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Sociologia

versão impressa ISSN 0872-3419

Sociologia  no.tematico11 Porto dez. 2021  Epub 20-Fev-2022

https://doi.org/10.21747/08723419/soctem2021a3 

Artigos originais

“Eu não quero palmas, eu quero almas”: crenças e pertenças no rap evangélico da Grande Lisboa

“I don’t want applause, I want souls”: beliefs and belongings in the Christian rap of Greater Lisboa

“Je ne veux pas des applaudissements, je veux des âmes”: croyances et appartenances dans le rap évangélique du “Gran Lisbonne”

“No quiero aplausos, quiero almas”: creencias y pertenencias en el rap evangélico del “Gran Lisboa”

Cátia Tuna1 

1Centro de Estudos de História Religiosa Universidade Católica Portuguesa


RESUMO

Este artigo baseia-se em entrevistas realizadas a cinco rappers pertencentes a comunidades cristãs evangélicas e residentes na Grande Lisboa e nas letras que escrevem e cantam. Serão abordados tópicos como a identidade que formulam numa dupla pertença à rua e à igreja ou a inserção do repertório e dos depoimentos no mapa teológico do neopentecostalismo.

Palavras-chave: Rap evangélico; Hip Hop cristão; Neopentecostalismo

ABSTRACT

This paper is based on interviews with five rappers belonging to evangelical Christian communities and residing in Greater Lisbon and on the lyrics, they write and sing. Different subjects will be covered as the identity they formulate in a double belonging to the street and to the church, or the insertion of the repertoire and interviews in the theological map of neo-Pentecostalism.

Keywords: christian rap; christian hip hop; Neopentecostalism

RÉSUMÉ

Cet article est basé sur des entretiens avec cinq rappeurs appartenant à des communautés chrétiennes évangéliques et résidant dans le Aire Urbaine de Lisbonne et sur les paroles qu'ils écrivent et chantent. Différents sujets seront abordés comme l'identité qu'ils formulent dans une double appartenance à la rue et à l'église, ou l'insertion du répertoire et des entretiens dans la carte théologique du néopentecôtisme.

Mots-clés: Rap évangélique; hip-hop chrétien; Néopentecôtisme

RESUMEN

Este artículo se basa en entrevistas realizadas a cinco raperos de comunidades cristianas evangélicas que viven en la región metropolitana de Lisboa y en las letras que escriben y cantan. Se abordarán temas como la identidad que formulan en una doble pertenencia a la “calle” y a la iglesia, o la inserción de su repertorio y sus entrevistas en el mapa teológico del neopentecostalismo.

Palabras clave: Rap gospel; hip hop cristiano; Neopentecostalismo

Introdução

Nós perdemos as nossas vozes para Jesus. TripLL-H.1

O rap é uma cultura expressiva que desde a década de 1980 foi adotada por várias tradições religiosas em diferentes contextos geográficos, desde o christian-hip hop norte americano que suscitou inúmeros estudos (por exemplo, Gault; Harris, 2019) até à multiplicidade do rap muçulmano que tem merecido uma crescente atenção dos investigadores (por exemplo, Nieuwkerk, 2011).2 As primeiras gravações de rap cristão em Portugal terão ocorrido há menos de duas décadas, em meados da primeira década do segundo milénio na Grande Lisboa. Este é um território com especificidades no panorama religioso português, sendo marcado por um crescimento acentuado de novas igrejas urbanas de cariz pentecostal e neopentecostal mais aptas a aderir a “novas lógicas de comunicação e de transmissão” (Teixeira, 2019: 10). Este fenómeno compreende-se em grande parte pelas mobilidades migratórias, o que explica que quatro dos cinco informantes tenham ascendência familiar nos PALOP ou que três tenham eles próprios feito a experiência de imigração a partir desses países. Este primórdio do rap cristão português foi protagonizado por alguns dos rappers entrevistados e nele teve especial importância a ocorrência de dinâmicas comunitárias, primeiramente bandas e progressivamente a “editora” como modalidade prevalecente deste trabalho conjunto: o grupo Atalaia teve uma dinâmica inicial fundamental que foi sendo capitalizada para a editora Hastro. Iniciando em 2009 como estúdio, afirmou-se como editora de rap cristão e foi alargando o seu espetro musical tendo atualmente o objetivo de apoiar artistas cristãos, no geral (Tuna, 2020: 96-97). Quatro dos rappers que entrevistamos integravam esta editora (à exceção de DPD) à data das entrevistas realizadas em 2014.3 Amil ou UnderWord, o Exegeta (Isaías Trindade), DPD (Maia Fernando), Mancallas (Carlos Fanqueira), William Martins (membro dos Alta Cúpula) e Sammy, o Salmista (Samuel Rodrigues), todos eles pertencentes a denominações evangélicas diferentes, são os rappers que entrevistámos. A descrição dos seus percursos biográficos encontra-se no artigo “Hiphopcalipse: percursos e discursos de rappers evangélicos na Grande Lisboa”, publicado recentemente na REVER (Tuna, 2020: 93-95). Tal como neste artigo, no qual tivemos oportunidade de abordar alguma visualidade dos rappers como reveladora de uma ancoragem ao imaginário hiphopper, privilegiamos no presente estudo os elementos discursivos das entrevistas e as rimas escritas e cantadas, mas também incluímos pontualmente a análise de alguma imagética. No intuito de cartografar as crenças ou convicções religiosas assumidas por estes músicos, esta investigação centra-se na dupla pertença que marca a sua identidade: inscrevem-se, por um lado, no mundo suburbano do hip-hop; por outro, integram uma comunidade religiosa, assumindo a sua identidade de cristãos como principal capital identitário que mobilizam no mundo do “rap secular”.4 Nessas letras e também nos discursos que as entrevistas captaram, regista-se uma certa reatualização das ofertas religiosas em contexto suburbano operada por estes músicos cristãos - tópico que abordaremos na última parte do artigo.

