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Faces de Eva. Estudos sobre a Mulher

Print version ISSN 0874-6885

Faces de Eva. Estudos sobre a Mulher  no.47 Lisboa June 2022  Epub Aug 01, 2022

https://doi.org/10.34619/bzgg-vwfo 

Estudos

Um olhar sobre a participação feminina na Assembleia Nacional: A deputada Virgínia Faria Gersão1

1i Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Departamento de Letras, Artes e Comunicação, Centro de Estudos em Letras, 5000-801 Vila Real, Portugal


Resumo

O ano de 1935 marca o início da participação da mulher na Assembleia Nacional. Trata-se de um marco histórico na sociedade portuguesa, pois dá-se voz a um grupo que vivia à margem do domínio público. É neste contexto que, em 1945, é eleita a deputada Virgínia Faria Gersão, que se destacou pelo seu espírito ativo e pela forma entusiasta como advogou a causa do ensino. No presente artigo, pretendemos conhecer e compreender o contexto em que esta deputada se movimentou, assim como analisar a sua participação na Assembleia Nacional durante a IV Legislatura, socorrendo-nos para tal de fontes arquivísticas e bibliográficas.

Palavras-chave: Virgínia Faria Gersão; mulher; deputada; Assembleia Nacional

Abstract

The year 1935 marks the beginning of women’s participation in the National Assembly. This is a historic milestone in the Portuguese society, as it gives voice to a group of the population that lived on the fringes of the public domain. It is in this context that, in 1945, the MP Virgínia Faria Gersão was elected, a high school teacher, who stood out for her active spirit and enthusiastic manner in advocating the cause of education. In this article, we intend to know and understand the context in which this MP moved, as well as to analyze her participation in the National Assembly during the IV Legislature, using archivist and bibliographic sources.

Keywords: Virgínia Faria Gersão; woman; MP; National Assembly

Introdução

O ano de 1935 constitui-se como um marco decisivo na história da participação feminina na atividade política, pois neste ano foram eleitas as primeiras mulheres deputadas na história de Portugal. Na sequência das eleições de 16 de dezembro de 1934, passaram a integrar a Assembleia Nacional a professora e médica Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho2 (1871-1966), a advogada Maria Cândida Bragança Parreira3 (1877-1942) e a professora Maria Baptista dos Santos Guardiola4 (1895-1987). Esta integração das mulheres “na Assembleia foi efusivamente saudada pelos senhores deputados, em termos encomiásticos que não deixam de denotar a intromissão de entes até então estranhos que cumpria receber cavalheirescamente” (Souza, 2013, p. 42).

A participação das mulheres no campo político pode ser considerada como uma importante estratégia de António de Oliveira Salazar (1889-1970), que viu na mulher um meio necessário para edificar e propagar a ideologia do Estado Novo. Repare-se que, ao contrário do que seria expectável, não foi o regime democrático, durante a 1.ª República, que integrou a mulher na esfera política, negando-lhe a possibilidade de votar e de ser eleita, tendo sido o regime de Salazar que lhe abriu estas portas, ainda que de uma forma muito condicionada. Esta característica não é específica de Portugal, pois, como nota Yolande Cohen, citada por Maria Reynolds de Souza (1986, p. 430), “é doloroso verificar que foram as ideologias totalitárias, reaccionárias ou pelo menos conservadoras quem primeiro compreendeu a importância das mulheres no jogo político”.

As primeiras deputadas portuguesas pertenciam a um grupo privilegiado da sociedade, possuindo todas elas formação superior, o que contrastava com uma população feminina que, na sua maioria, era analfabeta, de origem rural e estava confinada ao espaço doméstico. Segundo Adão e Remédios (2005),

se, em termos de ocupação profissional, elas se demarcam do papel de género reservado à mulher, tal ruptura acentua-se ainda mais ao serem escolhidas num universo fortemente masculino para desempenhar funções políticas fulcrais de estruturação ideológica do regime e de implementação das políticas de Oliveira Salazar. Essa apropriação diferente do papel de género salienta-se também quando algumas destas deputadas não se casam, e, deste modo, não vão realizar a missão que lhes está reservada, a maternidade, tendo em atenção a sua natureza. (p. 90)

Na verdade, a participação das mulheres ao longo das diversas legislaturas do Estado Novo foi sempre muito reduzida, como se pode confirmar pelos dados disponibilizados no estudo de Ana Vargas, que analisa a presença da mulher na Assembleia Nacional de 1934 a 1974:

Fonte: Vargas (2000, p. 59).

