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Millenium - Journal of Education, Technologies, and Health

versión impresa ISSN 0873-3015versión On-line ISSN 1647-662X

Mill  no.esp9 Viseu dic. 2021  Epub 07-Dic-2021

https://doi.org/10.29352/mill029e.25237 

Ciências da vida e da saúde

Ozonoterapia como coadjuvante na cicatrização de feridas e diminuição da dor

Ozone therapy as a coadjuvant in wound healing and pain reduction

La ozonoterapia como coadyuvante en la cicatrización de heridas y la reducción del dolor

1 Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Coimbra, Portugal

2 Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde, Viseu, Portugal

3 UICISA:E, ESEnfC- The Health Sciences Research Unit: Nursing, Coimbra, Portugal

4 SIGMA - Phi Xi Chapter, ESEnfC, Coimbra, Portugal

5 Centro de Investigação em Estudos da Criança da Universidade do Minho (CIEC UM), Braga, Portugal


Resumo

Introdução:

O ozono é considerado um potente agente antimicrobiano e por isso é utilizado enquanto terapia complementar da cicatrização de feridas e na redução da dor. Contudo, este tema é ainda pouco estudado empiricamente.

Objetivo:

Analisar a capacidade terapêutica da ozonoterapia como coadjuvante na cicatrização de feridas e diminuição da dor.

Métodos:

Estudo exploratório, transversal e retrospetivo e de caráter descritivo. A análise dos dados teve por base estatística descritiva e inferencial com recurso ao teste de Mann-Whitney e de Friedman (dados contínuos) e do teste Qui-quadrado/Fisher (dados dicotómicos ou ordinais).

Resultados:

Foram incluídas 20 pessoas, maioritariamente do sexo feminino (55%) e com uma média de idade de 61,9 anos (±16,7). Um estado de cicatrização mais agravado e níveis mais elevados de dor inicial estão associados à não cicatrização (p=0,02; p=0,03, respetivamente). Em relação à evolução temporal da cicatrização das feridas e dos níveis de dor (início, 1.º mês, 2.º mês e 3.º mês) observou-se uma redução gradual dos valores, o que se traduz numa melhoria significativa de cicatrização e redução da dor. A cicatrização não ocorreu apenas em 35% (n=7) dos casos.

Conclusão:

A ozonoterapia melhorou a cicatrização das feridas e reduziu os níveis de dor associados. Contudo, dado a reduzida amostra torna-se necessário replicar o estudo em amostras mais alargadas e com entidades nosológicas diversificadas para validar as mais valias desta intervenção terapêutica.

Palavras-chave: ozono; cicatrização; dor; ferimentos e lesões

Abstract

Introduction:

Ozone is considered a potent antimicrobial agent and is therefore used as a complementary therapy for wound healing and pain reduction. However, this subject is still little empirically studied.

Objetive:

To analyse the therapeutic capacity of ozone therapy as an adjuvant in wound healing and pain reduction.

Methods:

This was an exploratory, cross-sectional, retrospective, and descriptive study. Data analysis was based on descriptive and inferential statistics using the Mann-Whitney and Friedman tests (continuous data) and the Chi-square/Fisher test (dichotomous or ordinal data).

Results:

Twenty people were included, mostly females (55%) and with a mean age of 61.9 years (±16.7). A more aggravated state of healing and higher levels of initial pain were associated to non-healing (p=0.02; p=0.03, respectively). Regarding the time evolution of wound healing and pain levels (baseline, 1st month, 2nd month and 3rd month) a gradual reduction of values was observed, which reflects a significant improvement of healing and pain reduction. Healing did not occur in only 35% (n=7) of the cases.

Conclusion:

Ozone therapy improved wound healing and reduced the associated pain levels. However, given the small sample size, it is necessary to replicate the study in larger samples and with diversified nosological entities to validate the benefits of this therapeutic intervention.

Keywords: ozone; wound healing; pain; wounds and injuries

Resumen

Introducción:

El ozono se considera un potente agente antimicrobiano y por ello se utiliza como terapia complementaria a la cicatrización de las heridas y a la reducción del dolor. Sin embargo, este tema está todavía poco estudiado empíricamente.

