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Revista de Enfermagem Referência

versão impressa ISSN 0874-0283versão On-line ISSN 2182-2883

Rev. Enf. Ref. vol.serVI no.1 supl.1 Coimbra dez. 2022  Epub 30-Jun-2022

https://doi.org/10.12707/rv21035 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)

Estilo de vida, características sociodemográficas, ocupacionais e dor em profissionais de enfermagem com lombalgia

Lifestyle, sociodemographic and occupational characteristics and pain in nursing professionals with low back pain

Estilo de vida, características sociodemográficas y ocupacionales y dolor en profesionales de enfermería con lombalgia

Maiara Helena Rusch1 
http://orcid.org/0000-0001-9484-704X

Patrik Nepomuceno1 
http://orcid.org/0000-0001-8753-6200

Polliana Radtke dos Santos1 
http://orcid.org/0000-0002-1721-4334

Hildegard Hedwig Pohl1 
http://orcid.org/0000-0002-7545-4862

1 Universidade de Santa Cruz do Sul, Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil


Resumo

Enquadramento:

A lombalgia é frequente em enfermeiros e técnicos de enfermagem, profissionais que exercem atividades ocupacionais distintas.

Objetivo:

Comparar estilo de vida, características sociodemográficas e ocupacionais e perceção de dor de enfermeiros e técnicos de enfermagem com dor lombar.

Metodologia:

Estudo transversal, quantitativo, descritivo e analítico. Atenderam aos critérios 53 profissionais atuantes no ambiente hospitalar. Estes responderam um questionário adaptado e o STarT Back Screening Tool (SBST-Brasil). A dor mensurou-se pela Escala Visual Analógica da Dor.

Resultados:

A amostra foi composta por profissionais do sexo feminino, sendo 81% técnicas de enfermagem e 19% enfermeiras. Quanto a caracterização sociodemográfica, observou-se diferença significativa para classe socioeconómica (p = 0,039). Também há diferença estatística para o turno de trabalho (p = 0,001) ao analisar a caracterização do trabalho a partir da categoria profissional.

Conclusão:

Apesar de exercerem funções laborais distintas, há diferença significativa somente para classe socioeconómica e turno de trabalho; as demais variáveis não se relacionaram com a categoria profissional. Essas informações são importantes para o desenvolvimento de novas estratégias para a prevenção da dor lombar.

Palavras-chave: condições de trabalho; dor lombar; estilo de vida; profissionais de enfermagem

Abstract

Background:

Low back pain is common among nurses and nursing technicians, although they perform different professional activities.

Objective:

To compare the lifestyle, the sociodemographic and occupational characteristics, and the pain perception of nurses and nursing technicians with low back pain.

Methodology:

Cross-sectional, quantitative, descriptive, and analytical study. Fifty-three professionals working in hospital settings met the criteria. These professionals answered an adapted questionnaire and the STarT Back Screening Tool (SBST-Brazil). Pain was measured by the Visual Analog Scale.

Results:

The sample consisted of 53 female professionals, of whom 81% were nursing technicians and 19% were nurses. Concerning the sociodemographic characteristics, a significant difference was found only for socioeconomic class (p = 0.039). The analysis of the work characteristics by professional category also revealed a statistical difference for the work shift (p = 0.001).

Conclusion:

Although nurses and nursing technicians have different professional activities, a significant difference was only found for socioeconomic class and work shift. The other variables were not associated with the professional category. These findings are essential to developing new strategies for preventing low back pain.

Keywords: working conditions; low back pain; life style; nurse practitioners

Resumen

Marco contextual:

La lumbalgia es frecuente en enfermeros y técnicos de enfermería, profesionales que realizan diferentes actividades laborales.

Objetivo:

Comparar el estilo de vida, las características sociodemográficas y laborales, y la percepción del dolor de enfermeros y técnicos de enfermería con dolor lumbar.

