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Medicina Interna

versão impressa ISSN 0872-671X

Medicina Interna vol.25 no.1 Lisboa mar. 2018

https://doi.org/10.24950/rspmi/PP/1/2018 

PÁGINA DO PRESIDENTE / PRESIDENT PAGE

Diversificar a População de Doentes dos Serviços de Medicina e Estimular Populações Homogéneas: Um Desafio Difícil

Diversifying the Patient Population of Medicine Services and Stimulating Homogenous Populations: A Difficult Challenge

Luis Campos

Presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna

 

Todos sabemos que a população que temos nos serviços de medicina é cada vez mais idosa, com mais multimorbilidade, mais incapacitada, com problemas sociais e muitos morrem no hospital. Na realidade somos um dos países europeus com maior esperança de vida (81,1 anos) e onde essa esperança de vida mais vai crescer, sendo a previsão passarmos dos actuais dois milhões de idosos para os três milhões e meio em 2050, tornando-nos o terceiro país da OCDE com mais idosos, depois do Japão e de Espanha.1

Para além de sermos uma população muito idosa, os nossos velhos são mais doentes e incapacitados: o número de anos de vida saudável depois dos 65 é de 6,2 anos, inferior à média da OCDE (9,4) e muito inferior à Suécia, onde os idosos podem contar ainda com 16,3 anos de vida saudável, e a percentagem da população idosa com algum tipo de incapacidade é de 45,5%, muito superior aos 32,7% de média nos países da OCDE.

Num estudo que caracterizou uma população de 3234 doentes internados nos serviços de Medicina de 43 hospitais pudemos concluir que a idade média dos nossos doentes era de 76 anos e que o índice de Charlson era de sete.2 Num inquérito promovido pela SPMI no dia 15 de Janeiro aos serviços de Medicina de 34 hospitais, tínhamos 3755 doentes internados e desses 455 (12%) mantinham-se na enfermaria por motivos sociais, o que significa que os nossos serviços estão transformados em centros de resolução dos problemas sociais dos doentes. Por outro lado sabemos que seis em cada 10 pessoas morre no hospital, ocorrendo esta morte muito nos serviços de Medicina Interna.3

A nossa especialidade é a melhor preparada para tratar estes doentes, mas a redução da nossa população apenas a estes doentes acarreta um risco acrescido de burnout, compromete a formação dos nossos internos e dos alunos que passam pelos nossos serviços e dificulta a investigação por falta de populações homogéneas. Por estas razões é preciso diversificar a população de doentes dos serviços de Medicina e, ao mesmo tempo, estimular populações homogéneas. Como se consegue responder a este desafio?

Creio que há três estratégias mais impactantes a este nível. A primeira é a implementação de modelos departamentais de Medicina Interna, onde os internistas tomem conta dos doentes médicos que entrem na urgência coordenando a intervenção de outras especialidades. Este é um modelo que já funciona no Hospital Pedro Hispano, Hospital Beatriz Ângelo, Hospital CUF Porto e Hospital da Luz, por exemplo. A literatura mostra que esta cooperação entre especialidades generalistas e outras especialidades se traduz em menos exames, abordagens mais racionais e melhores resultados.4 A segunda é a disseminação de unidades para tratar doentes com patologias para as quais há evidência de melhores resultados neste tipo de unidades. Entre estas estão as unidades de AVC, de insuficiência cardíaca, de cuidados intermédios, de orto-geriatria, de cuidados paliativos e de cuidados integrados. Estas unidades, com médicos diferenciados, enfermeiros treinados e protocolos, não só obtêm melhores resultados como permitem melhor formação e alavancam a investigação. Além disso estimulam a diversidade de fenótipos de internistas, o que enriquece o serviço e potencia a sua capacidade de resposta e o seu protagonismo no hospital. Todas estas unidades, excepto a de cuidados paliativos, existem no meu serviço, no Hospital São Francisco Xavier. A terceira estratégia é aumentar a referenciação direta dos médicos de família, através de visitas aos centros de saúde, sessões clínicas e agilização da comunicação directa entre médicos de família e os internistas. Há vários exemplos da eficácia desta estratégia, como por exemplo o Hospital de Lugo, na Galiza, mas também há bons exemplos da sua implementação em hospitais portugueses como o Hospital Fernando da Fonseca ou o Hospital Garcia de Orta.

As unidades são uma forma de estimular populações homogéneas, o que melhora a formação dos internos e a investigação, mas também a enfermaria contém um manancial se populações homogéneas, se pensarmos, por exemplo, em multimorbilidade ou cuidados paliativos. Os departamentos de Medicina e a flexibilização da referenciação pelos médicos de família permitem aumentar a diversidade de doentes, reduzir o risco de burnout e criar melhores condições para a educação pré e pós graduada. A expansão da Medicina Interna alarga o mercado de trabalho dos nossos internos, mas acima de tudo permite aumentar a eficiência do sistema e a qualidade da assistência aos nossos doentes, que nós estamos em condições para garantir, mas para isso é necessário alinhar estratégias e sobretudo criar uma visão comum.

 

Referências

1. OECD. Health at a Glance 2017: OECD Indicators. Paris: OECD Publishing; 2017. [consultado 2017 Dez 9]. Disponível em: https://www.oecd-ilibrary.org/social-issues-migration-health/health-at-a-glance-2017_health_glance-2017-en        [ Links ]

2. Vilas-Boas A, Guimarães LE, Vieira NB. Who are our patients? – Characterization of Internal Medicine Wards in Portugal. Poster. 15th European Congress of Internal Medicine. Amsterdam. 2016.

3. Gomes B, Calanzani N, Gysels M, Hall S, HigginsonI J. Heterogeneity and changes in preferences for dying at home: A systematic review. BMC Palliat Care. 2013; 12:7.         [ Links ]

4. Ahmed A, Allman RM, Kiefe CI, Person SD, Shaneyfelt TM, Sims RV, et al. Association of consultation between generalists and cardiologists with quality and outcomes of heart failure care. Am Heart J. 2003;145:1086-93.         [ Links ]

 

 

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