Figura 1: Percentagem de mulheres eleitas nas várias legislaturas durante o Estado Novo 

Estes dados não surpreendem, uma vez que Portugal vivia numa ditadura, possuía uma sociedade marcadamente conservadora e tradicional, que, na generalidade, não reconhecia à mulher o direito de intervir ativamente no domínio político. Como salientam Massa e Almeida (2016),

o papel expressivo atribuído às mulheres era por demais vincado em atos como, por exemplo, na tríade que o regime fazia questão de afirmar e reafirmar: ‘Deus, Pátria e Família’. Se no acesso ao sufrágio, como vimos até aqui, a mulher era considerada um ser inferior ao homem na capacidade de discernimento para votar, nas funções executivas de poder o processo era ainda mais esclarecedor sobre o papel da mulher na sociedade. (p. 12)

No que respeita concretamente à participação das mulheres na Assembleia Nacional, várias vozes se opunham declaradamente à sua integração neste órgão, como o comprovam as palavras de um dos presidentes da Assembleia, José Alberto dos Reis5, a propósito da possível continuidade das deputadas na III Legislatura:

Fonte: Reis (1942, p. 9)

Figura 2: Opinião de José Alberto dos Reis sobre a participação feminina na Assembleia Nacional 

Apesar de o Presidente da Assembleia Nacional ser de opinião contrária à continuidade das mulheres neste órgão, o facto é que elas aí se mantiveram, ainda que integrassem principalmente a Comissão de Trabalho, Previdência e Assistência Social e a Comissão de Educação Nacional, Cultura Popular e Interesses Espirituais e Morais, por se considerar que se tratava de assuntos mais ligados aos interesses da mulher.

No presente artigo, é nosso intuito analisar a presença feminina na Assembleia Nacional, especificamente os contributos da deputada Virgínia Faria Gersão (1896-1974), que integrou a IV Legislatura. Por forma a cumprirmos este objetivo, damos destaque a alguns aspetos do seu percurso biográfico, que nos permitem compreender o contexto em que se formou e se movimentou. Num momento seguinte, analisamos as principais ideias subjacentes às suas intervenções na Assembleia Nacional, designadamente no que se refere às duas temáticas mais abordadas pela deputada – a tuberculose e a educação.

A deputada Virgínia Faria Gersão

Numa época em que as mulheres tinham pouca representatividade no mundo político, Virgínia Faria Gersão6 foi eleita deputada à Assembleia Nacional na IV Legislatura (1945-1949).

Fonte: Assembleia Nacional (1945-1949, p. 120)

Figura 3: Registo biográfico da deputada Virgínia Gersão 

Tal como as primeiras deputadas, Virgínia Gersão pertencia a um contexto social privilegiado, tendo convivido com as mais altas figuras da sociedade e distinguindo-se da maioria das mulheres portuguesas do seu tempo. Por exemplo, entre os seus correspondentes, encontram-se nomes como os de António Oliveira Salazar, Carolina Michaëlis de Vasconcelos7 (1851-1925), Mário de Figueiredo (1890-1969), Joaquim Mendes dos Remédios (1867-1932) e Maria Lúcia Vassalo Namorado8 (1909-2000).

Virgínia cresceu numa família que valorizava a instrução e que aplicava o mesmo grau de exigência nos estudos a rapazes e raparigas, não fazendo qualquer discriminação9. Todos os seus irmãos beneficiaram de acesso ao ensino superior, tendo sido a sua irmã mais velha, Augusta Faria Gersão Ventura10, a primeira a abrir as portas de Coimbra aos restantes irmãos. Foi precisamente na Universidade de Coimbra que Virgínia Gersão se licenciou em Filologia Românica e seguidamente concluiu o curso de magistério liceal na Escola Normal Superior da mesma Universidade.

