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Nascer e Crescer

versión impresa ISSN 0872-0754

Nascer e Crescer v.19 n.3 Porto sep. 2010

 

Prematuridade Tardia: Experiência da Maternidade Júlio Dinis

 

Cristina Godinho1

1 Maternidade Júlio Dinis - MJD/CHP

 

INTRODUÇÃO

A definição de prematuridade tardia (LPT) diz respeito aos recém-nascidos (RN) com uma idade gestacional entre as 34 e as 36 semanas e 6 dias. O total de nascimentos destes RN pré-termo em relação ao número de nados vivos tem vindo a aumentar progressivamente. (Tomashek, J. Pediatr, 2007). Há quem se tenha referido a este aumento como uma “nova epidemia”, porque este grupo é fisiológica e metabolicamente imaturo e tem uma grande morbilidade e mortalidade (quatro vezes superior à apresentada pelos RN de termo). Daí que seja importante conhecer as suas particularidades e alertar toda a comunidade (médica e não só), a fim de prevenir as suas consequências e diminuir a sua incidência.

Sendo a Maternidade Júlio Dinis (MJD) um Hospital de Apoio Perinatal Diferenciado, referência a nível da região Norte – no tratamento dos RN pré-termo, consideramos importante saber o que se passa com este grupo específico. Este interesse pela prematuridade tardia não é novo, a MJD apresentou no ano passado na XXI Reunião do H. de Crianças Maria Pia, um trabalho de revisão dos prematuros tardios nascidos na Instituição em 2008.

 

OBJECTIVOS

Conhecer a população de LPT nascidos no CHP-MJD, durante o ano de 2009 relativamente à sua prevalência, características e morbilidade e comparar estes resultados com o estudo efectuado no ano anterior. Verificar se o conhecimento de algumas particularidades deste grupo e a implementação de algumas propostas de trabalho, influenciou de alguma forma a nossa abordagem a estes RNs de risco.

 

MATERIAL E MÉTODOS

População alvo: RN nascidos na MJD no ano de 2009, com a idade gestacional compreendida entre as 34s+0d e36s+6d. Estudo retrospectivo, com consulta dos processos clínicos.

 

RESULTADOS

Num total de 3050 RN nados vivos, a taxa de prematuridade (IG inferior a 37 semanas) foi de 10,5%, o que correspondeu a 309 RN, dos quais 196 (61,4%) eram LPT. O número de RN estudados foi de 190 (em 6, não foi possível consultar o processo clínico), 99 (52%) eram do sexo masculino. Em relação à idade gestacional constatou-se que 21% ti­nham 34s, 26% 35s e 53% 36s; O peso médio ao nascimento foi de 2479gr (min = 1530 gr e max = 4110 gr) e em 95% dos casos era adequado à idade gestacional. O parto foi eutócico em 82 casos (43%). A cesariana ocorreu em 99 casos (52%), a maioria delas 47 (47%), em grávidas de 36 semanas. Os motivos apresentados para a sua realização, por ordem decres­cente foram: apresentação pélvica – 18%, pré-eclampsia –12,1%, descolamento da placenta/placenta prévia total – 10%, sofrimento fetal agudo – 9%, oligoâmnios – 8% e RCIU – 6%. De referir que em 11,1% dos casos, o motivo da cesariana não estava registado.

A gravidez foi vigiada na maioria dos casos (96,8%) e relativamente aos antecedentes maternos, apenas a referir hipertensão arterial em 5,2% das grávidas. Em relação às intercorrências durante a gravidez, observou-se que 10% tiveram diabetes gestacional, 8,4% história de ITU, 6,8% metrorragias e em 11% dos casos havia história prévia de ameaça de parto prematuro. Em 19% dos casos tinha sido efectuada corticoterapia profi­láctica pré-natal.

O tempo de internamento dos RN foi em média de 6,8 dias, com uma mediana de 4 dias. Metade, permaneceram junto da mãe e uma pequena percentagem (13%) necessitou de uma vigilância especial no berçário, os restantes 71 (37,4%) foram internados na Unidade de Neonatologia, 18 (9,5%) por necessidade de apoio ventilatório (2 deles com ventilação mecânica). Fizeram nutrição parentérica 17 (8,9%).