Metodología:

Estudio transversal, cuantitativo, descriptivo y analítico. Cumplían los criterios 53 profesionales que trabajan en el ámbito hospitalario. Estos respondieron a un cuestionario adaptado y al STarT Back Screening Tool (SBST-Brasil). El dolor se midió con la Escala Visual Analógica del Dolor.

Resultados:

La muestra estuvo compuesta por profesionales del sexo femenino, de entre las cuales el 81% fueron técnicas de enfermería y el 19% enfermeras. En cuanto a la caracterización sociodemográfica, se observó una diferencia significativa en la clase socioeconómica (p = 0,039). También hay una diferencia estadística en el turno de trabajo (p = 0,001) al analizar la caracterización del trabajo de la categoría profesional.

Conclusión:

Aunque tienen diferentes funciones laborales, hay una diferencia significativa solo para la clase socioeconómica y el turno de trabajo; las demás variables no se relacionaron con la categoría profesional. Esta información es importante para el desarrollo de nuevas estrategias de prevención del dolor lumbar.

Palabras clave: condiciones de trabajo; dolor de la región lumbar; estilo de vida; enfermeras practicantes

Introdução

A dor lombar ou lombalgia, é um sintoma frequente em grande parte da população mundial, afetando cerca de 60% a 80% dos adultos da população geral, pelo menos uma vez na vida (Nepomuceno et al., 2019). Além disso, a dor lombar é um dos distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho mais recorrentes, causando absenteísmos no trabalho e custos médicos elevados com o tratamento, sendo assim considerada um importante problema de saúde pública (Cargnin, Schneider, Vargas, & Schneider, 2019; Maciel Júnior et al., 2019).

A dor lombar é classificada como um distúrbio multifatorial, ou seja, diversos aspetos podem estar relacionados com o seu desenvolvimento, tais como fatores biomecânicos, psicossociais, biológicos e ocupacionais (Massuda et al., 2017). Ademais, a lombalgia também apresenta relação íntima com o perfil profissional.

Dentre os profissionais da saúde, a lombalgia é um sintoma comum, principalmente na enfermagem. Enfermeiros e técnicos de enfermagem são trabalhadores com grande risco de desenvolver dor lombar, sobretudo devido as sobrecargas laborais (Cargnin, Schneider, Vargas, & Schneider, 2019).

No entanto, apesar de enfermeiros e técnicos de enfermagem serem profissionais da mesma área, é importante ressaltar que estes exercem funções diferentes na sua rotina profissional; uma vez que estes profissionais convivem com cargas distintas, estando expostos a situações de diferentes riscos ocupacionais (Freire & Costa, 2016).

Assim, as especificidades quanto às cargas laborais e fatores organizacionais aos quais enfermeiros e técnicos de enfermagem estão sujeitos, podem comprometer a qualidade física e/ou mental (Souza et al., 2017; Cargnin, Schneider, Vargas, & Machado, 2019;Pires et al., 2020). Além dos fatores laborais, as condições socioeconómicas também podem estar relacionadas a presença de dor, o que interfere na qualidade de vida destes profissionais (Ribeiro et al., 2019).

Dessa forma, este estudo teve como objetivo comparar o estilo de vida, características sociodemográficas e de trabalho, bem como o nível e perceção de dor entre enfermeiras e técnicas de enfermagem com dor lombar.

Enquadramento

A dor lombar ou lombalgia é definida como uma sensação de algia localizada entre a margem inferior da 12ª costela e a linha glútea inferior (Cargnin, Schneider, Vargas, & Schneider, 2019). Dentre os fatores de risco para o seu desenvolvimento destacam-se fatores individuais, ou seja, o sexo, a idade, o índice de massa corporal (IMC), a qualidade e função muscular, as condições socioeconómicas e outras enfermidades, assim como, fatores profissionais, isto é, as movimentações e posturas inadequadas, a organização e execução laboral e o ambiente de trabalho inapropriado (Ribeiro et al., 2019).

