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Arquivos de Medicina

versão On-line ISSN 2183-2447

Arq Med vol.26 no.4 Porto jul. 2012

 

O Selénio e a Tiróide

Selenium and the Thyroid

 

César Esteves1, Celestino Neves1, 2, Davide Carvalho1, 2

1 Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo do Centro Hospitalar São João

2 Faculdade de Medicina da Universidade do Porto

 

Endereço para Correspondência

 

RESUMO

O selénio é um oligoelemento activo em várias reacções bioquímicas que ocorrem no organismo humano. Entre estas, as reacções de oxidação-redução e a desiodação das hormonas tiroideias são provavelmente as mais reconhecidas e discutidas. O reconhecimento do selénio como factor condicionante do estado de saúde do indivíduo desenvolveu-se nas últimas décadas, e o papel do selénio na génese da patologia auto-imune, particularmente a tiroideia, está bem patente em vários estudos, tendo-se observado uma relação entre o seu défice e a ocorrência de tiroidite auto-imune e doença de Graves. A terapêutica de suplementação com selénio é ainda controversa apesar dos vários estudos publicados sugerindo os seus potenciais benefícios, provavelmente mais significativos em doentes com tiroidite auto-imune e orbitopatia de Graves.

Palavras-chave: Tiróide, Auto-imunidade, Tiroidite, Selénio, Iodo

 

ABSTRACT

Selenium is a trace element, active in several of the biochemical reactions that occur in the human body, particularly oxidation and reduction reactions and deiodination of thyroid hormones. The recognition of selenium as a factor that interferes with an individual´s health status has evolved in the last decades, and its´ role in the pathogenesis of autoimmunity, and thyroiditis in particular, is well documented in several studies, establishing a relation between its deficiency and the occurrence of autoimmune thyroiditis and Graves’ disease. The supplementation with selenium is still controversial despite of the results suggesting its’ benefits in patients with autoimmune thyroiditis and Graves’ orbitopathy.

Keywords: Thyroid, Autoimmunity, Thyroiditis, Selenium, Iodide

 

INTRODUÇÃO

O selénio é um oligoelemento, descrito pela primeira vez pelo químico sueco Jöns Jacob Berzelius em 18171, e só quase duzentos anos após essa data a ciência médica está a explorar em pleno a importância deste micronutriente na saúde humana.

Presente em quantidades variáveis no solo, a sua incorporação pelos vegetais, em particular grãos e sementes, constitui a principal fonte de selénio nos animais2,3. No entanto, para o ser humano, não é de ignorar o contributo da ingestão de peixe, marisco e carne na dieta ocidental, dada a elevada ingestão deste tipo de produtos e o alto teor em selénio no tecido muscular, particularmente em áreas que possuam elevadas concentrações deste elemento no solo. A dose diária recomendada foi estabelecida em 55 µg/dia nos E.U.A., sendo no Reino Unido - um país com menor quantidade de selénio no solo - recomendada a dose de 65 a 75 µg/dia, para mulheres e homens, respectivamente. No entanto, a ingestão diária de selénio nos E.U.A. e Reino Unido ultrapassa em média este valor, aproximando-se dos 100 a 200 µg/dia e tornando improvável a deficiência grave nestas áreas, excepto em situações de desnutrição, alimentação parentérica total, patologia dermatológica ou alcoolismo crónico. No entanto, já foi descrita deficiência ligeira de selénio em regiões da Europa4 com pobre conteúdo deste elemento no solo, assim como em áreas da China, Rússia e continente africano onde a deficiência, clinicamente relevante, é relativamente frequente porque os alimentos consumidos são produzidos localmente.

