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Revista Portuguesa de Educação

versión impresa ISSN 0871-9187

Rev. Port. de Educação vol.31 no.2 Braga dic. 2018

https://doi.org/10.21814/rpe.13756 

ARTIGOS

 

Análise das concepções de profissionais da educação sobre o desenvolvimento infantil: Um estudo em creches de uma cidade da Paraíba – Brasil

Analysis of the conceptions of professionals in education on child development: a study in daycare centers in a city in paraíba – brazil

Análisis de las concepciones de profesionales de la educación sobre el desarrollo infantil: un estudio en creches de una ciudad de la paraíba - brasil

 

Vanessa da Cruz Alexandrinoi & Fabíola de Sousa Braz Aquinoi

iUniversidade Federal da Paraíba, Brasil

 

Endereço para Correspondência

 

RESUMO

A educação infantil é um importante período do processo de aprendizado e desenvolvimento infantil e o conhecimento dos profissionais da educação é importante para mediar práticas pedagógicas que integrem os aspectos físicos, emocionais, afetivos, cognitivos e sociais da criança, considerando o seu papel ativo no meio social. O objetivo deste estudo foi analisar e conhecer as concepções e ações de professoras da educação infantil, monitoras e psicólogas escolares sobre o desenvolvimento infantil em uma cidade do Estado da Paraíba. Participaram deste estudo 17 professoras, 17 monitoras e quatro psicólogas escolares, que atuavam em instituições públicas de educação infantil. Estas profissionais responderam a um questionário sociodemográfico e a uma entrevista semiestruturada. Os resultados indicaram que a maioria das professoras e monitoras percebe o desenvolvimento infantil a partir das atividades propostas e pelas situações de brincadeira. Por sua vez, as psicólogas relataram que o desenvolvimento infantil é um processo contínuo e que pode ser percebido através das situações de interação entre o adulto e a criança. Esse estudo reafirmou a importância da influência das concepções sobre desenvolvimento infantil nas práticas dos profissionais.

Palavras-chave: Desenvolvimento infantil; Educação infantil; Psicologia escolar

 

ABSTRACT

Early childhood education is an important period in the child's learning process and the knowledge of education professionals is important to mediate pedagogical practices that integrate the physical, emotional, affective, cognitive, and social aspects of the children, considering their active role in the social environment. The objective of this study was to analyze and understand the conceptions and actions of kindergarten teachers, monitors and school psychologists about child development in a city located in the state of Paraíba. 17 teachers, 17 monitors and four school psychologists participated in this study. They worked in public institutions of early childhood education. These professionals answered a sociodemographic questionnaire and a semi-structured interview. The results indicated that most teachers and monitors perceive child development from the proposed activities and play situations. In turn, psychologists have reported that child development is a continuous process that can be perceived through the interaction situations between the adult and the child. This study reaffirmed the importance of the influence of conceptions on child development in the practices of the professionals.

Keywords: Child development; Child education; School psychology

 

RESUMEN

La educación infantil es un importante período del proceso de aprendizaje y desarrollo infantil y el conocimiento de los profesionales de la educación es importante para mediar prácticas pedagógicas que integren los aspectos físicos, emocionales, afectivos, cognitivos y sociales del niño, considerando su papel activo en el medio social. El objetivo de este estudio fue analizar y conocer las concepciones y acciones de profesoras de la educación infantil, monitores y psicólogas escolares sobre el desarrollo infantil en una ciudad ubicada en el Estado de Paraíba. En este estudio participaron 17 profesoras, 17 monitores y cuatro psicólogas escolares, que actuaban en instituciones públicas de educación infantil. Estas profesionales respondieron a un cuestionario sociodemográfico y una entrevista semiestructurada. Los resultados indicaron que la mayoría de las profesoras y monitores perciben el desarrollo infantil a partir de las actividades propuestas y por las situaciones de juego. Por su parte, las psicólogas relataron que el desarrollo infantil es un proceso continuo y que puede ser percibido a través de las situaciones de interacción entre el adulto y el niño. Este estudio reafirmó la importancia de la influencia de las concepciones sobre desarrollo infantil en las prácticas de los profesionales.

Palabras-clave: Desarrollo infantil; Educación infantil; Psicología escolar

 

Introdução

A pesquisa, que ora se apresenta, parte de um conjunto de estudos que vem articulando a psicologia do desenvolvimento com o campo da educação infantil, apontando as possibilidades de atuação do psicólogo nesse contexto, fundamentado em pesquisas na interface psicologia do desenvolvimento e educação infantil (Cordazzo & Vieira, 2008; Costa & Guzzo, 2006; Lordelo & Carvalho, 2003; Moreira & Guzzo, 2013; Sant’Ana & Guzzo, 2016).

Atualmente, há um consenso de que a etapa da educação infantil deve possibilitar a imersão das crianças pequenas em sua sociedade por meio de práticas sociais de sua cultura, das linguagens que esta cultura produz e dos sentidos que esta linguagem pode produzir. Assim, uma das grandes tarefas da educação infantil é promover atividades intencionalmente pedagógicas voltadas para a construção de significados compartilhados e a ampliação de conhecimentos, havendo a possibilidade, pela mediação dos adultos, da construção de identidade infantil, desenvolvimento moral e consciência de si (Paschoal & Machado, 2009; Richter & Barbosa, 2010).