Neste contexto, profissões que exigem carga física, associada a posturas inadequadas e movimentos repetitivos, podem causar dor, especialmente na região lombar, sendo essa uma condição clínica altamente prevalente que afeta ambos os sexos (Lima et al., 2020). Assim, devido as condições adversas de suas atividades e a exposição a diversas cargas que podem estar inter-relacionadas, a área da enfermagem tem sido foco de pesquisas, especialmente no nível hospitalar (Cargnin, Schneider, Vargas, & Machado, 2019).

De acordo com Ribeiro et al. (2019), as condições laborais relacionadas a equipa de enfermagem não são consideradas satisfatórias em diversos países do mundo, podendo se tornar um risco para o surgimento de doenças e sintomas de dor. Estas condições podem ser influenciadas por altas cargas de trabalho, remuneração inadequada, turno de trabalho e categoria profissional.

Vale destacar que a equipa de enfermagem pode ser dividida em três categorias: o enfermeiro, o técnico e o auxiliar de enfermagem, conforme Stolarski et al. (2009).

Além da assistência ao paciente, enfermeiros são responsáveis prioritariamente por desenvolver funções administrativas, de organização e desenvolvimento, que geram menor sobrecarga física, enquanto os técnicos de enfermagem atuam diretamente nas atividades de assistência ao paciente, o que causa maior impacto físico a esses profissionais (Stolarski et al., 2009; Freire & Costa, 2016).

Freire e Costa (2016) também apontam que no ambiente laboral, o número de enfermeiros é inferior ao de técnicos de enfermagem, dessa forma, estes profissionais podem ser expostos a diferentes exigências ocupacionais. Assim, é importante o entendimento específico de cada profissional sobre a sua função.

Questão de investigação

Existem diferenças entre as variáveis sociodemográficas e ocupacionais, estilo de vida e dor entre enfermeiras e técnicas de enfermagem com dor lombar?

Metodologia

Trata-se de um estudo transversal, quantitativo, descritivo e analítico, realizado com trabalhadores de um hospital universitário do Rio Grande do Sul, Brasil, no ano de 2019. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Santa Cruz do Sul, sob CAAE nº 99490918.4.0000.5343. O cálculo do tamanho da amostra foi realizado em calculadora online considerando 295 profissionais da enfermagem que atuam no turno diurno, com erro de amostra de 10% e nível de confiança de 95%, sendo necessário 52 participantes.

Participaram neste estudo 143 profissionais de enfermagem, os quais primeiramente foram submetidos a um questionário com critérios de inclusão e exclusão da pesquisa. Foram selecionados enfermeiros e técnicos de enfermagem que relatassem sintomas de dor lombar, de ambos os sexos, com idade entre 18 e 50 anos, que trabalhavam nos turnos da manhã e tarde, atuando em unidades abertas (enfermaria adulto e pediátrica, maternidade e ambulatório) e unidades fechadas (unidades de terapia intensiva adulto e neopediátrica, centros cirúrgicos e obstétricos). Aqueles que concordaram em participar na pesquisa assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Foram excluídos da pesquisa profissionais de enfermagem que: foram submetidos a intervenções cirúrgicas previas na coluna vertebral; estivessem em período de gestação; apresentassem diagnóstico de fibromialgia; manifestassem qualquer disfunção clínica que impossibilitasse sua participação no estudo; que sofreram amputação de qualquer membro; ou possuíam IMC ≥ 30 kg/m².

Dos 143 profissionais de enfermagem, 68 preencheram os critérios para a avaliação; destes, 15 não completaram as avaliações pelos motivos de: desistência do profissional; desligamento do funcionário do hospital; funcionários que entraram em férias ou foram afastados no período da coleta. Assim, um total de 53 profissionais de enfermagem finalizaram as avaliações.

