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Medicina Interna

Print version ISSN 0872-671X

Medicina Interna vol.24 no.1 Lisboa Mar. 2017

 

ARTIGO DE OPINIÃO / OPINION ARTICLE

Pinceladas da História, do Presente e do Futuro do Serviço de Medicina Interna do Hospital de Santo António - Centro Hospitalar do Porto

Brushstrokes of the History, Present and Future of the Internal Medicine Service of the Hospital de Santo António – Centro Hospitalar do Porto

João Araújo Correia

Diretor do Serviço de Medicina do Centro Hospitalar do Porto, Porto, Portugal

Correspondência

 

 

Palavras-chave: Medicina Interna; Portugal; Serviços Hospitalares

 


Keywords: Keywords: Hospital Departments; Internal Medicine; Portugal.

 


 

A primeira pedra para a construção Hospital Geral de Santo António (HGSA), foi colocada em 1769, por iniciativa da Santa Casa da Misericórdia do Porto. O arquiteto John Carr quis fazer um edifício de grandes dimensões, em forma de quadrado, com um grande jardim central, que ocupasse todo o quarteirão. Consta-se que terá ficado surpreendido quando verificou que estava a ser construído com enormes blocos de granito, em vez do tijolo típico usado em Inglaterra. Não ficou um quadrado, por falta de verba para o granito. Mesmo assim, ficou um notável edifício neoclássico, em forma de ferradura, que se manteve como hospital público, durante mais de 200 anos, até aos dias de hoje. A Instituição sempre com uma marcada vocação para o ensino profissionalizante universitário, tendo sido criada em 1837 a Escola Médico- Cirúrgica, que foi transformada em 1911 na Faculdade de Medicina do Porto. Em 25-11-1959 a Faculdade de Medicina do Porto é transferida para o recém construído Hospital de S. João e o Hospital de Santo António perde o ensino pré-graduado, mantendo grande prestígio na formação dos internatos das especialidades. Passados 20 anos, em 1979, o HGSA volta a receber alunos do 4º ano do Curso Médico do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar. Eu próprio vivi intensamente este regresso do ensino médico ao velho Santo António, pois aqui conclui a licenciatura em 1983. Outro marco significativo na história do Hospital, foi a construção de um novo edifício de oito pisos, colocado em pleno funcionamento no ano de 2000, que acabou por fechar o quadrilátero idealizado por John Carr, dois séculos depois!

Até ao ano de 2010, no então HGSA, sempre existiram 2 Serviços de Medicina (Medicina 1 e Medicina 2). De ambos, foram Diretores Internistas de grande nomeada. Entre eles, é obrigatório referir os Drs. João de Melo, Antunes de Azevedo, Álvaro Guimarães, António Meireles, Carlos Soares de Sousa, Amaral Bernardo e Nelson Rocha.

Os Serviços de Medicina, sempre assumiram papel central no ensino pré-graduado, nas cadeiras de Semiologia, de Clínica Médica e, mais tarde, no módulo de Medicina do Ano Profissionalizante. Na formação pós-graduada, estão instituídas há mais de 40 anos reuniões de discussão de casos clínicos, onde participam várias especialidades do HGSA, muitas vezes com convidados de outros hospitais. Desde 1980 que foi adotado o registo clínico orientado por problemas, descrito por Lawrence Weed e que é, sem dúvida, um marco distintivo da nossa escola. Aliás, o registo clínico é considerado por nós como uma base essencial para a garantia de prestação de cuidados assistenciais de qualidade.

A minha nomeação como Diretor do Serviço, em junho de 2009, ocorre poucos meses depois do Conselho de Administração decidir a unificação dos dois serviços. Ficou um único Serviço de Medicina, com 3 Unidades de Internamento, 2 localizadas no edifício clássico (B e C), e outra (A) a ocupar todo o 7º piso do edifício Luís de Carvalho. O desafio inicial foi o de tornar o funcionamento das unidades similar entre si, todas com reuniões clínicas e visita médica semanais e reuniões de mortalidade, notas de alta, temas em medicina e journal club, com periodicidade mensal.

Depois, todo o esforço foi feito para incentivar o desenvolvimento das áreas específicas no âmbito da Medicina Interna, para além da Consulta de Hipertensão Pulmonar e da Unidade de Imunologia Clínica, já há muito com autonomia em relação ao Serviço de Medicina. Foi criada a Equipa Intra Hospitalar de Suporte em Cuidados Paliativos (EIHSCP), o Grupo de Estudo da Insuficiência Cardíaca (Gestic), o Grupo de Doenças Respiratórias (Inspira), a consulta de Doenças Metabólicas, a Consulta de Doenças Hepáticas e a Consulta de Fibrose Quística. Em 2016 o Ministério da Saúde reconheceu o Centro Hospitalar do Porto como Centro de Referência da Hipertensão Pulmonar e das Doenças Metabólicas.