Os diagnósticos mais frequentes foram a icterícia neonatal–82,1%, dificuldades alimentares–53,7%, hipoglicemia–12,4 % e dificuldade respiratória–30,5% (gemido, TTRN ou DMH). Efectuaram rastreio infeccioso 98 (52%), mas apenas em 3 casos (1,6%) este foi positivo. Fizeram antibioterapia 23 (12%). De salientar que, dos LPT de 34s, 92,5% fizeram rastreio.

À data de alta, houve registo do peso em 166 (87%). A perda ponderal média foi de 7% (0-21,8%).

A ecografia transfontanelar foi realizada em 101 casos (53,2%). Em 62 casos a ecografia foi efectuada ainda no internamento e repetida em 42 casos às 40 semanas de idade pós menstrual. Em 39 casos só foi efectuada às 40 semanas de idade pós menstrual. A alteração mais frequentemente descrita foi “hiperecogenicidade periventricular” em 24 casos; destes, 15 normalizaram às 40 semanas. Assim, do total de LPT que efectuaram ecografia transfontanelar, apenas 18 mostraram alterações às 40 semanas de idade pós-menstrual. As alterações descritas foram: dilatação ventricular (4 casos), vasculopatia lenticulo-estriada (3 casos), hemorragia ventricular (2 casos), quisto–periventricular/coroideu (2 casos), alargamento da cisura inter hemisférica (2 casos), assimetria ventricular (2 casos), agenesia do corpo caloso (1 caso), hiperecogenicidade dos núcleos da base (1 caso) e alargamento da cisterna magna (1 caso).

O reinternamento ocorreu em 44 (23,2%) dos LPT. O motivo principal foi a icterícia (86%) associada ou não a dificuldades alimentares e perda ponderal. Em 3 casos (7%), o motivo foi ALTE. A idade à data do reinternamento foi em 57% dos casos entre quatro a sete dias de vida.

A primeira consulta ocorreu em média aos 20 dias de vida, sendo que 53% dos RNs estavam com leite materno exclusivo.

 

CONCLUSÕES

A incidência de prematuridade tardia na MJD é inferior à referida na literatura–71%, o que pode ser justificado pela MJD ser um Hospital de Apoio Perinatal Diferenciado. No entanto a incidência aumentou nos últimos dois anos–56% em 2008 para 61,4% em 2009. Este aumento da incidência da prematuridade tardia também tem sido observado noutros países, não se conhecendo a verdadeira etiologia do fenómeno. Há quem refira que se deve bastante à intervenção médica nos factores obstétricos maternos, embora os dados sejam limitados. Na nossa casuística, podemos verificar que um dos motivos para cesariana foi apresentação pélvica em 18%. A incidência de gemelaridade nesta amostra foi de 18%.

Relativamente ao grupo de LPT, constatou-se que em 2009 o grupo das 36 semanas foi maior, 53% versus 46,2% em 2008. A média da idade gestacional foi de 35,3 semanas, sobreponível à de 2008.

Na apresentação da casuística dos LPT de 2008 no nosso Serviço de Neonatologia, foi elaborada uma proposta de trabalho de abordagem destes RN, para uma melhor vigilância e detecção precoce das co-morbilidades deste grupo específico. Uma das propostas era aumentar o tempo do internamento para um mínimo de 3 dias. Desta forma, certos problemas como a icterícia poderiam ser rastreados e tratados mais precocemente. Esta prática aumentou o tempo médio de interna­mento de 5,9 dias em 2008 para 6,4 dias em 2009.

Em 2009 tivemos de facto mais icterícias (82,1% versus 66,3% em 2008), 67,4% com critérios para fototerapia.

Outra das propostas foi fazer a determinação das glicemias nas primeiras 2h de vida a fim de detectar precocemente uma hipoglicemia e tratá-la de forma adequada. Obtivemos 84,7% de registos e foi detectada hipoglicemia em 12,4% dos LPT versus 11,2% em 2008, o que justifica a manutenção deste procedimento.