A importância do selénio em animais foi inicialmente identificada em experiências com ratos nos quais foi induzida deficiência de vitamina E, tendo-se demonstrado que a lesão hepática resultante podia ser prevenida pela suplementação com selénio5. A importância do selénio na saúde humana foi reconhecida pela primeira vez aquando da associação entre a doença de Keshan – uma cardiopatia endémica que afecta crianças e mulheres em idade fértil - e a sua prevalência em áreas com solos deficientes em selénio na China, problema que se revelou prevenido com a sua suplementação6. Nos anos 60, investigadores belgas na África Central observaram uma forte associação entre a deficiência combinada em selénio e iodo e a ocorrência de cretinismo mixedematoso endémico. Neste caso em particular, a suplementação de selénio antes da reposição de iodo resulta em elevação marcada dos níveis de T3 e T4, mas também de TSH, revelando um papel complexo do selénio na função tiroideia7,8.

 

FUNÇÕES NO SER HUMANO

O selénio não é utilizado na sua forma elementar, sendo incorporado em vários péptidos, ditos selenoproteínas, sob a forma de selenocisteína ou selenometionina9. Há vinte e cinco famílias de selenoproteínas no ser humano, das quais as peroxidase do glutatião (GPx), a reductase da tioredoxina (TRxR) e desiodinase 2 da iodotironina (DIO) são as mais extensamente caracterizadas, exercendo funções nas reacções de oxidação-redução. Em concentrações nano a micromolares, as selenoproteínas têm um comportamento anti-oxidante mas, em níveis superiores ao necessário para a sua máxima actividade, poderão ter um efeito pro-oxidante.

Uma série de reacções necessárias para o normal funcionamento do organismo humano depende diretamente da presença das selenoproteínas, particularmente do grupo selénio, para ocorrerem adequadamente, incluindo a síntese de ADN. A deficiência de selénio foi associada, de forma algo controversa, a uma miríade de patologias, sendo de referir a associação com o aumento do risco de cancro - incluindo da tiróide - infecções e estados de imunodepressão, infertilidade masculina, diabetes, doenças de Alzheimer e Parkinson, perturbações do humor, para além das já referidas doença de Keshan e cretinismo mixedematoso endémico1,2,4,10,11,12,13,14. A carência grave de selénio associa-se a disfunção muscular e cardiomiopatia, macrocitose e branqueamento do leito ungueal4,13,14. O papel da deficiência de selénio na patogénese destas doenças poderá estar relacionado com o resultante aumento do stress oxidativo, mas os seus mecanismos não estão ainda elucidados. Foi já documentado o aumento da actividade da GPx após suplementação com selénio, sendo os seus efeitos a nível da obtenção do estado eutiroideu ainda controversos15,16,17. A disparidade de resultados entre estudos poderá estar relacionada com a disponibilidade de selénio na dieta local conforme a região onde foram efectuados, condicionando suficiência ou deficiência nutricional. É de referir, no entanto, que a suplementação com selénio foi também associada a um aumento do risco de diabetes18,19.

Relativamente à metodologia utilizada para avaliar o status de selénio nos vários estudos já realizados, várias medidas foram utilizadas, com resultados variáveis: excreção urinária, concentração sérica, quantificação capilar e níveis séricos de selenoproteína P. Esta última é a forma de selénio mais presente no plasma sanguíneo e tem um papel no seu transporte20. A concentração sérica de selénio está na dependência directa da ingestão de selénio, pelo que se correlaciona, indirectamente, com a sua disponibilidade. Vários factores podem alterar a concentração do selénio, nomeadamente a idade, o estado fisiológico e o estilo de vida.

No que diz respeito à sua interacção com a função tiroideia, é de referir que a glândula tiróide é o tecido com maior concentração de selénio no corpo humano1. Este elemento integra a estrutura de várias enzimas necessárias à obtenção de um estado eutiroideu, tanto por remoção do excesso de peróxido de hidrogénio (H2O2) gerado durante a síntese de hormona tiroideia - papel desempenhado pelas GPx e TRxR, e, em níveis mais elevados de radicais de oxigénio, pela catalase - mas também pela obtenção de um equilíbrio fisiológico entre a activação e a inactivação da hormona tiroideia, a cargo das DIO1, DIO2 e DIO3. A renovação dos sistemas da GPx e da catalase, efectuada pelo anti-oxidante específico do tiól (TSA thiol-specific antioxidant), é controlada pela TSH14. Relativamente à actividade das DIOs, qualquer perturbação ao nível da expressão relativa destas enzimas pode resultar em alterações dos níveis de T3 e T4 livres ou totais, e a deficiência de iodo ou selénio induz variação das suas concentrações consoante a necessidade específica de cada orgão (ex. cérebro, periferia, tiróide).

