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Medicina Interna

versão impressa ISSN 0872-671X

Medicina Interna vol.26 no.4 Lisboa dez. 2019

https://doi.org/1024950/rspmi/Opiniao/Hosp.Braga/4/2019 

ARTIGOS DE OPINIÃO / OPINION ARTICLES

O Serviço de Medicina Interna do Hospital de Braga

The Internal Medicine Service of the Hospital de Braga

 

António Oliveira e Silva
https://orcid.org/0000-0003-3445-0926

Diretor Serviço de Medicina Interna

Hospital de Braga, Braga, Portugal

 

Palavras-chave: Departamentos Hospitalares; Medicina Interna; Prestação de Cuidados de Saúde.

Keywords: Delivery of Health Care; Hospital Departments; Internal Medicine.

 

“Portugal tem a vantagem de ter médicos “generalistas”, especializados em medicina interna nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS), numa altura em que os seus equivalentes “hospitalistas” estão a ser reinventados nos Estados Unidos da América e noutros países. A evidência sugere que os melhores cuidados de saúde são prestados por médicos com uma formação generalista, como ocorre na medicina interna, e fazendo parte de equipas multidisciplinares alargadas, que envolvem doentes e prestadores de cuidados de saúde."

In: Um Futuro para a Saúde, Lord Nigel Crisp et al, Fundação Calouste Gulbenkian, 2014

A Medicina Interna define-se pela competência na abordagem assistencial das doenças do adulto, especialmente focada naqueles com doenças crónicas e complexas. Para além da componente assistencial, a especialidade vincula-se a um cada vez maior aprofundamento e envolvimento nas estratégias preventivas e nas políticas de qualidade e de gestão de cuidados. Outra marca distintiva do internista é a capacidade de adaptação a realidades novas da medicina clínica (p. ex. o VIH e os problemas relacionados com as migrações), da inovação terapêutica e da adoção de novas tecnologias de informação e de diagnóstico.

De um modo geral, a arquitetura e a organização dos serviços hospitalares não se adequam nem à realidade nem à tipologia do doente internado. Os serviços estão organizados por especialidades médicas dedicadas à patologia de um órgão ou sistema, ou à execução de técnicas diagnósticas ou de terapêuticas específicas. Em relação ao que acontecia há alguns anos, o doente-tipo internado nos serviços hospitalares tem mais de 75 anos, tem patologia mais grave, sofre de uma ou de várias doenças crónicas, está polimedicado e tem uma situação social e económica instável, o que contribui para um maior condicionamento na tomada de decisões diagnósticas e terapêuticas e para a programação da alta hospitalar.

Toda a informação epidemiológica aponta no sentido da evolução para uma população mais envelhecida e com mais doenças crónicas. Esta realidade desperta para a necessidade de reorganização dos serviços com a criação de equipas com capacidade de gestão clínica e com competências transversais dirigidas aos vários problemas, próximas do doente internado, que centralizem a assistência, que decidam ou aconselhem a decisão mais adequada e que garantam a continuidade do processo assistencial.

O Serviço de Medicina Interna do Hospital de Braga é herdeiro de uma longa e prestigiada história que teve início no Hospital de S. Marcos e que passou por diversas soluções organizativas e funcionais, refletindo, a cada momento, as soluções consideradas mais adequadas às necessidades assistenciais, tendo em atenção a evolução das diversas especialidades e a disponibilização de recursos.

Para além da componente assistencial – no internamento, no ambulatório e na urgência interna -, os médicos do Serviço de Medicina Interna do Hospital de Braga (24 especialistas ETC de 40 horas) têm responsabilidades na docência (em 2018, frequentaram o serviço 232 alunos do mestrado integrado de medicina dos 3º, 4º, 5º e 6º anos da Escola de Medicina da Universidade do Minho), no ensino pós-graduado (27 internos de formação específica de medicina interna, para além da valência de medicina interna para internos de outras especialidades e para internos do ano comum) e na investigação (em 2018, participação em sete estudos observacionais, sete ensaios clínicos, publicação de 13 artigos em revistas indexadas e mais de 200 apresentações em reuniões e congressos nacionais e internacionais). Para fomentar as atividades de investigação e de formação no serviço, nomeadamente, entre os médicos internos, foi criado em 2015, em colaboração com a Escola de Medicina, um programa intensivo de introdução à investigação, com componentes básica e clínica, que decorre no início do internato durante duas semanas em tempo completo. Todos os internos ficam, desde o primeiro ano, ligados a um projeto de investigação ou a um ensaio clínico.

Além das suas funções hospitalares como especialistas, os médicos de Medicina Interna integram diversas comissões e estruturas hospitalares - Comissão de Farmácia e Terapêutica, Comissão de Ética, Hospital de Dia, Gestão de Risco e PPCIRA.

