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Psicologia, Saúde & Doenças

versão impressa ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças v.12 n.2 Lisboa  2011

 

Repercussão emocional do diagnóstico de câncer digestivo

Carlos Alexis Chimpén López 1 & Víctor Arturo Chimpén Ruiz 2

 

1 Universidad Adventista do Plata, Libertador San Martín, Entre Ríos, Argentina.

2 Hospital Clínico Universitario de Salamanca, España.

 

Contactar para E-mail: carloschimpen@doc.uap.edu.ar

 

RESUMO

Este estudo objetivou analisar a repercussão emocional do paciente ao conhecer o diagnóstico de câncer digestivo. Para tanto, foram observadas três variáveis através de seus respectivos questionários de medida: Depressão (Inventário de Depressão de Beck), Qualidade de Vida ( EORTC QLQ C30: Questionário de Qualidade de Vida da Organização Européia para Pesquisa e Tratamento do Câncer) e Ansiedade (Inventário de Ansiedade Traço/Estado). Foram comparados dois grupos de pacientes, o primeiro composto por 28 indivíduos que conheciam o diagnóstico de câncer digestivo; e o segundo por 31 indivíduos que apresentavam câncer digestivo e que receberam um diagnóstico alternativo dos médicos que lhes atendiam. Os resultados mostraram que das três variáveis estudadas, o conhecimento do diagnóstico de câncer digestivo nos primeiros momentos da enfermidade somente afeta à depressão, não repercutindo sobre a qualidade de vida ou sobre a ansiedade em quaisquer dos seus aspectos.

Palavras-chave: câncer digestivo, ansiedade, depressão, qualidade de vida

 

Emotional impact of the diagnosis of digestive cancer

ABSTRACT

The raised objective of our study was to analyze the emotional impact of knowing the diagnosis of digestive cancer. For that reason it was evaluated the repercussions of the digestive cancer in levels of depression (BDI: Beck Depression Inventory), quality of life (EORTC QLQ C30: Questionnaire of European Organization of Research and Treatment of Cancer) and anxiety (STAI: State/Trait Anxiety Inventory) before changes due to the treatment take place. It was compared two groups of patients, the first one was composed for 28 subjects diagnosed with digestive cancer and known by them and the second one was composed for 28 subjects with digestive cancer but diagnosed with an alternative digestive pathology. The results show that to know the diagnosis of digestive cancer in the very first moment of the illness only affect to the level of depression. The quality of life and state-anxiety are not sensible variable s to the digestive cancerous pathology.

Key-words: digestive cancer, anxiety, depression, quality of life.

 

Apesar de que nos anos sessenta a maioria dos médicos tendia a não notificar ou informar escassamente aos pacientes com câncer do transtorno que padeciam, nos últimos anos esta tendência se inverteu. Esta mudança ocorreu por diferentes razões, em países como Estados Unidos por imperativos legais, porém na maioria dos casos pela demanda dos próprios pacientes ou pela adoção de um modelo de atenção médica centrado no papel ativo do paciente (Girón, Beviá, Medina, & Simón, 2002; Durá, 1990).

O diagnóstico e tratamento biomédico do câncer costumam produzir, no paciente, um grande impacto emocional e sérios problemas psicológicos, tais como ansiedade, depressão, angústia e estresse agudo. A intensidade, duração e conseqüências dos mesmos podem ser observadas e influem consideravelmente, em um sentido positivo ou negativo, pelo tipo de estratégia, grau de eficácia ou ineficácia, e percepção subjetiva do controle que mostram os pacientes ao se depararem com tais distúrbios (Bayés, 1985; Bayés, 2008).

Todas estas reações dos pacientes com câncer poderiam de imediato, se relacionar com transtornos mentais, porém, nada mais longe da realidade, pois são respostas de adaptação à enfermidade frente a uma situação verdadeiramente perturbadora e estressante devendo, portanto, ser consideradas com naturalidade. A exceção está no caso de que perdurem muito tempo e aumentem o sofrimento dos pacientes, neste caso, em lugar de servir como respostas adaptativas, se converterão em transtornos a tratar mediante psicoterapia, medicação ou de forma conjunta.

O câncer digestivo é uno dos mais fáceis de esconder, já que nos primeiros momentos da enfermidade ocorre de um modo parecido a outras doenças não tão sérias do aparato digestivo. Deste modo, nos propusemos investigar as conseqüências emocionais relacionadas ao informar ou não e desmitificar as reações desmedidas que se espera encontrar nos familiares e, às vezes na equipe médica, pelas quais se tende a ocultar o diagnóstico de câncer digestivo.

 

MÉTODO

Participantes

A amostra foi obtida nos departamentos de Medicina Interna e de Cirurgia do Hospital Clínico Universitário de Salamanca (Espanha), durante um período de dois anos e meio.

O número total de indivíduos que conformaram a amostra foi de 59, dos quais 31 compunham o grupo controle (GC: com câncer do aparato digestivo, porém com outro diagnóstico) e 28 o grupo de estudo (GE: pacientes diagnosticados de câncer digestivo e que conheciam seu diagnóstico).

Material

O conjunto de provas foi constituído pelos seguintes instrumentos de avaliação:

Entrevista semi-estruturada: onde se recolhiam os dados sócio-demográficos.

Inventário de Ansiedade Traço/Estado - STAI (Spielberger, Gorsuch, & Lushene, 1994).