O seu percurso profissional ficou marcado pela docência na Escola Normal Primária de Lisboa e no Liceu Infanta D. Maria, em Coimbra, desenvolvendo neste último a maior parte da sua atividade profissional. Virgínia Gersão teve um papel muito importante na vida deste liceu, sendo muito ativa em diferentes níveis. Para além de ter sido uma notável professora, esteve muito envolvida no espírito cultural que marcou esta escola e até a própria cidade de Coimbra. Como atesta Moreirinhas Pinheiro (2004, p. 86), “foi uma brilhante professora e educadora dos ensinos primário, normal e secundário, tendo dedicado grande parte da sua vida profissional ao ensino e à cultura no Liceu Infanta D. Maria, em Coimbra”.

No seu meio, era tida como uma referência, circulando entre as elites. Estas suas eminentes relações ter-lhe-ão valido o convite para o cargo de deputada, que lhe terá sido endereçado pelo médico e também deputado José dos Santos Bessa (1905-1991)11.

Assim, no ano de 1945, Virgínia Gersão foi eleita deputada pelo círculo de Lisboa, com um total de 107 549 votos (Assembleia Nacional, 1947, p. 30), não se verificando uma grande discrepância relativamente aos votos obtidos pelos seus pares masculinos. Se atentarmos, por exemplo, na votação obtida pelo deputado Mário de Figueiredo12, também candidato pelo círculo de Lisboa, constatamos que este obteve uma votação inferior, com um total de 107 499 votos (Assembleia Nacional, 1947, p. 30). Na mesma legislatura, foi eleita apenas outra mulher, Maria Luísa de Saldanha da Gama van Zeller13 (1906-1983), com um total de 107 373 votos (Assembleia Nacional, 1947, p. 30)14.

Em termos etários, Virgínia Gersão ingressou na Assembleia numa fase da sua vida de bastante maturidade, pois já tinha 49 anos, ao passo que, por exemplo, a sua colega de legislatura tinha apenas 32 anos. Paralelamente, destaca-se ainda o facto de ser solteira, tal como a maioria das outras deputadas, o que de certa forma era contraditório, tendo em conta o tipo de mulher idealizado pelo Estado Novo: uma mulher casada e dedicada à sua família. Virgínia Faria Gersão integrou a Comissão de Educação Nacional, Cultura Popular e Interesses Espirituais e Morais, tendo sido eleita com 85 votos (Gersão, 1946a, p. 663). Note-se que esta deputada foi uma das responsáveis pela proposta de alteração do nome desta Comissão, que inicialmente se chamava “Educação Nacional e Cultura Popular” (Gersão, 1945, p. 42).

A integração de Gersão nesta comissão faz todo o sentido, tendo em conta a sua atividade profissional e a sua forte dedicação à causa da educação. Na verdade, um dos seus maiores desejos era colaborar numa grande reforma do sistema de ensino, como a própria assume nas primeiras palavras que dirige ao Presidente da Assembleia Nacional:

Sr. Presidente: eu esperava que os problemas da instrução e educação fossem abordados nesta Câmara para pedir a honra de me ser concedida a palavra. (...) levava-me apenas o desejo de colaborar nessa obra formidável, que tem sido o ideal de toda a minha vida - e de tal modo que se me afigura, pela sua importância, a primeira de todas. (Gersão, 1946b, p. 780)

Neste sentido, percebe-se que a maioria das suas intervenções parlamentares durante a IV Legislatura versasse sobretudo sobre a temática do ensino.

Temas abordados pela deputada nas suas intervenções parlamentares

Para além dos vários discursos parlamentares dedicados ao ensino, o outro assunto em destaque foi a causa dos tuberculosos, a que Virgínia Gersão se entregou com grande dedicação e espírito solidário15.

Para uma perceção mais rigorosa das suas intervenções na Assembleia Nacional, apresenta-se, de seguida, uma síntese das mesmas:

  • na 1.ª sessão legislativa (1945-1946), debruçou-se sobre o problema das circunstâncias materiais dos funcionários públicos tuberculosos;

  • na 2.ª sessão legislativa (1946-1947), discutiu a proposta de lei de reorganização do ensino técnico profissional e defendeu a causa dos tuberculosos pobres;

  • na 3.ª sessão legislativa (1947-1948), referiu-se à reforma do ensino liceal;

  • na 4.ª sessão legislativa (1948-1949), falou sobre o problema da instrução, destacando o excessivo esforço exigido aos alunos, e discutiu a proposta de lei relativa ao ensino particular (Castilho, 2009, p. 139).