As últimas duas décadas do século XX foram importantes para as mudanças relacionadas à educação infantil, no que concerne à qualidade das atividades desenvolvidas nesta etapa de ensino, às mudanças nas dinâmicas familiares e ao ingresso cada vez mais cedo de crianças neste contexto educacional (Melo, Oliveira, Braz Aquino, & Andrade, 2016). Um contexto educativo de qualidade é aquele que pode promover um impacto positivo no desenvolvimento dos educandos (Leal, Gamelas, Abreu-Lima, Cadima, & Peixoto, 2009). Apesar disso, Richter e Barbosa (2010) mencionam que, dificilmente, as instituições que trabalham com a educação de bebês e crianças se preocupam com as propostas pedagógicas voltadas para o processo de ensino-aprendizagem nos primeiros anos de vida. Para tais autores, os currículos elaborados para a creche, em sua maioria, “apontam para pedagogias adultocêntricas e higienistas… que não consideram [as crianças] em suas primeiras aprendizagens” (p. 90).

Estudos mais recentes reafirmam a compreensão de que as práticas pedagógicas dirigidas à educação infantil precisam ser embasadas, fundamentalmente, em ações relacionais, intencionais e lúdicas (Paschoal & Machado, 2009; Richter & Barbosa, 2010). No caso da educação de zero a seis anos de idade, tais ações devem envolver atividades que integrem o lúdico com o cognitivo, atentando para a importância da linguagem, inclusive a não-verbal. Paschoal e Machado (2009) destacam como diretrizes para a elaboração de atividades intencionalmente pedagógicas em instituições de educação infantil: a organização espacial; a interlocução entre iniciativa da criança e planejamento de atividades por parte do educador; a atenção aos aspectos afetivos; a linguagem apropriada e enriquecida; a intencionalidade pedagógica nas atividades (ao considerar as mais variadas dimensões a serem desenvolvidas pelas crianças); a estabilidade de rotina; a diversidade de materiais pedagógicos; o sistema de acompanhamento diário das atividades (cadernos de anotação, diários de campo, para futuros planejamentos); e o trabalho com família e comunidade.

A importância da etapa da educação infantil no desenvolvimento das crianças fomentou discussões sobre o papel dos profissionais que atuam neste contexto de desenvolvimento e aprendizado. Segundo Vasconcellos (2015), até mesmo a qualidade das políticas públicas voltadas para a educação infantil passa pela formação dos profissionais da educação que atuam junto às crianças, uma vez que tais profissionais são “reflexivo(s) do seu próprio fazer… por um maior conhecimento sobre as questões da infância, psicologia da criança, desenvolvimento humano e outros temas” (p. 69).

A identidade dos profissionais da educação infantil está ligada às suas crenças, valores, concepções, cultura e ideologia, que podem refletir e influenciar em sua qualidade de trabalho (Melchiori & Alves, 2001). Segundo Santos, Ramos, e Salomão (2015), concepções sobre o desenvolvimento infantil se baseiam em crenças elaboradas por meio de vivências e experiências sociais e culturais. Para estas autoras, tais concepções são relevantes na busca pela compreensão sobre a “qualidade das estratégias educacionais promovidas por essas profissionais junto às crianças que estão sendo acompanhadas” (p. 205).

Nesse estudo, parte-se da ideia de que o psicólogo trabalha mediando os processos intersubjetivos que se dão nos espaços de educação infantil, em especial as interações entre professores de educação infantil e crianças, e na mediação dos processos de aprendizado e desenvolvimento. Salienta-se a importância de se conhecer a concepção desses profissionais sobre desenvolvimento e educação de crianças de zero a seis anos de idade, uma vez que estes aspectos podem delinear e definir a atuação destes profissionais, junto a este grupo educacional.

Dada a pluralidade cultural brasileira, inclusive no que diz respeito às diretrizes norteadoras de práticas educacionais, optou-se por buscar especificações do Plano Municipal de Educação do município onde foi realizada a pesquisa. Neste Plano, é apresentada a formação acadêmica mínima esperada para cada categoria de profissional da educação que atua em contexto de educação infantil. Tendo em vista o objetivo deste estudo, foram observadas as formações mínimas necessárias para a atuação do professor, monitor e psicólogo.

Para a atuação como professor de educação infantil, é necessário que o profissional tenha, como mínimo, formação em magistério ou no ensino superior, no curso de pedagogia. Os monitores, por sua vez, precisam ter formação mínima no ensino médio ou magistério e participar de formações na área de educação oferecidas pela Secretaria da Educação do município e/ou instituição em que atuam. Ainda segundo este Plano Municipal, tais formações acadêmicas mínimas são importantes, pois a qualidade da educação perpassa pela capacitação, valorização e oferecimento de condições adequadas ao trabalho.

Diante disso, o objetivo geral desse estudo foi analisar e conhecer as concepções e ações de professoras, monitoras e psicólogas escolares sobre o desenvolvimento infantil, em instituições públicas de educação infantil de uma cidade do Estado da Paraíba - Brasil. Para além disso, buscou-se especificamente: conhecer a percepção dos profissionais sobre o desenvolvimento infantil; levantar a concepção dos profissionais sobre o papel da educação infantil no desenvolvimento humano; identificar as atividades realizadas junto às crianças/instituições, pelos profissionais entrevistados; compreender como ocorre o planejamento pedagógico nas instituições; verificar o referencial teórico adotado para as práticas profissionais nas instituições de educação infantil.