Para verificação do estado nutricional, foram verificados o peso (quilograma) e a estatura (centímetros convertidos para metros) para o cálculo do IMC, no qual se dividiu o peso pela estatura ao quadrado para classificar essa variável, foram considerados baixo peso: <18,5 kg/m2, faixa recomendada: 18,5-24,9 kg/m2, sobrepeso: 25-29,9 kg/m2, e obesidade: ≥30 kg/m2 (World Health Organization, 2000).

A avaliação socioeconómica e de estilo de vida foi realizada por meio do Questionário Saúde do Trabalhador e Estilo de Vida, adaptado, constituído por 21 questões referentes a dados de identificação, indicadores económicos, organização diária, atividade física e indicadores de esporte e saúde, sendo este questionário validado para a população em estudo (Pohl et al., 2010), a classificação socioeconómica foi avaliada seguindo o Critério de Classificação Econômica do Brasil da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa, tal instrumento conta com um questionário que pontua de 0 a 100, sendo que quanto maior a pontuação, melhor o nível socioeconómico, após foi feita a classificação em Classe A e B (de 29 a 100 pontos; renda média maior ou igual a 5 salários mínimos) e C e D (de 0 a 28 pontos; renda média inferior a 5 salários mínimos). Os sujeitos da pesquisa também responderam ao questionário STarT Back Screening Tool (SBST- Brasil), que se refere ao risco de mau prognóstico no tratamento primário da lombalgia (Pilz et al., 2014). O questionário é composto por 9 questões, sendo que nas primeiras oito há duas opções de resposta concordo e discordo, a primeira resposta vale um ponto e a segunda zero e no nono item há as opções nada, pouco, moderada, muito e extremamente, em que as três primeiras pontuam zero e as duas últimas um ponto cada. Após a soma dos pontos, o escore de zero a três é classificado como baixo risco. Para um resultado maior que três na pontuação total, consideram-se os pontos da subescala psicossocial (questões 5 a 9), em que a pontuação igual ou menor que três é considerado como médio risco, e se for maior que três classifica-se como alto risco (Pilz et al., 2014).

A intensidade da dor dos profissionais de enfermagem também foi aferida. Para isso, utilizou-se a Escala Visual Analógica da Dor (EVA), que consiste em níveis de zero a dez, sendo que zero significa ausência total de dor e dez o nível de dor máxima vivenciada pelo indivíduo (Martinez et al., 2011). Sendo assim, ao aplicar a EVA, os profissionais de enfermagem autorreferiram sua perceção de dor na região lombar no momento da avaliação.

Os dados foram analisados através do programa IBM SPSS Statistics for Windows (versão 23.0). As variáveis categóricas foram expressas em frequência e percentual e as variáveis contínuas em média e desvio-padrão ou mediana e intervalo interquartil. A amostra foi dividida em dois grupos a partir da categoria profissional: enfermeiros e técnicos de enfermagem. Para a comparação de grupos foi realizado o teste Qui-quadrado de Pearson ou teste Exato de Fisher (variáveis categóricas) e teste de Shapiro-Wilk para verificar a normalidade dos dados; a comparação de variáveis numéricas foi realizada através do teste U de Mann-Whitney ou teste t de Student para amostras independentes; considerando p <0,05.

Resultados

A amostra deste estudo foi composta por 53 profissionais de enfermagem do sexo feminino, dos quais 81% eram técnicas de enfermagem e 19% enfermeiras. A média de idade foi de 32,2 anos entre as técnicas de enfermagem e 32,6 anos entre as enfermeiras. Ao analisar as características sociodemográficas por categoria de trabalho, não se observou diferença estatística para idade (p = 0,690), estado civil (p = 1,000) e presença de filhos (p = 0,318). No entanto, ao comparar a classe socieconômica, verificou-se que 58% técnicas de enfermagem pertencem a classe C e D, enquanto 80% enfermeiras pertencem a classe socioeconómica A e B, apresentando diferença estatística (p = 0,039; Tabela 1).

