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Medicina Interna

Print version ISSN 0872-671X

Medicina Interna vol.29 no.4 Lisboa Dec. 2022  Epub Jan 02, 2023

https://doi.org/10.24950/rspmi.923 

Cartas ao Editor/ Letters to the Editor

A Propósito e “Febre de Origem Indeterminada num Hospital Terciário Português”

Apropos of “Fever of Unknown Origin in a Portuguese Tertiary Hospital”

1Serviço de Medicina Interna, Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, Hospital de Vila Real, Vila Real, Portugal


O estudo retrospetivo “Febre de origem indeterminada num hospital terciário português”, de Mafalda Ferreira et al,1 publicado recentemente na revista da SPMI, constitui um importante contributo para a prática da Medicina Interna, em particular em Portugal. É uma revisão retrospetiva de 55 doentes no biénio 2016-2017, possivelmente pioneira no nosso meio, com metodologia e discussão bastante assertivas. Os autores (AA) defendem o plano básico utilizado na investigação inicial da fever of unknown origin (FUO) e a necessidade de o ajustar ao caso individual, levando em consideração as particularidades epidemiológicas e as manifestações clínicas. Salienta-se a determinação e o dispêndio de tempo necessários para um estudo desta natureza, o que pode explicar a demora na sua conclusão.

Os AA assinalam que os resultados não diferem, no es-sencial, dos de outras séries publicadas ao longo do tempo, desde a famosa publicação de Petersdorf e Beeson.2 Na maioria, as séries referidas no estudo foram publicadas já a partir do ano 2000. Englobando a FUO um conjunto de doenças muito vasto e heterogéneo, em diferentes regiões do mundo, e mesmo da Europa, podem ocorrer diferenças na representação dos grandes grupos de causas entre as diversas séries. Por exemplo, no que respeita a infeções, nos últimos vinte anos apenas duas, ambas do médio oriente, tiveram taxa semelhante à do presente estudo (41,8%). É intrigante a elevada taxa de febre Q, correspondendo a 9,1% do total e a 21,7% do grupo das infeções. Ainda assim, parece questionável a instituição precoce de doxiciclina “em muitos casos “com base numa “história clínica suspeita e com o intuito de melhorar o desfecho clínico”: pode perturbar a investigação e comporta potencial iatrogénico. Outro aspeto que parece excessivo é a realização da serologia da borreliose em 52% dos pacientes.

Os AA não referem a demora média do internamento dos doentes nem o tempo decorrido até ao diagnóstico final da FUO, dados que foram colhidos e teria sido interessante revelar. A FUO pode tornar-se um quebra-cabeças, exige argúcia, atenção ao detalhe, estudo e paciência. Por vezes, feita a investigação aturada sem atingir o diagnóstico, pode ser adequada uma atitude vigilante em ambulatório, sendo fundamental uma relação de confiança entre a equipa clínica e o doente e família, nem sempre fácil de conseguir. Merece destaque a mortalidade de cerca de 20% da série desde a admissão aos 12 meses de follow-up.

Os AA integram a ecografia abdominal na avaliação inicial, mas outros preferem a realização de tomografia com-putorizada abdominopélvica, que tem maior sensibilidade. A disponibilização praticamente imediata deste exame permite esclarecer prontamente casos de febre sem foco aparente que poderiam ser classificados como FUO. Novos meios laboratoriais podem acelerar o diagnóstico. Por exemplo, no caso da mencionada febre Q, a utilização do designado “painel de zoonoses”, de biologia molecular, mais rápida que a serologia convencional.

Os estudos retrospetivos de FUO levantam questões metodológicas importantes. A simples definição utilizada pode fazer variar o número e etiologia de casos elegíveis. Se se for demasiado estrito na aplicação da definição, o período de 3 dias de investigação no hospital é curto. Imagine-se o doente admitido por febre arrastada apirético nos primeiros dias: pode levar a demora na realização de hemoculturas ou no pedido de certos exames. Outro exemplo: num doente com bacteriemia ou endocardite que colha hemoculturas numa quinta-feira: não sendo “lidos” os resultados ao fim de semana, pode um isolamento positivo que durante a semana sairia ao fim de dois dias só estar disponível ao quarto ou quinto dia, levando a considerar impropriamente caso de FUO. O mesmo pode ocorrer com estudos serológicos. Uma metodologia prospetiva seria do maior interesse em futuros estudos nacionais, idealmente multicêntricos.

REFERÊNCIAS

1. Ferreira M, Coutinho IA, Lavrador M, Duarte O, Espert H, Carvalho A. Febre de origem indeterminada num hospital terciário português. Med Interna. 2022; 29: 133-9. doi: 10.24950/rspmi.650 [ Links ]

2. Petersdorf RG, Beeson PB. Fever of unexplained origin: report on 100 cases. Medicine. 1961; 40: 1-30. doi: 10.1097/00005792-196102000-00001 [ Links ]

Fontes de Financiamento: Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo

3Proveniência e Revisão por Pares: Comissionado; Sem revisão ex-terna por pares.

Financing Support: This work has not received any contribution, grant or scholarship

6Provenance and Peer Review: Commissioned; without external peer review

7© Autor (es) (ou seu (s) empregador (es)) e Revista SPMI 2022. Reutiliza-ção permitida de acordo com CC BY-NC. Nenhuma reutilização comercial. © Author(s) (or their employer(s)) and SPMI Journal 2022. Re-use permit-ted under CC BY-NC. No commercial re-use.

Recebido: 10 de Agosto de 2022; Aceito: 06 de Outubro de 2022

Correspondence / Correspondência: Fernando Guimarães - fernandoguimaraes.a@gmail.com Serviço de Medicina Interna, Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, Hospital de Vila Real, Vila Real, Portugal Rua dos Lagoeiros 43, 5000-185 Vila Real

Conflitos de Interesse: Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na realização do presente trabalho

Conflicts of Interest: The authors have no conflicts of interest to declare.

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