Seguidamente, destacaremos as ideias essenciais presentes nos discursos que proferiu na Assembleia relativamente à causa dos tuberculosos e ao ensino.

A causa dos tuberculosos

Um dos temas abordados por Virgínia Gersão na Assembleia Nacional foi, como referido, o tema dos tuberculosos. Como salienta Almeida (2017, p. 664), “em Portugal, a mortalidade por tuberculose pulmonar, durante o Salazarismo, foi sempre muito elevada, crescendo durante a década de quarenta”. Nos seus discursos, a deputada abordou os problemas da sanatorização dos funcionários públicos tuberculosos, assim como dos tuberculosos pobres. Relativamente ao primeiro, Virgínia Gersão analisou-o na sessão legislativa de 1 de março de 1946, denunciando a situação penosa em que viviam estes doentes e propondo medidas por forma a minimizar as suas dificuldades. Seguem-se as sugestões apresentadas pela deputada:

  • 1.º De que o período destinado à cura do funcionário pobre possa ultrapassar os quatro anos nos casos em que isso seja absolutamente necessário;

  • 2.º De que os seus vencimentos sejam pagos sem atraso, como os de qualquer outro funcionário ao serviço; e, finalmente,

  • 3.º De que, enquanto a reforma da Assistência Nacional aos Tuberculosos não for um facto, se dispensem, para efeitos de concurso, as disposições do artigo 1.º do decreto-lei n.º 33:549, visto acarretarem uma despesa que inibe a assistência de socorrer muitos infelizes. (Gersão, 1946b, p. 782)

Na sequência deste discurso na Assembleia Nacional, Virgínia Gersão foi muito aplaudida quer interna quer externamente, e prova disso são os numerosos telegramas e comunicações que recebeu a felicitá-la e a agradecer-lhe pela dedicação que imprimiu à causa destes doentes. No arquivo do Parlamento, pode encontrar-se um exemplar destes telegramas em que a deputada é muito louvada pela forma como abordou este tema:

Permitam vossas excelencias que levemos ao conhecimento dessa assembleia o nosso profundo reconhecimento pela maneira sobre e desinteressada como a excelentissima senhora doutora virginia gersao advogou a causa dos funcionarios civis tuberculosos que bem merecem a atenção dessa assembleia. (Telegrama n.º 2560, 16 de março de 1946)16

Na segunda sessão legislativa, embora não fosse seu intento voltar a esta questão, Virgínia Gersão abordou novamente o problema da tuberculose, desta feita para se debruçar particularmente sobre a questão dos tuberculosos pobres. Na verdade, o que impulsionou esta iniciativa foi o facto de ter sido interpelada por um jovem tuberculoso que lhe pediu que advogasse a sua causa, assim como de ter recebido numerosos telegramas, que iam desde simples agradecimentos a queixas ou a súplicas acompanhadas de relatos dramáticos.

Perante a impossibilidade de o erário público suportar todos os custos inerentes ao tratamento desta doença, a deputada sugeriu que todos colaborassem individualmente à medida das suas possibilidades em obras de voluntariado e propôs que se realizassem festas educativas abertas ao público, à semelhança do que a própria fazia no seu liceu em Coimbra, sendo que os lucros reverteriam para esta causa. Pela sua parte, disponibilizou as suas peças teatrais para serem encenadas em diferentes locais, angariando dinheiro que seria usado nestas obras de beneficência. Como a própria refere:

Gostava tanto de que o Estado me autorizasse a realizá-las em Lisboa e de encontrar, da parte das Ex.mas reitoras e colegas dos liceus femininos, essa comunhão de ideais que nos leva a uma colaboração desinteressada e sincera, sem emulações mesquinhas, num verdadeiro sentimento de arte e caridade cristã!... (...) Ponho este alvitre, num preito de homenagem, nas mãos de S. Ex.as os Ministros da Educação Nacional e do Interior, e toda a minha boa vontade, o meu trabalho, a minha alma, na dos tuberculosos pobres. (Gersão, 1947b, p. 1001)

A causa do ensino

O assunto que despertou mais interesse à deputada Virgínia Gersão e mereceu a sua maior dedicação foi a causa do ensino. Na Assembleia, refletiu sobre o problema da instrução em geral, nomeadamente a reorganização do ensino técnico profissional e a reforma do ensino liceal, assim como sobre a proposta de lei relativa ao ensino particular.