Objetivo:

Analizar la capacidad terapéutica de la ozonoterapia como coadyuvante en la cicatrización de heridas y la disminución del dolor.

Métodos:

Estudio exploratorio, transversal y retrospectivo, de carácter descriptivo. El análisis de los datos se basó en la estadística descriptiva e inferencial mediante las pruebas de Mann-Whitney y Friedman (datos continuos) y la prueba de Chi-cuadrado/Fisher (datos dicotómicos u ordinales).

Resultados:

Se incluyeron 20 pacientes, principalmente mujeres (55%) y con una edad media de 61,9 años (±16,7). Un estado más agravado de la cicatrización y niveles más altos de dolor inicial se asociaron con la no cicatrización (p=0,02; p=0,03, respectivamente). En cuanto a la evolución temporal de la cicatrización de la herida y los niveles de dolor (inicio, primer mes, segundo mes y tercer mes) se observó una reducción gradual de los valores, lo que se traduce en una mejora significativa de la cicatrización y la reducción del dolor. La cicatrización no se produjo sólo en el 35% (n=7) de los casos.

Conclusión:

La ozonoterapia mejoró la cicatrización de las heridas y redujo los niveles de dolor asociados. Sin embargo, dado el pequeño tamaño de la muestra, es necesario replicar el estudio en muestras más grandes y con entidades nosológicas diversificadas para validar los beneficios de esta intervención terapéutica.

Palabras clave: ozone; cicatrización de heridas; dolor; heridas y lesiones

Introdução

A cicatrização consiste num processo complexo de regeneração de tecidos que foram alvo de uma lesão causados por algum tipo de ação externa ou interna (Sorg et al., 2017; Pechersky et al., 2016). A complexidade do processo de cicatrização depende do tipo de tecido envolvido, da extensão da lesão e da condição física do individuo, sendo influenciada por patologias associadas, pela idade e até pelo estilo de vida. Pode-se considerar que é um processo composto por inúmeros agentes do sistema imunológico, hematopoiético, hormonal e metabólico em que cada um destes sistemas tem um papel essencial para o sucesso da cicatrização num todo (Sorg et al., 2017; Pechersky et al., 2016).

A cicatrização ocorre imediatamente após uma lesão causada num determinado tecido e é composta de várias etapas, que ocorrem normalmente numa sequência temporal bem estabelecida e coordenada, sendo estas: hemóstase, inflamação, proliferação celular e remodelação tecidular (Sorg et al., 2017). Cada uma destas fases ocorre de acordo com as características do tecido alvo podendo variar na sua extensão e impacto de acordo com a região e extensão afetada. A eficácia desta cascata de processos está dependente da capacidade de recrutamento celular para o local da lesão de forma que os agentes adequados exerçam a sua função e permitam a progressão do processo de cicatrização. Diversos fatores podem influenciar negativamente a cicatrização como a infeção por agentes microbiológicos, patologias que diminuam a capacidade do organismo de executar qualquer uma das quatro etapas referidas ou lesão contínua que possa afetar a zona considerada (Sorg et al., 2017; Landén et al., 2016).

Estes fatores mencionados anteriormente por vezes tornam o processo de tratamento de feridas um processo moroso e que, por vezes, não tem o sucesso desejado no tempo desejado, especialmente em feridas crónicas (Fitzpatrick et al., 2018). A capacidade de restaurar rapidamente a barreira protetora da pele é essencial para garantir uma cicatrização rápida, mas também para evitar a proliferação microbiana, permitindo que o processo de desenvolva eficazmente (Landén et al., 2016). Por outro lado, o processo de cicatrização de feridas é, na maior parte dos casos, doloroso e incapacitante, reduzindo significativamente a qualidade de vida dos doentes por longos períodos de tempo ou mesmo até ao final da vida (Paschou et al., 2018). Assim e do ponto de vista clínico, é essencial a avaliação da ferida em termos do seu tamanho e do tipo de tecido que compõe a fase da cicatrização de forma a determinar qual ou quais as prioridades do tratamento (Degli Agosti et al., 2016). Adicionalmente, a avaliação da dor também se reveste de extrema importância porque pode inviabilizar a proposta de alguns tratamentos e afeta negativamente a vida das pessoas (Wilcox et al., 2015). Esta entidade nosológica, já foi objeto de estudo de cientistas, poetas, sociólogos e políticos, entre outros, sendo também alvo de preocupação do cidadão comum, por isso se impõe ser debelada. A necessidade de criar consensos acerca da sua mensuração, torna premente seguir uma definição aceite pela comunidade científica, pelo que se opta pela da International Association for the Study of Pain (2018) citada porMota, Cunha, Santos, Duarte, Rocha, Rodrigues, Gonçalves, Ribeiro, Sobreira, & Pereira, (2020), que a define como uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada a lesões reais ou potenciais. Esta definição deixa explícita a ideia de que a dor tem uma natureza subjetiva, sugerindo que apenas existe quando reportada pela própria pessoa, devendo como referido anteriormente ser devidamente gerida e tratada.