Tabela 1: Caracterização sociodemográfica das trabalhadoras a partir da categoria profissional 

Variáveis Técnicas de Enfermagem n = 43 n (%) Enfermeiras n = 10 n (%) p
Sexo
Feminino 43 (81) 10 (19) -
Idade† 32 (16) 33 (14) 0,690b
Classe Socioeconômica
A e B 18 (42) 8 (80) 0,039a
C e D 25 (58) 2 (20)
Estado Civil
Solteiro 30 (70) 7 (70) 1,000a
Casado 13 (30) 3 (30)
Filhos
Sim 21 (49) 3 (30) 0,318a
Não 22 (51) 7 (70)

Nota. n = Frequência absoluta; % = Frequência relativa; † = Mediana e intervalo interquartil. aTeste Exato de Fisher; bteste U de Mann-Whitney; p = nível de significância estatística.

Nas características de estilo de vida a partir da categoria profissional, nenhuma variável apresentou diferença estatística (p < 0,05); porém, há variáveis importantes a serem destacadas, como o número elevado tanto de técnicas de enfermagem (74%), como enfermeiras (60%) não praticantes de atividade física, bem como o alto percentual de uso de medicamentos por ambas categorias (74% das técnicas de enfermagem e 60% das enfermeiras), sendo predominante o uso de anticoncecional (60,5%), seguido de antidepressivos (18,5%), anti-hipertensivos (7,9), suplemento vitamínico (7,9), tireoidianos (2,6%) e analgésico (2,6%). Além disso, pode-se observar que grande parte das técnicas de enfermagem (81%) e enfermeiras (80%) não apresentam distúrbios de sono. Em relação à jornada doméstica de trabalho, ao comparar os dois grupos, observa-se que a maioria das técnicas de enfermagem (56%) possui uma jornada doméstica maior que duas horas diárias enquanto a maioria das enfermeiras (70%) possui uma jornada doméstica menor que 2 horas (Tabela 2).

Tabela 2: Caracterização do estilo de vida a partir da categoria profissional 

Variáveis Técnicas de Enfermagem n = 43 n (%) Enfermeiras n = 10 n (%) p
Atividade física
Sim 11 (26) 4 (40) 0,442a
Não 32 (74) 6 (60)
Horas de sono
<7 horas 21 (49) 6 (60) 0,728a
≥7 horas 22 (51) 4 (40)
Distúrbio de sono
Sim 8 (19) 2 (20) 1,000a
Não 35 (81) 8 (80)
Jornada doméstica de trabalho
<2 horas 19 (44) 7 (70) 0,175a
≥2 horas 24 (56) 3 (30)
Tabagismo
Sim 3 (7) 1 (10) 1,000a
Não 40 (93) 9 (90)
Consumo de bebida alcoólica
Frequentemente 10 (23) 3 (30) 0,063b
Raramente 17 (40) 7 (70)
Nenhuma 16 (37) -
Medicamento
Sim 32 (74) 6 (60) 0,442a
Não 11 (26) 4 (40)

Nota. n = frequência absoluta; % = frequência relativa. aTeste Exato de Fisher; b: Teste Qui-quadrado de Pearson; p = nível de significância estatística.

Acerca das características de trabalho, a partir da categoria profissional, observou-se que apenas a variável turno de trabalho apresentou diferença estatística (p < 0,05), na qual 47% das técnicas de enfermagem atuam pela manhã, 51% pela tarde e 2% em ambos turnos, enquanto 30% das enfermeiras trabalham no turno da manhã, 30% no turno da tarde e 40% nos dois turnos. Apesar de as outras variáveis não apresentarem diferença estatística, foi possível verificar que, quanto à postura predominante no trabalho, 60% das técnicas de enfermagem trabalham em pé e 40% sentada e alternada, já as enfermeiras, 40% exercem as suas atividades em pé e 60% sentada e alternada (Tabela 3)