1. A cabeça de Janus ou a dialética pertença-estranhamento à igreja e ao século

Este título recorre a uma frase de Paula Pereira (2011: 92) que afirma que o Homem desta “sociedade tecnológica global” é “mais livre mas mais atento à oscilação entre a pertença e o estranhamento”. A disjunção entre o sentimento de se estar vinculado a um dado grupo ou instituição e o desajuste com essa mesma instância vinculadora, faz alternar estas duas condições que se encontram em interação. Quando aplicado ao fenómeno musical, neste espectro gerado entre a pertença e o estranhamento, podemos encontrar num polo o modelo fusional, expressão de uma união total entre o “eu” do músico e a sua alteridade ou destinatário, e no outro o modelo conflitual, ostentador de uma rutura entre o sujeito músico e o interlocutor. Se no primeiro é possível situar a música de adoração, no segundo é posicionável o rap gospel dado que assenta em certa medida sobre uma cosmovisão dicotómica. Mónica Miller (2009: 42) destaca a linguagem binária que existe no rap evangélico patente em dicotomias como as seguintes: secular/cristão, fora/dentro. Christina Zanfagna (2011:148-149) acrescenta a dicotomia rua/igreja que vai ao encontro de uma frase proferida por Mancallas na sua entrevista: “Eu costumo dizer muitas vezes que sou demasiado rua para a igreja e demasiado igreja para a rua.” A pertença à rua e a experiência de rua são um tópico de indexação de grande relevância numa determinada identidade rapper por lhe conferir a garantia de realidade e de conhecimento (Cidra, 2002: 203-204). Nos rappers evangélicos entrevistados a afirmação dessa ligação à rua é oscilante, mas podemos grosso modo reconhecer que existe com mais proeminência nos percursos biográficos em que a infância e a adolescência foi passada fora de Portugal. Também se justifica por um fator geracional: quanto mais velhos eram os nossos entrevistados, mais o processo de aprendizagem ocorria em contexto de rua; quanto mais novos eram os nossos entrevistados, mais evidenciavam um contacto sobretudo doméstico e individual com o rap, mais em termos de consumo do que de prática. Nos elementos discursivos captados dos rappers evangélicos verifica-se a enunciação de uma dualidade identitária ou a pertença a dois mundos expressos como contrários e mutuamente excludentes. São duplamente condicionados e excluídos uma vez que, por um lado, ao fazerem rap são percecionados dentro do seu grupo religioso com suspeita, e que, por outro lado, a identidade evangélica prejudica-os na integração e no progresso dentro dos circuitos do rap. Isto é expresso, por exemplo, nestas rimas de Sammy, o Salmista:

E com certeza sou cristão ativista

eles querem a minha cabeça, João Batista

No serviço do meu rei sou satisfeito, abençoado no serviço do meu rei sou jubiloso e consagrado

no serviço do meu rei sou difamado porque sou crente, mas sou como o monte de Sião, permaneço para sempre.5

De igual forma, as suas motivações cruzam duas finalidades distintas. O rap incentiva-os a abrirem as igrejas ao século ao passo que a crença evangélica fá-los participar no rap com uma intenção espiritual e prosélita, extravasando-o como exercício musical e social. A capa da mixtape A Noiva Fora da Igreja, de Underword, o Exegeta, (figura n.º 1) expõe eloquentemente esta pertença que é interpretada como bipolarizada: numa mão encontra-se um CD e na outra uma Bíblia. O véu confere uma particular força expressiva no seu contraste com a t-shirt, as calças de ganga e o género masculino da pessoa que os veste. Também em várias das suas letras encontramos esta ambivalência identitária; por exemplo, na letra “Eu não paro” afirma: “Eu sou igual a ti / Mas no fundo até nem sou / Sou amigo da palavra / Fiel a quem me salvou”. 6

Figura 1: Fotografia da capa da mixtape “A noiva fora da Igreja”, de Rival (UnderWord, o Exegeta), 2013/2014 

As entrevistas sugerem-nos uma pertença intencionalmente visível a ambos os âmbitos tomados como dicotómicos, na exata proporção da consciência da sua conflituosidade com eles. Dito de outro modo, coexistindo o vínculo e a rutura com o “secular” e o “cristão”, ambos são expressos numa chave de uma certa exibição performativa, própria do género musical. Deste modo, assiste-se, por um lado, a uma exibição quer do ser-se rapper quer das crenças religiosas, registando-se inclusivamente uma saturação de elementos cristãos nas letras, e, por outro lado, a afirmação de um conjunto de críticas ao universo rapper e às igrejas, ou seja, a isso que é exposto de forma deliberadamente excessiva. Nas letras, as críticas dirigidas às igrejas visam amiúde as lideranças, ao passo que aquelas que são destinadas ao mundo do rap inserem-se num objeto denunciatório mais amplo que é a sociedade, no seu todo, da qual o rap constitui um reduto com características específicas, mas representativas do todo social tal como é por eles percecionado.

Este aparente dualismo verificável nas fontes discursivas em análise, na sectorização de identidades que realiza, terá de ser paradoxalmente refletido como integrador de uma complexíssima relação entre o «secular» e o «religioso», não redutível a um conjunto de modalidades ou categorias de interação. Importa calibrá-lo com uma complexificação da relação entre a religião e o mundo como âmbitos altamente conjugados, mesmo e talvez sobretudo em contextos e processos que os apresentam em linguagem de exclusão mútua. Recentes investigações sobre a mediatização da religião têm desconstruído bastante este aspeto que tem por trás uma certa tendência substancialista. Eles valorizam o peso dos imaginários, quer do imaginário da laicidade quer o imaginário do «religioso», como duas fontes simbólicas nas quais se reconhecem «circulações imaginativas» que proporcionam compreensões articuladas em vez de um entendimento binário (Hoover, 2019: 359-372). Esta perceção é necessária para ressaltar que estamos diante não só de mapas de ideias mas também e ao mesmo nível, de mapas imagéticos. No presente estudo percebe-se que são talvez sobretudo estes últimos que estão em causa na cosmovisão religiosa dos músicos em análise - e do neopentecostismo, no geral. A ponderação do «imaginário» é ainda importante para complexificar o aspeto dicotomizante da linguagem utilizada, e que reflete uma determinada perceção social em que o eixo definidor e ordenante é binário, tal como outros relativos a âmbitos como o género e a etnia. Na construção desse imaginário constituído por uma lógica de representações tendencialmente bipolarizadas, a rua é um lugar simbólico importante. Trata-se de um espaço construído por subjetividades que nela se diferenciam e que o assumem como lugar genealógico, isto é, o espaço onde se auto-inscreve a origem. Como habitat de identidades em processo, é também um local de disputa. Daniel Dehanas (2013: 295-308), ao analisar os influxos do rap cristão profissional de sucesso na performance dos outros jovens rappers no bairro londrino de Brixton, sublinha o tópico da autenticidade como característica conferidora de uma qualidade acrescida na performance dos hip-hoppers cristãos, o que fundamenta a influência exercida sobre os seus pares. Este tópico da «autenticidade» é um fator em jogo nessa disputa, ocorrendo esta, por outro lado, na proposta de uma espécie de «contra-axiologia», no qual o imaginário se verte para um conjunto de referenciais de índole moral. Deste modo, tanto nos poemas cantados como nas entrevistas é notória uma veemente admoestação dirigida ao enaltecimento do hip-hop (à sua perspetivação como um fim em si mesmo) e do ego, traduzida especialmente na busca da fama. Nestas rimas de Mancallas, encontramos não só estes aspetos, mas também a perspetiva do cristianismo como fator de superação do hip-hop, “saída da condição suburbana” (Tuna 2020: 100) e ainda a autorrepresentação do rapper como profeta:

Jesus Cristo é o nome que me faz feliz a 100%

Pensavas que era o hip-hop? Lamento, lamento, lamento. No dia que Cristo quiser deito o hip-hop no lixo

Não é ele que me dá sustento nem nunca morreu por mim. Ya, mano, é mesmo assim, sempre 100%, Cristo até ao fim. Cristo, Cristo, Cristo, sei que te irrita o nome,

Mas não te esqueças por um segundo, é Ele que está no trono (…).

Ilusão pela fama é para quem usa Dodot

Se és cristão e usas o rap tens de mudar o foco

Abandona a vaidade, pisa o ego, prega a verdade,

Encontra sossego em Cristo, caso contrário, nem no dia do teu enterro. Meu rap não é provocação, meu rap é por vocação,

É rima e salvação, de cima veio compaixão

Brother, siga para casa, não sou um profeta da desgraça

Sou um profeta da graça, tem graça…7

O resgate de almas perdidas como tópico prevalecente nos repertórios de rappers cristão é algo frequente no panorama geral do repertório deste tipo de rap (Souza; Montardo 2011: 21). A recusa de palmas funciona como uma metonímia para a recusa do ego. Além da sua alusão nos poemas cantados,8 é uma atitude exprimida por alguns entrevistados; assim o assevera Isaías Trindade: “Não cantar numa de “sou bom”, né. Porque quero é contar com uma outra pessoa, Jesus Cristo (…). No início quando eu comecei a cantar, comecei a ter alguns concertos, eu até privava as pessoas de aplaudirem (risos). Porque isto é sempre confusão e pensava que me estavam a glorificar…”. Os rappers criticam também a subestimação da realidade da morte, preponderando em muitas letras uma espiritualidade da fugacidade da vida, de cariz sapiencial e apocalítico. Incide- se com expressividade na morte precoce de jovens artistas mediáticos: “Existe sempre um momento onde a morte nos toca. / E um suspiro brota, o Espírito sai da toca, o sino toca / (…) Não viste o Angélico ou a Amy House? / Quando a morte nos toca não há Doutor House” (letra de Mancallas “Não tenho controlo”, álbum Ex-Ateu, 2013).9 Finalmente, existe uma crítica à visão da sexualidade e da perspetivação da mulher, como objeto sensual, bem assim à pornografia e à promoção de comportamentos considerados desviantes como o adultério. A letra “Não quero palmas” cantada por Mancalllas e Maura sendo a terceira música do seu primeiro álbum a solo, Ex-Ateu, assim o refere:

Não quero palmas, eu quero almas não quero damas, eu tenho armas

não quero damas na cama à procura da fama exclama: “sexo só depois do casamento” anda, chama-me jumento

não tenho o talento necessário para fazer do casamento um conto de fadas

inspiração para os brothers

na estrada da vida ainda existe amor eterno

só não entende o que eu digo quem não vive este gozo interno vale a pena o prazer da espera

eu sei que a carne desespera

com o pecado à perna.

Os nossos informantes denunciam também a corrupção política e as desigualdades sociais. Na letra “Em terra estranha”, do primeiro álbum de Underword, o Exegeta (This is Faith, 2007), abordam-se estes dois tópicos destacando o problema da emigração:

Benvindo à margem, que nos leva à profissão, roubo, lugar de guerra, ganância, corrupção,

onde no fundo estão os pobres e no topo estão os ricos,

os favorecidos pela exploração do capitalismo, dos políticos”.10

Os rappers arrogam para si a função de “comentadores sociais” (Shipley, 2009: 638). Jesse Shipley assim o assinala, reconhecendo nos rappers ganeses que estudou a correspondência entre as referências às questões de moral sexual e às de moral social. Isto ocorre tanto nas metáforas que são utilizadas num dos campos em alusão ao outro, bem assim no facto de os homens produzirem o seu valor de masculinidade através do rap, por exemplo, na corrupção moral que criticam e que assim o marca como autoridade pública. O rap gospel assume um papel de disciplinamento no qual os elementos religiosos convergem, participando na promoção de um determinado modus vivendi ou de um dado quadro axiológico seja do âmbito sexual seja do social. O universo hiphopper é o destinatário do primeiro âmbito; de forma mais rarefeita, o sujeito “sociedade” é o destinatário do segundo âmbito. Em ambos subjaz uma intenção de gerar medo, na qual participam elementos satanológicos, uma forte expectativa escatológica na qual Jesus aparece como messias que facultará a resolução das injustiças presentes. Há igualmente a ideia veterotestamentária de um Deus capaz de violência, mas detentor de autoridade moral (Sneed, 2007: 231). Paul Sneed considera que é esta a imagem de Deus que está implícita nos raps escritos, cantados, gravados e vendidos clandestinamente por narcotraficantes na favela da Rocinha no Rio de Janeiro, líderes do tráfico e desejavelmente da comunidade; destaca ainda os traços de messianismo e de utopia neles presentes. Em suma, podemos afirmar que a crítica a comportamentos de natureza afetiva e sexual e as constatações referentes ao lado negativo da organização social emanam de uma autorrepresentação dos rappers cristãos como fazedores de opinião e de uma opinião religiosa. A diversidade e o cariz sugestivo das críticas podem ser analisados do ponto de vista do género, no caso da disciplina sexual proposta, tendo subjacente a ideia de que o bom homem é o bom cristão evangélico e tendo em vista um determinado modelo familiar. Elas convergem na apresentação de Cristo como eixo da ordem moral sendo a figura do diabo a substanciar a ameaça a essa ordem. Percebe-se também uma relação de mimesis com os conteúdos veiculados nas igrejas. Abordamos agora a conflituosidade dos rappers com as suas igrejas, particularmente com as suas lideranças. As tensões entre eles e os pastores firmam-se num itinerário desde a rejeição à aceitação. Em todas as narrações dos nossos informantes ocorre este trânsito; transcrevemos duas:

No princípio o pastor que lá estava dizia que o rap era do Diabo e que não valia a pena fazê-lo. Mas com o tempo e com os frutos da pessoa perceberam que era só uma questão de estilo, que a mensagem era centrada em Cristo e na missão de Cristo, começaram a interpretar de maneira diferente. O salmo 50 se não estou em erro diz “Tudo o que tem fôlego louva o Senhor”, parece que bateu no pessoal de liderança e houve, entretanto, uma mudança pastoral e essa pessoa é muito vocacionada para a música, sempre apoiou. Aqui na Igreja local, sei que o pastor também não era, não gostava, não gostava, mas atualmente é ele que me convida para participar. De vez em quando “Então, não vais participar com nada, rapaz?” O pastor mais jovem apoia-me imenso. (Mancallas (Carlos Fanqueira), 28 anos, 11 de julho de 2014).