Das diferentes opções de tratamentos destaca-se o ozono que é considerado um potente agente antimicrobiano e por isso é utilizado enquanto terapia complementar que visa facilitar a cicatrização com base na aplicação de um ligeiro stress oxidativo local que resulta na desinfeção (Smith et al., 2017). A sua utilização no tratamento de feridas não se encontra circunscrito apenas às feridas crónicas, mas também a feridas agudas (por exemplo, resultantes de trauma ou cirurgia). A sua utilização tem tido uma atenção crescente na clínica moderna, sendo que as suas potencialidades são conhecidas desde o início do século XIX (Elvis, & Ekta, 2011).

A prática da ozonoterapia visa auxiliar o processo geral de cicatrização, diminuir o impacto da dor e reduzir o tempo de cicatrização. Vários estudos apontam a sua eficácia na melhoria do potencial cicatricial e da dor (Fitzpatrick et al., 2018; Degli Agosti et al., 2016; Elvis & Ekta, 2011). Nesse sentido, neste estudo é avaliado o potencial terapêutico da ozonoterapia no tratamento de feridas e para tal, definimos como objetivo: analisar a capacidade terapêutica da ozonoterapia como coadjuvante na cicatrização de feridas e diminuição da dor.

1. Métodos

Trata-se de um estudo exploratório, transversal e retrospetivo e de caráter descritivo, realizado no Centro Médico e Integrado de Soure/ Sicó Saúde.

A amostra, não probabilística por conveniência, contou com 20 pessoas com feridas de diversas etiologias, comorbilidades e fatores de risco. Foi utilizada ozonoterapia de uso tópico através da imersão transcutânea de ozono (ensacado), infiltrações nas imediações da ferida com solução ozonizada e auto-hemoterapia major no tratamento de diversos tipos de feridas em várias localizações anatómicas (Esteves, 2017).

Os critérios de inclusão definidos foram: pessoas com idade igual ou superior a 18 anos; que realizassem tratamento com ozonoterapia; e que aceitassem participar de forma voluntária e esclarecida no estudo. Os critérios de exclusão foram definidos tendo por base as incompatibilidades da ozonoterapia, sendo elas: doentes medicados com inibidores da enzima conversora de angiotensina (vulgarmente denominados de IECA), doentes com deficiência na enzima G-6PD (favismo), mulheres em período de gestação ou em amamentação, doentes com diagnóstico de hipertireoidismo e doentes sujeitos a uma intoxicação aguda por álcool.

A recolha de dados foi realizada com aplicação de um questionário aplicado por via telefónica embora a maioria dos dados, relativos às várias fases da terapia ao longo de um período de 3 meses, tenham sido recolhidos diretamente do processo clínico de cada participante, especificamente o tamanho da ferida, comorbilidades associadas, fatores de risco, local de residência, idade e género.

Este estudo avaliou dois outcomes:

  • Outcome primário: Cicatrização da ferida, sujeita ao tratamento com ozonoterapia ao longo dos 3 meses de tratamento;

  • Outcome secundário: Dor ao longo do período do tratamento.