 

Método

Foi realizada uma pesquisa de cunho qualitativo, de caráter descritivo. A pesquisa qualitativa permite a compreensão, a partir do relato dos participantes, de um conjunto de sentidos, experiências e vivências, concebidos em sua historicidade e totalidade. Esse tipo de pesquisa permite, ainda, a análise de redes de interação e demandas educacionais, uma vez que é melhor empregada na investigação de processos sociais ainda não explorados. Seu caráter descritivo possibilita um maior aprofundamento sobre as concepções dos profissionais que trabalham no contexto educacional, pela análise aprofundada de suas falas (Fazenda, 2008; Minayo, 2012).

 

Participantes

A amostra foi constituída por 38 participantes, sendo todas elas do sexo feminino, que atuavam em sete instituições públicas de educação infantil, em uma cidade do Estado da Paraíba - Brasil. Tais participantes foram divididas entre 17 professoras de educação infantil e 17 monitoras (que trabalhavam junto a crianças de seis meses a três anos de idade), além de quatro psicólogas escolares (três que trabalhavam via Secretaria de Educação, de forma itinerante, e uma que atuava diretamente em uma instituição pública de educação infantil).

As psicólogas escolares entrevistadas trabalhavam com crianças de seis meses a seis anos de idade, uma vez que, na cidade pesquisada, existem poucos profissionais de psicologia escolar que trabalham na educação infantil. Portanto, o critério utilizado para entrevistar as psicólogas escolares foi, basicamente, trabalhar junto a instituições públicas de educação infantil nesta cidade. A idade das psicólogas escolares entrevistadas variou entre 50 e 55 anos de idade, com média de 53,2 anos de idade. Já a idade das professoras variou entre 23 e 61 anos de idade, com média 41,8. E, por fim, a idade das monitoras variou entre 19 e 50 anos de idade, com média de 33,7 anos de idade.

No que se refere à formação profissional das psicólogas, duas tinham apenas a graduação em Psicologia, uma tinha Especialização e outra Mestrado. No que diz respeito às 17 professoras de educação infantil entrevistadas, sete apresentavam como formação acadêmica o Ensino Superior (seis em Pedagogia e uma em Letras - Português), duas tinham Especialização, cinco o Magistério e três tinham o Ensino Médio completo. Por sua vez, dentre as 17 monitoras, uma apresentava como formação acadêmica o Ensino Superior (Pedagogia), 12 tinham o Ensino Médio completo, duas tinham o Ensino Fundamental completo e duas o Ensino Fundamental incompleto. Destaca-se esta informação pela influência da formação profissional na concepção das profissionais da educação sobre o seu trabalho junto às crianças nesse contexto. Documentos oficiais direcionados à educação infantil (Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB, 1996, art.º 62), definem o ensino superior como o parâmetro de escolaridade para o profissional que atua no contexto da educação infantil, embora ainda se aceite, como mínimo, o nível médio (Oliveira, Silva, Cardoso, & Augusto, 2006; Ramos & Salomão, 2016; Rossetti-Ferreira, Ramon, & Silva, 2002).

 

Instrumentos

Para atender aos objetivos desse trabalho, foi utilizado um questionário sociodemográfico e um ‘Roteiro de entrevista sobre concepções de professoras/monitoras e psicólogas acerca do desenvolvimento e educação infantil’, que tem duas versões, uma para as professoras e monitoras e outra para psicólogas escolares. Cada roteiro continha quatro questões que discorriam sobre a atuação dessas profissionais no contexto de educação infantil, buscando averiguar suas concepções sobre o desenvolvimento das crianças com as quais trabalhavam. Para as professoras, monitoras e psicólogas, as perguntas feitas referiram-se: à percepção que tinham sobre o desenvolvimento da criança; ao papel da educação infantil; a atividades desenvolvidas junto às crianças/instituições; à existência de planejamento e/ou referencial teórico para o trabalho junto às crianças/instituições.

 

Procedimentos para coleta e análise de dados

Primeiramente, este trabalho foi apresentado ao setor de educação infantil da Secretaria de Educação do Estado da Paraíba, como forma de obter a anuência para a realização das entrevistas com os profissionais da educação que trabalhavam junto a instituições públicas de educação infantil. Obtida a aprovação, o estudo foi submetido ao Comitê de Ética do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba (UFPB)[1]. Para o estudo foram considerados todos os procedimento éticos para pesquisa com seres humanos apresentados na Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.

Antes da realização das entrevistas, foram explicados os objetivos do trabalho e, uma vez tendo aceitado participar do estudo, foi solicitada às professoras, monitoras e psicólogas a permissão para uso de gravador de áudio e a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. As entrevistas foram realizadas em local reservado nas instituições públicas de educação infantil e na Secretaria de Educação, para evitar possíveis interferências. No momento da entrevista, foi ressaltado que as participantes deveriam responder às perguntas baseando-se nas crianças com as quais trabalhavam.

