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Ex aequo

versão impressa ISSN 0874-5560

Ex aequo  no.31 Lisboa jun. 2015

 

EDITORIAL

Editorial

Virgínia Ferreira

O trigésimo primeiro número da ex æquo marca o início de um novo ciclo da vida da revista. A renovação da sua direção e conselhos (de redação e científico) assim o determina. Não por qualquer tipo de rutura relativamente ao seu passado, mas apenas porque a rotatividade de funções é um princípio de boa governação que respeitamos. Para esta nova equipa, aliás, o desafio é dar continuidade ao excelente trabalho da anterior, pois a rotatividade não implica necessariamente descontinuidade. Acreditamos que novas vontades facilitam a inovação e, sobretudo, potenciam a resiliência dos projetos. Assim esperamos.

Antes de mais, agradecemos a/os colegas que prontamente aceitaram o nosso convite para o conselho científico, o que muito nos honrou, e se propuseram acompanharnos nos passos necessários para vencer a próxima etapa. A criação do que chamamos conselho científico, porque lhe atribuímos a função de aconselhamento científico para o nosso trabalho editorial, trouxe até nós cientistas sociais de renome de várias áreas do conhecimento, de várias gerações e de vários continentes e nacionalidades.

Elucidamos desde já que encaramos a entrada da ex æquo no décimo sexto ano da sua publicação com grande ansiedade. Para usar uma imagem batida, digamos que nuvens cinzentas ensombram o horizonte, não deixando ver o caminho, nem distinguir entre o que é o nosso desejo e a realidade. As Ciências Sociais e as Humanidades atravessam uma época de extrema turbulência. Os Estudos sobre as Mulheres, de Género e Feministas são dos primeiros a sofrer os efeitos negativos de múltiplas tendências que se observam no campo da ciência e da investigação. Entre as tendências que mais perigosos desafios representam para a ex æquo contam-se a erosão da legitimidade epistemológica do conhecimento que difunde, em face da progressiva assunção, por vezes meramente cosmética, do produzido nas áreas disciplinares tradicionais. Com efeito, o crescente fechamento disciplinar, depois de um certo período de relativa, talvez apenas aparente, abertura, retira expressão e capacidade de expansão a áreas científicas por natureza interdisciplinares. A hiperespecialização e o entrincheiramento disciplinar são estratégias de defesa em face das ameaças representadas pelos critérios de «mérito» e as novas métricas bibliográficas com que se pretende «medir» o desempenho da atividade científica. A verdade é que, apesar de a bibliometria de base comercial ter sido amplamente denunciada como não tendo credibilidade para avaliar o impacto da produção científica em Ciências Sociais e Humanidades, de momento, ela é incontornável. Tal poderá traduzir-se na menor atratividade de publicações inter e multidisciplinares, como a ex æquo.

Também o acelerar da era digital nos impõe desafios completamente novos. A escrita e a publicação estão a ser totalmente transformadas pela internet, pelo acesso aberto e pelos «big data». A presença em grandes bases de dados é cada vez mais importante para garantir que o que se publica é lido e chega a um maior número de pessoas nos quatro cantos do mundo. Para uma revista que não possui apoio administrativo próprio trata-se de um pesado encargo. Os desafios são, portanto, muitos, mas a vontade de os superar é imensa.

Para evidenciar que a rotatividade não implica descontinuidade, este número da revista segue a estrutura já habitual das três secções – dossier temático, estudos e ensaios e recensões. O dossier temático foi constituído em torno da problemática «Violências de género e direito(s): diálogos feministas». Os textos que o constituem trazem-nos, sem dúvida, uma consolidação da análise crítica das violências de género, nas suas várias expressões, e do direito que delas se ocupa.

A teoria feminista do direito tem procurado perspetivar de que forma o direito pode ser um recurso efetivo das mulheres para a garantia do exercício dos seus direitos ou se está condenado à irremediável condição de instrumento de subalternização e opressão das mulheres. Um Estado e um Direito predominantemente androcêntricos tendem a minimizar e a trivializar as violências sobre as mulheres, por intermédio da conjugação complexa de dispositivos de silenciamento com práticas de invalidação e de esvaziamento de experiências. Estes processos sociais de apagamento têm profundas repercussões na forma como quer as vítimas, quer as políticas públicas e os tribunais definem, atribuem sentido e anulam as violências de género. Os contributos aqui incluídos irão certamente alargar os horizontes dessa procura.

Na secção «Estudos e Ensaios», dois excelentes ensaios reforçam a diversidade linguística, disciplinar e temática deste número da revista. Maria Cristina Gonzalez e Yamile Delgado de Smith, com o seu ensaio «Género y Migración: Desandando Caminos», convidam-nos, num primeiro momento, a acompanhar o percurso conceptual e teórico e a desvelar as marcas ideológicas que consubstanciam a base epistémica do tema em questão, para, em seguida, chamarem a nossa atenção para a importância da análise com base na estrutura de oportunidades das mulheres nos contextos de origem e de destino que abriu o caminho à produção de conhecimentos sobre a agência das mulheres. Esta abertura foi, na opinião das autoras, crucial para o aprofundamento de várias temáticas, como os processos identitários, as reestruturações das desigualdades, a interseccionalidade, as estruturas familiares transnacionais, as cadeias globais do cuidado e a participação política e a construção da cidadania, entre outras.

Por seu turno, Sonia Maria Melchiorre, no seu estudo «Gender Member-Gender Mender: Charlotte Ramsay Lennox and her Fictions», chama a atenção para a obra de Charlotte Ramsay Lennox, uma das melhores romancistas da cena literária britânica do século XVIII. Tendo sido a primeira mulher a escrever sobre Shakespeare e as suas fontes no séc. XVIII e a editora de uma das primeiras revistas de romances serializados, o estudo da sua obra é hoje incontornável dada a grande versatilidade plasmada em poesia, ficção e crítica.

A fechar, quatro recensões sobre obras de temáticas também muito diversas: jornalismo, lei da paridade em Portugal, transexualidade e estilo queer. Bons alicerces, portanto, para corresponder ao interesse de quem lê a ex æquo.

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