A atividade científica do Serviço de Medicina tem sido relevante e consistente, com múltiplas apresentações em congressos nacionais e internacionais e várias publicações relevantes (em 2015, 22 publicações das quais 9 em revistas indexadas). O Serviço de Medicina conta já com dois doutorados e cinco inscritos em Programa de Doutoramento e 16 especialistas do quadro mantêm atividade docente no Mestrado Integrado do Curso de Medicina.

O Serviço de Medicina Interna do CHP, conta com 28 especialistas, 37 internos de formação específica, 119 enfermeiros, 47 assistentes operacionais e 6 assistentes técnicos. No ano de 2015, foram tratados 4563 doentes, com demora média de 9,5 dias, taxa de ocupação de 96,4%, taxa de mortalidade de 15,1%, case mix de 1,25, 12,6 diagnósticos por episódio e 13% de taxa de reinternamentos aos 30 dias. Foram realizadas 28 026 consultas, das quais 3473 foram primeiras, com 100% de resposta a tempo e horas.

Nesta altura, com a legislação vigente em que os novos contratados têm uma redução dramática do tempo disponível para a atividade assistencial (18 horas dedicados ao Serviço de Urgência e descansos obrigatórios com prejuízo de horário), é impossível garantir a implementação de novos projetos, que têm sofrido constantes adiamentos. Um deles, é o da presença dos Internistas nos Serviços Cirúrgicos, com a responsabilidade do pré e do pós-operatório. Outro, é o de promover a existência de canais de comunicação fácil entre os Centros de Saúde e o Hospital. O primeiro passo, seria o da deslocação regular de um Internista a cada Centro de Saúde, para discussão de casos clínicos mais complexos, tentando ajudar na sua resolução.

No entanto, outros caminhos que se abrem para o desenvolvimento atual da Medicina Interna, estão no nosso horizonte, logo que sejamos dotados de um quadro de Internistas que o permita. São disso exemplo, a Hospitalização Domiciliária, a Unidade de Internamento de Curta Duração, ou o desenvolvimento de um Centro Ambulatório de Diagnóstico Rápido.

Mas, este ano de 2017 traz, pelo menos aos cinco elementos da Comissão Organizadora do Serviço de Medicina Interna do Centro Hospitalar do Porto, uma enorme responsabilidade: a organização do 23º Congresso Nacional de Medicina Interna (CNMI), que se realizará em Maio, no Edifício da Alfândega, no Porto.

Escolhemos o mote de “Porto de Confluências”, porque a Medicina Interna valoriza a visão global do doente, que precisa sempre da confluência de muitos saberes, sem enjeitar o aprofundamento de conhecimentos em áreas específicas, na procura incessante da excelência.

No Programa do 23º CNMI, quisemos arriscar e inovar, desafiando os congressistas a uma maior participação efetiva, com entusiasmo inusitado pela variabilidade de patologias com que lidamos, o que caracteriza a Medicina Interna e que torna o seu exercício tão difícil quanto compensador!

Muitas das sessões pretendem juntar novos e velhos Internistas, em discussões abertas e divertidas, sobre casos, patologias e caminhos para o futuro da especialidade e de todo o Sistema de Saúde em Portugal. Em várias ocasiões, vamos poder olhar as experiências de outros países, principalmente da Espanha, que cá poderemos vir a reproduzir.

Gostaríamos também que este 23º CNMI de 2017, marcasse o ponto de viragem entre as duas especialidades generalistas, que são a base do Sistema Nacional de Saúde, no hospital e no ambulatório. A Medicina Interna partilha com a Medicina Geral e Familiar os mesmos doentes, na maioria das vezes, apenas em fases diferentes de doença. A integração de cuidados não se faz por decreto. É preciso que nos conheçamos, que possamos saber a quem ligar, quando o nosso doente precisa. Porque vai ter alta e precisa de quem o saiba cuidar em casa, ou porque descompensa, e precisa de ser internado.

O Serviço de Medicina Interna do CHP mantém um permanente inconformismo, que eu considero saudável, e que é a garantia de conquistas permanentes. Orgulhamo-nos do que somos hoje, mas queremos ser ainda melhores, sempre na defesa de um exercício da Medicina Interna com um espírito holístico e humanista.

 

Correspondência: João Araújo Correia Joaoacorr@gmail.com
Centro Hospitalar do Porto, Hospital de Santo António, Porto, Portugal
Largo Prof. Abel Salazar, 4099-001 Porto

 

Conflitos de Interesse: Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na realização do presente trabalho.

Fontes de Financiamento: Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo.

 

Recebido:27/12/2016

Aceite:20/01/2017

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