Várias igrejas ainda estão fechadas. “Rap? Rap é a música dos bandidos. Rap… bandidos, qual é a doença que eles vão trazer? Qual é a letra que eles vão cantar? Vamos dar o palco para cantar e vão falar linguagem…” (…). Imagina, na tua própria igreja as pessoas estão a dizer: “Ah não, isso não, o teu próprio pastor, presidente, a dizer “Ah não, eu não quero isso aqui. Não quero rap, não… se quiserem entram no louvor e adoração, ficam lá na banda se … ficam lá a cantar, mas rap, rap não!”“ Então isso chocou muito, ficamos chocados nós, também. Ficamos chocados e … alguns pensaram sair da igreja (…). Quando as pessoas ouviram o CD, aí falaram... “Não…”. O pastor chamou-nos pediu perdão, como pastor, né, errou. Pediu perdão e tal. Apostou… pá, e tal, aquele apoio, e tal. Começaram a apoiar-nos.” (DPD (Maya Fernando), 33 anos, 7 de Julho de 2014)

Percebemos três etapas nestas narrativas: a primeira é a recusa do rap por parte dos líderes; a segunda consiste numa certa constatação da conformidade doutrinal e bíblica dos conteúdos cantados ou da eficácia do rap cristão no quadro do programa de ação da comunidade; a terceira corresponde ao acolhimento do rap cristão pelos pastores, apesar de ser acompanhado por uma tentativa de controlo, por nem sempre considerarem positivo que seja cantado fora das igrejas. Os rappers realizam um processo de autonomização que não põe em causa a sua pertença à comunidade e a cooperação com os pastores; eles estão nelas integrados e com cargos de responsabilidade. Para nos elucidarmos sobre a recetividade das igrejas evangélicas ao rap foi pertinente a leitura de uma investigação que Sandra Barnes (2008: 332-333) realizou recorrendo ao método do inquérito telefónico, dirigido a pastores de black churchs norte americanos, em que apresentava uma série de perguntas sobre a forma como integravam o rap gospel nos seus serviços de culto e os fatores que influenciavam a sua decisão. A autora partiu de duas categorias, apresentadas por Lincoln e Mamiya (1990), nas quais arrumou as denominações dos pastores contactados: a das funções sacerdotais e a das proféticas. As primeiras enaltecem a relação individual com Deus, movem-se numa lógica de resistência dentro de uma sociedade inimiga e de diferenciação clara dos padrões seculares, dão muito valor à vida futura e à adoração, com cânticos, assim como ao crescimento pessoal, com base na meditação e no estudo da Bíblia. As segundas valorizam o cristianismo como mecanismo de libertação social, económica e política, colocando o foco nos problemas sociais e visando uma mobilização para o combate social coletivo. Barnes concluiu que as denominações inseridas no modelo profético são as mais recetivas ao rap gospel, tendo também a ver o perfil do clero, a sua sensibilidade a questões de justiça social e o facto de ser pago, e também com a existência de novos membros e um atendimento regular a crianças. A investigadora conclui assim o “potencial do gospel rap para transformar as dimensões da experiência do culto das black churchs, para falar das experiências da juventude negra masculina e empobrecida, e para expandir os seus esforços prosélitos ” (Barnes, 2008: 324). Procurando analisar à luz deste artigo o caso dos rappers portugueses, confirmamos a importância do perfil dos pastores, talvez mais relacionado com características como a idade (Mancallas referia o acolhimento por parte do “pastor mais jovem”), ou com a prática musical de cada igreja em contexto de culto; por exemplo, para o rapper presbiteriano nunca se colocou a hipótese de cantar rap na sua comunidade e a mesma desconhece a sua atividade musical. Influenciam de igual modo o tipo de público-alvo privilegiado pelo grupo religioso, ou pelas suas instâncias clericais, que diverge com o público preferencial dos rappers; o grau de integração e o estatuto do rapper na sua congregação; finalmente, a história e o posicionamento ou “personalidade” teológica do mesmo. Seria desajustada uma aplicação das categorias sacerdotal e profético ao universo do cristianismo reformado português atual, pelo facto de historicamente talvez não se poder falar propriamente de black churchs, mas pode afirmar-se que está latente uma necessidade de realizar uma destrinça inequívoca entre o espaço sagrado e o espaço profano, ou de vigiar a fronteira entre ambos. Isto será típico de uma afirmação mais ortodoxa nos conteúdos acreditados e em momentos de maior tensão no processo de institucionalização de um dado grupo religioso. Em algumas letras feitas pelos rappers entrevistados, o ponto de pressão subjacente à dialética pertença-conflito traduz-se numa crítica interna às próprias igrejas, o que é particularmente notório nesta letra do repertório de Sammy, o Salmista:

Igrejas, isto é a começar por mim, também como João sou companheiro nas aflições. Igrejas, sei que isto não terá um fim mas tentaremos resistir diabo e suas tentações Igrejas, amem o pecador e não o pecado, pois na Palavra isto está fortemente vincado

Igrejas, se somos a noiva de Cristo, Cristo no casamento não quer o vestido manchado. Vocês não ensinam o menino o caminho por onde deve andar

Vocês obrigam o menino o caminho por onde deve andar

Ele cresce e fica a debandar nos cultos de oração

Não aprendeu a ser cristão, aprendeu a ser igrejão (…)

São esses os tais crentes da moda

Em que a boca diz “Ámen!” mas o coração não concorda. Sei que vai parecer cómico como me chamaram antes

Me tratavam por demónio por ter o cabelo grande Fazem o membro desistir, onde está o amor de Cristo? Vêm à Igreja por ir, ou então para não serem mal vistos Espíritos imundos, espíritos sem reconciliação

Falam tanto mal do mundo, o mundo tem mais união (…)11

Esta letra tem como background a tradição joanina, saliente no próprio título que reporta para a primeira parte do livro do Apocalipse, na comparação com o evangelista (“Também como João”), na metáfora da noiva ou das bodas, que é nele muito presente, e bem assim na literatura apocalítica. Nela podemos apreciar se se trata em certa medida de um anticlericalismo em contexto protestante, latente e não-organizado, mas com expressão pública, uma vez que está subentendida uma desaprovação dos líderes religiosos, consistindo numa “atitude de crítica à prática religiosa (…), no que esta representa de comportamento faltoso e de não verdade”, na “exigência de uma religião “mais autêntica” (Ferreira, 2000-2001: 79). Neste sentido é interessante a perceção de estarmos diante de uma crítica interna ao cristianismo evangélico e, por conseguinte, de uma descolagem da crítica ao catolicismo e ao seu clero (particularmente aos jesuítas) como se registava há cerca de um século (Leite, 2011: 126ss).