O estado de cicatrização da ferida foi avaliado através da aplicação da Escala de Cicatrização da Úlcera de Pressão (Pressure Ulcer Scale for Healing - PUSH). A opção deve-se ao facto de ser um instrumento amplamente utilizado, simples e de rápida aplicação, e de uso comum na prática clínica (Ferreira et al., 2007). Embora este instrumento tenha sido originariamente desenvolvido para avaliação de cicatrização de úlceras por pressão, pela transponibilidade dos seus domínios de avaliação na área das feridas, passou a ser recomendado na avaliação da cicatrização de outras feridas (crónicas e agudas) (Ferreira et al., 2007). Este instrumento é constituído por três itens - área da ferida, pontuado de 0 a 10; quantidade de exsudado, pontuado de 0 a 3; e por fim, a aparência do leito da ferida pontuado de 0 a 4. A pontuação total é obtida pela soma dos valores dos três indicadores, com uma variação de 0 (cicatrização) a 17 (deterioração da ferida). A monitorização do processo de cicatrização e a visualização da evolução são registados numa tabela e gráfico que acompanham a medida (Ferreira et al., 2007).

A dor foi avaliada através da aplicação de uma Escala Visual Analógica (EVA). Esta consiste numa linha horizontal, com 10 centímetros de comprimento, que tem assinalada numa extremidade a classificação “Sem Dor” e, na outra, a classificação “Dor Máxima”. A pessoa deve fazer um traço perpendicular à linha, no ponto que representa a intensidade da sua dor. Há, por isso, uma equivalência entre a intensidade da dor e a posição assinalada na linha reta. Por fim é medido, posteriormente e em centímetros, a distância entre o início da linha, que corresponde a zero e o local assinalado, obtendo-se, assim, uma classificação numérica que será assinalada na folha de registo (Direção-Geral da Saúde, 2003).

O estudo obteve parecer favorável da Comissão de Ética do Instituto Politécnico de Viseu (IPV) (N.º 15/SUB/2021) datado de 25 de março de 2021.

O tratamento de dados foi realizado com recurso ao software IBM SPSS Statistics, versão 23.0. Os dados foram explorados através de estatística descritiva recorrendo a frequências absolutas e percentuais e a medidas de tendência central (média ou mediana) e de dispersão (desvio padrão ou intervalo interquartílico) tendo por base o cumprimento ou não dos pressupostos de normalidade.

A análise das características sociodemográficas e clínicas dos participantes em função do estado de cicatrização foi realizada através da aplicação do teste U de Mann-Whitney (na presença de dados contínuos) e do teste Qui-quadrado (X 2) ou equivalente teste de Fisher (na presença de dados dicotómicos ou ordinais). Para avaliar se existiram diferenças na cicatrização das feridas e dos níveis de dor ao longo do tempo (início, 1.º mês, 2.º mês e 3.º mês) foi aplicado o teste de Friedman e, caso fosse significativo, as diferenças entre os grupos foram exploradas através de comparações por pares. Apenas foram utilizados testes não paramétricos devido às limitações amostrais e violação do pressuposto da normalidade (teste de Shapiro-Wilk<0,05, com medidas de achatamento e curtose >1,96). Nos testes de hipóteses foi considerado como estatisticamente significativo um p=0,05 (Pestana, & Gajeiro, 2008).

2. Resultados

A amostra deste estudo incluiu 20 pessoas com ferida, maioritariamente do sexo feminino (55%; n=11) e com uma média de idade de 61,9 anos (± 16,7). Em relação ao tipo de ferida, a mais comum é a ferida cirúrgica (35%; n=7) seguida pela úlcera mista (30%; n=6). Tendo por base os fatores de risco das pessoas, os mais frequentes na amostra são a dislipidemia (45%; n=9) e a obesidade (45%; n=9). A comorbilidade mais comum é a hipertensão arterial (60%; n=12). Predominantemente o local das feridas foi a perna (60%; n=12) (Tabela 1).

Tabela 1 Características sociodemográficas e clínicas dos participantes. 

