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Medicina Interna

versão impressa ISSN 0872-671X

Medicina Interna vol.24 no.4 Lisboa dez. 2017

https://doi.org/10.24950/rspmi/RCE/2017 

CARTA AO EDITOR / LETTER TO THE EDITOR

Resposta à Carta ao Editor, endereçada por João França Gouveia, "A Propósito do Reconhecimento em Portugal da Especialidade de Medicina de Emergência"

António Martins Baptista

Coordenador do Núcleo de Estudos de Formação em Medicina Interna da SPMI (NEFORMI)
Membro do Secretariado do Núcleo de Estudos de Urgência e do Doente Agudo da SPMI (NEURGMI)

Correspondência

 

Enquanto primeiro autor de um dos artigos citados pelo Sr. Dr. João França Gouveia, na sua carta ao editor publicada no último número desta nossa prestigiada revista, começo por declarar uma grande admiração e respeito pelo referido autor, apesar desta nossa divergência quanto às possíveis soluções para o excesso de afluência e a consequente disfunção organizativa dos serviços de urgência (SU) em Portugal.

Para melhorar esta disfunção, ele defende a criação da especialidade de urgência. Mas não explica, como através desta solução, vai diminuir a afluência aos SU. E sem esta redução, já que somos o país da Europa com maior afluência aqueles serviços, não há nenhuma varinha mágica que melhore o caos organizativo que se continua a viver nos nossos SU.

A sua carta diz basicamente que os internistas (especialistas médicos de que o autor se auto exclui) não gostam de fazer urgência, temem perder influência e as remunerações recebidas no SU. Pois nenhuma destas razões é alegada nos artigos que ele contesta, e não pode estar mais longe da verdade.

Os internistas ao escolherem a especialidade sabem que vão fazer noites de urgência, pelo menos até aos 50 anos. Todos sabemos o que custam esses longos turnos de trabalho fora de horas e, portanto, seria impensável querer fazê-las, sem se gostar muito da tarefa.

Alega o autor que temos medo de perder influência. Nunca utilizamos este tipo de argumentação, simplesmente porque não faz parte do nosso modo de pensar. Queremos simplesmente o melhor para os doentes que acorrem aos serviços de urgência, e o tempo, a experiência e até os exemplos fora de fronteiras, com a nova especialidade de urgência, provam à exaustão que o modelo baseado no internista é o mais humanizado e com mais fácil gestão do doente, desde que entra até que tem alta hospitalar. O continuum de cuidados que se gera tem a preferência clara dos doentes, e as gestões privadas compreenderam este facto muito antes da gestão pública.

Como último argumento, diz que temos medo de deixar de ganhar as horas extraordinárias que trabalhamos nos serviços de urgência. Mas a experiência diz exatamente o contrário. Sempre que um profissional passa a fazer menos horas de urgência, principalmente a partir de certa idade, é quase impossível fazê-lo voltar ao regime anterior. Porque trabalhar 12 horas é muito menos cansativo do que trabalhar 24 horas, e o dinheiro recebido não compensa o esforço extra.

Rebatidos os argumentos da carta do Dr. João França Gouveia, o que resta dizer?

Resta dizer que é urgente diminuir a afluência aos Serviços de Urgência. E que isso se faz não investindo nem mais um cêntimo nos mesmos, nomeadamente com a criação de novos especialistas, que prestarão com menor qualidade os cuidados que os internistas tão bem executam. Rever a rede de serviços de urgência básicos, que na sua maioria são um sorvedouro de meios e dinheiro, com muito pouco efeito na redução de afluência dos restantes SU. E em contrapartida investir em SAP (com esse ou outro nome, das 8h até às 24h ou 24/24h) para que os doentes menos graves tenham onde recorrer antes de vir à urgência hospitalar. Investir também em portas de acesso aos cuidados hospitalares, alternativas ao Serviço de Urgência (consultas de alta resolução diagnóstica, consultas de gestão das doenças crónicas, internamento de curta duração, internamento domiciliário, etc.)

A única questão em que estamos de acordo é que os doentes menos graves, que tenderão a ser cada vez menos se a estratégia anterior for posta em prática, poderão ser encaminhados para médicos de MGF, onde são, de modo geral, melhor atendidos do que nos SU. Este modelo já é praticado numa série de Hospitais em Portugal.

Em conclusão. Não invistam mais nos SU. Quanto mais dinheiro investirem maior é a afluência aqueles serviços. Abram portas alternativas, adequadas à realidade de cada doente, a montante e a jusante, para reduzir de forma significativa a afluência. Que cada internista não trabalhe mais de 12h semanais no SU. E que adequem o número de internistas de cada hospital, a essa nova realidade, até porque vão ser necessários para prover de médicos as portas alternativas referidas atrás. Verão como um problema crónico se desanuvia, com grande satisfação dos doentes e dos profissionais de saúde.

 

Referências

1. França Gouveia J. A propósito do reconhecimento em Portugal da especialidade de Medicina de Emergência. Rev Port Med Int. 2017;24:235-6.         [ Links ]

2. Baptista AM, Brazão ML, Nóbrega S. Viagem pelo mundo da medicina de urgência. Rev Port Med Int. 2017;24:9-10.         [ Links ]

 

Correspondência: António Martins Baptista antoniomartinsbaptista@gmail.com

 

Conflitos de Interesse: Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na realização do presente trabalho

Fontes de Financiamento: Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo

 

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