2. Ofertas de salvação em suburbanidade: violência, pregação e cura reformuladas

Uma neoapocalítica é formulada no pentecostalismo e neopentecostalismo, em que convergem elementos bíblicos, satanológicos, de tradições milenaristas, de um certo puritanismo, etc. Ela é subsumida pelos rappers e enforma o que escrevem e cantam, mas em termos identitários evocam especificamente o profetismo. Esta componente profética não está, contudo, presente apenas no rap gospel. Alguns autores consideram-na inerente ao rap no geral. Tricia Rose (1994, pp. 21) refere que um dos âmbitos da emergência do hip-hop é a “imaginação profética”, provavelmente pelo encaixe perfeito com um protótipo denunciatório; Imani Perry (2004) designou os rappers como “profetas de capuz”. Grupos de rap secular há que utilizam no seu nome a designação de “profetas”; é o caso dos sul-africanos “Profetas da Cidade” (Künzler, 2011: 27:43). Esta associação entre os rappers e os profetas justifica-se pelo facto daqueles realizarem um juízo do tempo, expressando-o de uma forma clarividente e afirmativa, de por vezes falarem de si próprios como pessoas que rezam (Dehanas, 2013: 295) e de se autorrepresentarem enquanto detentores de um poder interpretativo e ativo sobre a sociedade. Os rappers transpõem os conteúdos acreditados e este imaginário profético e apocalítico para os signos e as personagens que compõem o universo da organização de poder própria das unidades sociais suburbanas mais marcadas pelo narcotráfico, que é em grande medida coincidente com a imagética militar. Isto é particularmente frequente nos repertórios do grupo Alta Cúpula (veja-se a letra “Rap Gospel”, parcialmente transcrita em Tuna, 2020: 101) e de DPD, cujo rap “A união faz a força” é especialmente demonstrativo:

O nosso general é organizado

Não manda tropa na guerra desorientado (…) Guerreiros do Senhor chamados para lutar Programados para vencer, nada nos vai deter Pois venha o que vier jamais retroceder

Com Jesus vamos além e nada temei pois vou-me revestir com escudo da fé Capacete da salvação e armadura de Deus

Alistei-me nesta geração de guerreiros com motivação

Homens e mulheres fortes, não mortos, nem frios, mas quentes

Santos e separados, escolhidos e revestidos (…) Essa tropa não recua, com a força minha e tua Pisamos sim na cabeça do cão G.D.C.M.M. e K.C. Pisamos sim na cabeça do cão

Nós somos jovens fortes, armados até aos dentes

Nossas armas não são carnais mas sim espirituais.12

Raps como este reportam para a espiritualidade do “soldado de Cristo” (miles Christus), a qual “diz respeito, enquanto problemática paulina, à identificação do crente com o próprio Cristo enquanto “homem novo” e também à pertença de um “corpo societário” do qual o Cristo é a cabeça” (Ferreira 2013: 122). Ela marcou o imaginário católico originando modelos de ação individual e comunitária baseados no estímulo de uma atitude de militância corporizada na Ação Católica e em movimentos dela derivados. No campo protestante foram assumidos outros contornos mas a militância engloba, igualmente, entre outras atitudes uma disciplina de ordem formativa, espiritual e ativa e a predisposição para atividades coletivas onde subjaz a ideia de um corpo social identitariamente coeso, que age em bloco numa relação heterogénea com a sociedade e pretendendo uma conversão social. Podemos dizer que algumas letras de rap analisadas estão caldeadas por este paradigma de espiritualidade e de ação, pela mesma ideia de dissemelhança e de resistência face a um outro social associado recorrentemente à juventude. Acresce possivelmente no mundo protestante uma fundamentação realizada num quadro mais predestinizante: salientamos a existência das palavras “programados”, “separados” e “escolhidos” presentes no rap transcrito. Nas letras cantadas pelos nossos informantes ouvimos igualmente expressões como as seguintes: “juventude fanática”, “geração rebelde”, “gente ímpia”,13 em contraponto com a “geração de guerreiros”, presente no poema anteriormente transcrito. Há uma ideia de “reino dividido”, pelo que a sensação de fragmentação gera ansiedades que se organizam num imperativo de unidade e de constituição de um corpo (Ferreira, 2013: 122). Isto pode de algum modo concretizar- se nos nossos rappers na agregação em bandas e, mais recentemente, na editora Hastro.

Mancallas na sua entrevista afirma: “Somos o braço armado, vá, da igreja p’rá rua”. Letras há em que se assiste a uma apropriação das realidades do crime e da violência, idiossincrásicas dos contextos de ultraperiferia urbana, como é percetível na letra “Jesus mudou o meu viver” do primeiro álbum de DPD: “Hoje eu não preciso / andar com uma P.T / porque quem guarda / minha alma / hoje é Jeová Jiré”.14 Numa outra letra do seu segundo CD, intitulada “Arrependimento”, DPD narra a história na primeira pessoa de um desempregado que decide fazer um assalto com um gang, tendo sido apanhado em flagrante, tentando fugir, agredido pela polícia e detido durante 15 anos. O rap relata a vida dura da prisão em que o narrador lamenta o facto de ter ignorado os amigos que lhe diziam para aceitar Cristo como Senhor e Salvador; o refrão corresponde a uma prece a Deus para que o salve de tanta dor.15 Além de uma nítida intenção de dialogar com um tipo de população precisa, relatando num registo pictórico e do ponto de vista de quem tem propriedade das suas experiências relatadas, é possível ter em consideração outro quadro explicativo. No caso do rap evangélico, há que equacionar a hipótese de o este proporcionar a violência ou a agressividade expressiva que lhes é interdita na comunidade, onde se pressupõe a paz e o comedimento. A seguinte parte do depoimento de UnderWord, o Exegeta, pode indiciar essa leitura:

Eu quando vou cantar fora (sou) mais agressivo porque é assim que as pessoas gostam de entender as coisas. Porque se formos a ver a música que passa na televisão, que passa na rádio é muito agressiva, e nós não podemos ir com uma coisa tão soft, suave, para as pessoas de fora quando isso não as chama (...).