Em relação à atividade assistencial e em 2018, foram realizadas 9690 consultas externas (21% primeiras), divididas pelas diversas áreas funcionais do serviço: hipertensão arterial, risco vascular, doenças autoimunes e doenças infeciosas); houve 5179 episódios de internamento (lotação de 102 camas, com 3 alas de 30 camas e uma ala de 12 camas), com uma demora média de 11,7 dias, uma taxa de mortalidade de 13,6% e um índice decase-mix de 1,42. O Hospital de Braga está inserido num sistema de benchmarking de internamento com a participação de diversos hospitais portugueses e espanhóis de dimensão comparável; este sistema origina diversos indicadores de comparabilidade em relação, entre outros, à complexidade dos doentes, às readmissões (IRAR), à mortalidade (IMAR) e à demora média (IDMA), ajustadas à complexidade. O índice 1 representa o resultado esperado tendo em conta os resultados dos outros hospitais, sendo os valores inferiores e superiores a 1, respetivamente menores e maiores que o esperado. Em 2018, no serviço, o IRAR foi de 0,96, o IMAR de 0,71 e o IDMA de 1,09.

Para além da reunião de serviço semanal existem reuniões temáticas organizadas pelos responsáveis das diversas áreas interesse do serviço.

 É muito frequente que o prolongamento do internamento de um doente seja um problema só muito vagamente relacionado com o motivo pelo qual foi internado. Esta realidade despertou para a necessidade de reorganização do serviço com a criação de equipas com capacidade de gestão clínica e com competências transversais dirigidas aos vários problemas, próximas do doente internado, que centralizem a assistência, que decidam ou aconselhem a decisão mais adequada e que garantam a continuidade do processo assistencial.

Esta perceção obrigou-nos à alteração de algumas práticas no internamento, nomeadamente, a presença sistemática da assistente social e da farmacêutica que nos apoiam nas visitas ao serviço, onde, semanalmente, é exposto um ponto da situação de cada doente, tendo em atenção os aspetos clínicos, os eventuais constrangimentos sociais e o contexto familiar. Foi introduzido um conceito alargado de equipa de tratamento para cada “tira” de doentes, constituída pelo(s) médico(s) responsável, enfermeiro de referência e assistente operacional. Esta equipa reúne ao princípio e ao fim da manhã, sendo articulados os cuidados a prestar, os exames programados, as intercorrências identificadas em turnos anteriores e a preparação da alta, desde o primeiro dia de internamento. Além dos aspetos relacionados com o Serviço de Medicina Interna e sendo coerentes com a nossa ideia de organização hospitalar, em que as barreiras interserviços devem ser esbatidas, o serviço tem em permanência uma equipa no serviço de Ortopedia e prepara-se para alargar este conceito a outros serviços cirúrgicos. Esta visão mais alargada do campo da medicina interna hospitalar, aprofundando a cooperação e estabelecendo a cogestão do doente cirúrgico obriga, naturalmente, não só a um reset da nossa definição como especialidade, mas também a uma gestão e a uma captação de recursos diferentes do que tem sido a norma.

O tema da segurança do doente está sempre presente e as propostas de melhorias são permanentes. Adiantava dois exemplos de programas em curso: este ano, iniciámos, em colaboração com os Serviços Farmacêuticos, um programa de reconciliação terapêutica que, numa fase-piloto, tem lugar numa das alas do Serviço; em 2016 iniciámos uma série de intervenções de modo a minimizar o risco de quedas nos doentes internados, com a colaboração do Departamento de Qualidade do Hospital de Braga. Entre as várias intervenções, saliento o alargamento dos critérios de alerta de doentes em risco e o uso de meias antiderrapantes, a adaptação dos horários de administração de fármacos, as visitas noturnas ativas (e não reativas) de modo a antecipar eventuais necessidades, a adaptação de mesas, camas e cadeirões às necessidades dos doentes e, muito importante, a realização de diversas ações de formação para os profissionais e familiares. Nas três alas onde o programa foi colocado em prática houve resultados positivos (Fig. 1) que continuamos a querer melhorar.

Como prioridade para um futuro que tem de ser próximo, projetamos a criação de uma área destinada ao doente grave, dotada de um nível intermédio de cuidados, onde sejam possíveis a permanência e o tratamento dos doentes que, pelas características da doença e/ou da intensidade do tratamento, necessitem de acompanhamento mais intensivo.

O próximo Congresso de Medicina Interna, em maio de 2020, acontecerá em Braga com o envolvimento na organização de grande parte dos médicos do serviço. Será certamente um evento marcante para a Cidade, para o Hospital e para o Serviço e, esperamos, para todos os participantes. O programa científico (que eu não vou antecipar) tentará abranger, não só os temas habituais da especialidade, mas também novas visões sobre o que nos espera num futuro imediato. Venham e disfrutem do evento e, porque não, da cidade que, apesar de antiga, nos surpreende a cada dia.

 

Responsabilidades Éticas

Conflitos de Interesse: Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na realização do presente trabalho.

Fontes de Financiamento: Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo

 

Ethical Disclosures

Conflicts of Interest: The authors have no conflicts of interest to declare.

Financing Support: This work has not received any contribution, grant or scholarship

 

© Autor (es) (ou seu (s) empregador (es)) 2019. Reutilização permitida de acordo com CC BY-NC. Nenhuma reutilização comercial.

© Author(s) (or their employer(s)) 2019. Re-use permitted under CC BY-NC. No commercial re-use.

 

Correspondence/Correspondência:

António Oliveira e Silva – aosilva60@gmail.com

Diretor do Serviço de Medicina Interna do Hospital de Braga

Braga, Portugal

Sete Fontes – São Victor, 4710-243, Braga

 

Received/Recebido: 12/10/2019

Accepted/Aceite: 16/10/2019

 

Publicado/Published: 11 de Dezembro de 2019

 

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