No cretinismo mixedematoso endémico, a deficiência de iodo contribui para a indução de um estado hipotiroideu, com aumento dos níveis de TSH, o que aumenta a formação de radicais livres de oxigénio no tecido tiroideu. Esta elevação da TSH deveria acompanhar-se de aumento da produção de enzimas GPx e selenoproteínas, mas uma vez estabelecida a deficiência conjunta de selénio, a expressão destas enzimas é diminuída e a lesão oxidativa predomina21,22. O tiocianato, presente na dieta de algumas regiões africanas, foi já identificado como potencial agravante deste mecanismo em animais e humanos, em sinergia com a deficiência dos oligoelementos referidos7,21. Sendo assim, a lesão tiroideia é multifactorial: as deficiências de iodo e selénio estão associadas à acumulação de H2O2; a deficiência de selénio está associada ao atingimento da imunidade celular e a fibrose; o excesso de tiocianato está associado a necrose das células foliculares21,23. A elevada prevalência de bócio na África estará associada à elevada prevalência destes distúrbios nutricionais, isolada ou conjuntamente. Esta molécula também é um produto de metabolismo em fumadores, o que poderá estar relacionado com as alterações da função tiroideia observadas nesta população.

 

 

Quanto ao seu papel na auto-imunidade, o distúrbio das enzimas de oxidação-redução envolvidas no metabolismo tiroideu contribui para a lesão oxidativa e necrose do tireócito, assim como para o desenvolvimento de fibrose e hipofunção. A deficiência de selénio, mesmo que ligeira, pode constituir um dos factores ambientais que inicia ou mantém a actividade auto-imune tiroideia em indivíduos geneticamente susceptíveis22,24.

 

SELÉNIO E AUTO-IMUNIDADE

As selenoproteínas GPx e TRxR estão envolvidas em reacções essenciais para o normal funcionamento do sistema imunitário. Ambas têm funções de protecção celular quando os níveis intracelulares de H2O2 nos neutrófilos aumentam durante o fenómeno do estouro respiratório, com a finalidade de eliminar micro-organismos sujeitos a endocitose. A TRxR foi ainda identificada como um factor de crescimento linfocítico. Relativamente a estas funções, a expressão da GPx é regulada pela concentração de selénio e a de TRxR é regulada pela 1,25-(OH)2-vitamina D325. A perturbação da actividade destas enzimas poderá, portanto, resultar em distúrbios do funcionamento do sistema imunitário, tanto em termos de combate às infecções como do desenvolvimento de patologia auto-imune. Já foi verificada a influência dos níveis de selénio na reacção imunológica contra infecções víricas12, tendo sido observado maior risco de infecção grave associado a alterações na expressão de citocinas e quimiocinas envolvidas na resposta pró-inflamatória, assim como do padrão de infiltrado leucocitário no local de infecção.

Os fenómenos de auto-imunidade estão relacionados com uma série de factores, tanto genéticos como ambientais, sendo a tiróide um órgão extremamente vulnerável ao surgimento de doenças auto-imunes26. Dos vários factores ambientais identificados, é de referir a ingestão excessiva de iodo, agentes poluentes, doenças infecciosas, drogas e medicamentos, assim como a deficiência em selénio. É possível que este último factor esteja associado ao desenvolvimento de doença auto-imune tiroideia tanto no aumento da duração quanto na exacerbação da actividade da doença26. Sendo assim, a exposição a diferentes factores ambientais vai contribuir para o desenvolvimento das várias formas de patologia auto-imune tiroideia, no contexto de uma herança genética comum entre estas, como já foi teorizado para a tiroidite de Hashimoto e a doença de Graves27.

Já foi colocada a hipótese de outras patologias auto-imunes estarem também relacionadas com o selénio, nomeadamente a doença celíaca, onde o aumento da prevalência da tiroidite auto-imune poderá estar parcialmente relacionada com má absorção de selénio pela mucosa intestinal danificada.

 

SELÉNIO E TIROIDITE AUTO-IMUNE

Derumeaux28 verificou uma relação inversa entre níveis de selénio e volume tiroideu, risco de bócio e hipoecogenicidade do parênquima tiroideu numa amostra de mulheres com deficiência ligeira de iodo. Dado que a hipoecogenicidade tiroideia está habitualmente associada à ocorrência de tiroidite auto-imune, estando inclusivamente correlacionada com o título de anticorpos anti-receptor de TSH na doença de Graves, interpretou-se este facto como uma possível evidência da influência do selénio na actividade imunitária tiroideia. Esta constatação foi confirmada por Gärtner29 e Duntas30, que, para além de documentarem a melhoria da alteração imagiológica já referida, mostram também redução do título de anticorpos anti-TPO em mulheres com tiroidite auto-imune sujeitas a suplementação com selénio. Em ambos os trabalhos, a suplementação envolveu a administração de 200 µg/dia de selénio durante 3 meses, tendo-se obtido reduções médias do título de anticorpos anti-TPO de 36.4% e 46% vs 12% e 21% no grupo placebo29,30. A diferença observada entre grupos era mais marcada nos indivíduos com título de anticorpos inicial mais elevado (>1200 UI/mL)29. O segundo estudo30 estendeu a suplementação por mais três meses, tendo-se verificado persistência da diminuição do título de anticorpos anti-TPO. Não ocorreu redução dos níveis de anticorpos antitiroglobulina e não se verificou, no final do estudo, correlação entre os níveis de selénio e das hormonas tiroideias. No entanto, em ambos os estudos, os doentes referiram melhoria do estado de humor, o que poderá estar relacionado com o metabolismo da dopamina e/ou serotonina no sistema nervoso central, de acordo com os resultados de trabalhos anteriores, realizados em modelos animais31.

 

SELÉNIO, GRAVIDEZ E TIROIDITE PÓS-PARTO

Dada a reconhecida relação entre hipotiroidismo e complicações gestacionais32 e a elevada prevalência de patologia tiroideia no período gestacional e no pós-parto, procurou-se esclarecer a eventual influência do selénio neste contexto. Os resultados foram surpreendentes: no estudo de Al-Kunani33, as mulheres que sofreram abortamento espontâneo apresentavam menores níveis capilares de selénio que o grupo com gestação de termo. Esta constatação poderá ser particularmente interessante para as mulheres com tiroidite auto-imune que pretendam engravidar, uma vez que também estas têm um risco aumentado de abortamento e parto pré-termo, provavelmente associada à ligeira disfunção tiroideia que apresentam, ou à própria presença de anticorpos anti-tiroideus34. Nesse sentido, já se estabeleceu uma relação entre a presença de anticorpos anti-tiroideus e níveis discretamente mais elevados de TSH, o que poderá indiciar menor reserva tiroideia, com maior risco de desenvolver hipotiroidismo e as suas complicações durante a gravidez. A tiroidite pós-parto resulta de exacerbação de actividade auto-imune latente após o período de imunossupressão induzido pela gestação e aumenta o risco destas mulheres desenvolverem posteriormente hipotiroidismo permanente, que pode atingir até 30% dos indivíduos deste grupo. Relativamente à relevância do hipotiroidismo subclínico neste contexto, é de referir que, segundo os achados de Casey, o risco relativo de placenta abrupta e parto pré-termo no grupo com hipotiroidismo subclínico era de 3,0 e 1,8, respectivamente35. A prescrição de levotiroxina em mulheres grávidas com hipotiroidismo clínico ou subclínico é prática corrente, mas mesmo em mulheres grávidas com tiroidite auto-imune eutiroideias a suplementação com levotiroxina parece reduzir o risco das complicações gestacionais associadas a disfunção tiroideia36. Dada a evidência disponível relativamente ao efeito do selénio na redução do título de anticorpos anti-tiroideus29,30, Negro37 aplicou estes princípios no seu estudo em mulheres grávidas com tiroidite auto-imune, obtendo redução significativa do título de anticorpos anti-TPO e melhoria significativa do padrão ecográfico de tiroidite no grupo sob suplementação com selénio. As alterações analíticas e imagiológicas acompanharam-se da redução significativa da incidência de disfunção tiroideia pós-parto e hipotiroidismo permanente. A ingestão deficiente e excessiva de selénio está associada a níveis diminuídos e aumentados de T3, respectivamente. No entanto, é de referir que este trabalho foi efectuado numa amostra pertencente a uma população com ingestão adequada de selénio, razão pela qual não há disfunção da actividade das DIO nem alteração significativa dos níveis de T3, sem prejuízo para a sua actividade anti-inflamatória.

