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Medicina Interna

versão impressa ISSN 0872-671X

Medicina Interna vol.26 no.2 Lisboa jun. 2019

https://doi.org/10.24950/rspmi/CE/36/19/2/2019 

CARTAS AO EDITOR / LETTERS TO THE EDITOR

Cuidar do Doente em Fim de Vida: Tempo Para Agir!

End of Life Care: Time To Act!

 

Rui Carneiro1
https://orcid.org/0000-0002-0213-2504

 

1Serviço de Medicina 2.3 do Hospital de Santo António dos Capuchos, Lisboa, Portugal
2Serviço de Oncologia do Hospital de Santo António dos Capuchos, Lisboa, Portugal

Correspondência

 

 

Palavras-chave: Cuidados Paliativos; Cuidados Terminais; Medicina Interna

 


 

Keywords: Internal Medicine; Palliative Care; Terminal Care

 


Em artigo recente,1 Sara Machado e colegas fizeram uma caracterização muito clara e franca do que é o cuidado prestado em situação de últimas horas ou dias de vida numa enfermaria de Medicina Interna. É de louvar a honestidade o grupo de trabalho e a coragem do corpo editorial da Revista Medicina Interna na comunicação de um mau resultado e um desempenho muito aquém do standard para um momento particularmente sensível e vulnerável da vida de uma pessoa e de sua família. Os autores descrevem como a equipa não reconheceu o processo de morte em doentes com elevada probabilidade de morrer em internamento (todos com decisão de não reanimar) e como falhou nos objetivos e na forma de cuidar, culminando naquilo que os autores muito bem refletem como cenários de terapêutica desajustada e controlo sintomático inadequado. Este é um mau resultado para a atuação de equipa de Medicina Interna, quando a nossa especialidade é aquela que mais de perto acompanha o doente, mais valoriza a semiologia (a situação de últimas horas e dias de vida é um diagnóstico eminentemente clínico) e maior oportunidade tem em mudar a experiência de morrer em internamento. Nesta fase, parece que deixamos de ver o doente que temos à frente, falhamos no diagnóstico e funcionamos em “reflexo rotuliano”, irrefletida e automaticamente propondo medidas desajustadas para a condição. Se assim é a este nível, podemos pressupor que a comunicação com o doente e sua família e avaliação das necessidades psico-espirituais fiquem aquém do necessário.

Este não é tema novo na literatura científica nacional. O que é alarmante é o facto de, em dez anos, os vários artigos evidenciam sempre a mesma realidade, as mesmas fragilidades e não conseguimos melhorar a nossa prática!2 Esta é uma evidência que merece reflexão e, sobretudo, ação. Má qualidade de cuidados não pode ser uma inevitabilidade e não se coaduna com a postura da Medicina Interna nacional. Não se trata de um problema de iliteracia médica porque demonstramos, pela evidência científica que produzimos e publicamos, que temos uma excelente capacidade de acompanhar o estado da arte nas várias vertentes da Medicina, absorvemos com rapidez e respondemos com excelência aos desafios da aplicação dos novos conhecimentos científicos – mas não, quando se trata do doente em fim de vida. Poderá ser uma consequência da insuficiência de currículo formal no ensino pré e pós-graduado, mas atualmente abundam oportunidades formativas na área da medicina paliativa, nem sempre aproveitadas pelos internistas. Talvez seja uma expressão do curriculum escondido: afinal de contas, o doente na reta final da vida, na maioria das situações, não tem capacidade de defender o seu melhor interesse e as famílias, fragilizadas, demasiado habituadas a receber um cuidado pouco personalizado mas acostumadas à estereotipia: “se não come coloca-se sonda ou soro; se poderá ter infeção propõe-se o antibiótico”. Quanto à postura do médico, quem é aquele que se quer aproximar de quem morre e chamar a si a responsabilidade dele cuidar, da sua família e disponibilizar o seu tempo com quem certamente não vai melhorar? É uma questão que direcciono a cada um dos que lêem esta comunicação…

Terá, porventura, chegado o momento de sistematizarmos os cuidados destes doentes para que possamos consistentemente oferecer um tratamento personalizado e ajustado, promovendo conforto, catalisando lutos saudáveis, aumentando a qualidade da comunicação na equipa de saúde e reduzindo a sobrecarga emocional do profissional. Partilho convosco uma síntese de normas de boas práticas que a Equipa de Acompanhamento Suporte e Paliação do Hospital da Luz – Arrábida propõe para a instituição que serve. Faria sentido que todas as instituições evoluíssem nesse esforço colectivo e uniformizado.

Fig 1

 

Referencias

1. Machado S, Reis-Pina P, Mota A, Marques R. Morrer num serviço de Medicina Interna: as últimas horas de vida. Rev Soc Port Med Interna. 2018:25:286-92.         [ Links ]

2. Carneiro R. Medicina Interna: cronicidade e terminalidade. Rev Soc Port Med Interna. 2014: 21:91-6.         [ Links ]

 

Correspondência:Rui Carneiro – ruicarneiro77@gmail.com

Equipa de Acompanhamento, Suporte e Paliação, Departamento de Medicina, Urgência e UCI, Hospital da Luz – Arrábida, Porto, Portugal
Praceta Henrique Moreira, 150 4400-346 Vila Nova de Gaia

 

Conflitos de Interesse: Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na realização do presente trabalho.

Fontes de Financiamento: Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo.

Conflicts of interest: The authors have no conflicts of interest to declare.

Financing Support: This work has not received any contribution, grant or scholarship.

 

Recebido: 01/02/2019

Aceite: 19/03/2019

 

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