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Jornal Português de Gastrenterologia

versão impressa ISSN 0872-8178

J Port Gastrenterol. v.18 n.3 Lisboa maio 2011

 

Permeabilidade Intestinal e Endotoxemia na Cirrose Hepática

Intestinal Permeability and Endotoxemia in Liver Cirrhosis

 

Helder Cardoso1

1Gastrenterologista; Local de trabalho: Serviço de gastrenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e do Hospital de São João, Porto – Portugal

 

 

Em Hepatologia, a permeabilidade intestinal, translocação bacteriana,endotoxemia e correspondente resposta imunológica são actualmente temas interessantes de investigação. Este interesse está directamente relacionado com as suas propostas implicações em áreas como afisiopatologia da hipertensão portal, esteatohepatite e ocorrência de infecções, entre outras. As infecções bacterianas constituem uma causa significativa de morbilidade e mortalidade em doentes com cirrose hepática, sendo que a hemorragia gastrointestinal e a gravidade da doença hepática são factores preditivos independentes da sua incidência. Atranslocação bacteriana e atenuação da resposta imunológica foram considerados como mecanismos implicados, particularmente naperitonite bacteriana espontânea (PBE)1.

A endotoxemia na cirrose hepática com hemorragia digestiva foi primeiro descrita em 19772. No entanto ainda não há consenso na literatura sobre o papel das alterações da permeabilidade intestinal nos doentes com cirrose3. Alguns resultados discordantes poderão estar relacionados com diferenças metodológicas, nomeadamente a dimensão das amostras e utilização de testes diferentes para avaliar a permeabilidade intestinal3,4.Um teste utilizado é o de lactulose/manitol que se demonstrou estar elevado na cirrose hepática, particularmente na doença avançada5. Também com a utilização de 51Cr-EDTA verificou-se que o aumento da permeabilidade intestinal foi um achado comum em 52 doentes com cirrose, especialmente com doença mais avançada3. Outro teste interessante analisa a permeabilidade do polietilenoglicol, que tem características e propriedades químicas semelhantes à estrutura dasendotoxinas, e que também permitiu determinar um aumento da permeabilidade intestinal na cirrose com ascite6.

Num estudo recente de 113 doentes com cirrose hepática internados por hemorragia digestiva o índice de permeabilidade intestinal, no dia seguinte à admissão, correlacionou-se de forma significativa com a endotoxinemia e a ocorrência de infecções7.

Na investigação publicada no artigo “Permeabilidade intestinal em doentes com cirrose hepática: correlação com endotoxemia e níveis de TNFa, IL - 1 e IL - 6”8, que lemos com muito interesse, os autores propuseram-se a esclarecer melhor a interacção entre os diferentes eventos relacionados com a endotoxemia/translocação bacteriana e também a correlação com a evolução clínica dos doentes. Os resultados em parte inconclusivos poderão estar relacionados com a selecção de controlos com potencial patologia gastrointestinal. A este respeito os autores acabam por salientar a possível interferência da utilização de inibidores da bomba de protões (IBP) na permeabilidade intestinal.

Relativamente ao risco da utilização de IBP, tem sido descrita uma maior prevalência de infecções/PBE devida a provável hiperproliferação bacteriana e aumento consequente da sua translocação, mas em estudosrectrospectivos e com diferentes critérios,9 pelo que parecem ainda necessários estudos prospectivos para estabelecer a causalidade.

Outros autores têm investigado particularmente as repercussões imunológicas e circulatórias da translocação bacteriana. O nosso serviço participou num estudo sobre a imunidade inata na cirrose hepática compensada de etiologia etílica, em que se demonstrou aumento dos níveisséricos de sCD14, lipopolissacarídeo (LPS) e proteina de ligação a LPS, bem como atenuação da resposta imune inata mediada por toll-like receptor 2 em monócitos do sangue periférico, que apresentaram menor produção constitucional de factor de necrose tumorala10. Relativamente a alterações circulatórias na cirrose hepática, é de realçar um estudo em que se verificou associação da presença de ADN bacteriano a disfunção endotelial intrahepática, traduzida por maior elevação pós-prandial do gradiente de pressão venoso hepático, bem como diminuição da tensão arterial e da resistência vascular sistémica11.

 

 

REFERÊNCIAS

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