Se equacionarmos a dicotomia entre o sacerdócio e a profecia (a que aludimos no capítulo anterior), e o consequente entendimento do rap cristão enquanto movimento de alternativa à instituição, os rappers enunciam-se como marginais aos espaços e aos atores instituídos do culto, sem que com eles façam, porém, uma rutura pessoal. O músico como peça do dispositivo litúrgico, na órbitra do sacerdote ou do pastor, seja nos ritos católicos (como o salmista), seja nos da tradição protestante, é detentor de significativo protagonismo ou poder ritual. Por parte do cristianismo pré-reformado, foi sendo contruído um conjunto de procedimentos e teorias em torno do ethos do canto na celebração litúrgica (Hameline 2007: 929), uma espécie de disciplina vocal teologicamente fundamentada. Hameline elabora uma boa síntese dessa construção desde Nicetas de Remesiana até aos liturgistas do império Carolíngio. O mesmo autor vincula a música feita no âmbito litúrgico a uma “estética da “conveniência” (2007: 929). Ora o rap cristão pode ser lido com uma estética da inconveniência. O cantor é, neste caso, uma figura prosélita, fora do espaço celebrativo, numa lógica de exteriorização. Contudo, partilha com a música de context o litúrgico prevalecente nas igrejas de estrutura hierárquica as seguintes características: uma certa economia da emoção, a ideia de uma voz não excessiva e ao serviço da palavra, a proximidade da natureza recitativa da salmodia patente no seu dizer monocórdico e na quase ausência de variação quanto à altura, própria do padrão interpretativo do rap. A música no protestantismo pentecostal corresponde à função do louvor e da adoração sendo um dispositivo central de uma experiência litúrgica de tipo mais vivencial e emotivo que abstrata e oral (Hollenweger, 1995: 1145). Ora, os rappers cristãos para além da adoração, acrescem duas novas funcionalidades à música religiosa: a exortação e o anúncio. Ambas são exógenas ao culto mas estão orientadas para ele. Assim as refere Isaías Trindade:

Eu gosto muito de dar na cabeça. Eu gosto muito de exortar. (…) eu creio que sempre houve necessidade disso, porque os cristãos às vezes vão… vão adormecendo, não é, de certas realidades bíblicas. (…) A Bíblia também diz que nós devemos exortar, exortarmo-nos uns aos outros, para não cairmos na apostasia. (…) Habituei-me ultimamente a escrever mais de uma forma evangelística, né? Porque no início fui mais de exortar, mas agora eu vejo que há muita necessidade das pessoas de fora entenderem e saberem do amor de Deus.

Nesta parcela da entrevista de Underword, o Exegeta, antevê-se o rap gospel como um espaço alternativo de pregação e de liderança. O microfone corresponde a um púlpito portátil com um auditório sem fronteiras definidas. Jesse Weaver Shipley (2009: 662) evidencia o microfone tal como é utilizado no hip-hop como performance de autoridade individual:

O ethos do hip-hop do MC confere autoridade a um agente individual para se expressar poeticamente sobre si mesmo atrás do microfone. Esta sensibilidade permite à juventude urbana agir individual e livremente, sem necessidade de recorrer a apoio material ou institucional para se expressarem publicamente.

William Martins testemunhou-nos como a aquisição de um microfone significou um passo significativo no seu percurso musical e no dos seus pares:

Quando eu comprei o meu primeiro microfone eu vim correndo para casa e disse: “Meu Deus, muito obrigada, porque agora eu vou poder trabalhar com isso”. E graças a Deus esse microfone já me abençoou muito e está abençoando outros grupos também.

O rap gospel opera a descolagem do microfone do espaço sagrado e assim reconfigura os dispositivos de transmissão das crenças. Regis Debray (2002: 87ss) fala da profunda revolução em que consiste a portabilidade proporcionada pelo alfabeto: com ela a transcendência libertou- se dos lugares sagrados (fixos) e dos objetos hierofânicos. Para este autor a escrita faz com que o crer migre do limite espaço-tempo, produzindo transcendência. Possibilita ainda a abstração, a separação entre a imagem e o seu símbolo, a coisa e a ideia que a representa, realizando o trânsito entre o circunstanciado ou o particular e o incondicional ou o universal. Constitui assim comunidades de sentido para descodificarem os signos. A leitura, a voz, permite uma segunda fase do ciclo ao reapropriar-se do mistério ou da vida que os códigos escritos encerram. Debray refere o canto como um medium mais capacitado que o escrito no que respeita à experiência crente: “Há três mil anos que o escrito persegue os carismas do canto - sem os atingir. O arrepio capital está-lhe vedado. O sopro pulmonar e as cordas vocais permitem-nos tocar as fontes quentes das nossas crenças.” (2002: 91). Ao perceber-se o canto como realidade da ordem do carisma, melhor se perceciona a sua centralidade na liturgia pentecostal e melhor se compreende o pentecostalismo como renovação de estruturas de transmissão das crenças e da valorização do “transmissível” nas mesmas. O rap gospel é, por sua vez, um género musical que se pode definir como pregação-cantada ou canto-prédica. Não só o rap gospel, especificamente, pode ser entendido como pregação, mas o rap gospel no geral tem uma fisionomia predicativa, e autores houve que procuraram explorar as influências do protestantismo no rap neste campo. Paul Williams (2008: 114) testa a hipótese de o hip-hop remontar a um tipo de prédica seiscentista que emergiu no contexto de pós-colonização da América do Norte. Tratava-se de pregadores puritanos em cujos sermões criticavam a decadência aspetos como a indisciplina familiar ou o alcoolismo, tendo um conteúdo de carácter instrutivo e fortemente virado para o tempo escatológico. O autor reconhece no rap uma semelhante “imaginação apocalítica” e um “estilo paranóico” (2008: 119), e exemplifica com as críticas à administração Bush realizadas pelos rappers ou a sua intervenção no caso da catástrofe do furacão Katrina em Nova Orleães em 2005. Se atendermos à tipologia que Jean Paul Willaime propôs, referente às funções da pregação, poderemos concluir que as letras de rap escritas e/ou cantadas pelos rappers as cumprem na totalidade: são uma “lição doutrinária, testemunho pessoal, lição de moral, belo discurso, rito comunitário e exercício exegético” (2002: 44). Em relação a este último tópico, é interessante verificar a sua prevalência na forma deste conjunto de rappers cristãos se nomearem e apresentarem; o caso de UnderWord é o mais expressivo neste aspeto, sendo cognominado “o exegeta” e apresentando-se imageticamente como tal (figura n.º 2). Estes rappers apresentam-se como hermeneutas, numa construção da autoridade relativa ao texto bíblico, à doutrina e à moral. Nesta autorrepresentação procuram inscrever-se no “corpo de especialistas religiosos” reivindicando a legitimidade da interpretação das Escrituras ou da formulação de fronteiras ou interdições como trabalho simbólico próprio (Bourdieu, 1971: 394).