Para a deputada, a instrução era a base de toda a sociedade, constituindo-se como a solução para resolver os mais variados problemas que nela se encontravam. Um dos flagelos que mais afetava o país na época, como a própria refere, era a elevada taxa de analfabetismo, que atingia mais de 50% da população, colocando, “de uma forma clara, Portugal entre os países menos escolarizados e alfabetizados do mundo ocidental da altura” (Candeias & Simões, 1999, p. 166). Na verdade, esta realidade interessava ao regime ditatorial, que considerava vantajoso proporcionar à criança apenas noções elementares, como saber ler, escrever e contar, reduzindo, assim, a possibilidade de contestação às ideias do regime. Como salienta Nóvoa (1997, p. 177), “o Estado Novo concede uma grande importância às questões educativas e define, desde o início, políticas que investem a escola como espaço privilegiado de doutrinação e de integração social”.

Por outro lado, estes valores do analfabetismo também se devem ao número insuficiente de escolas primárias e à falta de condições nas escolas existentes, como Virgínia Gersão (1947a) denuncia:

É certo que há muitas de construção moderna; mas, em geral, aproveitam-se para salas de aula divisões horríveis, sem condições de higiene, de iluminação e ventilação; as crianças, no inverno, sem aquecimento algum, tiritam de frio; chegam às vezes molhadas e enxugam no corpo as suas roupitas pobres. É este o triste panorama da maior parte das nossas escolas. (p. 446)

Perante estes constrangimentos, o rendimento das crianças teria de ficar aquém do desejado, pois não lhes eram asseguradas as condições mínimas necessárias para se poderem concentrar e retirar aproveitamento dos ensinamentos do professor. Dada a importância que as condições dos estabelecimentos de ensino tinham para o processo de ensino e aprendizagem, nesta época ganharam força as discussões em torno dos edifícios escolares. Como salientam Nóvoa e Bandeira (2005),

No decurso do século XX, eles adquirem uma enorme visibilidade pública, ocupando um lugar de primeiro plano na geografia do país, mas também no imaginário individual e colectivo. Para além das suas funções internas, a casa da escola delimita um território de poder e de expectativas: o futuro de muitas crianças joga-se no interior destas paredes mais ou menos majestosas. (p. 47)

Outro problema a que Virgínia Gersão alude é a falta de preparação dos professores primários que se formam na época. Constata que, apesar de se estudar mais, a qualidade da formação é notoriamente inferior à da sua altura, discordando absolutamente das práticas adotadas na formação de professores. No seu tempo, para se aceder a estas escolas, era necessário fazer um exame de admissão, de nível equivalente ao do 3.º ano do liceu. Por outro lado, o curso tinha a duração de três anos e regia-se por práticas pedagógicas muito rigorosas; ao passo que, na época em que a deputada profere este discurso, o curso tem a duração de apenas dois anos e o nível de exigência é inferior.

A este propósito, recorde-se que, se durante a I República se investiu na formação dos professores com a criação das Escolas Normais Primárias e das Escolas Normais Superiores, o novo regime propôs-se “acabar com a preparação pedagógica e científica dos professores de quem muito pouco agora se viria a exigir para a execução da doutrina do ler, escrever e contar” (Carvalho, 2008, p. 732).

Assim, na opinião de Virgínia Gersão, era fundamental inverter este quadro e investir na formação dos professores, sem os quais não seria possível garantir a qualidade do ensino.

Do mesmo modo, era importante ter o cuidado de ajustar os programas ao contexto educativo, por forma a evitar os constrangimentos variados que daí podiam advir, como o insucesso escolar e a desmotivação dos alunos. Como a própria refere, não pode ocorrer nenhuma reforma “sem o concurso de duas condições fundamentais: a primeira é a rigorosa escolha do pessoal docente, capaz de fazer da sua carreira um sacerdócio e não só um ganha-pão; a segunda reside essencialmente na organização e adaptação dos programas” (Gersão, 1947a, p. 447).

