 2,4 ± 0,3 1,9 ± 0,3 2,3 ± 0,6
B 8 40,3 ± 9,5 44,1 ± 16,3 48,3 ± 9,8 2,4 ± 0,4 2,3 ± 0,3 3,5 ± 1,1

Quadro 3 Teores em P e K assimiláveis 

Horizonte Tratamento N P (mg/kg) K (mg/kg)
30 jun/20 7 out/20 1 out/21 30 jun/20 7 out/20 1 out/21
Ap1 (5-15 cm) A 8 68± 15 70 ± 24 172 ± 55 210 ± 75 305 ± 166 295± 51
B 8 85± 48 89± 51 297 ± 144 388 ± 170 634± 376 738± 232
Ap2 (20-30 cm) A 8 96 ± 37 81± 13 115 ± 49 32 ± 11 195 ± 84 160± 38
B 8 248 ± 59 380 ± 214 445 ± 150 1280 ± 467 1496± 730 890± 242
Média (E=20 cm) A 8 82± 30 76 ± 19 144 ± 60 265 ± 105 250± 135 227± 81
B 8 167± 96 234 ± 206 371 ± 165 834 ± 554 1066± 694 814± 249

Quadro 4 Dados biométricos da cultura do milho forrageiro 

Ano 2020 2021
Tratamento Nº plantas/ha Peso médio (g/planta) Produtividade (MV) t/ha Nº plantas/ha Peso médio (g/planta) Produtividade (MV) t/ha
A 49920,9 537,05 26,81 80977,2 736,38 59,63
B 52070,4 604,95 31,50 78317,6 885,88 69,38

CONCLUSÕES

Conclui-se que a mobilização do solo com charrua de aiveca distribui os RO e o SO, localizados sobre a superfície do terreno, segundo um padrão determinístico e sistemático, na forma de bandas inclinadas e bolsas. O contraste entre as unidades morfológicas de elevada concentração em RO e SO e as formadas só por terra (TE), nos teores em carbono e nutrientes, é muito forte, bem como na distribuição radicular do milho forrageiro. O conforto nutricional da cultura, em ambos os ciclos, foi elevado no TA e muito elevado no TB. O rendimento em matéria verde foi significativamente mais elevado no TB, mais alto no 2º ano do que no 1º, este fortemente afetado pelo muito elevado défice hídrico.

Agradecimentos

À MUSAMI-Operações Municipais do Ambiente, EIM, SA, agradecemos o apoio dado a este estudo, fornecendo o SO e custeando as análises do solo.

Referências bibliográficas

Cruz, C. (2013) - Caracterização do SO. MUSAMI.Rel. técnico. [ Links ]

Oliveira, A. (2020) - Aplicação substrato orgânico SO-MUSAMI na cultura do milho forrageiro: balanço em carbono, nutrientes e produtividade. Diss. obtenção grau mestre em eng. Agronómica. ISA/ULisboa. [ Links ]

Pacheco, C.A. & Teixeira, F.M. (2016) - Avaliação do potencial produtivo do composto orgânico FO-MUSAMI nas fileiras da horticultura, fruticultura, floricultura e agricultura. Rel. Técnico. [ Links ]

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons