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Revista Portuguesa de Educação

versão impressa ISSN 0871-9187

Rev. Port. de Educação vol.31 no.1 Braga jun. 2018

 

EDITORIAL

 

Maria Alfredo Moreira, Maria José Casa-Nova, Lia Raquel Oliveira

 

O primeiro número de 2018 marca o início do processo de transição da Revista Portuguesa de Educação (RPE): de um modelo de publicação impressa para um modelo digital. Embora ainda sem a publicação XML na plataforma RCAAP, onde se aloja a revista, tal transição já pode ser observada na plataforma REDALYC. A conclusão do processo será feita ainda no ano de 2018. Este formato irá permitir a utilização dos textos nos diferentes dispositivos de leitura de que dispomos, desde o clássico computador aos dispositivos móveis, algo particularmente importante nos dias de hoje. Adicionalmente, permite uma melhor preservação digital dos arquivos, bem como a geração de diferentes formatos de leitura como o html, o pdf ou o epub, melhorando a capacidade de interoperabilidade com sistemas de informação científica e índices bibliográficos.

Na linha do que tem vindo a ser prática da RPE, também este número acolhe textos oriundos de diferentes realidades contextuais e geográficas, que abordam temáticas diversas de interesse educacional. Iniciando pela análise de um projeto político-educativo presente num contexto nacional, mas de origem e com ramificações transnacionais, passa, de seguida, para a escola e para as implicações que o estudo do autoconceito dos estudantes tem para melhor se equacionar o seu rendimento académico. Continuando com a escola, mas avançando para os contextos educativos informais também, segue-se uma análise dos limites e competências necessárias para a construção de uma educação multicultural, à qual se seguem duas reflexões filosóficas sobre o papel da educação formal no pleno desenvolvimento do indivíduo na sua singularidade e capacidade para o pensamento autónomo e da formação de professores numa perspectiva pós-estruturalista. O número encerra com o contexto do ensino superior, e com a exploração de uma metodologia de construção de cenários futuros que ajudam a (re)pensar a Universidade em tempos vindouros.

O número abre com o artigo Estratégias e incidência empresarial na atual política educacional brasileira: O caso do movimento Todos Pela Educação, de Erika Moreira Martins e Nora Rut Krawczyk, da Universidade Estadual de Campinas, Brasil. O artigo discute o Movimento Todos pela Educação (TPE), uma organização de origem empresarial de grande visibilidade, que vem atuando na educação pública brasileira desde 2006, por via de uma interlocução privilegiada com os órgãos governamentais. Suportado numa sólida estratégia de comunicação legitimada pelos media, o TPE é já considerado como um especialista em educação, formando opiniões e indo ao encontro do senso comum que, perante altos índices de abandono e fracasso escolares, aceita os argumentos de reorganização da educação pública em função de valores como filantropia, voluntariado, responsabilidade social empresarial, corresponsabilidade, pautados por uma gestão por resultados, característica da racionalidade empresarial. O estudo baseia-se em pesquisa documental (documentos oficiais, literatura científica, notícias produzidas pelo TPE), em observação de eventos do TPE e em entrevistas com atores do movimento.

Guilherme da Silva Gasparotto, Thaynara do Prado Szeremeta, Gislaine Cristina Vagetti, Tania Stoltz, Valdomiro de Oliveira, também do Brasil, da Universidade Federal do Paraná, apresentam O autoconceito de estudantes de ensino médio e sua relação com desempenho acadêmico: uma revisão sistemática. Como o título indica, os autores e autoras realizam uma revisão sistemática sobre o autoconceito, em bases de dados eletrónicas de referência internacional, orientada por descritores relativos ao autoconceito, ao rendimento académico e, também, à capacidade académica percebida. A revisão incidiu sobre onze anos (2007-2017) de publicações, tendo sido considerados pertinentes para análise dez estudos, em nove dos quais se revelou consistente a relação entre autoconceito e desempenho acadêmico. Tal revisão permite estabelecer um estado da arte importante, desde logo por se constatar que esta faixa etária (ensino médio ou secundário) parece não estar a ser suficientemente estudada. Isto apesar de o tema do autoconceito ser, há anos, bastante discutido na literatura, dada a adolescência ser entendida como um período crítico no que respeita às percecões de si próprio. Tais resultados podem potenciar o uso de estratégias pedagógicas que contribuam para o fortalecimento do autoconceito dos jovens adultos, resultando num melhor rendimento escolar.

Conhecer contextos, conhecer profissionais: contributo para explorar o desenvolvimento de competências interculturais em contextos educativos é o título do artigo de Daniela Filipa Santos Silva e de Sofia Marques da Silva, da Universidade do Porto, Portugal. A partir da constatação da (ainda) dificuldade de acolhimento, integração e interação nos contextos sociais e educativos do diferente “outro”, as autoras reforçam o papel da escola na implementação de uma educação multicultural, explicitando os conceitos a ela associados, mas também partindo para o terreno, desenvolvendo um estudo qualitativo com atores diretamente envolvidos na educação deste “outro”. A partir de 15 entrevistas semiestruturadas e 3 grupos de discussão focalizada, realizados com sujeitos envolvidos em três projetos do Programa Escolhas, as autoras elencam as competências valorizadas pelos diferentes atores no trabalho com a diversidade étnica e cultural, especificamente com jovens descendentes de imigrantes e de minorias étnicas, e que são de natureza relacional e prática, mas também relativas a processos de integração e de valorização cultural.

