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Nascer e Crescer

versión impresa ISSN 0872-0754

Nascer e Crescer v.20 n.2 Porto jun. 2011

 

Unexplained Physical Complaints

M. Elena Garralda, In Child Adolesc Psychiatr. Clin N Am. 2010; 19: 199–209

 

Maria do Carmo Santos1

1 Departamento de Pedopsiquiatria do Hospital Maria Pia / CH Porto

 

Physical complaints tend not to feature prominently in the everyday work of child and adolescent psychiatrists or child and youth mental health clinics. These problems are more likely to be referred to the local pediatric clinic. As a result, expertise in the assessment and management of the psychiatric aspects of such problems varies considerably and can be limited. An exception are psychiatric pediatric liaison teams as they deal primarily with problems at the interface between physical and mental health problems, which include medically unexplained symptoms. Nevertheless, family engagement in assessment and treatment can be problematic even for specialist liaison teams.

Whether children and families engage with and benefit from psychiatric services depends to a large extent on whether families appreciate the link between physical and psychiatric symptoms, and wish to work on the comorbid psychopathology such as anxiety disorders or on the contributing psycho­social problems such as family disruption or school difficulties. Benefit may also depend on the joint expertise of pediatric and child and adolescent mental health teams in attending to these types of problems.

Keywords: Physical complaints; Somatization; Somato-form disorders.

 

COMENTÁRIOS

As queixas somáticas sem explicação médica são muito frequentes em crianças e adolescentes e constituem um motivo regular de consultas e exames clínicos, para além de poderem suscitar bastante stress nos pais e por vezes também nos próprios médicos.

O propósito deste trabalho é rever os dados mais recentes que as pesquisas têm revelado acerca das queixas físicas em crianças e adolescentes. São problemas relativamente comuns que terão, na sua maioria, uma explicação fisiológica e não derivam de uma doença médica reconhecível.

Estudos na população geral detectam que, nesta faixa etária, existe uma média de dois sintomas somáticos “muito” presentes nas duas semanas prévias. Os mais frequentes são cefaleias, fadiga, músculos doridos, náuseas e mal-estar gástrico, dores nas costas e dores de estômago. Muitos destes sintomas são ligeiros mas para uma minoria os problemas serão intensos e incapacitantes, prejudicando o seu funcionamento no quotidiano, tal como se verifica no absentismo escolar.

O modo como estas queixas vão ser encaradas depende da forma como vão ser entendidas. Se os pais ficam preocupados ou mesmo angustiados, interpretando-as como um sinal de doença, irão consultar o médico ou tentarão resolvê-las com os seus conhecimentos caseiros. Se as encaram como temporárias, sem probabilidade de significar doença, poderão atribuir-lhes uma causa inocente (do género, as dores abdominais serão porque qualquer alimento “não caiu bem”) e ter uma atitude mais expectante. Poderão mesmo arranjar motivos psicológicos quando as queixas apresentam algum padrão repetitivo e previsível – as dores de cabeça, quando as exigências escolares desse dia são maiores ou quando se aproxima um evento que é desagradável à criança. Nestas situações, as estratégias mais eficazes serão minimizar a importância dos sintomas e confortar para poder enfrentar a situação temida.

Mas existem quadros em que as queixas somáticas, pela sua intensidade e sobretudo pela incapacidade funcional que provocam dão lugar a quadros reconhecidos em que a somatização é o aspecto comum – as perturbações somatoformes, particularmente a perturbação de dor somatoforme, a perturbação dissociativa/conversão ou o síndrome de fadiga crónica. Em todos estes quadros existe alguma evidência de somatização, isto é, uma tendência para sentir e comunicar o mal-estar através de sintomas somáticos. No entanto estes quadros são relativamente raros, ao contrário da prevalência das queixas físicas inexplicadas.

É importante referir que na somatização as queixas não são produzidas intencionalmente, isto é, não existe simulação. Alguns pais podem desvalorizar ou impacientar-se com as quei­xas dos filhos quando constatam que as queixas cessam com as medidas tranquilizadoras, como a de ir buscar a criança à escola ou a de ir a uma consulta médica. A teoria da aprendizagem salienta que a criança com uma lesão ou doença aprende os benefícios do papel de doente – a solicitude parental e o evitamento de responsabilidades desagradáveis. Como intervir então eficazmente e poder levar a criança ou jovem a encarar as tarefas do crescimento e poder ultrapassar esses sinais incómodos que o seu corpo lhe envia?

O consumo de actos médicos, a expectativa de um tratamento e frequentemente a recusa de uma avaliação psiquiátrica, são problemas adicionais que se colocam na abordagem destas situações. Os médicos poderão também recear que uma doença possa não estar a ser reconhecida ou ter dificuldades em reconhecer a interligação estreita entre sintomas psicológicos e físicos.

O artigo remete para um modelo biopsicossocial, em que se considere a contribuição relativa dos factores biológicos, psicológicos e sociais na contribuição e manutenção dos sintomas. Nem os sintomas físicos serão totalmente explicados medicamente e do domínio exclusivo da pediatria, nem os que medicamente não se conseguem explicar estarão fora desta e pertencem ao domínio psiquiátrico. Por exemplo, é o que pode acontecer com a intensidade ou incapacidade dos sintomas – uma fractura do membro inferior e imobilização a que se segue uma fraqueza muscular excessiva ou a ocorrência de pseudocrises numa criança com epilepsia.

O reforço parental dos sintomas, através da sobreprotecção e fraco incentivo a enfrentar os problemas e o papel de factores de stress, têm sido documentados nas crianças que manifestam queixas físicas excessivas; estas foram também caracterizadas como sendo sensíveis, inseguras e ansiosas, com baixas com­petências sociais.

O tratamento deveria então incluir um interesse pela criança e seu contexto, conduzir as investigações necessárias e discutir cuidadosamente com os pais que a doença orgânica foi excluída; daqui avançar para a hipótese de outros factores prejudiciais possíveis, como exigências escolares ou psicológicas excessivas, ajudando a família a modificá-los. Explicar as ligações entre dor física e psicológica, limitar a atenção dada aos sintomas, promover técnicas de distracção e incentivar a participação nas rotinas diárias, são aspectos fundamentais. Ouvir as preocupações parentais e discuti-las, pode ajudar os pais a sentirem-se mais seguros e confiantes a lidar com as queixas dos filhos.

Algumas das características dos sintomas também podem ajudar a compreender a sua natureza psicossomática(1): tendem a ser vagos, breves, não se detecta uma base orgânica óbvia e ocorrem em contexto de stress. Ao contrário, sintomas bem definidos e de duração superior a algumas semanas merecem uma avaliação mais cuidada.

Para as famílias mais resistentes a aceitarem uma compreensão mais psicológica dos problemas dos filhos pode ser útil utilizar uma estratégia de enfatizar a importância da mente sobre o corpo: mesmo quando há problemas físicos, estes podem piorar quando o estado emocional está mais fragilizado.(2)

O prognóstico estará dependente mais do que da intensidade e incapacidade dos sintomas, dos problemas psicológicos associados (ansiedade, depressão), do apoio familiar e dos acontecimentos de vida negativos.

 

BIBLIOGRAFIA

Taylor RL. Psychological Masquerade: distinguishing psycho­logical from organic disorders. 3rd edition. New York: Springer Publishing Company, 2007: 181-2.         [ Links ]

Goodman R, Scott S. Child psychiatry. 2nd edition. Oxford: Blackwell Science, 1998.         [ Links ]

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