Os materiais recolhidos por meio das entrevistas foram analisados tomando por base as diretrizes do método de categorização de conteúdo proposto por Bardin (2016). Dessa forma, foi realizada, inicialmente, uma leitura flutuante de cada entrevista realizada. Em seguida, foram identificadas similaridades semânticas entre as respostas específicas das participantes. Tais falas literais foram agrupadas por similaridade e estão inseridas em eixos de análise, que foram gerados a partir das perguntas que compunham os roteiros de entrevista e do objetivo do presente estudo, quais sejam: a) percepção das profissionais sobre o desenvolvimento infantil; b) papel da educação infantil para o desenvolvimento humano; c) atividades realizadas junto às crianças/instituições; d) planejamento pedagógico e/ou referencial teórico adotado.

 

Resultados e discussão

Percepção das profissionais sobre o desenvolvimento infantil

No que se refere ao primeiro eixo de análise, quando perguntado às professoras do berçário I e II (que atuavam junto a crianças de seis meses a um ano e meio de idade) sobre como percebiam o desenvolvimento das crianças com as quais trabalhavam, todas (N=4) responderam que percebiam o desenvolvimento dos bebês através de uma dimensão motora/cognitiva/lúdica, como ilustra a seguinte fala: “Eu percebo assim, nas brincadeiras” (C4E4).

Por sua vez, duas das sete monitoras que atuavam no berçário I e II citaram a importância da etapa da educação infantil, mencionando que as crianças inseridas neste contexto desde o berçário I (seis meses a um ano de idade) eram mais desenvolvidas do que aquelas que iniciaram a experiência nestes contextos a partir do primeiro ano de vida; três monitoras disseram que conseguiam perceber o desenvolvimento infantil no cotidiano; e, por fim, duas delas mencionaram que percebiam o desenvolvimento das crianças através de brincadeiras realizadas no cotidiano.

No grupo das 13 professoras do maternal I e II (que trabalhavam junto a crianças de dois e três anos de idade), oito também mencionaram que observavam o desenvolvimento das crianças por meio de atividades lúdicas ou quando elas conseguiam realizar as atividades propostas por elas, o que pode ser observado no seguinte trecho de fala: “Através das atividades lúdicas que eu faço” (C4E2). As outras cinco professoras afirmaram que o desenvolvimento motor e da linguagem oral das crianças é o principal indicador de que elas estão se desenvolvendo e que utilizavam uma avaliação do comportamento infantil através de observações e anotações, embora não tenham especificado como realizavam esta avaliação. Estes dados evidenciam a importância das interações estabelecidas entre adulto-criança e criança-criança no contexto de educação infantil e como estas interações e a qualidade das atividades desenvolvidas junto às crianças podem influenciar de forma positiva no desenvolvimento da motricidade (Costa, 2016).

Das dez monitoras do maternal I e II, seis mencionaram que também percebiam o desenvolvimento infantil nas brincadeiras e atividades realizadas junto às crianças, como pode ser percebido pela fala de uma delas: “Através do dia a dia, da brincadeira, das tarefas que a professora faz, a gente percebe” (C7M1). Duas monitoras responderam que percebiam que algumas crianças se desenvolvem mais rápido que outras, embora não tenham feito alguma menção à forma como percebem este desenvolvimento. Uma das monitoras mencionou que o afeto é um dos principais fatores que influenciam no desenvolvimento das crianças. Por fim, uma monitora respondeu que não conseguia perceber o desenvolvimento das crianças e que a não participação no planejamento das atividades pode ter influência nisto.

Percebe-se, pelo relato de algumas profissionais, que a brincadeira faz parte do rol de atividades desenvolvidas por elas junto às crianças, sendo importante também para que elas percebam o desenvolvimento das crianças com as quais trabalham. Documentos oficiais elaborados para o contexto da educação infantil, a exemplo das Novas Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil (CNE/CEB nº 5/2009), ressaltam que as interações sociais e brincadeiras devem nortear as atividades educativas de crianças de zero a seis anos de idade, sendo a brincadeira uma ferramenta importante para a mediação intencionalmente pedagógica nas atividades propostas no âmbito da educação infantil (Oliveira, Braz Aquino, Salomão, & Melo, 2015).

No que se refere ao grupo das psicólogas, quando questionadas sobre como percebiam o desenvolvimento das crianças nas instituições públicas de educação infantil, uma delas fez uma contextualização histórica sobre o papel da creche no desenvolvimento infantil, citando os documentos oficiais e as políticas públicas relativas à educação infantil no Brasil (PSI1); duas psicólogas relataram que percebiam o desenvolvimento das crianças através do desenvolvimento motor e linguístico, enfatizando que este desenvolvimento é gradativo e contínuo: “a gente percebe nitidamente o desenvolver deles no falar, no se comunicar com as pessoas, no caminhar” (PSI2). Outra profissional mencionou: “é gradativo . . . é um processo, . . . a parte dos estímulos também que são dados ao redor, tanto da parte das expressividades, das educadoras de um modo geral, como também dos objetos que lhe são oferecidos” (PSI3). Estas falas evidenciam o papel do processo de aquisição da linguagem. Ramos e Salomão (2016) argumentam que tal processo é influenciado pelas trocas sociais estabelecidas entre a criança e os sujeitos que já possuem o domínio da linguagem. O adulto pode ser considerado um mediador fundamental neste processo, uma vez que as formas de comunicação, desde os meses iniciais, repercutem no desenvolvimento da linguagem infantil. No contexto de educação infantil, as professoras e psicólogas se tornam “parceiras comunicativas de nível avançado” (p. 37) e as trocas comunicativas entre adulto e criança são essenciais para o desenvolvimento linguístico.