Características n (%)
Idade, média (desvio padrão) 61,9 (16,7)
Sexo Feminino 11 (55,0)
Masculino 9 (45,0)
Tipo de ferida Cirúrgica 7 (35,0)
Úlcera Mista 6 (30,0)
Úlcera de Pressão 4 (20,0)
Úlcera Varicosa 2 (10,0)
Queimadura 1 (5,0)
Local da ferida Perna 12 (60,0)
2 (10,0)
Calcâneo 1 (5,0)
Dedo do pé 1 (5,0)
Mama 1 (5,0)
Braço 1 (5,0)
Abdómen 1 (5,0)
Sacro 1 (5,0)
Presença de fatores de risco Dislipidemia 9 (45,0)
Obesidade 9 (45,0)
Tabagismo 6 (30,0)
Insuficiência Renal Crónica 1 (5,0)
Imunodepressão 1 (5,0)
Insuficiência Renal Aguda 1 (5,0)
Presença de comorbilidades Hipertensão Arterial 12 (60,0)
Insuficiência Cardíaca Congestiva 8 (45,0)
Diabetes 7 (35,0)
Depressão 3 (15,0)
AVC/AIT 2 (10,0)
Polineuropatia 2 (10,0)
Trombose venosa profunda 2 (10,0)
Artrite Reumatóide 1 (5,0)
Asma 1 (5,0)
Doença arterial periférica 1 (5,0)
Linfoma 1 (5,0)
Lupus 1 (5,0)
Neoplasia da mama 1 (5,0)

Quanto à caracterização sociodemográfica e clínica dos participantes em função do estado de cicatrização nenhuma das variáveis (género, presença de comorbilidades, presença de fatores de risco e tipo de feridas) mostrou estar relacionada com a cicatrização (p>0,05) (Tabela 2).

Tabela 2 Características sociodemográficas e clínicas dos participantes em função do estado de cicatrização. 

Cicatrização Variáveis Sim Não Total X 2 p
n (13) % (65) n (7) % (35) n (20) % (100)
Género
Masculino 6 30 3 15 9 45 0,02 1,0
Feminino 7 35 4 20 11 55
Presença de comorbilidades
Sim 12 60 7 35 19 95 0,56 1,0
Não 1 5 0 0 1 5
Presença de fatores de risco
Sim 7 35 13 65 20 100 N/A N/A
Tipo de feridas
Cirúrgica 6 30 1 5 7 35 5,97 0,22
Úlcera Mista 2 10 4 20 6 30
Úlcera de Pressão 2 10 2 10 4 20
Úlcera Varicosa 2 10 0 0 2 10
Queimadura 1 5 0 0 1 5

Quanto à restante caracterização clínica dos participantes (idade, dor e estado de cicatrização inicial), verificamos que a idade não está relacionada com a cicatrização (p=0,6). Contudo, a dor inicial e o estado de cicatrização inicial estão relacionados com a cicatrização significativamente (p=0,02; p=0,03 respetivamente) (Tabela 3).

Tabela 3 Características clínicas dos participantes em função do estado de cicatrização. 

Variáveis Cicatrizou Não cicatrizou U Mann-Whitney p
n Ord. Médias n Ord. Médias
Idade 13 10 7 11,43 39 0,60
Dor Inicial 13 8,42 7 14,36 18,5 0,02*
Estado de cicatrização inicial 13 8,5 7 14,21 19,5 0,03*

Nota: * Estatisticamente significativo.

Por outras palavras, um estado de cicatrização mais agravado e níveis mais elevados de dor inicial estão associados à não cicatrização.

Em relação à evolução temporal da cicatrização das feridas e dos níveis de dor (início, 1.º mês, 2.º mês e 3.º mês) é possível observar uma redução gradual dos valores, o que se traduz numa melhoria significativa de cicatrização e redução da dor (Tabela 4).

Tabela 4 Estado de cicatrização e dor em função do tempo. 

Nota: * Estatisticamente significativo.

É ainda possível verificar que existem diferenças significativas entre todos os momentos com exceção do 2.º e 3.º mês de tratamento (C VS D; p>0,05). Por fim, verificou-se que em 35% (n=7) dos casos não ocorreu cicatrização, apesar da redução da pontuação da escala PUSH e da dor (escala EVA).

3. Discussão

Este estudo teve por base uma amostra pequena e heterogénea no que concerne à idade, histórico clínico (comorbilidades e fatores de risco), o tipo e local de feridas a tratar, pelo facto de não ter existido “controlo” da medicação habitual dos participantes (como por exemplo a analgesia), assim como a forma e a tipologia de aplicação de ozono variar em função da etiologia e da fase de cicatrização/ evolução da ferida, motivos estes que se apresentam como sérias limitações metodológicas. Não obstante a esta diversidade, verificou-se uma tendência de melhoria da cicatrização e redução da dor dos participantes. De salientar que durante todo o período de estudo não ocorreram interrupções do tratamento em nenhum dos participantes e não foram registadas quaisquer complicações associadas ao procedimento no referente a efeitos adversos.