O tema da avaliação do Desempenho Docente (ADD) é objeto de debate político aceso a nível nacional e internacional, não existindo um modelo comum a todos os países, mas antes uma grande disparidade de critérios e procedimentos. Porém, todos os modelos assentam em três intenções expressas: proporcionar o crescimento profissional dos professores, contribuir para a melhoria da prática pedagógica e promover o sucesso escolar dos alunos. É este o debate que nos propõe o texto Perceção dos professores sobre a avaliação do desempenho docente, de Maria Piedade Alves, Pedro Cunha (Universidade Fernando Pessoa), Abílio Afonso Lourenço (Agrupamento de Escolas Alexandre Herculano) e Ana Paula Monteiro (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro), de Portugal, que estudaram no território continental a forma como os/as professores/as percecionam a ADD. Trata-se de uma investigação quantitativa com uma amostra de 240 professores/as a quem foi administrado um inquérito por questionário, construído de raíz e validado. De entre os resultados apresentados, destacamos a desvalorização de processos de autoavaliação, como facilitadores de reflexão crítica relativamente às práticas implementadas.

No texto A ontologia da singularidade e a educação em Hannah Arendt: Uma preparação para o mundo, Danilo Arnaldo Briskievicz, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais, Brasil, propõe-nos uma reflexão sobre o pensamento de Hannah Arendt para discutir a possibilidade de uma ontologia da singularidade em educação. O pensamento político da autora é carreado para uma discussão sobre a educação como espaço privilegiado de formação da vida do espírito; nascendo singulares, a educação inicia-nos no espaço público. Há uma ontologia da singularidade no ato de educar, ato intermediário entre o nascimento e a ação no mundo comum, essencial para o exercício pleno da vita activa. A ontologia da singularidade é fundamentada a partir de seis pontos relativos ao papel da educação: acolher, preparar e incluir os singulares, fomentar espaços para o discursar, valorizar as diferenças e preservar a tradição. Assim a educação preserva a originalidade do indivíduo, não obstante o peso da tradição.

A reflexão filosófica sobre o papel da teoria e da prática nos modos atuais de pensar a educação e a formação inicial e pós-graduada de professores/as continua no texto Revezamentos entre teoria e prática: Movimentos que acionam outros modos de pensar o ensino da arte, de Marilda Oliveira de Oliveira, Vivien Kelling Cardonetti, Cláudia Aparecida dos Santos (da Universidade Federal de Santa Maria) e Francieli Regina Garlet (da Universidade Estadual de Maringá) do Brasil. A partir de um posicionamento pós-estruturalista, as autoras discutem novos modos de pensar a educação e a formação de professores/as, requacionando a relação teoria e prática. Criticando a racionalidade hegemónica de pendor positivista, a partir do conceito de escrita biografemática de Roland Barthes, mas também com fortes contributos de autores como Gilles Deleuze e Michel Foucault, as autoras fundamentam a abordagem seguida para a produção dos trabalhos de final de curso, dissertações de mestrado e teses de doutoramento, no âmbito do trabalho desenvolvido pelo grupo de educação pela arte da Universidade Federal de Santa Maria, que reinvindica processos de construção de conhecimento próprios do/a professor/a-investigador/a, mas de natureza líquida, nômada e desterritorializante. Neste processo de revezamento entre teoria e prática, não é tanto a solução de problemas o que se procura, mas antes a invenção de novos problemas susceptíveis de um novo olhar sobre a educação.

O número encerra a secção de artigos com um texto sobre a Universidade do futuro e o modo como ela é perspetivada pelos atores da atualidade, no texto Pensar a Universidade dos próximos 20 anos através de uma metodologia de cenários, de Isabel Alarcão, José Tavares e Óscar Mealha, da Universidade de Aveiro, Portugal, e Dayse Neri Souza, do Centro Universitário Adventista de São Paulo - UNASP, Brasil. Neste texto, os autores e autoras exploram as potencialidades de uma metodologia de construção de cenários futuros, que combina procedimentos de formação em workshop com procedimentos de discussão em grupo focal. Através da valoração inicial, seguida pela discussão de marcadores da ideia de Universidade nas dimensões da formação, inovação e pesquisa, como mentes, afetos, autonomia, tecnologias, métodos, organização, edifícios, financiamentos, contextos, equipamentos, comportamentos, empregabilidade, democraticidade e internacionalização, foram construídos três cenários para a Universidade do futuro. Os autores e autoras fundamentam e avaliam os procedimentos seguidos para concluir da adequação dos processos metodológicos e organizacionais explorados para perspetivar cenários futuros em educação.

O número finaliza com uma recensão da autoria de Marcele Homrich Ravasio, da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul e Leandro Jorge Daronco, do Instituto Federal Farroupilha, ambos do Brasil. O livro, publicado em 2018, Processo interativo de formação docente: Uma perspectiva emancipatória na constituição do currículo escolar, é escrito por Eva Teresinha Boff e José Claúdio del Pino e explora o modo como professores/as da educação básica, da universidade e em formação inicial, podem ser co-construtores do currículo escolar quando se tornam investigadores da ação docente.

 

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