Por fim, a quarta psicóloga citou a influência da relação família-escola no desenvolvimento infantil, por meio do seguinte trecho: “elas ficam muito vítimas desse discurso: que é a família, a família e a escola, sabe? Que se a escola não desenvolve, que a escola não é boa, e na escola é a história que a família é desestruturada, que a família... Então fica nesse jogo”. Os conflitos existentes entre as instituições de educação infantil e a família podem existir pela divergência entre os profissionais da educação e os pais, no que concerne às necessidades, desenvolvimento e aprendizado das crianças. Contudo, faz-se necessária uma constante negociação entre os profissionais da educação e a família, de modo que este diálogo constante diminua as possíveis tensões existentes entre estas partes e se redimensione para uma relação de colaboração mútua, tal como menciona o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (Brasil, 1998).

 

Papel da educação infantil para o desenvolvimento humano

Sobre o segundo eixo de análise, quando perguntado às professoras do berçário I e II sobre o papel da educação infantil no desenvolvimento da criança, três das quatro professoras responderam que é a “base” para o desenvolvimento da criança. Uma das professoras respondeu apenas que o foco da educação infantil é o desenvolvimento infantil. Das sete monitoras do berçário I e II, cinco responderam que o papel da educação infantil é educar, enquanto as outras duas monitoras mencionaram que o papel da etapa da educação infantil é cuidar e dar afeto às crianças, como pode ser percebido na fala de uma delas: “Cuidar, dar carinho” (C9M3).

Foi possível notar, na fala de algumas profissionais, uma diferenciação entre o termo “cuidar” e o termo “educar”, embora no Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (Brasil, 1998) o termo “educar” englobe o cuidado, a importância da brincadeira e as atividades orientadas, conhecimentos amplos sobre a sociedade e a cultura, e desenvolvimento das potencialidades corporais, afetivas, emocionais, éticas e estéticas, que contribuem para o desenvolvimento global infantil.

Ainda sobre o papel da educação infantil, das 13 professoras do maternal I e II, cinco mencionaram que a etapa da educação infantil é fundamental no desenvolvimento das crianças e na formação de “cidadãos de bem”. Essa afirmação é ilustrada na fala a seguir: “Acho que é formar eles, formar um bom cidadão, fazer com que eles sejam um cidadão de bem” (C4E2). Cinco professoras mencionaram que a etapa da educação infantil é a base para o desenvolvimento da crianças; duas professoras responderam “educar as crianças”, e uma “educar e cuidar”. No que se refere às monitoras, cinco das dez profissionais responderam que a educação infantil é uma etapa muito importante, a base para a aprendizagem das crianças; duas monitoras responderam “cuidar e educar”; uma monitora respondeu “cuidar’; uma monitora respondeu “educar”; e, por fim, uma monitora respondeu que o papel da educação infantil é “mostrar sabedoria às crianças” (C9M2).

O termo “cidadania” ou “formar cidadãos de bem” compareceu na fala de algumas profissionais do maternal I e II. Este termo é encontrado na LDB (1996), quando este documento cita que a educação básica tem por finalidade o desenvolvimento do sujeito, na garantia de assegurar uma formação comum indispensável para o exercício da cidadania e qualificação para o ensino posterior e o campo do trabalho. Contudo, este documento não especifica o que seria a formação de um “cidadão de bem”, tal como destacado pelas profissionais.

Quando perguntado às psicólogas escolares sobre o papel da educação infantil no desenvolvimento humano, duas mencionaram a importância da atuação no contexto de educação infantil ser planejada e consciente, como pode ser observado no trecho de fala de uma delas: “é uma coisa mais planejada, mais consciente… mais direcionada, a gente faz com que eles direcione (sic) aquela aprendizagem do bebê, não é uma coisa assim, que tá aprendendo por aprender, tem objetivos” (PSI2).

A importância de atividades planejadas e intencionais foi ressaltada por duas das quatro psicólogas entrevistadas. A intencionalidade pedagógica, que deve nortear a atuação dos profissionais da educação denotando seu papel mediador no aprendizado infantil, está diretamente relacionada à discussão acerca da qualidade dos serviços disponibilizados às crianças no contexto de educação infantil. Partindo de uma leitura histórico-cultural, defende-se que os profissionais que trabalham em contextos de educação infantil apresentem propostas intencionalmente pedagógicas que favoreçam o desenvolvimento de funções psicológicas superiores (atenção, memória, imaginação, fala e pensamento) essenciais para a construção de habilidades sociocognitivas e comunicativas, tipicamente humanas (Bezerra & Soares-Silva, 2008; Richter & Barbosa, 2010).

