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Revista de Enfermagem Referência

Print version ISSN 0874-0283On-line version ISSN 2182-2883

Rev. Enf. Ref. vol.serV no.5 Coimbra Mar. 2021  Epub May 18, 2021

https://doi.org/10.12707/rv20100 

Artigo de Investigação (Original)

Protocolo de intervenção individual baseado na terapia de estimulação cognitiva em idosos com perturbação neurocognitiva ligeira

Individual intervention protocol based on cognitive stimulation therapy for older adults with mild neurocognitive disorder

Protocolo de intervención individual basado en la estimulacíon cognitiva para ancianos con trastorno neurocognitivo leve

Susana Isabel Justo-Henriques1 
http://orcid.org/0000-0002-8872-4307

1 Cediara - Associação de Solidariedade Social de Ribeira de Fráguas, Aveiro, Portugal


Resumo

Enquadramento:

A estimulação cognitiva (EC) é uma das terapias não-farmacológicas (TNF) recomendadas e com melhores evidências na perturbação neurocognitiva ligeira (PNCL), permitindo estimular a neuroplasticidade e a reserva cognitiva, podendo atenuar a progressão do declínio cognitivo no idoso com PNCL.

Objetivo:

Apresentar detalhadamente a estrutura e o conteúdo de um protocolo de intervenção em idosos com PNCL, baseada na EC individual.

Metodologia:

Identificação das fases preliminares ao desenho do protocolo de intervenção.

Resultados:

Protocolo de intervenção individual baseado na EC, composto por esquema base de 6 sessões, com frequência bissemanal e com duração aproximada de 45 minutos por sessão, administrado por terapeutas treinados.

Conclusão:

O programa de EC individual pormenorizado facilita a sua implementação e disseminação, podendo ter implicações relevantes na prática clínica e na investigação da PNCL.

Palavras-chave: demência; idoso; desenvolvimento de programas; disfunção cognitiva; estimulação cognitiva; depressão

Abstract

Background:

Cognitive stimulation (CS) is one of the recommended non-pharmacological therapies (NPTs) with the best evidence base for mild neurocognitive disorder (mNCD). It stimulates neuroplasticity and cognitive reserve and can reduce the progression of cognitive decline in older adults with mNCD.

Objective:

To describe the structure and content of an individual CS intervention protocol for older adults with mNCD.

Methodology:

Identification of the stages preceding the design of the intervention protocol.

Results:

Individual CS therapy intervention protocol, consisting of a program implemented by trained therapists with six sessions, twice a week, each lasting around 45 minutes.

Conclusion:

The detailed individual CS protocol facilitates its implementation and dissemination and can have significant implications for clinical practice and research on mNCD.

Keywords: dementia; aged; program development; cognitive dysfunction; cognitive stimulation; depression

Resumen

Marco contextual:

La estimulación cognitiva (EC) es una de las terapias no farmacológicas (TNF) recomendadas y con mejores evidencias en el trastorno neurocognitivo leve (TNL), lo que permite estimular la neuroplasticidad y la reserva cognitiva y puede atenuar la progresión del deterioro cognitivo en los ancianos con PNCL.

Objetivo:

Presentar detalladamente la estructura y el contenido de un protocolo de intervención en ancianos con TNL, basado en la EC individual.

Metodología:

Identificación de las fases preliminares al diseñar el protocolo de intervención.

Resultados:

Protocolo de intervención individual basado en la EC, compuesto por un esquema básico de 6 sesiones, quincenales y con una duración aproximada de 45 minutos por sesión, administrado por terapeutas formados.

Conclusión:

El programa individual detallado de EC facilita su aplicación y difusión, y puede tener implicaciones relevantes para la práctica clínica y la investigación del TNL.

Palabras clave: demencia; anciano; desarrollo de programa; disfunción cognitiva; estimulación cognitiva; depresión

Introdução

A falta de apresentação de protocolos para a intervenção com idosos com perturbação neurocognitiva ligeira (PNCL), suficientemente detalhados e ajustados à cultura portuguesa, é uma limitação comum das investigações baseadas em terapias não-farmacológicas (TNF) que sugerem efeitos positivos nos idosos com a doença.

Um protocolo de intervenção individual com base na terapia da estimulação cognitiva (EC) de média e longa duração, pode melhorar a funcionalidade cognitiva e reduzir a sintomatologia depressiva na população-alvo.

O objetivo deste artigo é apresentar de forma pormenorizada um protocolo de intervenção individual baseado na EC, desenvolvido para a população idosa com PNCL a frequentar respostas na área da terceira idade em Portugal (p. ex., estruturas residenciais para idosos [ERPI&”93;, centro de dia), passível de ser facilmente compreendido, adaptado e administrado pelos terapeutas (p. ex., psicólogos, outros profissionais habilitados).

Enquadramento

Assistimos a um envelhecimento da população sem precedentes. Segundo o Instituto Nacional de Estatística - INE (2018, 2019) a população residente em Portugal era composta por 21,5% de pessoas com 65 ou mais anos, sendo o quarto país da União Europeia com maior percentagem de idosos, a qual se estima que continuará a aumentar nas próximas décadas e que em 2080 possa representar 37,2% da população residente no país.

Um dos novos desafios na área da saúde mental decorrentes do envelhecimento é a perturbação neurocognitiva (PNC), um dos problemas mais comuns em pessoas com 65 ou mais anos (Organização Mundial da Saúde &”91;OMS], 2017a). A condição clínica inicial e menos grave da mesma é a PNCL, a qual é definida por evidências de um declínio cognitivo modesto em relação a um nível prévio de desempenho do participante em um ou mais domínios cognitivos (p. ex., atenção complexa, funções executivas, aprendizagem e memória, linguagem, capacidade percetivomotora ou cognição social), mas sem interferência na sua capacidade de independência nas atividades da vida diária, que, apesar de preservadas, poderão exigir um maior esforço, utilizando estratégias de compensação ou de ajustamento (American Psychiatric Association [APA], 2013). Os dados apontam que sofrer de uma PNCL, aumenta a probabilidade de desenvolver uma perturbação neurocognitiva major (PNCM), registando-se entre 3% e 13% de casos em cada ano (OMS, 2017b).

Uma das intervenções recomendadas em casos de PNC é a EC, a qual compreende várias atividades e exercícios dirigidos a melhorar o funcionamento cognitivo e social (Clare & Woods, 2004). Além de usada como complemento à terapia farmacológica, a EC é uma abordagem usada a nível global para intervir nas alterações de memória e outros declínios cognitivos de pessoas com PNC. Está indicada para os declínios de domínios cognitivos (p. ex., memória, atenção, linguagem, funções executivas) que surgem nos estádios ligeiros, moderados e moderadamente graves, tendo como propósito manter o desempenho dos domínios cognitivos. Os programas de EC contam com demonstrada eficácia na intervenção em participantes com PNC, independentemente do efeito da medicação (Woods et al., 2012).

Concretamente, as revisões sistemáticas sobre a eficácia da EC (McDermott et al., 2019; Woods et al., 2012), após a intervenção, encontraram um benefício significativo, de forma consistente, na função cognitiva e que se manteve nos 3 meses seguintes, estando estes efeitos acima de qualquer efeito de medicação anticolinérgica. Observaram também benefícios significativos na qualidade de vida e no bem-estar, na comunicação pessoal e na interação social.

A terapia de orientação para a realidade (TOR) foi também associada a melhorias significativas na cognição, consistindo na apresentação e repetição de informação temporal e espacial ao longo do dia ou em sessões regulares de atividades relacionadas com a orientação (Hsiao-Yean et al., 2018).

Considerando a existência da reserva cognitiva e plasticidade neuronal em pessoas idosas, existem evidências que sugerem que a EC produz benefícios cognitivos em pessoas com PNCL, impedindo ou atrasando a progressão para uma PNCM (Justo-Henriques et al., 2019; Woods et al., 2012).

Quanto mais cedo se iniciarem estas intervenções maior será a probabilidade de se manterem as funções cognitivas (Vernooij-Dassen et al., 2010), diminuindo o impacto ao nível dos custos económicos associados à demência e na qualidade de vida das pessoas diagnosticadas e respetivas famílias (Nickel et al., 2018).

Contudo, uma limitação comum na maioria das investigações sobre TNF é referente ao facto de não se descreverem detalhadamente os protocolos de intervenção que permitam a sua implementação (Orrell et al., 2017). Considerando esta limitação e as evidências dos benefícios da TOR e da EC, foi desenvolvido o protocolo apresentado neste artigo, que consistiu em combinar os benefícios das duas terapias, destinado a melhorar a cognição e a diminuir a sintomatologia depressiva em pessoas com PNC.

O protocolo descrito neste artigo foi aplicado num estudo piloto, com desenho pré-teste - pós-teste com grupo controlo não equivalente, onde foram comparados um grupo de participantes que recebeu o programa de intervenção de EC de longa duração em formato individual (grupo de intervenção) com outro que não recebeu a intervenção (grupo controlo), mas sem aleatorização dos participantes aos grupos de intervenção e controlo. A amostragem (n = 30) foi do tipo não probabilística, selecionada por conveniência. Os utentes de uma instituição de apoio à terceira idade foram selecionados sucessivamente e atribuídos ao grupo de intervenção (n = 15), enquanto que as pessoas da comunidade com a mesma proveniência geográfica e emparelhadas de acordo com os anteriores em termos de sexo, idade, nível educativo, subtipo etiológico e pontuação no estado cognitivo, identificados com a colaboração da junta de freguesia e do centro de saúde local, foram atribuídas ao grupo controlo (n = 15). As 88 sessões de intervenção, com uma periodicidade bissemanal, basearam-se no presente protocolo, estandardizado num manual detalhado e nos princípios da EC, as quais foram dirigidas por terapeutas previamente treinados. Os resultados evidenciaram um efeito significativo na funcionalidade cognitiva e na sintomatologia depressiva. Verificou-se ainda uma elevada adesão à intervenção, um elevado grau de colaboração durante a intervenção e uma baixa taxa de desistências (Justo-Henriques et al., 2019).

Este protocolo foi aplicado em outro estudo, também com desenho pré-teste - pós-teste com grupo controlo não equivalente e com uma amostra semelhante (p. ex., características sociodemográficas, subtipo etiológico, proveniência geográfica), para confirmar a eficácia do programa de intervenção. A amostra foi constituída por 82 participantes, 41 atribuídos ao grupo de intervenção e 41 atribuídos ao grupo controlo. Foram administradas o mesmo número de sessões, periodicidade e estrutura. Os resultados confirmaram o efeito significativo sobre a funcionalidade cognitiva e sintomatologia depressiva. Em relação aos subtipos etiológicos da PNCL, verificou-se que a doença de Alzheimer foi a mais prevalente. A percentagem de desistências foi baixa, a adesão à intervenção foi elevada, verificou-se um elevado grau de colaboração por parte dos participantes nas sessões realizadas (Justo-Henriques et al., in press).

Questão de Investigação

Que estrutura e conteúdos apresenta o programa de EC individual desenvolvido para idosos com PNCL?

Metodologia

O desenvolvimento do protocolo de intervenção teve uma progressão contínua e sustentada em quatro fases.

A primeira fase baseou-se na revisão da literatura científica relativa à EC, nomeadamente identificar os formatos mais estudados (p. ex., individual, grupo) e respetivos efeitos sobre a cognição, quais as características dos materiais e/ou atividades de suporte, e características dos participantes (p. ex., idades, género, subtipos etiológicos). Foi selecionado para adaptação o programa Making a Difference de Spector et al. (2006), considerado o mais influente nas revisões teóricas. Verificou-se que a EC apresentava evidências encorajadoras para a construção da fase seguinte.

Na segunda fase, foi realizada uma pesquisa de materiais adaptados para a cultura portuguesa (p. ex., imagens, palavras, factos históricos do conhecimento geral) e com conteúdos relacionados com o quotidiano dos idosos, de forma a estimular os diferentes domínios cognitivos. Foram selecionados dois materiais existentes que reuniam os princípios associados à EC. Verificou-se a necessidade de desenvolver materiais complementares associados à TOR.

Na terceira fase, definiu-se a estrutura e o conteúdo das sessões, com o recurso aos materiais selecionados. Foi estabelecido um formato individual, o qual foi considerado mais apropriado para os objetivos terapêuticos, adequado às necessidades, preferências, referências e ao ritmo do participante. Foram definidas estratégias para reduzir possíveis perdas de participantes, entre as quais, as recomendadas por Grady, et al. (2008). Foram estabelecidos como critérios de inclusão: apresentar uma PNCL, de acordo com os critérios do DSM-5 (APA, 2013) e determinado por um psiquiatra ou psicólogo clínico, apresentar uma pontuação entre 18 e 26 no Mini-Mental State Examination (MMSE) e ter 65 ou mais anos. Como critérios de exclusão: apresentar incapacidade para comunicar ou défice auditivo grave, ter recebido apoio psicológico ou psiquiátrico nos 60 dias anteriores ao início da primeira sessão, estar a participar em outro estudo. Seguidamente, foram convidados a participar nas sessões 10 idosos com PNCL de forma voluntária sem qualquer tipo de benefício económico. Todos os participantes forneceram consentimento informado por escrito. As sessões de EC foram administradas por dois terapeutas, treinados com os princípios da EC e com formação prévia nos procedimentos do protocolo. Os terapeutas partilharam sessões e distribuíram os participantes mediante cronograma prévio. Foram realizadas seis sessões, com periodicidade bissemanal e com uma duração aproximada de 45 minutos. No final de cada sessão, o terapeuta preenchia a respetiva ficha de registo de sessão, com o objetivo de avaliar o grau de aceitabilidade ao material selecionado e o grau de colaboração dos participantes nas sessões. No global, verificou-se que a adesão e aceitabilidade à intervenção foi boa, sendo relevante para a revisão prevista na última fase.

A quarta fase, com base no diagnóstico elaborado por cada terapeuta e na análise swot, consistiu na revisão dos tempos da estrutura da sessão, nomeadamente a duração da atividade principal, realização de melhorias nos materiais complementares. Foram ainda realizadas manutenções nas condições do espaço onde decorriam as sessões, salvaguardando a acessibilidade e o conforto.

Este estudo foi conduzido de acordo com a última revisão da Declaração de Helsínquia (2013) e obteve aprovação da comissão de bioética da Universidade de Santiago de Compostela.

Resultados

O protocolo de intervenção é composto por um esquema base numa série de seis sessões, repetível, com uma periodicidade bissemanal e uma duração aproximada de 45 minutos cada sessão. As sessões seguintes seguem a mesma ordem. Todas as sessões obedecem à mesma estrutura (Tabela 1). Os primeiros 5 minutos destinam-se a fazer o acolhimento do participante, os seguintes 10 minutos são dedicados a trabalhar a orientação para a realidade, onde o participante é incentivado a preencher as informações relativas à data e ao tempo atual através do quadro temporal. Seguidamente, durante aproximadamente 25 minutos são treinados os domínios cognitivos, com o recurso a materiais de EC, nomeadamente Roletas da Memória©, compostas por atividades de língua portuguesa, de matemática e de atividades da vida diária, e Bingos Seniores©, que inclui o bingo da fruta, o bingo da viagem ao passado e o bingo dos sons I. Os últimos 5 minutos de cada sessão são dedicados ao retorno à calma, com um breve diálogo sobre as dificuldades, interesses e benefícios da sessão. Por último, é realizada a despedida e o participante é recordado da data e hora da próxima sessão. Após concluir a sessão, o terapeuta preenche a ficha de avaliação da mesma.

Tabela 1: Estrutura base do programa individual de estimulação cognitiva 

As sessões de intervenção têm formato individual e devem ser conduzidas por terapeutas com treino prévio no protocolo de intervenção e nos princípios da terapia de EC. As atividades realizadas em cada sessão seguem os conteúdos do programa de EC (Tabela 3). O conteúdo do programa de intervenção, com recurso a atividades em suporte de papel (p. ex., cartões de letras, números e imagens) e digital (p. ex., sons), está organizado nas temáticas associadas nomeadamente à língua portuguesa, matemática e atividades da vida diária.

As sessões devem ser realizadas num local confortável, acessível, privado e que permita que as atividades decorram sem interrupções (Justo-Henriques et al., 2020).

Ao longo da intervenção, devem seguir-se os princípios de aplicação da terapia de EC, formulados por Spector et al. (2006; Tabela 2).

Tabela 2: Princípios de aplicação da terapia de estimulação cognitiva 

Nota. Adaptado de “Making a difference: An evidence-based group programme to offer cognitive stimulation therapy (CST) to people with dementia” de Sector et al., 2006.

No início de cada sessão, o terapeuta deve saudar o participante, orientar para o insight e transmitir os objetivos da sessão. Posteriormente, recorrendo a um quadro de orientação temporal (incluir: dia da semana, mês, dia do mês, ano, estação e época do ano, estado do tempo e relógio), realizar o treino de orientação para a realidade, i.e, preencher o quadro referentes aos aspetos temporais e abordar os elementos espaciais (Tabela 1).

Seguidamente, e de acordo com a temática definida para a respetiva sessão (Tabela 3), o terapeuta desenvolve a atividade principal de estimulação de vários domínios cognitivos. Concretamente, através da temática de língua portuguesa, estimula-se por exemplo, a atenção, a linguagem, a memória de curto prazo e a memória semântica. Através da temática de matemática, estimula-se por exemplo, o raciocínio, o cálculo, as funções executivas. Mediante a temática das atividades da vida diária, estimula-se por exemplo, a atenção, a memória declarativa, a linguagem. Com recurso à temática associada à fruta, estimula-se por exemplo, a memória de curto prazo e a memória semântica. Relativamente à atividade focada na reminiscência, história da viagem ao passado, estimula-se a memória episódica. Por fim, com o recurso aos sons e aos respetivos cartões, permitem o treino da memória sensorial e declarativa, as gnosias, a atenção e a coordenação óculo-manual. Além de apresentar e explicar os pressupostos da atividade, o terapeuta ensina, aos participantes, estratégias e técnicas de processamento da informação (p. ex., estratégias mnemónicas para melhorar a sua capacidade de armazenamento, estratégias de aprendizagem organizada e estratégias de síntese).

Tabela 3: Conteúdos das atividades, objetivos e materiais das sessões do programa de intervenção 

Nota. RL = Roletas da Memória©; BS = Bingos Seniores©.

No final de cada sessão, deve ser questionada a opinião do participante acerca da mesma e referir a temática, data e hora da sessão seguinte.

Discussão

O desenvolvimento da PNCM é clinicamente silencioso. Estima-se que a progressão da PNCL dure 7 anos (National Institute on Aging, 2019) e passam ainda mais anos até que as capacidades cognitivas diminuam para um grau funcionalmente incapacitante como a PNCM (Caselli & Reiman, 2013).

A intervenção individual está associada a melhores resultados, na medida em que potencia o acesso à mesma, facilita um contacto mais próximo com o participante e recorre a atividades personalizadas, as quais tendem a aumentar a sua adesão à intervenção. Promove uma relação terapêutica mais forte e o ritmo da intervenção ajustado ao participante, de acordo com uma abordagem de assistência centrada na pessoa como um indivíduo único (Justo-Henriques et al., 2020).

Além de um guia técnico para os terapeutas, a descrição detalhada de um protocolo de intervenção poderá reduzir a relevância da heterogeneidade dos participantes e das instituições onde é implementado (Justo-Henriques et al., 2020).

O material utilizado na terapia de EC está adaptado às características do participante (i.e., idoso com declínio cognitivo) e é usado em atividades para treino de vários domínios cognitivos (p. ex., atenção, memória, linguagem).

Com base nos princípios da terapia de EC e da TOR, foi desenvolvido um programa de intervenção individual dirigido para idosos com diagnóstico de PNCL que se encontram a frequentar respostas na área da terceira idade em instituições portuguesas (p. ex., ERPI, centro de dia, serviço de apoio domiciliário [SAD]. A literatura demonstra que as terapias mencionadas são benéficas nesta população, no que concerne à melhoria do funcionamento cognitivo e estado do humor (Clare & Woods, 2004).

O protocolo de intervenção individual é composto por seis sessões base, permitindo uma adaptação em relação à duração do programa (i.e, curta, média e longa duração), com uma periodicidade bissemanal e uma duração aproximada de 45 minutos. O principal objetivo deste programa, a ser aplicado pelos terapeutas das instituições de apoio a idosos, consiste na diminuição da progressão do declínio cognitivo, através da estimulação dos domínios cognitivos, obtendo assim benefícios não só ao nível cognitivo, mas também do humor, pois a depressão tem sido identificada como um fator de risco relacionado com o aparecimento de declínio cognitivo (Leyhe et al., 2017).

O facto de se tratar de um programa multicomponente, através da utilização de diferentes materiais, numa sequência repetível, facilita a reorganização neuronal estável para a manutenção a longo prazo da aprendizagem.

Apesar de contribuir para atenuar uma limitação recorrente da maioria das investigações e os resultados da sua aplicação tenham evidenciado um contributo significativo na função cognitiva e no humor dos participantes, nomeadamente em idosos com diagnóstico de provável doença de Alzheimer, é recomendável realizar novas investigações para avaliar a eficácia do protocolo intervenção em diferentes subtipos etiológicos, contextos geográficos e literacia. A aplicação do protocolo a idosos com uma condição cognitiva distinta (p. ex. idosos com declínio cognitivo moderado a grave) poderá carecer de ajustamento.

Conclusão

Os resultados sugerem um programa de intervenção individual com uma estrutura e conteúdos detalhados, facilitando a perceção e disseminação do mesmo.

Este programa de intervenção poderá ter implicações importantes na prática clínica e na investigação, sendo possível a sua implementação em instituições com respostas na área da terceira idade (p. ex., ERPI, centros de dia), podendo ainda constituir um ponto de partida para novos programas e estudos científicos (p. ex., a realização de um estudo multicêntrico de medidas repetidas, aleatório e controlado, com uma amostra maior e alargamento da cobertura geográfica; a realização de um estudo para avaliar a eficácia do programa de intervenção em formato de curta duração).

Referências bibliográficas

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7

Recebido: 28 de Junho de 2020; Aceito: 28 de Outubro de 2020

Conceptualização: Justo-Henriques, S. I.

Análise formal: Justo-Henriques, S. I.

Metodologia: Justo-Henriques, S. I.

Investigação: Justo-Henriques, S. I.

Redação: Justo-Henriques, S. I.

Autor de correspondência Susana Isabel Justo Henriques E-mail: susana.justo.henriques@gmail.com

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