Tabela 3: Caracterização ocupacional a partir da categoria profissional 

Variáveis Técnicas de Enfermagem n = 43 n (%) Enfermeiras n = 10 n (%) p
Turno de Trabalho
Manhã 20 (47) 3 (30)
Tarde 22 (51) 3 (30) 0,001a
Manhã e Tarde 1 (2) 4 (40)
Unidade de trabalho
Aberta 25 (58) 6 (60) 1,000b
Fechada 19 (42) 4 (40)
Tempo de atividade (meses) † 48 (60) 104 (171,5) 0,250c
Outra atividade remunerada‡
Sim 10 (24) 1 (10) 0,668b
Não 32 (76) 9 (90)
Postura predominante no trabalho
Em pé 26 (60) 4 (40) 0,300b
Sentada e alternada 17 (40) 6 (60)
Como se sente após um dia de trabalho
Muito bem/Bem 9 (21) 2 (20)
Um pouco cansada 20 (46) 4 (40) 0,900a
Muito cansada/exausta 14 (33) 4 (40)

Nota. n = frequência absoluta; % = frequência relativa. † Mediana e intervalo interquartil; aTeste do Qui-quadrado de Pearson; bTeste de Fisher; cTeste U de Mann-Whitney; ‡ 1 missing; p = nível de significância estatística.

Ao analisar-se a diferença entre os grupos quanto ao SBST-Brasil, IMC e perceção de dor, nenhuma variável apresentou diferença estatística. Entretanto, notou-se que 60% das técnicas de enfermagem apresentaram risco baixo na classificação do SBST, 33% risco médio e 3% risco alto; das enfermeiras 90% apresentou risco baixo e 10% risco médio. Quanto a classificação do IMC, 60% das técnicas de enfermagem apresentam excesso de peso, enquanto 70% das enfermeiras apresentam peso normal. Em relação a EVA, a maioria das técnicas de enfermagem (56%) e enfermeiras (70%) referiram EVA <5 (Tabela 4).

Tabela 4: Comparação entre os grupos quanto ao SBST-Brasil, IMC e dor 

Variáveis Técnicas de Enfermagem n = 43 n (%) Enfermeiras n = 10 n (%) p
Pontuação SBST‡ 3 (3) 2 (2) 0,339b
Classificação SBST
Risco Baixo 26 (60) 9 (90) 0,199a
Risco Médio 14 (33) 1 (10)
Risco Alto 3 (7) -
IMC em kg/m2 25,0 (2,8) 23,9 (2,5) 0,262c
Classificação IMC
Peso normal 17 (40) 7 (70) 0,156d
Excesso de Peso 26 (60) 3 (30)
EVA‡ 4 (4) 4 (4) 1,000b
Classificação EVA
< 5 24 (56) 7 (70) 0,494d
> 5 19 (44) 3 (30)

Nota. n = frequência absoluta; % = frequência relativa. † média e desvio padrão; ‡ mediana e intervalo interquartil; aTeste do Qui-quadrado de Pearson; bteste U de Mann-Whitney; cTeste t de Student para amostras independentes; dTeste Exato de Fisher; p = nível de significância estatística; SBST = STarT Back Screening Tool; IMC = Índice de Massa Corporal; EVA = Escala Analógica Visual da Dor.

Discussão

Neste estudo todas as profissionais da equipa de enfermagem eram do sexo feminino, entre as quais prevaleceu o número de técnicas de enfermagem, como no estudo de Pires et al. (2020), realizado com profissionais de enfermagem, no qual foi observado prevalência do sexo feminino, bem como, predominância de técnicas de enfermagem em relação às enfermeiras. Em relação ao prevalecimento a do sexo feminino, Santos et al. (2017), explicam que apesar de estarem ocorrendo mudanças neste cenário, a feminilização ainda é uma característica forte entre os profissionais de saúde, uma vez que mais de 90% das vagas são ocupadas por mulheres.