Figura 2 Fotografia de UnderWord, o Exegeta, (fotografia de Daniel Leiro) 

Salvaguardamos, porém, que o rap cristão, sendo um discurso, não é pronunciado no contexto de um dispositivo de culto nem para um auditório constituído por um grupo de fiéis regulares, o que Willaime indica como condições definitórias da pregação. É interessante notar a forma como os nossos informantes arrogam para si a qualidade de pregador por contraposição com o de “animador de auditório”. Mancallas assim o patenteia:

Como nós trazemos uma mensagem dura de confronto, há igrejas que a gente canta lá uma vez. O pessoal não convida mais. Porque às vezes confronta e escandaliza, especialmente quando os irmãos pensam que nós vamos animar o auditório, nós levamos mensagem madura, bíblica.

Os entrevistados referem frequentemente o imperativo de cantar fora da igreja. O título do segundo álbum de UnderWord, o Exegeta, “A noiva fora da Igreja”, exprime-o eloquentemente. A polaridade dentro/fora da igreja, e a referência preferencial pela segunda, faz- nos antever o ensejo de alteração das fronteiras do grupo e da verdade por ele definida. Mas atendendo às origens pessoais e familiares dos nossos informantes ou ao quadro de conversão em que alguns se inserem, podemos dizer que é um processo de comunicação de estrangeiros para estrangeiros (Certeau: 1969). Concomitantemente, trata-se de uma relação de salvadores e vítimas (Teixeira 2004: 112-113), uma vez que representam os de fora como tais, isto é, como “pessoas que precisam”. Expressam frequentemente a intenção de salvar “almas perdidas”, utilizando expressões como “quero almas” ou “ganhar pessoas”: “Quando eu falo ganhar pessoas é tirar as pessoas que estão no meio da droga, colocá-las na sociedade, no caminho bom e quem sabe conhecer a palavra de Deus”, refere Isaías Trindade. O destinatário-ideal destes rappers coincide em grande medida com as “figuras-limite que personificam estas novas realidades de desafetação social” (Teixeira, 2004: 114). Na citação anterior verificamos a referência aos toxicodependentes; noutras entrevistas indicam-se os guetos e as prisões. Por exemplo, William Martins afirma: “Eu prefiro cantar na rua, num bairro social, numa instituição do que cantar dentro de uma igreja evangélica”. O músico prossegue: “Eu me vejo como um médico que quer cuidar das pessoas, que quer mostrar que há uma cura.” Esta afirmação manifesta o enquadramento do rap cristão numa “religiosidade de vocação terapêutica” (Teixeira 2004: 139). Também se verifica uma contiguidade entre a cura e a conversão (2004:139): a cura diz respeito a uma superação de males físicos e espirituais, o alcance de um estado de saúde total que corresponde a uma situação totalizante de prosperidade e de graça. Ora a conversão pode ser definida exatamente da mesma forma, não incidindo tanto nos efeitos quanto ao ato em si, enunciado enquanto adesão a Jesus e à Igreja. O rap mostra-se sobremaneira eficaz na prossecução da cura e da conversão, o que exprime uma vez mais a proeminência da figura individual do rapper como agente de uma conversão-cura, em detrimento da instituição. DPD testifica diversas circunstâncias em que essa eficácia se mostrou patente: “Um dos sítios que marcou mais foi em Queluz Belas, Quatro caminhos, na igreja Graça e Paz. Converteram nesse dia 16 pessoas. 16 jovens. Pela primeira vez, que não conheciam Cristo, através do rap. Isso aí marcou-me completamente.” Mancallas refere outra circunstância:

Na cadeia, por exemplo, quando acabei de cantar vieram-me, um dos presos veio-me entregar um… um azulejo pintado por eles, um bocado curioso. Ele vinha a chorar e vinha a dizer: “Olha, muito obrigado por aquilo que vieste aqui fazer hoje. Esta mensagem vai-me marcar para a minha vida. ‘Tou a pensar quando sair daqui envolver-me numa igreja.” Não foram estas as palavras concretas, mas o que ele deu a entender foi isso. Depois não pude manter contacto porque a cadeia não permitiu, não permitiu nem deixar o meu contacto nem manter contacto, porque são regras deles, eu não podia ‘tar a interferir. E depois houve uma vez num concerto em que nós cantámos que era mistura de pessoal crente com pessoal secular, vá, chamemos-lhe assim, e …e nós cantámos, Atalaia. E a seguir o rapaz que ia cantar começou a chorar, a chorar, a chorar e a dizer: “Eu não quero cantar mais a minha música, eu quero conhecer mais do Deus que esse pessoal ‘tava a cantar.” E saiu do palco, depois nós tivemos a conversar com ele. Foi muito bom. (Mancallas (Carlos Fanqueira), 28 anos, 11 de julho de 2014).