Inventário de Depresão de Beck - BDI (Beck, Ward, & Mendelson, 1961; Conde & Useros, 1975).

Questionário de Qualidade de Vida - EORTC QLQ-C30 (Aaronson & Beckmann, 1987; Aaronson, Ahmedzai, Bullinger et al., 1993; Arraras Urdaniz et al., 1995).

Procedimento

O objetivo do nosso estudo foi avaliar se o conhecimento do diagnóstico afetará negativamente aos pacientes com câncer digestivo e repercutirá em seu estado de ânimo, ansiedade e qualidade de vida.

Na análise dos dados foi utilizado o programa estatístico SPSS 11.5 e a confecção dos gráficos com o programa Microsoft Word 2003.

 

RESULTADOS

Em função da variação de conhecimento do diagnóstico se formaram dois grupos, o primeiro formado por 28 pacientes com câncer digestivo que conheciam o diagnóstico (sim) e o outro formado por 31 pacientes que receberam um diagnóstico não real e totalmente desvinculado de doenças oncológicas (não).

 

Tabela 1

Comparação dos grupos de câncer: Depressão

 

Ao realizar a análise da diferencia de médias (teste t de Student) onde como variável independente se introduzem os grupos de conhecimento do diagnóstico e como variável dependente as pontuações em depressão, os resultados indicam diferenças estatisticamente significativas (t(57)=2,78; pa=0,007). Os participantes que conhecem seu diagnóstico apresentaram maiores valores de depressão, ou seja, o desconhecimento do diagnóstico protege aos indivíduos do estado de ânimo depressivo.

 

Figura 1

Conhecimento do Diagnóstico: Depressão

 

Também avaliamos se o conhecimento do diagnóstico influía sobre a percepção da qualidade de vida. O resultado do teste t de Student não apresentou diferenças significativas (t57=0,76; pa=0,45). Encontramos valores similares no grupo que conhecia o diagnóstico e no grupo que recebia um diagnóstico alternativo e, portanto, não conhecia seu verdadeiro diagnóstico.

 

Tabela 2

Comparação dos grupos de câncer: Qualidade de vida

 

Por último, analisamos a variável ansiedade-estado. Ao comparar os dois grupos de câncer em função do conhecimento e depois de realizar uma análise da diferença de médias se obtiveram os resultados expostos na tabela 3. Comprovando que também não existiam diferenças significativas (t57= -0,72; pa=0,47).

 

Tabela 3

Comparação dos grupos de câncer: Ansiedade-Estado

 

DISCUSSÃO

Diversos estudos mostram como o padecer de uma enfermidade que ameaça seriamente a vida produz sentimentos de confusão, ineficácia e ansiedade (Piqueras, Martínez, & Ramos, 2008; Grahn, 1996), e que o conhecer ao diagnóstico desta enfermidade pode desencadear um quadro de reação aguda caracterizado pelo estreitamento da consciência, desorientação e sintomas autonômicos de curta duração, ainda que seja mais freqüente observar sintomas afetivos também de curta duração (López Ibor, 2007; Salvador et al., 1992). Nesse sentido, nossos resultados confirmam a aparição de sintomas depressivos, apesar de não estarem relacionados com a ansiedade.

Também concordamos com López Ibor (2007) y Salvador e cols. (1992), em afirmar que as reações catastróficas frente ao diagnóstico, como uma reação de estresse extremo e ruptura com a vida anterior do indivíduo, se desenvolvendo a uma síndrome depressiva severa, com desesperança, idéias de morte, rejeição de alimentos e assistência, insônia, ansiedade, preocupação ou agitação psicomotora, descritas por Temoshok em 1984 e mais recentemente por David (1999), são bastante infreqüentes, ao menos no caso do câncer digestivo que estudamos.

Encontramos somente um estudo que trata das reações ao diagnóstico de câncer digestivo, realizado por Nordin e Glimelius (1997), porém mais relacionado com o prognóstico e a confrontação da enfermidade, que com a reação ao diagnóstico em si mesmo. De forma associada, os níveis de ansiedade e depressão foram pequenos, ainda que se observaram níveis altos nos pacientes incuráveis. Tendo em conta este trabalho e que os indivíduos com câncer de nossa amostra não conheciam seu prognóstico, pensamos que as diferenças encontradas na depressão poderiam se dever à antecipação negativa das conseqüências da enfermidade. Entretanto, o efeito de se realizar a avaliação antes de passada uma semana desde o conhecimento do diagnóstico, não dá lugar à apresentação da “ansiedade frente à incerteza”, nem a afeta os valores da variável qualidade de vida, normalmente afetada nestes pacientes durante o passar do tempo, as intervenções e os tratamentos (Montejo, Llorca, & Díez, 1996).

Não encontramos estudos comparativos entre indivíduos com câncer digestivo que conhecem seu diagnóstico, com os que não o conhecem e que receberam um diagnóstico alternativo. Neste sentido, nosso trabalho abre a possibilidade de se realizar futuras investigações similares, e que nos permitam comparar os resultados.

Como conclusão, podemos afirmar que o conhecer do diagnóstico produz sentimentos de desesperança que influem negativamente no estado de ânimo nos pacientes. O fato de não afetar a qualidade de vida, nem a ansiedade, nos proporciona um ponto de partida para realizar novas avaliações em outros momentos evolutivos da enfermidade.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido em 9 de Setembro de 2009/ Aceite em 30 de Outubro de 2011