Outra orientação foi a avaliação da lactação nas primeiras 24h, estabelecendo um plano alimentar para o internamento e para o domicílio, com documentação da percentagem de peso perdida e reavaliação em 24h, caso se justificasse. Deste modo tivemos um registo de peso à data de alta em 87% dos casos (versus 49% em 2008). A perda ponderal média foi de 7% com um mínimo de 0 e um máximo de 21,8%. Os dias em que se verificaram uma maior perda ponderal foram em D3 e D4 (46%).

A taxa de reinternamento foi de 23,2% (44 casos), versus 14,2% (24 casos) em 2008. O motivo principal do internamento foi a icterícia em 86% dos RNs, associada ou não a dificuldades alimentares com perda ponderal. Este aumento poderá ser justificado pelo maior número de RN com idade gestacional de 36 semanas, nesta casuística. Como é referido na literatura o reinternamento nos LPT é mais frequente quanto maior for a idade gestacional uma vez que estes RN têm habitualmente um maior peso e há tendência a terem altas mais precoces. Neste estudo se analisarmos os reinternamentos relativamente à idade gestacional verificamos que apenas 11% dos RN de 34 semanas foram reinternados versus 59% dos RN com 36 semanas. Outro dos motivos será provavelmente a reavaliação que é feita 24 a 48h após a alta naqueles RNs que por qualquer motivo (icterícia sem critérios para fototerapia à data da alta ou por dificuldades alimentares) necessitam de uma maior vigilância. Como se pode constatar a idade do reinternamento foi em 57% dos casos na primeira semana de vida (D4 -D7), o período de maior fragilidade. O ideal seria a vigilância domiciliar.

Uma outra proposta surgiu do conhecimento de que estes RN são mais susceptíveis pela sua imaturidade a lesões cerebrais. Neste trabalho verificou-se que de facto houve um esforço no sentido de efectuar ecografia transfontanelar ao maior número de LPT (53,2% versus 33,7% em 2008). Dos que realizaram ecografia, 45,2% apresentaram alterações, a mais frequentemente descrita foi a “hiperecogenicidade periventricular” com 21 (33,9%) casos. Do total de LPT que efectuaram ecografia transfontane­lar às 40 sem de idade pós-menstrual 18 (17,8%) mostraram alterações. Nesta altura o prognóstico das lesões apresentadas é bem diferente do mostrado no internamento, pois como se verificou, 24% destas lesões desaparecem.

Estes trabalhos de revisão, mostram-nos que há sempre procedimentos que podemos melhorar e aperfeiçoar e não nos devemos esquecer que é com a avaliação dos resultados de todo um trabalho em equipa que podemos validar os nossos conhecimentos, implementar as estratégias mais adequadas, reforçando a vontade de trabalhar cada vez melhor.

 

BIBLIOGRAFIA

1 - Ryan W Loftin, Mounira Habli, Candice C Snyder, Clint M Cormier, David F Lewis and Emily A DeFranco. Late Preterm Birth. Rev Obstet Gynecol. 2010. Winter; 3(1):10-9.

2 - The Chiefs of Neonatology, KP NCAL “Care Guideline for Late preter Infants -2008”. In Hot Topics, California, April 2008, Pag 222-6.

3 - William Engle, Kay Tomashek, Carol Wallman. “Late-Preterm” Infants: A population at risk. Pediatrics. 2007; 120/6: 1390-401

4 - Position Statement of the Canadian Paediatric Society. Guidelines for detection, management and prevention of hyperbilirruinemia in term and late preterm newborn infants (35 or more weeks’ gestation)–Summary. Paediatr Child Heath. 2007. 12/5:401-7

5 - Tonse Raju, Rosemary Higgins, Ann Stark, Kenneth Leveno. Optimizing care and outcome for late-preterm (near term) infants: A summary of the workshop sponsored by the National Institute of Child Health and Human Development. Pediatrics. 2006;118/3:1207-14

6 - Carrie Shapiro-Mendonza et al. Effect of Late-Preterm Birth and Maternal Medical Conditions on Newborn Morbidity risk. Pediatrics.2008;121/2:e223-32         [ Links ]

7 - www.pediatriccareonline.org/pco/ub/pview/AAP-Textbook-of-Pediatric-Care/

 

AGRADECIMENTO

O Autor agradece a colaboração da interna complementar de pediatria do H. de Viseu, Joana Ramos Pereira, na colheita destes dados.

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