Uma das psicólogas respondeu a esta questão de forma mais ampla, analisando a educação infantil, enfatizando aspectos políticos e pedagógicos relacionados a esta etapa educacional, como ilustra esse trecho:

Essencial, eu vejo como base, como uma estrutura mesmo. A gente sabe que nos outros países mais desenvolvidos a educação infantil é vista como muito mais importante que as outras séries, e o Brasil ainda tá engatinhando nisso, porque depende muito da sensibilidade do profissional. (PSI1).

Por fim, uma das psicólogas discorreu sobre a necessidade de se trabalhar as questões de gênero junto aos outros profissionais do contexto escolar, desde a etapa da educação infantil: “Eu acho fundamental, fundamental, principalmente quatro e cinco anos, a identificação, as questões de gênero” (PSI4).

O profissional de psicologia escolar, como já mencionado anteriormente, é um agente de mediação do saber psicológico no processo de ensino-aprendizagem, junto aos atores sociais que compõem as instituições de educação infantil. Como um agente de transformação, este profissional pode contribuir para a ressignificação de concepções e práticas, colaborar com processos de conscientização pela via da criação de espaços de discussão coletiva, que mobilizem e produzam impactos positivos nas estratégias pedagógicas existentes (Marinho-Araújo, 2010; Melo et al., 2016; Vokoy & Pedroza, 2005).

 

Atividades realizadas junto às crianças/instituições

No que se refere ao terceiro eixo de análise, quando questionadas sobre as atividades desenvolvidas junto às crianças, todas as quatro professoras e sete monitoras dos berçários I e II mencionaram a importância de atividades lúdicas, além de ressaltarem que se utilizam de outros recursos como contação de histórias, vídeos, fantoches, cantigas de roda, desenho, pintura e músicas: “brincadeira, cantigas de roda, historiazinha, com fantoches, história contada, risco e rabisco” (C4E4).

No que concerne às professoras do maternal I e II, sete das 13 professoras entrevistadas mencionaram que suas atividades junto às crianças com as quais trabalhavam giravam em torno da arte (através de desenhos, músicas e pinturas) e brincadeiras: “Tem muitas atividades de artes, de brincadeiras, de brinquedos… inúmeras atividades desenvolvidas com eles” (C1E1). Cinco professoras mencionaram que desenvolviam atividades tomando por base o planejamento pedagógico que ocorre junto à equipe pedagógica das instituições de educação infantil onde trabalhavam. Uma das professoras mencionou que, além de atividades como aulas de vídeo, passeio pela creche e rodinha de conversa, também fazia uma oração com as crianças, no início de suas atividades diárias. Dentre as dez monitoras do maternal I e II, seis também responderam que desenvolviam atividades ligadas à arte (músicas, pinturas, desenhos) e brincadeiras. Duas monitoras mencionaram que desenvolviam atividades ligadas à brincadeira, junto às crianças, enfatizando que as atividades pedagógicas são realizadas apenas pelas professoras: “Muitas brincadeiras, atividade é a professora. A gente faz brincadeiras com eles, atividades, só brincadeiras mesmo” (C8M2). Uma das monitoras respondeu que parte de suas atividades era ensinar as crianças a se tornarem independentes e uma monitora respondeu, apenas, que todos os dias as crianças têm uma rotina a cumprir, planejada pelas professoras.

Nos relatos acima, percebe-se a presença da atividade de brincadeira, considerada como favorecedora da apropriação de habilidades sociais, culturais e para o gradativo entendimento de regras que, a partir do jogo, se ampliam para as demais esferas relacionais. Pela brincadeira, as reações humanas são recriadas e reelaboradas, proporcionando à criança uma interação com os aspectos subjetivos e culturais de sua personalidade (Vigotski, 2001). Transpondo essa ideia para o contexto da educação infantil, pode-se afirmar que a brincadeira se constitui como a principal atividade da infância e um contexto mediador por excelência do processo de desenvolvimento e aprendizado (Melo et al., 2016; Pereira, Amparo, & Almeida, 2006). Segundo Melo et al. (2016), o emprego da brincadeira nas atividades junto às crianças depende de como o educador infantil concebe o “brincar”, pois essa concepção influencia suas propostas e atividades pedagógicas. Para estas autoras, a brincadeira pode se apresentar como um recurso educativo e a mediação do profissional da educação em situações de brincadeira é de grande importância para o desenvolvimento sócio cognitivo infantil.

Quando questionadas sobre as atividades desenvolvidas junto às instituições públicas de educação infantil, uma das psicólogas (PSI1) respondeu que suas atividades são realizadas bimestralmente, por meio de eixos temáticos desenvolvidos nas creches, enfatizando que cada atividade é planejada mediante a faixa etária das crianças. Uma das psicólogas entrevistadas mencionou que a sua atividade junto às instituições é dar orientação de planejamento às pedagogas, enfatizando, assim como a primeira psicóloga, que tais trabalhos são planejados mediante a faixa etária das crianças. Ilustra essa questão o seguinte trecho de fala: “Nós orientamos o planejamento das pedagogas… o que elas [as crianças] podem e o que não podem alcançar, o nível de maturidade, a gente lida muito com a questão do desenvolvimento delas, por faixa etária” (PSI2). As outras duas psicólogas mencionaram, dentre outras atividades, que seus trabalhos são em equipe, que fazem encontros, acompanhamentos e supervisões junto às professoras, buscando trabalhar a proposta pedagógica, os autores que fundamentam as atividades que serão implementadas e a supervisão das atividades da rotina (PSI3/PSI4).