 

SELÉNIO E DOENÇA DE GRAVES

À semelhança dos estados de deficiência de selénio, a doença de Graves está associada a um estado de estresse oxidativo, pelo menos parcialmente reversível com a administração de tiamidas ou anti-oxidantes38,39. À semelhança da tiroidite de Hashimoto, a doença de Graves está associada à deficiência relativa de selénio16, tendo sido confirmada uma correlação entre níveis séricos elevados de selénio e a tendência para obter remissão da doença40, assim como a relação entre a doença de Graves e a gravidade da orbitopatia associada com níveis diminuídos de selenoproteína P41. Foi também constatada uma correlação inversa entre os níveis de selénio e o título de anticorpos antirreceptor de TSH40. Vrca e colaboradores16 estudaram a eficiência da suplementação com anti-oxidantes (selénio, beta-caroteno e vitaminas C e E) para além da prescrição de antitiroideus na obtenção de um estado eutiroideu na doença de Graves. Os doentes com acesso a suplementação obtiveram normalização da função tiroideia mais rapidamente que o grupo tratado apenas com metimazol, em associação a um aumento dos níveis séricos de selénio e da actividade de GPx. Não é de excluir uma acção sinérgica dos anti-oxidantes citados na obtenção do resultado. Marcocci42 estudou a evolução clínica da orbitopatia de Graves ligeira durante suplementação com selénio e verificou melhorias significativas em termos de qualidade de vida, envolvimento ocular e progressão da doença neste grupo em comparação com placebo.

 

CONCLUSÃO

O selénio é um oligoelemento com um papel significativo em múltiplas reacções, particularmente nas que dizem respeito à manutenção do equilíbrio oxirredução. A deficiência em selénio, por via da indução de um estado de estresse oxidativo, poderá estar relacionada com a patogénese de múltiplas doenças, por mecanismos ainda pouco esclarecidos. A interferência do selénio na regulação da imunidade poderá também contribuir para a relação entre este elemento e a génese da patologia auto-imune. É de referir a relação especial que o selénio tem com a fisiologia tiroideia, tanto ao nível do seu normal funcionamento como com as sequências de eventos que conduzem à formação do bócio, neoplasia da tiróide ou patologia tiroideia auto-imune. Os ensaios clínicos que envolvem a suplementação de selénio em indivíduos com tiroidite auto-imune e doença de Graves revelaram benefício significativo a nível analítico, imagiológico e, em menor grau clínico, após 6 meses. Estes estudos poderão estar enviesados pela área de residência da amostra, onde é prevalente um estado de deficiência ligeira de selénio proveniente da dieta (ex. Alemanha, Grécia). A suplementação com selénio será particularmente vantajosa em mulheres com tiroidite auto-imune que pretendam engravidar, independentemente de pertencerem a uma população com ingestão adequada de selénio, com provável diminuição do risco de disfunção tiroideia durante esse período. São, porém, necessários ensaios clínicos controlados para confirmar esta hipótese.

 

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Endereço para Correspondência

Local: Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo do Centro Hospitalar São João

Morada: Centro Hospitalar São João – Alameda Prof. Hernâni Monteiro, 4200-319, Porto

E-mail: cesar_esteves@hotmail.com

Telefone: 965881138

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