O perfil socioeconómico encontrado no presente estudo vai de acordo com a pesquisa de Lombardi e Campos (2018), o qual identificou que a remuneração dos técnicos de enfermagem tende a diminuir pela metade em relação a dos enfermeiros, uma vez que, no nosso estudo, as técnicas de enfermagem possuíam classe económica inferior quando comparada às enfermeiras.

Em relação ao turno de trabalho, no presente estudo há mais enfermeiras que atuam em dois turnos quando comparado com as técnicas de enfermagem, achados que corroboram com o estudo de Freire et al. (2015), realizado com profissionais de terapia intensiva. Diferente do nosso estudo, Freire et al. (2015) ainda identificaram que os enfermeiros possuíam uma jornada de trabalho maior em relação aos técnicos de enfermagem, sendo que ter uma longa jornada de trabalho pode estar relacionado com a inatividade física.

No presente estudo, apesar de a maioria dos profissionais não possuírem uma dupla jornada de trabalho, observou-se que a maior parte dos profissionais de ambas categorias não praticavam atividade física. Este achado também foi encontrado no estudo de Pimenta e Assunção (2016), realizado com enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem, em que prevalecia o número de profissionais que não realizavam atividade física.

A atividade física traz diversos benefícios, como a diminuição do estresse, da ansiedade e depressão, melhora nas atividades cognitivas e nas relações interpessoais, bem como no aumento da disposição e energia para a realização das atividades diárias e de trabalho (Freire et al., 2015). Além disso, Massuda et al. (2017), constataram no seu estudo que o nível de atividade física praticada possui relação inversa com a ocorrência e intensidade de dor lombar nos profissionais de enfermagem, ou seja, sujeitos que praticam atividade física, relatam menos dor lombar em relação aos que não praticam. Este achado corrobora com o nosso estudo, ao ponto que o mesmo foi realizado com profissionais de enfermagem que relataram presença de dor lombar e na sua maioria não praticavam atividade física.

No estudo de Maciel Júnior et al. (2019), é possível observar que a média do IMC dos enfermeiros é maior do que as de técnicos de enfermagem, o que sugere que há mais enfermeiros classificados com excesso de peso ou obesidade. Porém, no nosso estudo verificou-se que dentre as duas categorias profissionais, mais técnicas de enfermagem foram classificadas com excesso de peso em relação às enfermeiras. Ademais, ainda se destaca que em relação ao IMC, indivíduos que foram classificados com sobrepeso e obesidade tendem a desenvolver dor lombar com maior frequência (Nepomuceno et al., 2019).

Quanto a intensidade da dor lombar, a percentagem de enfermeiras que declararam EVA > 5 é menor em relação às técnicas de enfermagem, categoria profissional na qual um maior número de indivíduos foram identificados com excesso de peso. Nesse sentido, o IMC pode ser um fator considerável, uma vez que a intensidade da dor tende a aumentar conforme o peso aumenta (Massuda et al., 2017). É importante ressaltar que, a intensidade da dor pode desenvolver estresse, sofrimento psíquico e insatisfação, o que influencia na capacidade do trabalho (Cargnin, Schneider, Vargas, & Schneider, 2019).

Neste estudo, ainda foi possível observar que um percentual elevado de técnicas de enfermagem (81%) e enfermeiras (80%) não apresentam distúrbios de sono, o que pode estar associado ao turno e jornada de trabalho. De acordo com um estudo de Viana et al. (2019), realizado com enfermeiros, os profissionais que trabalhavam no turno diurno, com uma jornada de trabalho de 6h por dia, apresentavam uma qualidade de sono melhor que os trabalhadores do turno noturno, com jornadas de 12 horas de trabalho e descanso nas 36 horas posteriores.