As falas das PSI3 e PSI4 se aproximam de uma perspectiva de trabalho relacional e institucional, quando mencionam o trabalho junto aos demais profissionais da instituição, marcadamente os professores. No contexto da educação infantil, o psicólogo escolar pode promover reflexões conjuntas com as professoras de educação infantil, a fim de socializar a interlocução do saber psicológico à educação, com vistas a potencializar os processos de desenvolvimento e aprendizado e promover a ressignificação de concepções e práticas junto aos profissionais da educação infantil (Costa & Guzzo, 2006).

 

Planejamento pedagógico e/ou referencial teórico adotado

Por fim, no que se refere ao quarto eixo de análise, quando questionadas sobre a existência de planejamento pedagógico e/ou referencial teórico adotado, todas as quatro professoras do berçário I e II responderam que participavam do planejamento pedagógico e que trabalhavam a partir de eixos de projetos. Uma dessas professoras mencionou que as atividades eram planejadas semanalmente e quinzenalmente, com base na faixa etária das crianças. Das sete monitoras do berçário I e II, seis responderam que existia planejamento e que este ocorria bimestralmente. Uma das monitoras respondeu apenas “não”.

Dentre as 13 professoras do maternal I e II, 11 responderam que existia planejamento nas instituições onde trabalhavam e que este ocorria de forma semanal, quinzenal e anual. Uma das professoras mencionou que o planejamento ocorria com base no que é proposto pela prefeitura da cidade pesquisada e uma professora respondeu que existia planejamento e, como referencial teórico, consultava o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil: “Existe planejamento, eu sempre trabalho, pesquisando, no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil” (C1E3). Dentre as dez monitoras do maternal I e II, seis responderam que existia planejamento e que este é repassado para elas pela orientadora pedagógica. Quatro monitoras, por sua vez, responderam que não participavam do planejamento, sendo uma formação continuada exclusiva das professoras: “Pra gente? A gente não faz planejamento, só quem participa são os professores, porque a gente não pode né?, só professor que pode planejar, a gente pode dar um apoio, uma opinião, mas nem tanto” (C8M2).

O planejamento é essencial ao processo educativo, pois é através dele que o docente determina as necessidades básicas de seu trabalho, os objetivos pedagógicos que deseja alcançar através de sua atuação e os recursos que serão utilizados para a execução de suas atividades (Castro, Tucunduva, & Arns (2008). A ausência de planejamento das atividades, levando a uma atuação improvisada por parte dos profissionais de educação, influencia na execução de atividades não intencionais e desconsidera o papel da mediação no desenvolvimento e aprendizado infantil.

A formação dos profissionais que trabalham no contexto de educação infantil, a despeito de suas funções, tem influência em sua atuação e na relação entre o profissional e a criança. A qualidade das relações entre criança e adulto não é prerrogativa de pessoas de um “certo nível instrucional”, mas pode ser influenciada pelas concepções sobre o desenvolvimento infantil dos educadores que trabalham junto às crianças (Lordelo & Carvalho, 2003; Melo et al., 2016). Sendo assim, considera-se relevante a participação de monitores nos momentos de planejamentos institucionais, uma vez que tal participação pode auxiliar em práticas comprometidas com o desenvolvimento e o aprendizado infantil. Vale destacar que apenas uma professora mencionou que, além de participar dos planejamentos pedagógicos, se utiliza de documentos oficiais voltados para a educação como referencial teórico para desenvolver o seu trabalho junto às crianças.

Com relação à questão do planejamento e do referencial teórico para o trabalho nas instituições públicas de educação infantil, uma das psicólogas entrevistadas mencionou que existe um planejamento para o trabalho junto às instituições e que se guia pelo Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, além de destacar os projetos desenvolvidos nas instituições que visita (PSI1). Uma das psicólogas não mencionou algum planejamento, apenas o referencial para o seu trabalho: “Sim, nós nos orientamos pelos parâmetros curriculares, nacionais, os referenciais curriculares” (PSI2).

A terceira psicóloga entrevistada ressaltou que existe um planejamento de ação das psicólogas que trabalham na Secretaria de Educação, além de destacar a utilização dos Referênciais Curriculares Nacionais, as propostas desenvolvidas pela Secretaria de Educação para o trabalho na educação infantil, e mencionou alguns autores que fazem parte do seu aporte teórico e metodológico, como Vygotsky e Piaget. Por fim, a quarta psicóloga entrevistada mencionou que se baseia no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (Brasil, 1998), na proposta da Secretaria de Educação, a Base Nacional Comum Curricular - BNCC (Brasil, 2017), além de aconselhar às professoras que sempre busquem informações no site do Ministério da Educação (MEC), para que possam expandir os seus trabalhos.

É possível perceber que o planejamento faz parte do rol de atividades das psicólogas entrevistadas, assim como da maioria das professoras que participaram deste estudo. Ademais, todas as psicólogas citaram algum referencial teórico que as auxilia no planejamento e posterior desenvolvimento de suas atividades. Adverte-se para a relevância de aprofundar a compreensão acerca das contribuições efetivas desses referenciais para a prática desses profissionais na educação infantil e ainda da constante busca por um aprofundamento teórico e metodológico que sustente suas ações nesses contextos, com foco no processo de desenvolvimento humano.