Esta narrativa revela a indução de uma determinada experiência de relação com os ouvintes, que acelera os processos de identificação. Dá também nota da volatilidade do tipo de vínculo, que não teve continuidade pela impossibilidade de contacto. O rap evangélico proporciona um espetáculo que não visa imediatamente a integração na comunidade mas reproduz um forte clima emocional e uma relação fusional com o público, própria dos grupos pentecostais. Neles a música assume essa funcionalidade afetivo-emocional,16 enquanto, por exemplo, no neopentecostalismo, a figura carismática do pastor tem um protagonismo superior ao dos músicos. Os rappers cristãos dirigem-se a um tipo de população juvenil e vulnerável porque desinscrita no tempo, no caso de jovens de famílias migradas ou desagregadas, com a rutura na transmissão da memória grupal ou familiar, cujo cenário e figuras de ascendência não reconhecem no seu habitat atual. É desinscrita também no espaço, pelos territórios fragmentados e isolados em que a comunicação com o tecido social da cidade e o usufruto dos seus lugares e serviços culturais são interrompidos (por motivos pecuniários, pelo desenquadramento cultural ou por outras dinâmicas de exclusão, endógenas e heterógenas a estes grupos). Os rappers não investem na reposição dessa memória mas na expetativa apocalítica que transportam para a subcidade que anuncia precisamente a sua destruição. Não reparam a rutura, capitalizam-na para a conversão. A ambivalência destruição-construção é própria destas subculturas que procuram sobreviver em práticas expressivas que parecem reinventar a sua própria decadência, reformular a memória pela recolha e reorganização de fragmentos do espaço perdido (a cidade) e do tempo perdido (o passado inacessível e o futuro condicionado). Recorrendo a uma metáfora do campo da organização dos serviços de saúde, podemos afirmar que a cura que estes rappers ministram é superiormente da ordem da ambulância do que do hospital. Com efeito, ela não se enquadra tanto na natureza do serviço procurado e prestado mas num outro “de emergência” e sem uma fixidez territorial. Acontece em lugares sociais insuspeitos mas reorienta para o lugar central, a igreja. O itinerário parte, pois, do sagrado-de-rua para o sagrado-sagrado. Descentralizando-o, os rappers entornam o sagrado no estilhaçamento urbano, acompanhando o processo de liquefação das subculturas urbanas. Fazem-no como emocionalizadores e agilizadores da mensagem através sobretudo da força, base da cosmogonia que está associada ao Espírito Santo e, como tal, do Pentecostalismo (Aubrée 2010: 881), seja a da violência da sua performance ou a da tensão escatológica e messiânica dos discursos, seja a da doçura da terapia de que são agentes.

Conclusão

Os rappers entrevistados posicionam-se na linha de fronteira entre a igreja e a rua, capitalizando performativamente a simultaneidade do vínculo e do conflito tanto à comunidade religiosa como ao hip-hop. Esta bipolarização (igreja e rap cristão, de um lado e rua e rap secular do outro) terá de ser esbatida como dicotomia simbólica e como representação significativa no que respeita à constituição de um imaginário religioso. A crítica às igrejas é dita numa exigência de autenticidade na relação com o mundo e numa necessidade de diferenciação com o mesmo. A abordagem denunciatória ao hip-hop é feita numa estratégia de contra profanação ou numa moralização ou purificação do rap. Focámos neste âmbito alguns aspetos: uma moralidade conservadora em termos de comportamentos sexuais e modelos familiares; uma sensibilidade aos problemas sociais (desde as desigualdades entre classes à corrupção política); uma admoestação ao enaltecimento do ego coincidente com uma denúncia das ameaças atinentes ao universo hip- hopper, seja o de contexto da rua seja o do estrelato (a criminalidade, a fama, o dinheiro), realizada numa referência à fugacidade da vida agudizada, por sua vez, no tópico da morte jovem. O interlocutor principal dos rappers entrevistados corresponde ao protótipo do jovem suburbano, no quadro comportamental de delinquência e fascínio pelo acesso a uma vida de um certo poder e de desafogo financeiro e moral. A forma como os rappers definem a sua identidade e a sua função no quadro das igrejas, num paradigma de militância e de “corpo unitário” contra um bloco social outro, corresponde a uma abstratização da violência e re-imaginação das narrativas em torno do imaginário urbano ultra-periférico a partir das metáforas e símbolos bíblicos e teológico, pela força expressiva da neoapocalítica pentecostal. Autocompreendendo-se como convertidos e conversores, estes rappers cristãos constroem lideranças alternativas às institucionalizadas e abrem um espaço de pregação disjuntivo. Este assenta na ideia de destruição do espaço e do tempo já fragmentados e pela oferta de um futuro organizado, de uma expetativa securizante face à cidade e ao passado inacessíveis. A forma como se identificam e o paradigma da sua ação, nomeadamente o modo como criam a experiência do concerto, expressa simultaneamente uma intenção terapêutica e uma urgência apocalítica.

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Notas

1(…) we lose our voices for Jesus”. Frase do MC TripLL-H em entrevista à etnomusicóloga Christina Zanfagna durante o seu trabalho de campo em Los Angeles (2011: 155).

2Pese embora os nossos informantes utilizarem esporadicamente o termo hip-hop querendo significar não o movimento suburbano, mas um género musical muito próximo ao rap mais melódico e coreográfico, no quadro deste estudo prefere-se muitas vezes a expressão “rap cristão” a holy hip-hop ou christian hip-hop. Utilizaremos todas estas expressões como sinónimas, não obstante estas matizes semânticos.

3Os raps cujas letras aqui citaremos foram gravados também até este ano.

4Adotamos a diferenciação entre «rap cristão» e «rap secular», tal como se apresenta nos depoimentos dos nossos entrevistados.

5Sammy, o Salmista, “No serviço do Rei”, Hiphopcalipse (Hastro, 2015).

6Amil (ou Underword, o Exegeta), “Eu não paro”, A Noiva Fora da Igreja (s.i), 2013/14).

7Mancallas, “Caneta na mão do poeta”, Ex-Ateu (Hastro, 2013).

8Cf. Mancallas, “Não quero palmas”, Ex-Ateu, (Hastro, 2013). Desta letra retirámos a citação incluída no título deste estudo. Sammy, o Salmista, canta igualmente: “Eu vou nas calmas, mas cheio de fé / eu quero palmas mas sem a letra “p” Sammy, o Salmista, feat Rebeca Vaz, “Em nome de Jesus”, Hiphopcalipse, (Hastro, 2015).

9Mancallas, “Não tenho controlo”, Ex-Ateu (Hastro, 2013).

10Amil, “Em terra estranha”, This is Faith, ((s.i), 2007).

11Sammy, o Salmista, “Carta às igrejas”, Renascido das Cinzas (Deepmusic, 2013).

12DPD Dependentes de Deus, “A união faz a força”, Verdadeiro Amigo (s.i), 2010).

13Expressões retiradas do rap “Alguém vai ficar” de Underword, o Exegeta: Atalaia, “Alguém vai ficar”, Hip-Hop Cristão, (Hastro; AD Algés), 2011.

14DPD Dependentes de Deus, “Jesus mudou o meu viver”, Verdadeiro Amigo ((s.i.), 2010).

15DPD Dependentes de Deus, “Arrependimento”, Mais que Vencedor Eu Sou, (O Moio Produtora, 2010).

16A dimensão emocional é uma das quatro dimensões da identificação (religiosa) propostas por Danièle Hervieu-Léger (2005: 74-80), a juntar à comunitária, à ética e à cultural.

Recebido: 14 de Abril de 2021; Aceito: 10 de Setembro de 2021

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