Entre as limitações deste estudo, aponta-se o fato deste ser de caráter transversal, o que impede a relação entre causa e efeito. Outro aspeto a ser considerado é a falta de variáveis que abrangem as condições de trabalho, como a presença e utilização de equipamentos auxiliares, dificuldades de manuseamento, bem como, o conhecimento do profissional acerca das intervenções a serem adotadas em casos de sobrecarga física, o que não permite relacionar estes dados com as demais variáveis estudadas. Ademais, considerando o fato de a amostra ter sido composta exclusivamente de mulheres, não é possível extrapolar tais achados para toda a população de profissionais de enfermagem, cabendo destacar que esse fato se deu devido à população objeto do estudo ser composta maioritariamente de mulheres e os homens não foram contemplados, pois foram excluídos de acordo com os critérios de exclusão. Como aspetos positivos, considerando que ainda existem poucos estudos que comparam estas duas categorias profissionais, nosso estudo pode colaborar para pesquisas futuras, e também contribuir no planeamento de ações em saúde considerando as especificidades de cada categoria. Ainda cabe destacar que há baixo uso de analgésicos e miorrelaxantes na amostra estudada, o que reduz vieses que poderiam interferir nos resultados.

Conclusão

Com este estudo objetivou-se analisar as diferenças entre técnicas de enfermagem e enfermeiras com dor lombar, já que estes, apesar de serem profissionais da mesma área, exercerem funções laborais diferentes. Apesar disso, ao comparar as características sociodemográficas, estilo de vida, características ocupacionais e a diferença entre os grupos em relação ao IMC, SBST Brasil e perceção de dor, observa-se que há diferença estatística somente para classe socioeconómica e turno de trabalho; vale destacar, ainda que a maioria dos profissionais de ambas categorias não realizam atividade física. Desta forma, conclui-se que não há diferença quanto a variáveis de estilo de vida, socioeconómicas, ocupacionais, estado nutricional e a presença de dor entre enfermeiras e técnicas de enfermagem.

Apesar de não serem evidenciadas diferenças entre as categorias, através do presente estudo é possível identificar que a dor lombar é um problema prevalente em enfermeiras e técnicas de enfermagem, independente das características sociodemográficas, econômicas e laborais. Assim, destaca-se a importância do desenvolvimento de novas estratégias para prevenção da dor lombar a serem implementadas no ambiente de trabalho destas profissionais, com o intuito de instrumentaliza-los acerca da ergonomia adequada e hábitos saudáveis e prevenir a dor lombar, uma vez que em ambos grupos a dor lombar fazia-se presente.

Referências bibliográficas

Cargnin, Z. A., Schneider, D. G., Vargas, M. A., & Machado, R. R. (2019). Dor lombar inespecífica e sua relação com o processo de trabalho de enfermagem. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 27:e3172. https://doi.org/10.1590/1518-8345.2915.3172 [ Links ]

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13Como citar este artigo: Rusch, M. H., Nepomuceno, P., Santos, P. R., & Pohl, H. H. (2022). Estilo de vida, características sociodemográficas, ocupacionais e dor em profissionais de enfermagem com lombalgia. Revista de Enfermagem Referência, 6(Supl. 1), e21035. https://doi.org/10.12707/RV21035

Recebido: 08 de Março de 2021; Aceito: 15 de Outubro de 2021

Conceptualização: Pohl, H. H., Santos, P. R.

Tratamento de dados: Santos, P. R., Nepomuceno, P.

Análise formal: Rusch, M. H., Nepomuceno, P., Santos, P. R.

Aquisição de financiamento: Pohl, H.

Metodologia: Santos, P. R., Pohl, H.

Investigação: Rusch, M. H., Nepomuceno, P., Santos, P. R.

Administração do projeto: Santos, P. R., Pohl, H.

Supervisão: Pohl, H.

Recursos: Pohl, H.

Redação - rascunho original: Rusch, M. H., Nepomuceno, P.

Redação - análise e edição: Santos, P. R., Pohl, H. H.

Autor de correspondência Maiara Helena Rusch E-mail: mayrusch3005@gmail.com

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