A ação do psicólogo escolar deve ser orientada por referenciais teóricos ligados ao campo da psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem e da educação. A apropriação de um marco teórico poderá guiar as suas ações no campo do saber, de modo a favorecer uma atuação que rompa com práticas individualistas e, de forma contrária, considere o desenvolvimento e o processo de ensino-aprendizagem como fundamentados na concretude humana (Antunes, 2008; Medeiros & Braz Aquino, 2011).

 

Considerações finais

Este trabalho teve como objetivo principal analisar e conhecer as concepções e ações de um grupo de professoras, monitoras e psicólogas escolares sobre o desenvolvimento de crianças inseridas em contextos públicos de educação infantil, em uma cidade do Estado da Paraíba- Brasil. Estudar essa temática é relevante pelo impacto da intersubjetividade entre adulto-criança para o desenvolvimento infantil e das concepções dos adultos sobre as interações com crianças, desde seus primeiros anos de vida.

Os resultados obtidos através da entrevista demonstraram que a maioria das professoras da educação infantil percebe o desenvolvimento infantil a partir das atividades propostas e pelas situações de brincadeira nas quais se engajam as crianças. Tais profissionais destacaram a importância da etapa da educação infantil para o desenvolvimento da criança e a importância do planejamento para suas atuações. Destaca-se, aqui, a importância de práticas fundamentadas em uma formação básica e continuada, tal como preconiza a LDB (1996), dada a influência das concepções sobre o desenvolvimento infantil na atuação junto às crianças.

Por sua vez, as psicólogas relataram que o desenvolvimento infantil é um processo contínuo e que pode ser percebido através das situações de interação entre o adulto e a criança. Estas profissionais também destacaram a importância do planejamento para elaboração de atividades intencionalmente pedagógicas no contexto de educação infantil e a maioria delas revelou, em seus discursos, uma atuação junto aos professores, com a equipe técnica, a família e as crianças.

Menciona-se ainda a relativa dificuldade em encontrar psicólogos escolares que fizessem parte do quadro efetivo das instituições públicas de educação infantil pesquisadas. O trabalho de psicólogos junto a estas instituições dá-se majoritariamente via Secretaria de Educação e a presença desses profissionais geralmente ocorre quando surge uma queixa por parte da gestão ou dos docentes. Salienta-se a relevância da participação efetiva e contínua de psicólogos escolares no contexto da educação infantil, pela importância da mediação do saber psicológico ligado ao desenvolvimento e à aprendizagem. Defende-se, ainda, que o trabalho do psicólogo escolar ocorra de forma preventiva e relacional, não apenas a partir de queixas institucionais que se guiam por um paradigma do fracasso escolar, mas por uma perspectiva abrangente e institucional, que engloba a criança e os espaços que a compõem e que por ela são compostos, como a própria instituição, sua comunidade e a família, os quais fazem parte da cultura na qual ela está inserida (Costa & Guzzo, 2006; Marinho-Araújo, 2010).

O psicólogo escolar pode auxiliar no desenvolvimento das funções psicológicas superiores ao mediar as ações dos professores junto às crianças e, assim, colaborar com o desenvolvimento tanto dos sujeitos mais experientes (profissionais), quanto daqueles que estão em processo inicial de apropriação de elementos da cultura. Os resultados desse estudo reafirmam a importância do psicólogo escolar no contexto de educação infantil, conforme relatos das profissionais entrevistadas, quando afirmaram que atuam de forma coletiva e medeiam, juntos às professoras, conhecimentos específicos do campo da psicologia que possibilitam o planejamento de atividades intencionalmente pedagógicas, além de, segundo tais profissionais, criarem espaços de discussão junto aos outros profissionais da instituição e familiares, sobre o papel da educação infantil no desenvolvimento das crianças. Entende-se que esse tipo de prática está diretamente atrelada à formação dos psicólogos desde a graduação, bem como à formação continuada em serviço. Dessa forma, reafirma-se a importância do trabalho do psicólogo escolar no contexto da educação infantil, uma vez que este profissional pode ser considerado um agente mediador da interação educador-criança no que tange aos processos de desenvolvimento e aprendizado humanos.

Espera-se que este estudo venha a contribuir para a atuação de profissionais da educação e pesquisadores que trabalhem na interface da psicologia escolar e o desenvolvimento. Sugere-se que futuros estudos, ligados a esta temática, contem com um número maior de participantes, principalmente psicólogos escolares, e envolvam outros profissionais da educação infantil, como gestores, coordenadores e supervisores pedagógicos.

 

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Legislação

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Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2009. Fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação infantil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação, Câmara de Educação Básica.

 

Endereço para Correspondência

Toda a correspondência relativa a este artigo deve ser enviada para: Vanessa da Cruz Alexandrino, Av. Oceano Pacífico, 134, apt. 202, Intermares, Cabedelo, Paraíba, Brasil. Email: vanessacruz.psi@gmail.com

 

Recebido em: janeiro 2018

 

Aceite para publicação em: novembro 2018

 

Notas

[1] Aprovado com o número do parecer 1.530.902, CAAE: 48946115.6.0000.5188.

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