Este segundo aspeto foi bastante debatido pela deputada, que considerava os programas pouco adequados às necessidades dos alunos. Nas escolas, professores e alunos confrontavam-se com programas demasiado extensos, que não respeitavam a necessidade de uma progressão gradual, do mais simples para o complexo: “Não os acho adequados à idade dos alunos nem vejo que se parta, como o exige rigorosamente o primeiro princípio da verdadeira pedagogia, do mais simples para o mais complexo, do geral para o especial” (Gersão, 1947a, p. 448).

Por outro lado, havia um recurso excessivo à memorização de conhecimentos, muitas vezes inúteis, não contemplando as especificidades de cada faixa etária da criança. Esta ideia de Virgínia Gersão está claramente alinhada com o ideário da Escola Nova, que estabelece como um dos princípios básicos o seguinte: “Em relação à educação intelectual, a Escola nova procura abrir a mente para uma cultura geral do espírito e não para uma acumulação de conhecimentos memorizados” (Ferrière, 2015, p. 12).

Esta elevada exigência de que Gersão dava conta implicava uma dedicação quase sobre-humana por parte do aluno, não lhe restando tempo livre para brincar, para poder ser criança. A deputada alertou também para o sentimento de aflição dos próprios pais que acompanhavam impotentes o processo de esgotamento dos filhos, com claros danos para a sua saúde. Na sua opinião, o sistema vigente tratava a criança como um adulto, não seguindo os princípios de renovação pedagógica da Escola Nova, caracterizados pela defesa de uma escola ativa e preocupada com a individualidade do aluno. Na verdade, a política educacional do Estado Novo não se identificava com estes valores e assentava fortemente na violência e na repressão. Para o Regime, “tornava-se imperioso destruir o chamado movimento da ‘Escola Nova’, que teorizava sobre os processos activos e interessantes de aprendizagem, argumentando que tudo isso não passava de frutos da democracia e do livre-pensamento” (Mónica, 1978, p. 308).

As palavras da deputada deixam transparecer a sua preocupação constante em colocar a criança e as suas necessidades no centro do processo educativo: “o que eu queria - e não me canso de o dizer - é que a criança tivesse tempo para ser criança, que o ensino fosse adequado às necessidades de cada época da sua vida, que tivesse horas livres para correr e pular” (Gersão, 1948, p. 34).

Todas as suas intervenções acerca da educação denotam uma consciência da realidade do ensino e dos seus problemas, focada na criança e nos seus interesses, tendo Virgínia Gersão sido a deputada que mais interveio no panorama da educação (Braga, 2014, p. 18).

2. O fim das funções de deputada

No final de cada legislatura, diversas entidades, como o Presidente da Assembleia Nacional ou a Comissão Executiva da União Nacional, enviavam a Salazar propostas de listas para a constituição da nova legislatura. Apesar das sugestões apresentadas pelas várias personalidades, todos tinham consciência de que “a inclusão ou exclusão das listas em preparação depende de Salazar, que conduz pessoalmente todo o processo” (Castilho, 2007, p. 233). No caso específico da V Legislatura, nas listas elaboradas por Albino Soares Pinto dos Reis (1888-1983) e enviadas a Salazar, o nome de Virgínia Gersão surge como um dos que poderiam ser substituídos17, apesar do seu enorme interesse e dedicação à causa do ensino, reconhecidos pelo Presidente da Assembleia Nacional, como se pode comprovar na figura que se segue:

Fonte: Reis (1949).