Os períodos e extensão dos tratamentos variaram consoante as necessidades e disponibilidade dos participantes, sendo influenciados também pela gravidade da ferida. Normalmente, os tratamentos iniciavam-se com uma periodicidade de 3 em 3 dias, evoluindo para um tratamento semanal. Esta periodicidade é devida ao fato de que contrariamente a outros procedimentos no tratamento de feridas ou adjuvantes da cicatrização, a utilização da ozonoterapia permite uma calendarização mais leve e menos rigorosa, o que permite uma maior flexibilidade e disponibilidade (Iorio et al., 2012).

Os resultados deste estudo mostram que a utilização de ozono no tratamento de feridas promove, em certa extensão, um complemento a outras terapias de cicatrização, com um vasto potencial de aplicação, quer no tipo de ferida, quer na sua localização (Liu et al., 2015). Ainda que não tenhamos avaliado a eficácia da ozonoterapia propriamente dita é de referir que algumas das feridas eram complexas e que previamente já tinham sido alvo de outras terapêuticas sem sucesso cicatricial. Também outros estudos realizados na cicatrização de feridas e recorrendo à ozonoterapia, demonstraram que o ozono em aplicações para a cicatrização e para o alívio da dor, têm um potencial a ser considerado (Marchesini et al., 2020; Shah et al., 2011).

A ozonoterapia tópica pode ser usada como terapia adjuvante às terapias convencionais, por exemplo no caso do tratamento de úlceras venosas, resultando em ganhos para a saúde da pessoa, de que são caso as taxas de cicatrização e o controlo de infeção da ferida, bem como ganhos económicos, dos quais se destacam menor número de tratamentos, menos complicações, menos deslocações aos serviços de saúde, culminando num menor absentismo às obrigações laborais e portanto maior produtividade (Esteves, 2017).

Ainda assim é de referir que uma das limitações à aplicação desta terapia é o facto de ser um tratamento não comparticipado pelos subsistemas de saúde em Portugal, embora, este tipo de tratamento esteja regulamentado (Portaria n.º 163/2013).

O estudo contínuo dos efeitos e capacidades da ozonoterapia poderão tornar possível o acesso desta terapia a uma população mais abrangente num futuro próximo, podendo ser considerada uma terapia de eleição. Para isso, é necessário que as entidades governamentais num contexto local e nacional valorizem esta área e promovam o conhecimento do seu potencial, facilitando, inclusive, o seu financiamento e recomendação (Santos, 2016).

Conclusões

A viabilidade de uma terapia para feridas agudas e crónicas está dependente de diversos fatores como o custo, a predisposição da pessoa para realizar a terapia, a comparticipação por parte dos subsistemas de saúde e a própria disponibilidade de informação e formação dos profissionais de saúde relativamente a uma técnica em específico. O presente estudo permitiu concluir que a prática da ozonoterapia melhorou a cicatrização das feridas e reduziu os níveis de dor associados.

Em termos de implicações para a prática clínica, estes resultados sugerem que a ozonoterapia pode ser utilizada como adjuvante na cicatrização de feridas e redução da dor.

Por fim e tendo por base as implicações para a investigação sugerimos a realização de mais estudos nacionais que permitam dados mais generalizados da população portuguesa e com amostras mais abrangentes. Estudos futuros devem ser realizados no âmbito da eficácia da ozonoterapia de forma independente a outras terapias, podendo ser uma alternativa determinante no tratamento de feridas e uma solução preferencial.

Agradecimentos

Os autores agradecem a contribuição dos participantes que integraram o estudo. De igual forma, agradecem o apoio da Escola Superior de Saúde de Viseu (ESSV) e da Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem (UICISA: E), acolhida pela Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC) e financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).

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Recebido: 02 de Agosto de 2021; Aceito: 31 de Agosto de 2021

Autor Correspondente Célia Mendes Beco do Casal nº 93- Morraçã Tentúgal 3140- 579 Coimbra - Portugal cemdmendes@gmail.com

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