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Medicina Interna

versão impressa ISSN 0872-671X

Medicina Interna vol.28 no.4 Lisboa dez. 2021  Epub 01-Dez-2021

https://doi.org/10.24950/rspmi.cd.131.4.2021 

Cartas ao Editor

Prescrição Off-Label em Cuidados Paliativos

Off-Label Prescribing in Palliative Care

1Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, Portugal

2Unidade de Cuidados Paliativos “Bento Menni”, Casa de Saúde da Idanha, Sintra, Portugal.

3Faculdade de Medicina, Universidade de Lisboa, Portugal.

4Laboratório de Farmacologia e Cuidados Farmacêuticos, Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra, Portugal


A prescrição off-label contempla a prescrição de um fármaco cujo uso (indicações, subgrupos populacionais, dose ou via de administração) não foi aprovado pelas entidades reguladoras, não constando no resumo das características do medicamento (RCM).1

Em Cuidados Paliativos (CP), particularmente em fim de vida, para além das alterações fisiopatológicas, existe perda de via oral, sendo fundamental encontrar vias alternativas para administrar fármacos que sejam seguras e contribuam para melhorar a qualidade de vida do doente.1,2

Para determinar a prevalência de prescrições off-label, de forma regular, numa unidade de internamento de CP (UCP), desenvolveu-se um estudo observacional descritivo, retrospetivo, transversal sendo analisados:

i) o número de fármacos prescritos off-label, por doente;

ii) o critério do uso off-label (via de administração ou dose)

Não foram analisados os motivos de prescrição, o local de administração, a ocorrência de reações adversas ou eficácia clínica.

O presente estudo teve parecer favorável da Comissão de Ética da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e autorização da Direção Clínica da instituição onde decorreu o estudo.

Foram incluídos 115 doentes da UCP “O Poverello” (53,9% homens; idade média 70,0±12,9 anos). Verificou-se mediana de 4 fármacos (intervalo interquartil: 3; 7) por doente. Do total, 82 doentes (71,3%) tinham uma prescrição off-label, pelo menos. Nestes, o uso off-label estava relacionado com a via subcutânea em 100% dos casos, facto não contemplado no RCM.3 Entre os fármacos assim administrados encontravam-se: metoclopramida (em 44 doentes, sendo 88,6% off-label); midazolam (em 30 doentes, sendo 58,3% off-label); dexametasona (em 28 doentes, sendo 100% off-label); furosemida (em 24 doentes, sendo 58,3% off-label); levomepromazina (em 15 doentes, sendo 100% off-label) e haloperidol (em 13 doentes, sendo 84,6% off-label).

A prevalência da prescrição off-label neste estudo foi su-perior à identificada numa recente revisão sistemática, onde variou entre 14,5% e 35%.1 Tal pode dever-se ao predomínio de doentes oncológicos (84,3%), admitidos 10 dias antes da morte (mediana), sem via oral patente ou acessos vasculares periféricos, e cuja caquexia condicionava a administração intramuscular. Em conformidade, uma revisão recente com doentes oncológicos verificou que a prescrição off-label podia ter uma prevalência até 76% em CP.4

A via subcutânea é largamente utilizada em CP, devido às suas vantagens, nomeadamente comodidade, baixo custo e viabilidade em regime ambulatório.5 Contudo, verifica-se escassa evidência científica pelo que o uso desta via denota a experiência clínica de cada médico e instituição. Numa recen-te revisão sistemática foi identificado o potencial efeito benéfico do uso subcutâneo da metoclopramida, dexametasona, furosemida e levomepromazina, no entanto também destaca a falta de evidência de qualidade dos estudos efetuados.5 Já para o uso do midazolam e do haloperidol a evidência foi considerada insuficiente e por isso, a recomendação, inconclusiva.5 Assim, importa clarificar a eficácia desta via e outros aspetos farmacológicos (biodisponibilidade, dose, formas de diluição e compatibilidades) para uniformizar e certificar esta prescrição em CP.1

A prescrição off-label é um dos desafios no final da vida em CP, com implicações técnicas, legais e éticas (associadas à autonomia e ao consentimento informado, p.e.).1 Não há um registo nacional pelo que a prevalência do uso de fármacos off-label em Portugal é desconhecida. Este assunto requer uma abordagem multidisciplinar e tem sido amplamente dis-cutido, inclusive, foi considerado um dos eixos prioritários em 2019-2020 no Plano Estratégico para o Desenvolvimento dos Cuidados Paliativos.2

REFERÊNCIAS

1. Hagemann V, Bausewein C, Remi C. Drug use beyond the licence in palliative care: A systematic review and narrative synthesis. Palliat Med. 2019;33:650-62. doi: 10.1177/0269216319840602 [ Links ]

2. Comissão Nacional de Cuidados Paliativos. Plano Estratégico para o Desenvolvimento dos Cuidados Paliativos - Biénio 2019-2020 [Internet]. [consultado 2021 Jun 2]. Disponível em: https://www.sns.gov.pt/wp-content/uploads/2019/04/PEDCP-2019-2020-versao-final-10.02.2019.pdfLinks ]

3. Infomed - Base de dados de medicamentos. [homepage na Internet]. INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde IP; 2021 [consultado 2021 Jun 2]. Disponível em: https://extranet.infarmed.pt/INFOMED-fo/index.xhtmlLinks ]

4. Saiyed MM, Ong PS, Chew L. Off-label drug use in oncology: a systematic review of literature. J Clin Pharm Ther. 2017;42:251-8. doi: 10.1111/jcpt.12507 [ Links ]

1Responsabilidades Éticas Conflitos de Interesse: Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na realização do presente trabalho. Fontes de Financiamento: Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo. Proveniência e Revisão por Pares: Não comissionado; revisão externa por pares. Ethical Disclosures Conflicts of interest: The authors have no conflicts of interest to declare. Financing Support: This work has not received any contribution, grant or scholarship. Provenance and Peer Review: Not commissioned; externally peer re-viewed

2© Autor (es) (ou seu (s) empregador (es)) e Revista SPMI 2021. Reutili-zação permitida de acordo com CC BY-NC. Nenhuma reutilização comercial. © Author(s) (or their employer(s)) and SPMI Journal 2021. Re-use permit-ted under CC BY-NC. No commercial re-use.

Recebido: 14 de Julho de 2021; Aceito: 10 de Setembro de 2021

Correspondence / Correspondência: Tatiana Peralta - tatianaoperalta@gmail.com Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, Portugal Urbanização Panorama, 3º lote, 3ºB - Monte formoso, 3000-446 Coimbra

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