Figura 4: Proposta de lista de deputados para a V Legislatura 

A continuidade de Virgínia Gersão como deputada terá sido posta em causa pelo facto de esta não silenciar os aspetos com os quais discordava. Na verdade, a sua condição feminina não a impediu de expressar a opinião, criticando situações ou propostas que considerava desadequadas ou erradas. Por vezes, assumiu até um tom duro, como podemos ver na intervenção que se segue em que discute a proposta de lei que reorganiza o ensino técnico-profissional:

Pois bem: analisando a proposta do Governo e o parecer da Câmara Corporativa, tive também impressão de que se não tratava de nada extraordinário e parecia-me impossível que pessoas inteligentes, encarregadas há tantos anos de uma reforma destas, tivessem produzido tão pouco. (Gersão, 1947a, p. 444)

O momento que terá gerado maior desagrado em relação à sua posição crítica foi a forma como denunciou alguns aspetos da reforma do ensino liceal do ministro da Educação Nacional, Fernando Andrade Pires de Lima (1906-1970). Na sua opinião, era necessário remediar urgentemente alguns aspetos que considerava graves, nomeadamente o tempo excessivo que as crianças passavam na escola, a extensão exagerada dos programas e a falta de adaptação dos mesmos aos alunos, o elevado grau de exigência a que se submetia a criança, entre outros.

Em suma, independentemente das razões que terão estado na base da sua eliminação das listas de deputados, o facto é que a participação de Virgínia Gersão na Assembleia Nacional se circunscreveu apenas à IV Legislatura. No entanto, as mulheres continuaram a ter lugar no hemiciclo, desta feita, na V Legislatura, pelas mãos da já experiente Maria Guardiola e da estreante Maria Leonor Correia Botelho18 (1915-1996).

Considerações finais

À distância de quase um século, analisar o percurso de Virgínia Faria Gersão, que viveu num país muito tradicionalista e pouco aberto à mudança, permite-nos perceber que estamos perante uma figura detentora de um elevado nível cultural e que circulava entre as elites da época.

O facto de ter crescido numa família que valorizava a educação e na qual as mulheres tinham um papel ativo permitiu-lhe não só ter acesso a uma formação superior, mas também assumir-se enquanto mulher ativa com uma profissão e com participação social, cultural e política.

Nos vários contextos em que atuou, deixou a sua marca. No liceu, ao qual dedicou quase toda a sua vida, ficou gravado para sempre o seu nome e o seu contributo, sendo ainda hoje amplamente reconhecidos.

Na esfera política, teve o privilégio de ser uma das primeiras e poucas mulheres deputadas, num momento em que, em Portugal, se sentiam as amarras de um regime autoritário, que reservava à mulher o lugar doméstico e de responsável pelo cuidado do lar.

Neste mundo marcadamente masculino, a sua voz fez-se ouvir maioritariamente em favor da educação, que pode ser considerada a sua bandeira de luta. Influenciada pelo ideário pedagógico da época, pugnou por uma escola mais adequada às necessidades da criança e que a valorizasse enquanto tal. Em seu entender, o sucesso e a felicidade de qualquer nação civilizada passariam sempre pelo acesso à educação, como nos ilustram as suas sábias palavras: “o povo precisava de ser educado para ser mais feliz” (Gersão, 1946b, p. 781).

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1 Este trabalho é financiado por fundos nacionais através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), no âmbito do Centro de Estudos em Letras, com a referência n.º UIDP/00707/2020.

2 Domitila Carvalho foi professora, médica e poetisa. Foi a primeira mulher a frequentar a Universidade de Coimbra, tendo-se licenciado em Matemática, Filosofia e Medicina com distinção (Pimentel & Esteves, 2003, p. 292). Ocupou o cargo de deputada à Assembleia Nacional durante duas legislaturas (1935-1942).

3 Maria Cândida Parreira licenciou-se em direito em 1919. Para além de advogada, era também escritora e conferencista. Foi deputada à Assembleia Nacional na I Legislatura (1935-1938) (Souza, 2005a, p. 601).

4 Maria Guardiola licenciou-se em Matemática em 1920, tendo exercido a docência nos principais liceus femininos nacionais. Foi reitora do Liceu Maria Amália Vaz de Carvalho de 1928 a 1946. Para além da sua participação parlamentar, teve um papel de relevo nas principais organizações femininas do regime: A Obra das Mães e a Mocidade Portuguesa Feminina, nas quais ocupou cargos de direção durante muitos anos. Foi deputada à Assembleia Nacional na I, II, III e V Legislaturas, sendo considerada “uma das mulheres mais importantes e emblemáticas do Estado Novo” (Pereira, 2005, p. 593).

5José Alberto dos Reis (1875-1955) foi advogado e professor de Direito na Universidade de Coimbra, tendo sido diretor da Faculdade de Direito e ainda vice-reitor da mesma Universidade. No domínio político, este amigo pessoal de Salazar foi nomeado para o Conselho Político Nacional em 1931 e para o Conselho de Estado em 1933. Foi Presidente da Assembleia Nacional entre 1935 e 1945.

6Para mais informações acerca da vida e obra de Virgínia Gersão, veja-se Castelo (2003), Souza (2005), Coelho e Fontes (2018), Coelho e Fontes (2019) e Coelho e Fontes (2021).

7 Carolina Michaëlis de Vasconcelos foi a primeira mulher a dar aulas numa universidade portuguesa, onde ministrou lições de Filologia Portuguesa, que viriam mais tarde a ser compiladas no livro Lições de Filologia Portuguesa.

8 O percurso de Maria Lúcia Vassalo Namorado ficou marcado pela sua intensa atividade jornalística, tendo colaborado em diversos jornais e revistas, com destaque para a revista Os Nossos Filhos, da qual foi diretora e editora. Publicou vários livros, ficando a sua vida “marcada por uma preocupação constante com a intervenção social, a educação da mulher e da mãe, o bem-estar das crianças” (Pessoa, 2003, p. 972).

9Estas informações foram prestadas pela sua sobrinha, a Dr.ª Eliana Gersão, a quem manifestamos o nosso agradecimento pela colaboração.

10Augusta Faria Gersão licenciou-se em Ciências Matemáticas na Universidade de Coimbra. Foi professora no Liceu Infanta D. Maria em Coimbra, tendo tido “um papel determinante na organização administrativa e pedagógica inicial do liceu” (Seabra, 2003, p. 213).

11José dos Santos Bessa permaneceu na Assembleia Nacional desde a IV Legislatura (entrou ao mesmo tempo que Virgínia Gersão) até ao final do Estado Novo.

12 Mário de Figueiredo foi Presidente da Assembleia Nacional a partir de 1961, sendo considerado um dos membros mais próximos de Salazar, com quem mantinha relação de amizade desde os tempos de infância no Seminário de Viseu. Este deputado também fazia parte das relações de Virgínia Gersão, havendo registo de troca de correspondência entre ambos.

13 Maria Luísa de Saldanha da Gama van Zeller licenciou-se em Medicina em 1932, exercendo a profissão de médica e dirigente em várias instituições de saúde. Foi bastante ativa, integrando e dirigindo várias associações femininas da época, como por exemplo a Liga da Ação Católica Feminina. Enquanto deputada, foi eleita durante três legislaturas (1938-1949) e referiu-se, “em muitas das suas intervenções parlamentares, aos problemas mais prementes das mulheres do seu tempo, assumindo-se, por vezes, como sua ‘representante’” (Souza, 2005c, p. 724).

14 Note-se que, nesta altura, era frequente o cenário de fraude eleitoral, como nos documenta Rosas (2008, p. 90) a propósito das eleições realizadas em 1945.

15 Outro deputado com um importante papel no combate à tuberculose foi precisamente o seu amigo José dos Santos Bessa, que foi o responsável pela introdução da vacina gratuita contra a tuberculose para as crianças.

16 Manteve-se na transcrição do presente telegrama o texto de acordo com o original.

17Apesar da indicação de que se poderia substituir, o discurso usado pelo presidente da Assembleia é diferente do usado para outros deputados, em que diz perentoriamente “Sem interesse parlamentar”.

18Maria Leonor Correia Botelho concluiu o curso de assistente social com distinção, em 1939. Colaborou ativamente em diversas organizações, tais como a OMEN, o Instituto de Serviço Social, o Instituto Superior de Higiene Dr. Ricardo Jorge, o Instituto de Assistência à Família, entre outros. Foi deputada à Assembleia Nacional durante a V e a VI legislaturas. “A sua actividade parlamentar caracterizou-se pela lucidez e coragem com que ousou chamar a atenção para situações sociais que considerava profundamente injustas e que exigiam correção” (Souza, 2005b, p. 716).

19Susana Fontes. Email: sfontes@utad.pt

Recebido: 03 de Março de 2021; Aceito: 03 de Janeiro de 2022

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Sónia Coelho. Email: ccoelho@utad.pt

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